REPENSANDO O FLUXO MIGRATÓRIO DAS COMUNIDADES TRADICIONAIS: A NECESSIDADE DO OLHAR ETNOGRÁFICO NA FORMAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS À CIRCULAÇÃO TRANSFRONTEIRIÇA DOS POVOS INDÍGENAS

REPENSANDO O FLUXO MIGRATÓRIO DAS COMUNIDADES TRADICIONAIS: A NECESSIDADE DO OLHAR ETNOGRÁFICO NA FORMAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS À CIRCULAÇÃO TRANSFRONTEIRIÇA DOS POVOS INDÍGENAS

28 de novembro de 2023 Off Por Cognitio Juris

RETHINKING THE MIGRATION FLOW FROM TRADITIONAL COMMUNITIES: THE NEED FOR AN ETHNOGRAPHIC PERSPECTIVE IN THE FORMATION OF PUBLIC POLICIES AIMED AT THE CROSS-BORDER MOVEMENT OF INDIGENOUS PEOPLES

Artigo submetido em 25 de setembro de 2023
Artigo aprovado em 10 de outubro de 2023
Artigo publicado em 28 de novembro de 2023

Cognitio Juris
Volume 13 – Número 50 – Novembro de 2023
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Izaura Rodrigues Nascimento [1]
Geraldo Uchôa de Amorim Júnior [2]
André Ricardo Antonovicz Munhoz [3]

RESUMO: Almeja-se com o presente estudo discutir a situação do fluxo migratório das comunidades tradicionais indígenas através do estudo de instrumentos etnográficos dispostos por antropólogos clássicos como Lévi-Strauss e Malinowski. Intenta-se rediscutir a democracia e a justeza das políticas públicas adotadas em território nacional tendo como balizador o pensamento coletivo acerca das populações indígenas, bem como seus direitos à (livre) circulação em território indígena. A metodologia aplicada foi o método dedutivo; quanto aos meios de pesquisa, utilizou-se o bibliográfico, com uso da doutrina, da legislação e da jurisprudência sobre o assunto; no tocante aos fins, a pesquisa compreende-se como qualitativa. Conclui-se que há um espaço de incerteza jurídica, decorrente da ausência de aplicação da eficácia vertical dos direitos fundamentais, quando da produção de normas infraconstitucionais e políticas públicas; sugerindo-se produzir um panorama normativo mais justo, democrático e duradouro às normas nacionais voltadas à migração das comunidades tradicionais por intermédio dos estudos etnográficos.

PALAVRAS-CHAVE: Comunidades Tradicionais. Etnografia. Migração.

ABSTRACT: The aim of this study is to discuss the situation of the migratory flow of traditional indigenous communities through the study of ethnographic instruments arranged by classical anthropologists such as Lévi-Strauss and Malinowski. The aim is to re-discuss democracy and the fairness of public policies adopted in the national territory, based on collective thinking about indigenous populations, as well as their rights to (free) circulation in indigenous territory. The applied methodology was the deductive method; as for the means of research, the bibliographic was used, with use of the doctrine, legislation and jurisprudence on the subject; with regard to the purposes, the research is understood as qualitative. It is concluded that there is a space of legal uncertainty, due to the lack of application of the vertical effectiveness of fundamental rights, when producing infraconstitutional norms and public policies; suggesting the production of a fairer, more democratic and lasting normative panorama for national norms aimed at migration from traditional communities through ethnographic studies.

KEYWORDS: Migration; Indigenous; Ethnography.

INTRODUÇÃO

Tomando-se como exemplo a situação de penúria das comunidades tradicionais da etnia Warao, verifica-se que a precariedade da situação indígena em situação migratória é quadro consolidado no cenário urbano de Manaus. Imigrantes que, desde 2014, cruzam a fronteira venezuelana e ingressam no território pátrio – através de canoas ou ônibus – buscando fugir da crise política e econômica de sua terra natal.

A questão da migração, todavia, sofrera aumento exponencial durante a pandemia de Covid-19, considerando os sucessivos pedidos de deportação formulados pelo Executivo de Boa Vista/RR à Polícia Federal (suspensos pela Justiça Federal apenas em dezembro de 2021). Desta forma, vislumbraram, na capital amazonense, um novo espaço para consolidar seu meio ambiente multifacetado.

O objeto do presente artigo é analisar – dentro da conceituação de comunidade tradicional (perpassando pelas lições de Malinowski, Lévi-Strauss, Little, entre outros) – as origens da dificuldade da condução de políticas públicas voltadas a políticas públicas migratórias das populações indígenas.

Logo, tem-se que o estudo proposto ultrapassa a situação concreta apresentada – negligência e isolamento dos Warao na comunidade amazonense – intentando demonstrar, de maneira crítica, as origens históricas e sociológicas para tal processo de marginalização por parte do Poder Público, utilizando-se, como suporte teórico, os ensinamentos de autores clássicos da antropologia.

1. PERCEPÇÃO HISTÓRICA DAS COMUNIDADES TRADICIONAIS: AS MÚLTIPLAS VISÕES DA ANTROPOLOGIA DURANTE OS SÉCULOS.

A antropologia, em sua visão clássica do século XIX, fora profundamente influenciada pelo contexto político de supremacia de ideologias dos denominados “povos civilizados” e o dever (por vezes tido como sagrado, natural) de “educar” os “bárbaros”, alavancá-los ao “patamar civilizatório” adequado aos padrões dos conquistadores.

Assim, não se pode desvencilhar a utilização de instrumentos antropológicos (em especial os estudos etnográficos em sua origem) do processo de conhecimento de comunidades distintas – em especial as populações tradicionais – com o fito de facilitar a exploração e dominação por parte dos civilizados. Importantes as lições de Lifschitz (2013, pág. 13) para a adequada compreensão do panorama:

Teorias que foram utilizadas como referência pela Antropologia em suas origens refletiam as ideologias e posturas políticas dos “civilizados”, que pretendiam justificar o domínio e a exploração dos territórios conquistados apoiando-se em concepções sobre a superioridade natural dos europeus com relação aos povos conquistados considerados “atrasados”.

Assim, tem-se que o início da antropologia (século XIX, a partir da década de 1870), liderado por Edward Burnett Tylor (com sua obra Primitive Culture[4]) e Herbert Spencer (com o clássico The Synthetic Philosophy[5]) fora no sentido de demonstrar as diferenças culturais entre as diversas comunidades, bem como a ideologia do progresso – servindo de suporte teórico às ações adotadas durante o processo de colonização.

Tem-se a gênese do evolucionismo ou darwinismo social o qual possui características puramente etnocentrista e pretensões científicas. Todavia, critica-se na atualidade que, quanto ao cientificismo proposto, não houve a concretização de seus parâmetros, visto que, baseava-se em (pre)conceitos abstratos sobre povos fora do continente europeu, sem o efetivo conhecimento destas comunidades.

A ideologia central dos primeiros antropólogos, fundada no etnocentrismo, pressupõe uma hierarquia das raças aferidas através da cultura (civilizada ou bárbara/inferior). Nesta visão, tinha-se que a cultura produza pelo homem branco (europeu) seria superior aos outros povos (colonizados), servindo de fundamento para as práticas do colonialismo e da escravidão.

Tendo como régua a cultura (compreendida nas lições de Tylor como o complexo total de conhecimento, crença, arte, direito, entre outros, adquiridos pelo homem como membro de sua comunidade), afirmava-se que a raça branca era superior às outras, criando-se uma hierarquia na qual os asiáticos ocupavam o segundo lugar, os indígenas americanos em terceiro, e, por último, os povos negros africanos. Desta forma, justificava-se a colonização como uma (sagrada) missão de auxiliar no desenvolvimento “civilizado e superior” aos povos “menos desenvolvidos”.

As ciências sociais do século XIX, tendo como percussoras, entre outras, a antropologia, amparavam o contexto político-econômico dos séculos XIX e XX, tendo-se em tais ideologias a gênese da atual marginalização das comunidades tradicionais – tido, ainda que de forma inconsciente e abstrata no coletivo social – a premissa de uma comunidade que depende da assistência/ tutela de outras.

Estas sementes, plantadas há mais de dois séculos, germinam na sociedade do século XXI ao se perceber a dificuldade de se enxergar as comunidades tradicionais como indivíduos – com voz positiva (direitos políticos ativas e passivos) – capazes de conduzir, influenciar e contribuir na confecção de políticas públicas; ao contrário da visão ainda predominante de meros receptáculos (objetificação/ invisibilidade) de medidas governamentais.

Todavia, no final do século XIX, exsurgem as primeiras correntes de modificação na antropologia no sentido de alterar as visões clássicas etnocentristas. Um dos primeiros vanguardistas (pioneiro da etnografia) fora Franz Boas através de sua obra As limitações do método comparativo da antropologia – introduzindo o relativismo cultural (ideologia que combate a ideia de classificação hierarquizante da cultura).

Neste, discorre-se sobre a necessidade de aprofundamento na cultura de um povo (adotar iguais costumes, conhecer a língua, ou seja, o trabalho etnográfico) para fins de compreendê-lo plenamente, sem preconceitos. Sua visão fora influenciada por uma expedição realizada no norte do Alasca para fins de mapear um conjunto de ilhas da região, levando-o a conhecer os povos nativos (em especial os indígenas Kwakiutl). Excerto da obra de Boa (1896, págs. 31-32), in verbis, pode auxiliar na compreensão do procedimento revolucionário que propunha:

Desse modo, reconhecemos que a suposição fundamental tão frequentemente formulada pelos antropólogos modernos não pode ser aceita como verdade em todos os casos. Não se pode dizer que a ocorrência do mesmo fenômeno sempre se deve às mesmas causas, nem que ela prove que a mente humana obedece às mesmas leis em todos os lugares. Temos que exigir que as causas a partir das quais o fenômeno se desenvolveu sejam investigas, e que as comparações se restrinjam àqueles fenômenos que se provem ser efeitos das mesmas causas. Devemos insistir para que essa investigação seja preliminar a todos os estudos comparativos mais amplos. Nas pesquisas sobre sociedade tribais, aquelas que se desenvolveram por associação precisam ser tratadas separadamente das que se desenvolveram por desintegração […] Em suma, antes de se tecerem comparações mais amplas, é preciso comprovar a compatibilidade do material. (grifou-se)

Mais revoluções advieram no século XX: o antropólogo polonês Bronislaw Malinowski estruturou a antropologia ao teorizar o método funcionalista, no qual se compreende a sociedade tendo como base o papel e a função de seus vários elementos. Em sua obra Os Argonautas do Pacífico Ocidental, de 1922, Malinowski traça um verdadeiro manual[6] para o trabalho antropológico, baseado na pesquisa de campo e no processo metódico de coleta de dados, ou seja, os pressupostos básicos da etnografia moderna.

O valor de seus ensinamentos também se funda na modificação do olhar do antropólogo, visto que a visão clássica do métier era de puro objetivismo (tendo como premissa a cultura hierarquizante) e Malinowski elucida a impossibilidade de não se enxergar no contexto observado, tampouco não ser modificado pelos elementos que o cercam[7]. Esta compreensão é imprescindível para garantir, na perene subjetividade do trabalho, o caráter mais científico possível dos estudos e das observações.

Outro antropólogo que revolucionara seu campo fora Claude-Lévi-Strauss, o qual traçara o método do estruturalismo. Neste, busca-se compreender as comunidades através da imersão de sua cultura e de sua linguagem, estabelecendo suas estruturas fundamentais.

Em sua obra O Pensamento Selvagem, são trazidas importantes contribuições acerca das comunidades tradicionais. Inicia-se desmistificando a visão clássica de que o conhecimento dos selvagens teria como único enfoque as “necessidades orgânicas e econômicas”, esclarecendo que há um conhecimento sistematicamente montado não apenas pela utilidade prática, mas, de igual forma que os tidos civilizados, em um profundo desejo de adquirir conhecimento (a curiosidade intrínseca à natureza humana)[8].

Tem-se, portanto, uma progressiva metamorfose da antropologia (e dos instrumentos etnográficos) que auxiliam na compreensão das comunidades tradicionais – passando do darwinismo social ao funcionalismo e ao estruturalismo.

Todavia, consoante explanado, há premissas no inconsciente coletivo que dificultam a modificação da posição que os povos tradicionais ocupam no cenário político: permanece a visão (ainda que velada) não de sujeitos com poder ativo, decisório, argumentativo, mas de indivíduos que carecem de tutela, proteção, meros receptáculos de medidas governamentais formuladas por terceiros.

2. POLÍTICAS PÚBLICAS E AS COMUNIDADES TRADICIONAIS

Segundo o Censo de 2022[9], o Brasil conta com 207.750.291 (duzentos e sete milhões, setecentos e cinquenta mil, duzentos e noventa e um) habitantes. A despeito de não se ter a confirmação de dados do Censo de 2022, até a presente data[10], a respeito da população indígena, tem-se a previsão de mais de 1,4 (um ponto quatro) milhão de indígenas residentes no Brasil. Aumento expressivo considerando os dados do Censo de 2010[11] (896.900 indígenas, aproximadamente). Tem-se, então, que as comunidades tradicionais cresceram em torno de 66% (sessenta e seis por cento) no Brasil, representando 0.67% (sessenta e sete por cento) da população brasileira.

Todavia, a despeito do progressivo incremento de sua população (havendo novos métodos de identificação, como a consulta livre prévia e esclarecida junto às lideranças das associações indígenas), ainda se vislumbra uma diminuta participação deste na condução das políticas públicas.

Importante estabelecer – a par das ilações do item Percepção Histórica das Comunidades Tradicionais – os principais instrumentos normativos que dispuseram sobre as comunidades indígenas, esclarecendo como os direitos lhe seriam (ou não) garantidos:

Século XIX, 1824, Constituição Imperial do Brasil: não há manifestação expressa sobre as comunidades indígenas[12]. Importante consignar que em 1831, com a revogação das Cartas Régias de Dom João VI, extinguiu-se a figura da servidão. Todavia, os indígenas libertos não encontraram suporte no novo governo[13].

Constituição Republicana de 1891: permanece o total silêncio do constituinte sobre os povos tradicionais[14]. Posteriormente, na vigência desta Carta Magna, estabeleceu-se o art. 6º do Código Civil de 1916 que dispunha sobre a “incapacidade relativa dos silvícolas”, prevendo-se um regime tutelar voltado à adaptação e progressiva incorporação desta comunidade “à civilização do País” – disposições revogadas apenas pelo Código Civil de 2002.

Constituição de 1934: primeiro instrumento que dispusera sobre os indígenas (mais de um século após a formação do Estado Brasileiro). Classificava-os como silvícolas e dispunha sobre a posse destes quanto a seus territórios, porém atribuindo à União a responsabilidade pela promoção da política indigenista[15].

Constituição de 1937: repete as previsões estabelecidas na carta magna anterior[16].

Constituição de 1946: reproduz os termos da Carta de 1934 e 1937[17].

Constituição de 1967: avança-se nos direitos dos “silvícolas”, garantido o usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nele existentes[18]. Imprescindíveis as lições de Dornelles (2018, pág. 77) quanto à invisibilidade, no sentido de que houve, ao longo dos séculos, um perene processo encetado pelo Estado (através de seus órgãos e representantes) de produzir elementos etnográficos falaciosos, com o fito de diminuir a presença da comunidade indígena no território nacional e facilitar o uso de suas terras, sem preocupação com políticas indigenistas, in verbis:

“procurou-se apresentar alguns apontamentos sobre como a produção da invisibilidade dos povos indígenas passava pela construção de dados estatísticos nos espaços dos aldeamentos, com finalidade muito clara de expropriar terras e obter trabalhadores. E foram os próprios indígenas que mostraram, através do acionamento de todos os recursos que possuíam, sua consciência sobre tais processos. (grifou-se)

Constituição de 1988: cria capítulo próprio para tratar dos indígenas (ultrapassando-se a denominação silvícola); revoluciona a relação do Estado com a comunidade tradicional, visto que garantiu o direito de manutenção da identidade do indígena (reconhecimento da organização social, costumes, línguas, crenças e tradições; direito originário sobre terras tradicionalmente ocupadas; conceituação do que se entende por terra indígena – avançando no caráter meramente habitacional para o espaço de disseminação de seu meio ambiente, de sua cultura e de sua reprodução física; fomentando o direito coletivo indígena).

Por essencial ao estudo, colaciona-se o teor do art. 231, caput e parágrafos, e art. 232, da CF/88, contrapondo – a par das demais Cartas Magnas – a gama de direitos reconhecidos:

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. (grifou-se)

§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. (grifou-se)

§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. (grifou-se)

§ 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei. (grifou-se)

§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis. (grifou-se)

§ 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, “ad referendum” do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco. (grifou-se)

§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé. (grifou-se)

§ 7º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.

 Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo. (grifou-se)

Observa-se, claramente, a mudança de paradigma em relação às Constituições pretéritas, na qual o Constituinte se limitava a assegurar a posse permanente dos indígenas sobre a terra tradicional.

Interessante observar, igualmente, que até a Constituição de 1946 havia o dever da União de legislar sobre a “incorporação dos silvícolas à comunhão nacional” (art. 5º, alínea “r”, CF/46). Ou seja, a Carta Magna de 1988 – com a garantia de reconhecimento da cultura, do meio ambiente, da língua, das tradições dos indígenas (art. 231, §1.º, CF/88) – apresenta um salto evolutivo significativo no sentido de garantir a identidade do indígena (a par de todas as Constituições pretéritas que tinham como objetivo transformá-lo/ inseri-lo na “comunhão nacional”).

Deve-se pontuar que as mudanças estatuídas na Constituição de 1988 decorreram de um processo social iniciado na década de 1970, tendo como marco a 1ª Assembleia de Chefes Indígenas, em 1974, no município de Diamantino/MT. Neste encontro (com representantes de nove povos distintos), alavanca-se a posição dos indígenas como organizadores, planejadores de seu próprio futuro, nas palavras de CIMI, in verbis:

A conclusão mais importante que se poderia tirar deste primeiro encontro de Chefes Indígenas é que os índios são capazes de resolver seus próprios problemas, planejar e construir seu próprio futuro, desde que os brancos não os atrapalhem. Esse branco pode ser a FUNAI, as Missões ou os exploradores de toda espécie. (CIMI, 1974, pág. 2). (grifou-se)

Todavia, deste contexto histórico, prevalece o entendimento dominante de que os indígenas são seres passíveis de tutela, não garantidores da condução de suas políticas públicas. Verifica-se uma objetificação das comunidades tradicionais, revisitando o conceito de invisibilidade do grupo social; culminando em não os enxergar como sujeitos ativos de mudança. Extremamente pertinentes as pontuações de Rosane Lacerda (2008, pág. 16) a respeito da visão geral coletiva dos indígenas:

Esta visão dos índios como portadores de uma incapacidade natural levou a que fossem vistos também como naturalmente sem voz e inativos, sempre necessitando serem representados em seus diversos interesses. Levou também à ideia de serem totalmente incapazes de sobreviver frente à suposta superioridade do aparelho “civilizado” não-indígena. Os índios estariam, enfim, destinados a desaparecer da face da terra. O tipo de tratamento recebido por parte do Estado ou da sociedade brasileira apenas aceleraria ou retardaria tal processo. (grifou-se)

A partir da 1ª Assembleia de Chefes Indígenas, em 1974, tem-se registrado outros 57 (cinquenta e sete) encontros nacionais entre o lapso de 1974 a 1984, segundo Matos (1997). Verifica-se uma profunda análise da situação indígena, criticando-se o modelo vigente (de tutela), bem como elaborando propostas no sentido de condução de suas políticas públicas.

Assim, verifica-se um movimento cultural e social tendente à racionalização das políticas públicas tendo como principal atores as comunidades indígenas, todavia, da farta legislação trazida, observa-se que – a despeito das conquistas evidenciadas na Constituição Federal de 1988 – permanece no inconsciente coletivo a premissa de incapacidade, de voz inativa na condução de suas políticas públicas.

3. O OLHAR ETNOGRÁFICO COMO ELEMENTO INSTRUMENTAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS À CIRCULAÇÃO TRANSFRONTEIRIÇA DOS POVOS INDÍGENAS.

Perpassando por todos os capítulos anteriores, tem-se que a situação das comunidades tradicionais – em termos de legislação aplicável – é de um panorama de receptáculos de direitos, sem voz ativa no processo de condução de suas políticas públicas.

No tocante às legislações sobre processos migratórios verifica-se, de igual forma, o processo de marginalização das comunidades tradicionais. Explana-se:

A vigente Lei de Migração N. 13.445/17 revogara o antigo Estatuto do Estrangeiro (Lei N. 6.815/80). A mudança do paradigma decorre do fato de que na legislação pretérita havia a prevalência do princípio da segurança nacional e do utilitarismo econômico (inclusive insculpido no art. 2.º do Estatuto “Na aplicação desta Lei atender-se-á precipuamente à segurança nacional, à organização institucional […]”).

Na novel norma havia a previsão de livre circulação das populações tradicionais, especificamente no art. 1.º, §2.º do Projeto de Lei N. 288/13. Todavia, tal disposição fora vetada pelo Poder Executivo. Nas palavras de Dupas (2017, pág. 75):

Os povos indígenas e as populações tradicionais não foram contemplados como sujeitos de direitos, o que demonstra que ainda há a permanência do princípio de defesa do território nacional como elemento de soberania e o controle da entrada e saída de indígenas […]

O texto original dispunha que “são plenamente garantidos os direitos originários dos povos indígenas e das populações tradicionais, em especial o direito à livre circulação em terras tradicionalmente ocupadas” (grifou-se). Porém, via veto, o Presidente Michel Termer justificara a retirada da previsão normativa nos seguintes termos:

O dispositivo afronta os artigos 1.º, I; 20, § 2.º; e 231 da Constituição da República, que impõem a defesa do território nacional como elemento de soberania, pela via da atuação das instituições brasileiras nos pontos de fronteira, no controle da entrada e saída de índios e não índios e a competência da União de demarcar as terras tradicionalmente ocupadas, proteger e fazer respeitar os bens dos índios brasileiros. (CASA CIVIL, 2017)

Observa-se que, a despeito da ausência de oitiva das comunidades tradicionais envolvidas, elegeu-se como metavalores: a soberania nacional, a faixa de fronteira para defesa do território nacional e a propriedade da União sobre as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas. Cristalino o uso dos argumentos descritos no Estatuto do Estrangeiro, no sentido de defesa nacional acima de qualquer outro direito fundamental (entre entes, o núcleo essencial dos direitos indígenas).

A mudança de paradigma da Lei de Migração de N. 13.445 é inegável, visto que rompera com as ideologias predominantes da Ditadura Militar. Porém, evidente que remanescem melhoramentos a serem efetuados, em especial no tocante às comunidades tradicionais em processo de migração.

A liberdade de locomoção – inclusive em âmbito internacional – é tida como direito universal do homem, protegida pelo núcleo essencial da igualdade e da não discriminação.

Trazendo para a situação concreta enfrentada, em razão da precária situação dos indígenas Warao em território nacional, a Defensoria Pública da União, em 2016, impetrara habeas corpus coletivo para evitar a deportação de 450 (quatrocentos e cinquenta) venezuelanos oriundos de comunidades tradicionais, bem como recomendara às autoridades policiais de Roraima que impedissem manifestações de xenofobia no estado.

Em paralelo, na condição de custos vulnerabilis, houve o ingresso como amicus curiae, nos autos da Ação Civil Originária N. 3.121, na qual o Estado de Roraima solicitara o bloqueio da fronteira com a Venezuela. (Defensoria Pública da União, 2018). O Poder Público argumentara à época:

Argumenta a ré que, dentre os diversos pedidos feitos na inicial, pretende o Estado autor obter tutela antecipada para que “seja compelida a fechar temporariamente a fronteira Brasil-Venezuela a fim de impedir que o fluxo imigratório desordenado produza efeitos mais devastadores aos brasileiros e estrangeiros residentes no Estado de Roraima; ou que seja compelida a limitar o ingresso de refugiados venezuelanos a uma quantidade compatível com a capacidade do Estado Brasileiro de acolher e prover as necessidades básicas de tais estrangeiros, até que sejam minimizados e corrigidos os impactos sociais e econômicos decorrentes dos milhares de estrangeiros que estão no Estado de Roraima (STF, 2018, ON-LINE).

Não houve manifestação expressa por parte do Pretório Excelso acerca do fechamento das fronteiras, limitando-se a Relatora (Ministra Rosa Weber) a afirmar: “Houve a tentativa de conciliação sobre as questões em que cabível, excluído o tema de ‘fechamento da fronteira’, sobre o qual proferi decisão negativa (evento 206)”.

A decisão da ministra privilegia as garantias dispostas em tratados internacionais que dizem respeito ao refúgio humano, entendendo que o pedido do Estado de Roraima infringira diretamente Constituição Federal, a Lei da Migração e ainda o Acordo sobre documentos de viagem dos Estados Partes do Mercosul e Estados Associados, ao qual Brasil e Venezuela aderiram (PAULI 2019, pág. 129).

Assim, tem-se a necessidade de revisitar as legislações pertinentes à circulação das comunidades tradicionais, visto se tratar de direito fundamental do homem, em especial da população indígena; não se podendo, a pretexto de garantir a defesa nacional, impedir o fluxo migratório ínsito ao meio ambiente (em suas multifacetas) dessas etnias.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apresentara-se a evolução do olhar antropológico sobre as comunidades indígenas, bem como as legislações de regência em nível nacional, com o fito de discutir, de forma crítica, o panorama legal da circulação das comunidades indígenas no território brasileiro.

Constata-se uma evolução legislativa (Lei N. 13.445/17), porém, em razão de veto do Poder Executivo, houve a denegação dos direitos das populações tradicionais de livre circulação, amparados pelos antigos preceitos da segurança e da defesa nacional (Lei N. 6.815/80).

Diversas ações em âmbito nacional, como, por exemplo, a situação da etnia Warao em Roraima (Ação Civil Originária N. 3.121), visam a assegurar a continuidade da livre circulação das comunidades tradicionais, porém, em razão da omissão legislativa, ainda a situação depende da interpretação do Judiciário sobre a matéria, implicando o desrespeito do núcleo essencial dos direitos da população indígena.

REFERÊNCIAS

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[1] Doutora em Relações Internacionais e Desenvolvimento Regional (UnB/UFRR/Flacso). Mestre em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia, Universidade Federal do Amazonas, UFA. Graduação em Ciências Sociais, UFA. Docente da UFA, atuando no Curso de Mestrado Profissional em Segurança Pública, Cidadania e Direitos Humanos, no Mestrado em Direito Ambiental, e nos cursos de Graduação em Ciências Econômicas e em Direito, da Universidade do Estado do Amazonas, UEA. https://orcid.org/0000-0001-5508-8730

[2] Mestrando em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas – UEA. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Amazonas. Procurador do Município de Manaus/AM. Advogado. https://orcid.org/0009-0006-7207-3809

[3] Mestrando em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas – UEA. Especialista em Direito do Estado pela Universidade Anhanguera. Defensor Público (DPE/AM). https://orcid.org/0000-0002-3127-4181

[4] No seguinte trecho (Tylor, 1871 pág. 13) encontra-se a base teórica da antropologia clássica no sentido de um desenvolvimento progressivo da cultura (como forma de manifestação de uma comunidade), servindo de suporte intelectual à era de colonização em curso: “CULTURE or Civilization, taken in its wide ethnographic sense, is that complex whole which includes knowledge, belief, art, morals, law, custom, and any other capabilities and habits acquired by man as a member of society. The condition of culture among the various societies of mankind, in so far as it is capable of being investigated on general principles, is a subject apt for the study of laws of human thought and action. On the one hand, the uniformity which so largely pervades civilization may be ascribed, in great measure, to the uniform action of uniform causes; while on the other hand its various grades may be regarded as stages of development or evolution, each the outcome of previous history, and about to do its proper part in shaping the history of the future”. (grifou-se)

[5] Doutrinador famoso por propagar o darwinismo social, baseado nos princípios da evolução, inclusive seleção natural, aplicados nas sociedades humanas, classes sociais e indivíduos.

[6] Os três principais instrumentos da etnografia são: objetivos verdadeiramente científicos; condições adequadas para o trabalho etnográfico e métodos especiais de recolha, manipulando e registrando suas provas (Malinowski 1984, pág. 03).

[7] Trata-se do que fora discutido por Malinowski (1984, pág. 03) como “Na Etnografia, o autor é, simultaneamente, o seu próprio cronista e historiador; e embora as suas fontes sejam, sem dúvida, dificilmente acessíveis, elas são também altamente dúbias e complexas; não estão materializadas em documentos fixos e concretos, mas sim no comportamento e na memória dos homens vivos”.

[8] “Pode-se objetar que uma tal ciência não deve ser absolutamente eficaz no plano prático. Mas, justamente, seu objeto primeiro não é de ordem prática. Ela corresponde a exigências intelectuais ao invés de satisfazer às necessidades” (Lévi-Strauss, 2004 pág. 24).

[9] Disponível em https://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2022/Previa_da_Populacao/POP2022_Brasil_e_UFs.pdf. Acesso em 09/03/2023.

[10] Informação mais recente, de 06/03/2023, declara que o IBGE está realizando a última etapa do Censo 2022 na Terra Indígena Yanomami, prevendo-se a finalização do estudo e disponibilização dos dados em 2023/2024, consoante informações coletadas de https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-03/ibge-inicia-ultima-etapa-do-censo-2022-na-terra-indigena-yanomami. Acesso em 09/03/2023.

[11] https://indigenas.ibge.gov.br/graficos-e-tabelas-2.html. Acesso em 09/03/2023.

[12] Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm. Acesso em 09/03/2023.

[13] Essencial veicular, ainda, as lições de Dornelles (2018, pág. 63) em que se demonstra o processo de integração dos indígenas ao cenário nacional como indivíduos despossuídos, nos seguintes termos “O cercamento das terras indígenas através das definições estabelecidas no Regulamento acerca das Missões de catequese e civilização dos Índios (1845, art. 1˚,§ 11,13,15) e na lei de regulamentação fundiária e de colonização (1850), por meio do conceito de terras devolutas e da reserva de áreas para a colonização indígena via aldeamentos (art. 12˚ da Lei 601/1850, regulada pelo Decreto 1.318, art. 72˚ ao 75˚) teve como objetivo a dissolução das formas comunitárias deacesso à terra e, fim último, a formação de um contingente de trabalhadores livres e despossuídos”. (grifou-se)

[14] Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm. Acesso em 09/03/2023.

[15] Art. 129 da CF/34 “Será respeitada a posse de terras de silvícolas que nelas se achem. permanentemente localizados, sendo-lhes, no entanto, vedado aliená-las”. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm. Acesso em 09/03/2023.

[16] Art. 154 da CF/37 “Será respeitada aos silvícolas a posse das terras em que se achem localizados em caráter permanente, sendo-lhes, porém, vedada a alienação das mesmas”. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao37.htm. Acesso em 09/03/2023.

[17] Art. 216 da CF/46 “Será respeitada aos silvícolas a posse das terras onde se achem permanentemente localizados, com a condição de não a transferirem”. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm. Acesso em 09/03/2023.

[18] Art. 186 da CF/67 “É assegurada aos silvícolas a posse permanente das terras que habitam e reconhecido o seu direito ao usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nelas existentes”. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao67.htm. Acesso em 09/03/2023.