REGULARIZAÇÃO ADMINISTRATIVA DE NOMEADO SUBJUDICE

REGULARIZAÇÃO ADMINISTRATIVA DE NOMEADO SUBJUDICE

1 de março de 2023 Off Por Cognitio Juris

ADMINISTRATIVE REGULARIZATION OF SUBJUDGE NOMINEE

Artigo submetido em 26 de janeiro de 2023
Artigo aprovado em 01 de fevereiro de 2023
Artigo publicado em 01 de março de 2023

Cognitio Juris
Ano XIII – Número 45 – Março de 2023
ISSN 2236-3009

Autores:
Ricardo Nascimento Fernandes[1]
Ana Paula Gouveia Leite Fernandes[2]

Resumo: O presente trabalho visa demostrar que a Administração Pública pode e deve, conforme cada caso concreto, regularizar servidores nomeados por força de decisão judicial precária, ou seja, que encontram-se na situação de subjudice, definindo, portanto, sua posição funcional perante a Administração Pública, a bem das partes e da Sociedade.

Palavras-chave: Concurso Público. Regularização Administrativa de Nomeado subjudice. Teoria do Fato Consumado. Princípio da Segurança Jurídica. Princípio da Boa Fé.

Abstract: The presente work aims to demonstrate that Administration can and must, according to each specific case, regularize, servers appointed by court decision and are in the quality of subjudice, defining, rerefore, their functional situation before the Public Administration for the good of the parties an of Society.

Keywords: Public tender. Administrative regularization of appointed subjudice. Fait Accomplished Theory. Principle of Legal Security. Principle of Good Faith.

  1. INTRODUÇÃO

Incontáveis são os servidores públicos, civis e militares, de todas as esferas de Poder (Federal Estadual e Municipal) nomeados em decorrência de decisões judiciais precárias, pendentes de uma conclusão de mérito e do trânsito em julgado. Nesta atmosfera, inexiste o direito subjetivo a ser aplicado para fins de referendar a nomeação definitiva do subjudice que está ocupando algum cargo por determinação judicial precária. Esta situação é efeito do entendimento majoritário dos julgadores e tribunais espalhados por todos os estados membros, perpassando pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal de Justiça. Dito de outro modo: os tribunais brasileiros, como regra, não reconhecem o cabimento da aplicação da teoria do fato consumado como pano de fundo para chancelar o mérito do direito perquirido pelo candidato à vaga de concurso público que fora nomeado e tomou posse de forma precária em decorrência do deferimento do pedido de tutela de urgência para determinar das demais fases do concurso, incluindo aí, naturalmente, a nomeação e posse.

Como lógica causal de tal entendimento majoritário dos tribunais, mesmo realizando todas as atribuições inerentes as funções profissionais, ostentando conduta exemplar para as partes, sendo participativo em suas obrigações, pontual, produtivo e apresentando todas as qualidades que só os melhores servidores expressam, a verdade é que os servidores subjudices vivem um ambiente, externo e interno, de permanente insegurança jurídica, a partir da qual, em sua faculdade, cultivam, de modo constante, o assombroso juízo, o espírito e o medo de que o cargo para o qual está exercendo as funções pode ser perdido a qualquer momento, em decorrência de uma reviravolta processual e do reconhecimento judiciário no sentido de que sua eliminação fora legal, portanto, não teria direito de se manter no concurso, logo, de ser nomeado e tomar posse no cargo público, concluído, neste panorama, em na determinação da manutenção de sua exclusão do certame, o que reflete diretamente com a cassação de sua nomeação e posse no cargo.

Todos nós temos medo de não alcançarmos o trabalho que um dia sonhamos para nós. É que quando trabalhamos, encontramos a dignidade, e quando trabalhamos naquilo que gostamos, encontramos não só a dignidade, mas também todas as chances para se alcançar a felicidade pessoal.

Afirma o Autor, (2009 .p 21/22), em seu trabalho intitulado Pessoa com Deficiência e o Direito Fundamental à Reserva de Vagas no Cargo de Delegado de Polícia.

Tal situação de medo é pertinente refletir, conforme dito, decorre da permanente insegurança em que vivem os servidores subjudice, externamente, pois todos sabem de sua condição e, muitas vezes são preteridos nos eventos profissionais, desde o curso de formação até o direito de receber gratificações outros atributos, e internamente, pois vivem em um constante stress e abalo psicológico, provocado pela indefinição de sua situação direito e que acarreta enorme dificuldade na hora de se tomar qualquer decisão cujos efeitos possa perduram em sua vida. Veja-se: o servidor nomeado pode até receber um bom salário, mas, sem sã consciência, vai adquirir um veículo ou imóvel financiado, sabendo do risco de se perde o cargo em decorrência da decisão judicial de mérito que não venha a acolher o seu direito?

Isto é apenas um mero exemplo dos desdobramentos de uma situação pendente de resultado final, mas são infinitas as situações que levam o subjudice a condição de stress que alteram a normalidade de sua vida.

Cabe aqui um parêntese: muitas vezes, os servidores subjudices, são servidores que estão nas atribuições dos seus cargos, há anos; às vezes mais de décadas e que depois de terem sido nomeados, mesmo em condições precárias, passaram a constituir família, casaram, tiveram filhos e, ao contrário do acima expresso, agindo pelo impulso natural e por necessidade, financiam imóveis, carros, arcam com todas as despesas particulares, alugueis, planos de saúde, escola, sem contar outras despesas ordinárias do cotidiano, como água, energia eletrica, telefone, internet, vestimentas, etc. Tudo isso se soma a suas preocupações, mas nada supera a preocupação de se perde o emprego em decorrência da decisão judicial que lhe colocou no cargo.

No Brasil, sobretudo diante de suas condições sócio econômica, da grande falta de trabalho e emprego, além dos baixíssimos salários referente ao trabalho privado, entre outros fatores, a nomeação e posse em concurso público é o grande sonho de boa parte dos cidadãos. Afinal de contas: é melhor trabalhar e receber R$ 1.500,00 na qualidade de concursado, do que trabalhar e receber R$ 2.000,00 no trabalho privado. Quantos não se dedicam integralmente a estudarem e disponibilizam todas as ferramentas necessárias para conquistar um lugar no disputado e seleto clube dos servidores públicos concursados? Quantos não abdicam de lazer, momentos com a família e até mesmo de um trabalho, para promovem uma dedicação integral e exclusiva ao caminho da conquista de uma vaga de concurso público?

Em regra e na prática, a verdade é que, se por um lado o exercício da função pública requer um menor esforço do sujeito; por outro, apresentam melhores salários e uma série de direitos e garantias que levam o servidor a uma vida geral mais tranquila e capaz de realizar planejamento financeiro a longo prazo. Um concurso público, sim, garante uma “tranquilidade eterna”, advinda da sonhada estabilidade e tudo que a este atributo consta inerente.

A estabilidade não é uma garantia para os trabalhadores não concursados e, hipoteticamente, realizando um comparativo, apenas por passagem, estes trabalhadores dispõem de cargas horárias de trabalho, são submetidos a desenvolverem várias funções, não tem gratificações, não recebem horas extras devidamente, são submetidos a situações vexatórias, tem salários atrasados e tantas outras mazelas ocorrem em suas vidas profissionais. Por regra, isso não ocorre com os servidores públicos.

Com efeito, retornando ao ponto, eis o resumo do que até aqui fora dito: qual nomeado subjudice não tem medo de perder a função em decorrência da Decisão de mérito que lhe denegou o direito de permanecer no concurso, desconhecendo, portanto, o direito de nomeação, posse e permanência no cargo?

Imagine-se, agora, o caso hipotético a seguir: o candidato à vaga de Soldado da Polícia Militar do Estado da Paraíba – CFSD PM/PB, fora eliminado em uma das fases do certame, por qualquer motivo – e aqui resta uma hipótese de eliminação genérica, ou seja, sem indicar uma determinada fase ou motivo, porque essa hipótese pode alcançar todas as fases e motivos de eliminação -.

Para rever seu direito de continuar no certame, o eliminado acionou o Poder Judiciário que lhe concedeu a tutela de urgência e assim ele retornar ao concurso, realizou as demais fases do processo seletivo, obteve êxito, realizou o curso de formação, no ano de 2005 e passou a servir a Sociedade no combate ao crime, colocando em risco a própria vida, inclusive.

O Estado/Sociedade, por outro lado, durante a realização do curso de formação daquele, investiu dinheiro, aparelhamento e pessoal neste processo.

Durante o exercício da função policia militar, este profissional passou a ostentar diversos elogios em sua ficha funcional, pelos bons serviços prestados a Sociedade. Sempre foi pontual e nunca faltou aos serviços; sempre realizou suas atividades com dedicação exclusiva e a cautela de qualquer servidor exemplar. Desempenhou suas atividades pautado na ética, gerando uma boa fé decorrente de todos os seus atos profissionais.

O tempo passou e o militar prestou concurso interno para Curso de Formação de Sargento, vindo a lograr êxito entre os primeiros colocados em todas as fases deste certame. Passou a exercer as funções de sargento e continuou a ter elogios em sua ficha funcional devidos a decisão na proteção da Sociedade.

Em sua vida particular, casou-se, teve dois filhos, passou a ser arrimo de família, logo, passou a pagar todos os compromissos decorrente dela, aluguel, feira, escola dos filhos, financiamento de automóvel e imóvel, etc.

Acrescente-se ainda um detalhe: há época que tinha realizado o concurso CFSd PM/PB, o mesmo fora aprovado e convocado para participar do Curso de Formação de Soldados do Estado do Rio Grande do Norte, CFSd PM/RN. Entretanto, como conquistou do Poder Judiciário a tutela de urgência para se manter no concurso CFSd PM/PB, escolheu correr o risco de gozar dos efeitos precários dessa decisão, tendo em vista que ele e toda a sua família residem neste Estado. Saliente-se ainda: todas estas informações estavam contidas no processo judicial pendente de julgamento de mérito e que lhe concedeu o direito de continuar no certame CFSd PM/PB, por decisão precária.

Pois bem, chegou o ano de 2023 e o Poder Judiciário julgou o mérito de sua ação judicial e, para sua surpresa e desagrado, a Justiça indeferiu os pedidos constituídos na exordial do processo, cassou os efeitos da decisão provisória que lhe permitiu realizar o curso de formação, sob o fundamento de que sua eliminação estava em conformidade com as regras do edital do concurso e não se podia haver afronta aos principio da legalidade e da isonomia, entre outros e determinou a revogação da nomeação e posse.

Observe-se as consequências da situação: o servidor subjudice, antes solteiro e sem qualquer responsabilidade financeira, agora, pai de família e cheio de compromissos financeiros, possuidor de um cargo público, ostentando bom salário, as noite para dia se ver desempregado, sem salário e sem ter como amparar sua família, célula mater da Sociedade. Observe-se o desastre social causado nesta família em decorrência da “feitura da justiça”.

Diante das razões expostas, naturalmente, advém o questionamento: para o caso concreto, a Justiça fez Justiça?

O Poder Judiciário, por intermédio do Estado Juiz, analisou e refletiu bem sobre o caso concreto e todos os seus desdobramentos para se alcança, na essência o conceito do que se pode entender por Justiça?

Entendeu ele os nefastos efeitos decorrentes de sua Decisão, determinando a “exoneração” de um, então, Sargento da Polícia, servidor público reconhecidamente ético, exemplar a Corporação e a Sociedade, pai de família plenamente dedicado a combater o crime, auxiliar todo cidadão em sua segurança, inclusive com o risco da própria vida?

A hipótese apresentada, em realidade, alcança milhares de concursados que se encontram empossados em cargos públicos provenientes dos poderes (Poder Executivo, Poder Judicial e Poder Legislativo) de todo o Brasil, por força de determinação judicial precária, motivo pelo qual o presente trabalho fundamenta sua importância na perspectiva e pretensão de demonstrar um caminho alternativo, porém, absolutamente eficaz para resolução da lide, caminho este que perpassa por um processo administrativo donde, a partir do poder dever da Administração Pública, é insofismavelmente possível regularizar de modo definitivo a situação dos servidores subjudices, tornando-os permanentes em seus cargos, logo, encontrando de uma só fez a paz individual do servidor subjudice, a paz social diante de resolução do conflito e um resultado obliquamente definitivo para a resolução da lide judicial pendente.

Os sustentáculos, portanto, fundamentos para solução de cada caso concreto perpassa por um processo administrativo a partir do qual a Administração Pública adote uma decisão no sentido de resolução do mérito acerca do problema apresentado. Isto se dá com a observância da teoria do fato consumado, o princípio da segurança jurídica e o princípio da autotela, temas que serão abordados com mais atenção neste trabalho, em detrimentos de outros princípios que devem ser analisados pela Administração pública para solucionar cada caso concreto, mas que não serão, contudo, aprofundados no presente trabalho, a saber: o principio da dignidade da pessoa humana, o princípio da boa fé, o princípio da proporcionalidade e razoabilidade, o princípio da eficiência, da legalidade e da publicidade, enfim, do princípio da estabilização social pelo acesso definitivo ao trabalho.

É importante deixar claro: o presente trabalho não tem a pretensão de tratar das questões históricas que envolvem o tema ou de exaurir a temática diante do verdadeiro oceano de teses que podem advir da hipótese apresentada e que só enriquecerá o processo de dialética, motivo pelo qual, todas as críticas expostas serão bem aceitas para o amadurecimento do tema em análise.

  • SOBRE A TEORIA DO FATO CONSUMADO

A teoria do fato consumado, Segundo Tessler (2004), surgiu por volta da década de 1960, quando candidatos a vagas de universidades buscaram o Poder Judiciário para terem seus problemas solucionados, tais como: acesso a vagas do ensino universitário gratuito, obterem a conclusão do curso, questionamentos sobre benefícios concedidos a determinados indivíduos como a “Lei do Boi”. Conforme jurisprudências relacionadas em seu artigo, as decisões de tais casos eram proferidas após a consumação do fato, o que tornava a decisão desproporcional diante da atual situação, ensejando assim a aplicação da Teoria do Fato Consumado.

Quanto ao atributo  da teoria (ROCHA, 1996, p. 17) admoesta:

Teoria é um corpo de conceitos sistematizados que nos permite conhecer um dado domínio da realidade. A teoria não nos dá um conhecimento direto e imediato de uma realidade concreta, mas nos proporciona os meios (os conceitos) que nos permitem conhecê-la. E os meios ou instrumentos que nos permitem conhecer um dado domínio da realidade são justamente os conceitos que, sistematizados, forma a teoria. Daí a definição de teoria como um corpo de conceitos sistematizados que nos permite conhecer um dado domínio da realidade.

Com efeito, é possível afirmar: a teoria do fato consumado, para o caso em análise, ou seja, relacionada a concurso público, nomeação e posse precária em cargos públicos, decorre e é uma realidade advinda da jurisprudência brasileira, de situações jurídicas que analisam e concedem o direito ao jurisdicionado de forma precária, por meio das denominadas tutelas de provisórias. Conforme o mesmo autor (2002, p. 115).

O fato consumado é o tópico jurisprudencial pretensamente a serviço da equidade por meio do qual o Judiciário, em sentença, ratifica a liminar autorizadora da prática de ato ilícito, apenas porque, no momento de apreciar o mérito da causa, o detentor do provimento cautelar ilegal já desenvolveu, de fato, a atividade que lhe interessava.

Não se pretende analisar os desdobramentos da teoria do fato consumado à luz da jurisprudência – exceto de forma obliqua e se necessário -, mas sim sua instrumentalização à regularização administrativa de nomeado subjudice. Portanto, para o que se almeja, é o bastante dizer: a Jurisprudência brasileira, não considera, como regra, para temas que envolvem concurso público, a aplicação da teoria do fato consumado sobre casos em que candidatos à vaga do certame foram nomeados em decorrência de decisão judicial provisória, mesmo diante de considerável lapso temporal em que ele esteja prestando serviço a Sociedade, pois, conforme a tese do STF, o interesse púbico deve prevalecer sobre o interesse privado e, assim, a Corte Decidiu um caso onde uma nomeada da Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Norte, teve que deixar o cargo após doze anos de prestação de serviços a Sociedade. Neste caso, é importante dizer: ocorreu da candidata ter sido eliminada no exame de aptidão física, ter acionado o Poder Judiciário, conquistado o pedido cautelar para manter-se no concurso, contudo, ter realizado o curso de formação sem se submeter ao exame psicológico. Portanto, por regra, o candidato nomeado por meio de concessão de liminar, não detém direito subjetivo de posse definitiva no cargo.

Ainda assim, há exceções donde, o judiciário, no julgamento de mérito de determinado caso, pode indeferir a matéria de direito proposta na ação judicial, o que consequentemente levaria a revogação dos efeitos da tutela de urgência, mas, de forma obliqua, fundamenta esta mesma decisão, com base a teoria do fato consumado, dispondo o fim da lide por perda do objeto e na prática, mantém o direito do nomeado preservado, ou seja, mantem-se o jurisdicionado efetivamente no cargo para o qual fora inserido por força de decisão provisória.

Em regra, a fundamentação para este desfecho advém, a princípio, da morosidade no julgamento de mérito das ações judiciais por parte do Poder Judiciário ou mesmo da inércia da Administração Pública, fazendo permitir com que situações precárias se consolidem diante do significativo lapso temporal, perpassando pela fundamentação do entendimento judicial acerca da aplicação da teoria do fato consumado, que deve ser analisado, concomitantemente, com o princípio da segurança jurídica, do interesse público, da boa fé administrativa, da confiança, da razoabilidade, da proporcionalidade e da estabilização das relações sociais, entre outros.

Ultrapassado, de forma breve, o olhar da perspectiva que o Poder Judiciário tem relativo à aplicação da teoria do fato consumado, passasse a analisar e compreender seu conceito: a teoria do fato consumado, tem como e regra, fundamentar situações jurídicas amparadas por meio de decisões judiciais provisórias, consolidadas pela passagem do tempo e que não devem ser alteradas quando da decisão definitivas tendo em vista que a mudança do direito, ao final, torna-se um remédio pior que a doença, prejudicando todas as partes do processo. Dito com outras palavras: um fato decorrente do tempo e de uma decisão jurídica provisória, pelo conceito de Justiça, não pode ser desfeito quando do julgamento de mérito contrário àquela decisão provisória, decorre consequências que representam insegurança jurídica para o jurisdicionado e todas as partes envolvidas no processo.

Pode-se dizer, ainda: a teoria do fato consumado é aplicada quando o postulante a determinado direito o detém de forma provisória, porém, esse direito pode vir a não ser reconhecido no julgamento do mérito da sua ação, mas ainda assim é mantido, sob o fundamento de se está o jurisdicionado usufruindo de tal direito há considerável lapso temporal e, perdê-lo, não representaria Justiça maior que mantê-lo. Para a hipóteses apresentara, é a situação pela qual, revogar o direito provisório concedido torna-se ineficaz e inviável por ser mais prejudicial não apenas ao jurisdicionado, mas também ao ente público para o qual ele prestou concurso e a Sociedade que deixaria de ter um servidor já treinado e preparado. Trata-se, portando, de casos excepcionalíssimos.

Para Tesller (2004, p.97):

(…) a teoria do fato consumado, de um modo geral e em síntese, gira em torno da consideração de que a situação é excepcional e o problema, mais do que sob o aspecto da legalidade, deve ser encarado do ponto de vista da finalidade social das leis; as circunstâncias excepcionais aconselhariam a inalterabilidade da situação. A inércia da Administração teria permitido a constituição de situações de fato revestidas de aparência de legalidade; assim, mereceriam prestígio.

A Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Eliana Calmon (Brasil, 2014), em um de seus julgados, asseverou:

A Teoria do Fato Consumado incide apenas em casos excepcionalíssimos, nas quais a inércia da Administração ou a morosidade do Judiciário deram ensejo a que situações precárias se consolidassem pelo decurso do tempo.

Corroborando com a exposição lógica apresentada, o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, (BRASIL, 2014), em Agravo Regimental no Recurso Especial, argumenta:

A Teoria do Fato Consumado apoiasse na evidência empírica de que o tempo não retrocede – pelo contrário, foge irreparavelmente – de sorte que é naturalmente impossível regressar-se a situações ultrapassadas, para desconstituir relações que se consolidaram como fatos.

Ainda sobre o tema, o Ministro Mauro Campbell Marques, (BRASIL, 2014), apresentou sua versão:

Conforme a orientação jurisprudencial do STJ, aplica-se a teoria do fato consumado nas hipóteses em que a restauração da estrita legalidade ocasionaria mais danos sociais do que a manutenção da situação consolidada pelo decurso do tempo em razão de ordem judicial concedida em mandado de segurança.

Já o Ministro do STJ Benedito Gonçalves, ao julgar o REsp 1444690/MS – Rel. Min. Benedito Gonçalves – DJe 07.05.2014, tratando da Teoria do fato consumado, assim se expressou:

A jurisprudência deste Sodalício, em situações excepcionalíssimas, tem admitido a incidência da Teoria do Fato Consumado, como forma de realizar justiça no caso concreto, à luz do princípio da segurança jurídica. Precedentes: RMS 31.152/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 25/02/2014; MS 15.471/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, Primeira Seção, DJe 02/08/2013; AgRg no REsp 1.205.434/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 27/08/2012; RMS 38.699/DF, Rel. Min. Ari Pargendler, Rel. p/ Acórdão Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 05/09/2013.

Portanto, a teoria do fato consumado deve servir de fundamento para solucionar os casos em que o tempo consolidou a situação decorrente da decisão jurídica precária, não devendo, conforme a hipótese, as partes e a Sociedade de sofres as penalidades decorrentes da morosidade judicial e de uma Decisão de mérito no sentido de negar o direito anteriormente reconhecido de forma precária.

Logo, com base na teoria do fato consumado, a Justiça aplica para o caso concreto a essência da Justiça ao efetivar o direito do pretendente a partir da analise, pelas vias obliquas, da teoria do fato consumado e não mais do fato que deu origem a lide.

  • SOBRE O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA

Ao se buscar a explicação de uma norma, necessário se faz promover a interpretação que melhor atinge os interesses da coletividade, não podendo haver uma nova hermenêutica restritiva de direito aplicada pela a Administração, aliás, esta diretriz está em conformidade com previsão do art. 2º, XIII da Lei 9784/99 que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal e logo será analisado.

É que não se deve afetar situações consolidadas no passado ou decorrentes de considerável lapso temporal, sendo estes preceitos o que representa a essência do princípio da segurança jurídica: uma garantia para o cidadão administrado. Nesta razão, a noção de segurança jurídica associa-se diretamente a noção de direito, pois, sem o primeiro, não existe o segundo e disto decorre a segurança jurídica como direito fundamental que visa o encontro da estabilização nas relações jurídicas restando pautado sob três aspectos a) ato jurídico perfeito, b) direito adquirido, c) coisa julgada. Cabe aqui informar que estes aspectos não serão analisados profundamente, em virtude da pretensão e do próprio espaço desprendido para as conclusões do trabalho.

O princípio da segurança jurídica, portanto, constitui uma das vigas mestras da ordem jurídica, não sendo, por isso, objeto de divergência quanto a sua importância à manutenção da democracia, da justiça e da estabilidade das relações jurídicas. Para Luís Roberto Barroso (2002, p. 49), Ministro do STF, o princípio da segurança jurídica:

encerra valores e bens jurídicos diversos […] açambarca em seu conteúdo conceitos fundamentais para a vida civilizada, como a continuidade das normas jurídicas, a estabilidade das situações constituídas e a certeza jurídica que se estabelece sobre situações anteriormente controvertidas. Grifo Nosso.  

A Constituição Federal do Brasil, em seu art. 5º, inciso XXXVI, reflete o princípio da segurança jurídica nos seguintes termos: “XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”, ratificando, portanto, um direito fundamental de todo cidadão brasileiro.

Por outro lado, a lei 9784/99 que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, em seu art. 2 § parágrafo único, inciso XII:

Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

(…)

XIII – interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação. (Grifo Nosso).

O principio da segurança jurídica, é de se destacar: está intimamente ligado ao principio da boa fé entre as parte e sua filosofia é evitar o sentimento de insegurança do cidadão, do administrado com relação à Administração Pública, no caso, do nomeado subjudice que se encontra a considerável tempo prestando serviço à Sociedade, de boa fé e a bem da dela. Diante destas situações, é imprescindível encontrar a estabilidade das relações jurídicas sob o fundamento de que não se torna razoável ou proporcional desconstituir a condição fática conquistada temporalmente em virtude de uma decisão judicial precária.

Apenas um parêntese acerca do princípio da boa fé: é um dos principais princípios do direito brasileiro. Partir dele, estabelecesse um padrão ético de conduta para as partes ou a parte interessada. É imprescindível, portanto, que o servidor goze de uma boa conduta para fins de conquistar o amparo administrativo do direito pretendido, devendo o mesmo ser um exemplo para seus pares, motivando, assim, a Administração Pública no sentido de corroborar o ato de torna-lo regularizado para todos os efeitos.

Nesta soma de raciocínio, pode-se dizer: o nomeado subjudice que realizou o curso de formação, recebeu investimento do Estado, passou a prestar serviço à Sociedade de forma ética e comprometida, tornando-se, inclusive, um exemplo para os seus pares, diante do lapso temporal em que se encontra na citada situação, entende-se, alcançou uma espécie de “direito adquirido” para permanecer no cargo provisório, agora, de forma definitiva, pois, tal situação fundamenta a configuração do ato jurídico perfeito. Segundo analise de Vilarim (2010, p. 28):

O princípio da segurança jurídica ou da estabilidade das relações jurídicas impede a desconstituição injustificada de atos ou situações jurídicas, mesmo que tenha ocorrido alguma inconformidade com o texto legal durante sua constituição. Muitas vezes o desfazimento do ato ou da situação jurídica por ele criada pode ser mais prejudicial do que sua manutenção, especialmente quanto a repercussões na ordem social. Por isso, não há razão para invalidar ato que tenha atingido sua finalidade, sem causar dano algum, seja ao interesse público, seja os direitos de terceiros. Grifo Nosso.

Com efeito, diante deste contexto, a segurança jurídica tem a filosofia de proteger o administrado e seu sentimento de boá fé, no fundamento de que o tempo, por si, resolveu o problema apresentado na ação judicial, mas é possível afirmar: a segurança jurídica visa, também, proteger a outra parte processual, assim como a Sociedade, uma vez que sua abstração como fundamento para solução de lide, seja pelo Poder Judiciário, seja pela Administração Pública, não reflete em prejuízo a qualquer das partes e visa a estabilização social.

Diante deste contexto, a Administração Pública, baseado no analisado princípio e toda sua filosofia, tem o poder/dever de revisar seus atos, uma vez ter o nomeado subjudice passado à sua esfera íntima de pensamentos, a expectativa formada por um espécie de “direito adquirido” em decorrência dos fatos hipotéticos já narrados, mas, somado a isso, ter a Administração Pública, em seus quadros, após investir no treinamento do nomeado subjudice, um servidor qualificado e pronto para atender as demandas apresentadas pela Sociedade e pela própria Administração.

Portanto, sob a perspectiva da hipótese apresentada, a aplicação do princípio da segurança jurídica, entrelaçada com a teoria do fato consumado e outros comandos normativos, torna-se fundamental para a Administração Pública chancelar a regularização administrativa de um servidor nomeado em caráter subjudice, estabilizando sua situação jurídica precária, cujo desfazimento tardio e em sentido contrário se tornaria absolutamente incompatível com uma solução equitativa e justa, ou seja, absolutamente irrazoável e desproporcional.

Importante descartar a existência de Lei no sentido de proibir a Administração Pública de fundamentar seus atos sob o prisma do princípio da segurança pública, da teoria do direito e de outros institutos normativos, motivo pelo qual, buscar uma solução administrativa do problema apresentado, a partir da teoria do fato consumado e do princípio da segurança jurídica, é buscar a efetivação do princípio da eficiência dos atos administrativos, o que representa um ato de eficácia à Sociedade em geral.

Em um caso onde existiam inúmeros policiais militares (servidores públicos) na condição de subjudice advindos de vários processos judiciais diferentes, a Procuradoria do Estado, por representação do Procurador, emitiu o parecer nº 00013/2015, no qual analisou os pedidos administrativos dos policiais que se encontravam na situação de empossados no cargo de forma precária e aguardavam, cada um deles, em seus processos judiciais particulares, uma decisão de mérito para poderem levar a vida adiante. No mencionado parecer, o Procurador, sabiamente, utilizou não apenas da teoria do fato consumado, também o princípio da segurança jurídica, da proporcionalidade e da estabilidade das relações jurídica para fundamentar seu relatório jurídico e, ao final, seu parecer foi pela concessão administrativa do direito pleiteado por esta gama de servidores que se encontrava em situação pendente junto a Administração Pública. Seu parecer fora chancelado pelo  comando geral e todos os militares, independente da resolução futura contida em seus processos judiciais, deixaram de consta na condição de subjudice para a condição de servidor regularizado, sem pendencia alguma e efetivado para todos os fins de direito.

Eis algumas passagens relacionada ao parecer jurídico contida no Boletim Interno da Polícia Militar nº 00063 de (06 de abril de 2006 p. 2745/2755), que regularizou os militars subjudices:

Compulsando o acervo documental acostado aos presentes autos, depreende-se que os requerentes submeteram-se a Concurso Público destinado ao preenchimento de vagas para o Curso de Formação de Soldados da Polícia Militar do Estado da Paraíba, tendo participado do aludido Curso de Formação por força de decisões judiciais de caráter precário.

Emerge, ainda, dos autos que os requerentes, em que pese terem concluído o Curso com aproveitamento, ainda se encontram na condição de Soldados Recruta, ante a não comprovação do trânsito em julgado dos processos nos quais exarados os provimentos jurisdicionais que asseguraram a participação no Curso de Formação.

(…)

Com efeito, no caso dos autos, os requerentes, além de haverem concluído com aproveitamento o Curso de Formação de Soldados, encontram-se no pleno e efetivo desempenho das funções policiais militares, ostentando a condição de Policiais Militares em igualdade de condições com os demais Soldados efetivos da Polícia Militar (Símbolo PM-02).

(…)

Na hipótese sub examine, perfazendo um sopesamento dos valores em jogo no caso concreto, infere-se que a ausência de trânsito em julgado da determinação judicial que garantiu aos candidatos a participação no Curso de Formação deixa de prevalecer diante da incidência de princípios constitucionais revestidos de maior relevância para o deslinde da controvérsia submetida à apreciação, quais sejam, os princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica.

E continua em seu parecer:

Em sua perspectiva objetiva, a segurança jurídica recai sobre o ordenamento jurídico objetivamente considerado, significando a estabilização das situações fáticas e jurídicas consolidadas em face do decurso do tempo, assegurando estabilidade e previsibilidade aos atos estatais, materializável nas garantias constitucionais do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF/88).

Em sua dimensão subjetiva, a segurança jurídica visa resguardar as legítimas expectativas depositadas pelos cidadãos nos atos do Poder Público, do que deriva o princípio da proteção da confiança legítima, garantindo aos cidadãos o respeito à confiança legitimamente depositada nos comportamentos e procedimentos estatais, uma vez que a conduta adotada pelo Estado gera uma legítima expectativa de previsibilidade no espírito do cidadão, a qual não pode ser injustificadamente frustrada por um ulterior comportamento contraditório por parte do Poder Público.

E segue:

Na espécie, sobressai incontroverso que a certificação definitiva do Curso de Formação dos requerentes para fins de promoção ao cargo de Soldado PM-02 da Polícia Militar do Estado da Paraíba atende aos princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica ante a constatação de que eventual desconstituição da situação fática em disceptação revelar-se-ia extremamente lesiva ao interesse público primário consubstanciado no contínuo aperfeiçoamento da prestação do serviço de segurança pública, que traduz atividade estatal indelegável e essencial à salvaguarda da ordem pública e da paz social, notadamente após o Estado haver investido na formação desses servidores, capacitando-os para o efetivo exercício da atividade policial militar.

(…)

Na hipótese vertente, desponta incontroverso dos autos que a situação fática na qual se encontram os requerentes amolda-se, com precisão cirúrgica, à orientação jurisprudencial fixada pelo Colendo Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, porquanto, não obstante tenham participado do Curso de Formação de Soldados da Polícia Militar do Estado da Paraíba sob o manto de decisões judiciais precárias, concluíram o aludido Curso com aproveitamento em tempo significativo, encontrando-se em pleno desempenho da atividade policial militar, não se revelando recomendável eventual desconstituição da situação fática consolidada pelo decurso de considerável lapso temporal, ainda mais diante dos inequívocos esforços empreendidos e das significativas despesas realizadas pela Administração da Polícia Militar do Estado da Paraíba com o objetivo de formar um policial plenamente capacitado para o exercício das relevantes funções policiais.

De fato, forçoso reconhecer que a desconstituição posterior da situação fática consolidada pelo decurso do tempo tornar-se-ia desaconselhável no caso concreto, máxime quando o seu desfazimento não implicará qualquer benefício para a Administração da Polícia Militar do Estado da Paraíba. Muito pelo contrário, acarretaria manifesto prejuízo à Corporação, na medida em que os requerentes, estando no pleno exercício das funções policiais, comprovaram já estarem capacitados para as atribuições do cargo.

III – CONCLUSÃO:

Com base nas razões de direito e de fato até aqui esposadas, e ainda levando a efeito a busca por uma prestação de um serviço administrativo que atenda não só à legalidade, mas também, ao fim social a que deve estar atrelada a Administração Pública, em observância aos princípios da proporcionalidade, da segurança jurídica e da estabilidade das relações jurídicas, opino no sentido da possibilidade de certificação definitiva do Curso de Formação dos requerentes para efeito de promoção ao cargo de Soldado da Polícia Militar do Estado da Paraíba – Símbolo PM-02, com efeitos a partir da data da homologação deste parecer, salvo determinação judicial em sentido contrário. É o parecer, S.M.J.

João Pessoa, 26 de março de 2015.

WLADIMIR ROMANIUC NETO

Procurador do Estado

Assessor-Chefe

Observe-se: a fundamentação do mencionado parecer parte do entendimento acerca da teoria do fato consumado, perpassando pelo princípio da segurança jurídica, da proporcionalidade e da estabilidade das relações jurídica, mas, também, restam implícito outros princípios que norteiam a administração pública, como o princípio da eficiência, da legalidade e da publicidade, entre outros.

A conjugação deles tem o único proposito de evitar lesão, primeiro, ao erário público e a Sociedade, alcançado, contudo, o direito subjetivo do nomeado subjudice, a partir de sua regularização administrativa definitiva, logo, alcançando a pacificação e estabilização das relações sociais.

Basta imaginar, depois deste ato administrativo, a tranquilidade em que poderão dormir os militares, pais de familiar, servidores da sociedade, agora, regularizados definitivamente no exercício do cargo público.

Tudo isto que até aqui se viu, deriva, direta ou indiretamente, o Poder de Autotutela, conforme passa-se a analisar.

  • SOBRE O PRINCÍPIO DA AUTOTUTELA

A partir do princípio da autotutela, ou por alguns denominado de princípio da executoriedade, a Administração Pública tem o poder/dever, por provocação ou de oficio, de rever sua posição quando diante de um ato jurídico ilegal, inoportuno ou ineficiente. Cabe observar que o exercício da autotutela por parte da Administração Pública independe de uma determinação por parte do Poder Judiciário ou da necessidade de se aguardar a finalização de processos judiciais pendentes.  

Obviamente, tratando-se do caso concreto donde o nomeado encontra-se na situação de subjudice, não há se falar em ato jurídico ilegal decorrente da decisão judicial precária que o colocou naquela situação. A Administração Pública não pode se utilizar da autotutela sob o pretexto no sentido de que a decisão judicial precária é um ato jurídico ilegal.

Contudo, por outro lado, conforme o caso analisado, torna-se absolutamente inoportuno e ineficiente manter o nomeado subjudice em situação administrativa irregular, a espera de um eventual trânsito em julgado da ação judicial que lhe permitiu a nomeação e posse em caráter precário, pois, conforme restou demonstrado, as consequências de uma reviravolta na análise do direito por parte do Poder Judiciário, culminando com o entendimento no sentido de negar o direito material e por consequência cassar a tutela de urgência e todos os seus efeitos, tornam-se muito mais prejudiciais ao administrando, a Administração Pública e a Sociedade como um todo, sobretudo quando não se visualiza qualquer espécie de prejuízo as partes processuais e a Sociedade .

É diante destes casos e da hipótese apresentada que a Administração Pública, por um meio alternativo e absolutamente eficaz, deve exercer o seu poder de autotutela para fins de estabilização das relações jurídicas e pacificação social, solucionando o que já não mais deve ser um problema entre administrado e Administração.

Veja-se o entendimento acerca do conceito de autotutela para alguns doutrinadores a iniciar por José dos Santos Carvalho Filho (2015. p. 25):

A autotutela envolve dois aspectos quanto à atuação administrativa: 1) aspectos de legalidade, em relação aos quais a Administração, de ofício, procede à revisão de atos ilegais; e 2) aspectos de mérito, em que reexamina atos anteriores quanto à conveniência e oportunidade de sua manutenção ou desfazimento.

Já Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2007, p.149-150), assim trata do princípio da autotutela:

O princípio da autotutela instrumentaliza a Administração para a revisão de seus próprios atos, assegurando um meio adicional de controle da atuação da Administração e reduzindo o congestionamento do Poder Judiciário. É um princípio implícito, que decorre da natureza da atividade administrativa e de princípios expressos que a informam, especialmente o princípio da legalidade.

Portanto, a Administração Pública, apegada ao princípio da autotutela, por questão de oportunidade/conveniência e eficiência, poderá rever a situação do nomeado subjudice, promovendo, logo, sua regularização administrativa e, consequentemente, retirando-o da condição na qual restava pendente de Decisão judicial definitiva e transitada em julgado. Destaque-se, ademais, que, neste caso, o Poder Judiciário não pode retirar do mundo jurídico os atos validados pela Administração Pública.

Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal editou duas súmulas, a saber: STF, Súmula 326: “A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos” e Súmula 473:

“A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revoga-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”. Grifo Nosso

Agindo neste sentido, além de conferir um bem maior a Sociedade, a Administração Pública estará contribuindo com o Poder Judiciário, a partir da possibilidade de redução das demandas pendentes de julgamento de mérito, uma vez que elas poderão ser julgadas mais rapidamente, a partir da perda do objeto sob disputa ou da possibilidade de transação com base no art. 26 da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro que remete o que segue:

Art. 26. Para eliminar irregularidade, incerteza jurídica ou situação contenciosa na aplicação do direito público, inclusive no caso de expedição de licença, a autoridade administrativa poderá, após oitiva do órgão jurídico e, quando for o caso, após realização de consulta pública, e presentes razões de relevante interesse geral, celebrar compromisso com os interessados, observada a legislação aplicável, o qual só produzirá efeitos a partir de sua publicação oficial.

Observe-se: embora o conteúdo da norma apresente termos abertos e subjetivos, como regra, para a aplicação em cada caso concreto, e assim se definir o que seja conveniência e oportunidade, sua essência advém da busca pela segurança jurídica, princípio norteador do Estado Democrático de Direitos. Segurança jurídica, diante do caso já analisado, onde o nomeado tomou posse de forma precária, por força de decisão liminar, donde os efeitos da composição proporcionará a todas as partes envolvidas, com respaldo na teoria do fato consumado, no princípio da eficiência e da motivação, entre outros, conforme já analisado, a pacificação social, pois, o administrado continuará em definitivo no exercício do cargo, a Administração terá em seus quadros um sujeito já capacitado, assim como a Sociedade manterá um servidor preparado, revelando-se, portanto, a supremacia dos interesses públicos dos atos administrativos.

Apenas como rápida composição do presente trabalho, vale destacar, sobre o princípio da eficiência, conforme enunciado de Vladimir da Rocha França (p.165):

O princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada somente com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros. Grifo Nosso.

Com efeito, facilmente percebe-se a conjugação entre o princípio da eficiência e o tudo que se pretende como fim para as partes envolvidas. Diante do contexto apresentado, o princípio da eficiência amolda-se a teoria do fato consumado, ao princípio da segurança jurídica, enfim, ao princípio da autotutela para se chegar ao fim razoável e proporcional e equânime, como solução do problema.

Por outro lado, cabe, ainda, não se esquecer do princípio da motivação, pois, para que o princípio da autotutela seja contemplado é necessário fundamentá-lo com base em uma coerência de razões. Segundo Jèze (1926. p. 63):

O princípio da motivação dos atos administrativos constitui moderna tendência do Direito Administrativo dos países democráticos.

Pela motivação o administrador público justifica sua ação administrativa, indicando os fatos (pressupostos de fato) que ensejam o ato e os preceitos jurídicos (pressupostos de direito) que autorizam sua prática.

(…)

A motivação, portanto, deve pontar a causa e os elementos determinantes da prática do ato administrativo, bem como o dispositivo legal em que se funda. Esses motivos afetam de tal maneira a eficácia do ato que sobre eles se edificou a denominada teoria dos motivos determinantes, delineada pelas decisões do Conselho de Estado da França e sistematizada. Grifo Nosso.

Portanto, a morosidade judicial que leva um processo a ter anos e anos, não raras vezes, décadas de vida, não pode servir de pano de fundo para se fazer “justiça”, quando, em eventual julgamento de mérito, nega o direito e anula os efeitos precários da tutela de urgência que concedeu ao jurisdicionado o direito de nomeação e posse em concurso público. É que no Estado Moderno, o que deve prevalecer são os direitos do cidadão, sob o olhar do interesse geral em detrimento da concepção organicista tradicional. Neste mesmo caminho, alias Bobbio (2004. p. 7):

O tema, já aflorado nos escritos anteriores, do significado histórico — ou melhor, filosófico histórico — da inversão, característica da formação do Estado moderno, ocorrida na relação entre Estado e cidadãos: passou-se da prioridade dos deveres dos súditos à prioridade dos direitos do cidadão, emergindo um modo diferente de encarar a relação política, não mais predominantemente do ângulo do soberano, e sim daquele do cidadão, em correspondência com a afirmação da teoria individualista da sociedade em contraposição à concepção organicista tradicional.

Portanto, o administrado, a Administração Pública e a Sociedade não devem pagar o preço em decorrência da tardia “justiça” que venha, ao julgar o mérito, negar o direito pleiteado e, consequentemente, desfazer a concessão da tutela de urgência que conferiu, outrora, o direito precário para o cidadão ser nomeado e tomar posse em cargo público. Tal Decisão não reflete Justiça e seus efeitos torna-se muito mais prejudicial a todas as partes do processo. para se evitar este espécie de “erro” do Poder Judiciário, torna-se necessário que a Administração Publica, portanto, adote os caminhos administrativos cabíveis a solução eficaz da lide, regularizando, conforme os fundamentos de direito analisado, em definitivo, a situação dos nomeados subjudices. Assim, faz-se Justiça!  

  • CONCLUSÃO:

Destarte, conforme explicitado, observa-se o poder/dever da Administração Pública, – respaldada, sobretudo, no princípio da autotutela, na teoria do fato consumado, no princípio da segurança jurídica, aqui bem analisados, no princípio da boa fé, no princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, no princípio da eficiência, além de todo o direito que possa servir de sustentação, – em por fim, por revogação (ato administrativo), a eliminação de candidato a vaga de concurso público que se encontra há determinado lapso temporal nomeado e empossado em cargo público em decorrência de uma decisão judicial precária e, por consectário lógico, fundamentar a finalização da lide judicial pendente de Decisão de mérito e que se for improcedente ao servidor subjudice, trará, certamente uma instabilidade familiar e social, prejudicando todas as partes envolvidas.

Portanto, utilizando destes instrumentos, estará a Administração Pública solucionando o caso de forma administrativa, promovendo a estabilização das relações jurídica e sociais, encontrando, logo, a efetivação do conceito de Justiça para o caso concreto.

REFERÊNCIAS

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. 14. ed. Niterói: Editora Impetus, 2007.

BARROSO, Luís Roberto. Temas de direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

CARVALHO FILHO, José dos Santos: Direito Administrativo. 28. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2015.

Congresso Nacional. LEI Nº 9.784 de 29 de janeiro de 1999.

Constituição da República Federativa do Brasil. ISBN: 978-85-7018-698-0

Couto e Silva, Almiro do, RDA 204/24.

CASALI, Guilherme Machado. Sobre o conceito de segurança jurídica. Disponível em:<http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/guilherme_machado_casal i.pdf >. Acesso em: 13 abr. 2014.

JÈZE, Gaston. Principes Généraux du Droit Administratif. Paris: RT 664/63, 1926.

Paraíba. Policia Militar do Estado. Boletim Interno da Polícia Militar nº 00063 de (06 de abril de 2006 p. 2745/2755).

FERREIRA, Odim Brandão. Fato consumado. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002.

FERNANDES, Ricardo Nascimento. A Pessoa com Deficiência e o Direito Fundamental à Reserva de Vagas no Cargo de Delegado de Polícia. UNIPE/BC 2009.

ROCHA, José de Albuquerque. Teoria geral do processo. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1996.

TESSLER, Marga Inge Barth. O fato consumado e a demora na prestação jurisprudencial.Disponívelem:<http://www2.cjf.jus.br/ojs2/index.php/revcej/article/view File/639/819>. Acesso em: 29 de abril de 2014.

VALIM, Rafael Ramires Araújo. O princípio da segurança jurídica no direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros. 2010. FRANÇA, Vladimir da Rocha. Eficiência Administrativa na Constituição Federal, RDA 220/165.


[1] Militar, Professor e Advogado Especialista em Concurso e Direito Administrativo.

[2] Administradora e Advogada Especialista em Concurso Público e Direito do Trabalho.