OS EFEITOS INSTITUCIONAIS DA ARGUMENTAÇÃO SOBRE O ACERTO DAS DECISÕES JUDICIAIS NA SUPERAÇÃO DOS PRECEDENTES
30 de dezembro de 2024THE INSTITUTIONAL EFFECTS OF ARGUMENTATION ABOUT THE CORRECTNESS OF JUDICIAL DECISIONS IN OVERCOMING PRECEDENTS
Artigo submetido em 20 de dezembro de 2024
Artigo aprovado em 27 de dezembro de 2024
Artigo publicado em 30 de dezembro de 2024
Cognitio Juris Volume 14 – Número 57 – Dezembro de 2024 ISSN 2236-3009 |
.
Autor(es): Marcel Felipe Moitinho Torres[1] |
.
Resumo: O diálogo entre os renomados juristas Oliver Wendell Holmes e Learned Hand, no qual Holmes declara que não é seu papel fazer justiça, destaca uma distinção fundamental entre o direito e a moral. Entretanto, a crescente influência moral nas questões jurídicas aumenta o grau de subjetividade nas decisões, levando a uma maior volatilidade no conteúdo do direito e na variabilidade das decisões judiciais. Nesse contexto, a utilização de precedentes para a manutenção da previsibilidade e segurança das decisões judiciais acaba prejudicada pela utilização de argumentos que se baseiam no acerto ou erro do que fora decidido, sendo mais frequente a utilização dessa argumentação em causas morais mais controversas, favorecendo a percepção de arbitrariedade nas decisões judiciais. Em razão disso, o papel institucional das Cortes Supremas e o desenho institucional pretendido pela Constituição acaba sendo prejudicado.
Palavras-chave: Instituições; Crise; Precedentes; Superação.
Abstract: The dialogue between renowned jurists Oliver Wendell Holmes and Learned Hand, in which Holmes declares that dispensing justice is not his role, highlights a fundamental distinction between law and morality. However, the growing moral influence on legal matters increases the degree of subjectivity in decisions, leading to greater volatility in legal content and variability in judicial decisions. In this context, the use of precedents to maintain predictability and security in judicial decisions is undermined by arguments based on the correctness or incorrectness of what was previously decided, with such argumentation being more frequent in morally controversial cases, fostering a perception of arbitrariness in judicial decisions. As a result, the institutional role of Supreme Courts and the institutional design intended by the Constitution are compromised.
Keywords: Institutions; Crisis; Precedents; Overcoming.
1. Introdução
Dworkin (2010) descreve em uma de suas obras o diálogo mantido entre dois grandes juristas norte-americanos, Oliver Wendell Homes (aclamado Juiz da Suprema Corte Americana entre 1902 e 1932) e Learned Hand (Juiz Federal do Distrito Sul de Nova York entre 1909 e 1924 e Juiz da Corte de Apelações Federais do Segundo Circuito entre 1924 e 1951), quando o segundo, ao se despedir do primeiro, teria dito “Faça Justiça, Juiz” e ouvido como resposta “Não é esse o meu trabalho”.
Na obra em questão, o autor citado buscou investigar de que forma as convicções morais de um juiz se relacionam com os julgamentos sobre o que é direito por ele realizados. No presente artigo, buscaremos explorar, sobre prisma similarmente filosófico, de que forma tais convicções se relacionam com a superação de precedentes judiciais, observando, especialmente, o seu impacto no Juízo de Superação e as consequências disso no que se entende por stare decisis.
A atividade jurídica contemporânea – notadamente aquela desenvolvida no período posterior à segunda grande guerra ou segunda guerra mundial – é marcada pela reaproximação entre direito e moral, mormente ante às atrocidades verificadas em razão da adoção do isolamento extremado do direito.
Dizer que o conteúdo do que se entende por direito encontra-se atualmente correlacionado de maneira intrínseca a um conteúdo moral (e, assim, à certa percepção do que possa se entender por “justiça”) deixou de ser uma questão filosófica e passou a ser formalmente uma questão jurídica com a inserção de limites axiológicos à produção legislativa de determinado Estado, tornando, por conseguinte, a atividade judicante ainda mais complexa.
De se notar, entretanto, que a questão moral posta é sujeita a elevado grau de subjetividade (derivando, esse fenômeno, da própria abstratividade dos conceitos axiológicos empregados pelas Constituições para a delimitação dos contornos jurídicos de um Estado), pelo que o próprio conteúdo do direito sofre com maior nível de volatilidade, o que se expressa na variabilidade das decisões judiciais que se sucedem no tempo.
No contexto dos precedentes, parece ser possível se perceber que quanto maior é influxo moral sobre uma questão jurídica debatida (e, portanto, o grau de convicção do Juiz sobre tal questão), mais se faz presente a utilização de argumentos com elevado grau de subjetividade para a sua superação direta (overruling), como, e.g., o erro de uma decisão judicial (“plainly wrong decision”).
Como consequência, a alteração jurisprudencial promovida através de Juízos de Superação pautados em tais argumentos acaba por provocar efeitos deletérios mais sensíveis no desenho das instituições, uma vez que intimamente ligadas ao próprio fenômeno jurídico, provocando uma erosão da estabilidade e da segurança jurídica que se pretende obter através da utilização do sistema de precedentes, conforme passamos a argumentar e fazendo surgir questionamentos sobre a correlação entre direito e democracia.
2. Dos Precedentes
O precedente, em termos simples, é a decisão que deve ser observada para casos similares subsequentes. Dele, pode-se extrair a ratio, o dictum e a tese, pelo que se determina a amplitude e o significado do que restou decidido. O seu objetivo é, portanto, conferir segurança e estabilidade a determinado sistema jurídico, na medida em que se sabe que o futuro que será decidido observará o que já foi julgado no passado, em decisão anterior (precedente).
Ratio, nesse contexto, é, em síntese, a proposição jurídica extraída de uma decisão de uma Corte sobre um caso concreto apta a ser utilizada para resolver determinada questão jurídica. Dictum, ao revés, seria tudo aquilo que não integra o core da decisão (Pires, 2023).
A tese, conforme ensina Teresa Arruda Alvim e Rodrigo Barioni (2019), consiste em uma “hipótese de incidência” da ratio. O seu surgimento e utilização, assim, é mais bem visualizado no bojo dos casos repetitivos.
O Código de Processo Civil de 2015 atribuiu a certas decisões caráter juridicamente vinculativo, buscando agilizar e uniformizar o tratamento processual dos jurisdicionados, considerando o volume substancial de casos envolvendo assuntos idênticos.
Nesse sentido, Teresa Arruda Alvim e Bruno Dantas comentam:
O CPC prestigia precedentes proferidos em certas e determinadas situações que justificam sejam eles tidos de antemão como precedentes. Sim, porque há e sempre houve decisões que se tornam, naturalmente, precedentes a posteriori: ou seja, são densas, convincentes, com excelentes fundamentos, que passam a ser respeitadas em casos posteriores, idênticos ou semelhantes.
De acordo com a sistemática do CPC, há decisões que já nascem como precedentes obrigatórios e que devem ser paradigma para as posteriores, em casos às vezes idênticos e as vezes semelhantes. Esse não é o único aspecto que caracteriza os precedentes à brasileira, mas é bastante relevante. (2023, p. 312)
Por meio da implementação do sistema de precedentes vinculantes, o judiciário intenta alcançar um maior nível de certeza em relação à sua posição sobre questões específicas, evitando assim a ambiguidade e a emissão de decisões conflitantes que se desviam dos princípios orientadores legalmente estabelecidos.
Hermes Zaneti Jr. argumenta que, no contexto atual, o termo precedente deve ser usado para referir-se apenas a essas decisões tidas como vinculantes, reservando-se para os ditos “precedentes persuasivos”, ou seja, decisões que influenciam em casos futuros em razão de sua qualidade material, a terminologia de jurisprudência ou direito jurisprudencial (2015, p. 324 e seguintes).
Não se pode ignorar, entretanto, que diversas decisões assumirão simultaneamente viés persuasivo, por sua qualidade, e vinculante, em razão da previsão legal, pelo que a distinção defendida apenas problematiza a questão sem oferecer maior instrumentalidade prática, ao que nos parece.
Assim, concordamos com os argumentos elaborados Michel Pires (2023), que abaixo transcrevemos:
Também não nos parece adequado dizer que os precedentes vinculantes brasileiros são apenas aqueles formalmente previstos em lei, ou seja, que se trataria de um sistema por determinação legal. Aliás, nesse ponto, deve-se observar que a previsão em lei poderá ser insuficiente para a caracterização de um precedente vinculante. Isto é, ainda que se trate de orientação jurisprudencial listada no artigo 927 do Código de Processo Civil, esta carecerá de eficácia vinculante se não estiver dotada dos atributos mínimos necessários à formação de um precedente, especialmente o respeito ao contraditório e a fundamentação adequada e suficiente para se identificar e compreender a ratio decidendi. (2023, p. 80)
O direito, entretanto, não é imutável, pelo que mesmo o que foi anteriormente decidido (o precedente) pode deixar de ser observado no futuro em casos similares e, portanto, superado.
Nesse viés, quando se fala em distinção, na verdade, estar-se-á a falar em hipótese de não aplicação de um caso anterior, por falta de aderência ou similaridade, preservando-se hígido o quanto anteriormente decidido para aplicação futura a casos semelhantes. Não se confunde, portanto, com a ideia de efetiva superação do precedente.
Michel Pires (2023) destaca, ainda, a existência de “inconsistent distinguishing”, uma espécie de distinção que, na verdade, a própria corte de origem estabelece exceções á ratio, reduzindo o seu âmbito de incidência.
Para a superação direta do precedente, todavia, há necessidade de realização de um juízo, conforme veremos no capítulo a seguir.
3. Do Juízo de Superação
De início, esclarecemos que por “Juízo de Superação” estamos a nos referir ao ato de verificação dos requisitos necessários a revogação de um precedente.
Nesse sentido, como bem expõe Michel Pires (2023, p. 153):
Antes de prosseguir, cumpre dizer que o objeto do juízo de superação que se está a delimitar depende de que seja aceita uma premissa: o ordenamento jurídico brasileiro adotou o princípio do stare decisis. Isto é, os precedentes vinculantes devem ser preservados, a menos que haja razões especiais para sua superação e, por isso, vinculam também o próprio tribunal que fixou o entendimento.
Nessa linha, tem-se que a decisão pela superação de um precedente exige justificação especial e específica: especial, porque a superação deve ser vista como medida extraordinária (last resort); específica, porque os argumentos pertinentes à superação dizem respeito ao princípio do stare decisis e não se confundem com o mérito do caso concreto ou com os fundamentos do precedente ameaçado.
Em verdade, admitir que o tribunal invariavelmente altere entendimento anterior pelo simples fato de dele discordar implica minar a normatividade dos precedentes. Como já apontamos, com base em Frederick Schauer, seguir um precedente, pelo seu status de precedente vinculante, é aplicar as mesmas conclusões do caso analisado anteriormente, independentemente de um juízo de valor das razões que lhe dão suporte. (grifamos)
A exigência de uma justificação especial e específica para a superação de um precedente nada mais é do que uma consequência lógica sua existência, afinal, se nesse sistema fosse possível alterar o entendimento anteriormente firmado e proposição jurídica que se extraiu do que previamente foi decidido por mero capricho ou de forma arbitrária não haveria qualquer razão para se atentar ao que foi anteriormente entabulado pelas Cortes. Devem os agentes processuais se desincumbirem desse ônus argumentativo acaso desejem ver uma proposição jurídica diversa ser aplicada a caso semelhante e futuro.
Trata-se de um Juízo prejudicial à própria análise de mérito do recurso ou da demanda e, por aplicação do princípio hierárquico, é feito pela própria corte de onde se originou o precedente, não sendo bem recebido o juízo de superação feito por cortes hierarquicamente inferiores (chamado de “antecipatory overruling”), por se tratar de verdadeira hipótese de enfraquecimento do sistema de precedentes (Pires, 2023).
Em perspicaz análise desse Juízo de Superação, Michel Pires (2023) se debruça sobre diversos casos do direito-americano em que ocorreu a superação de um precedente, identificando alguns argumentos comuns, como relativos: à sua inexequibilidade; à alteração das circunstâncias fáticas e jurídicas que constituíam a base do precedente; à grave e flagrante equívoco no precedente e; à ausência de graves impactos no que concerne à proteção da confiança em decorrência da mudança a ser realizada.
Nessa senda, conforme Kozel (2017), a utilização da argumentação ou dos resultados do precedente para a sua superação (ou seja, da afirmação de “grave e flagrante equívoco do precedente) ocasiona sérios problemas em um universo de divergências interpretativas plurais e igualmente respeitáveis.
Conforme o autor comenta, em tradução livre:
Se houvesse um consenso (ou algo próximo a isso) sobre a maneira como a Constituição deve ser interpretada, concentrar-se no raciocínio falho de uma decisão ou em seus resultados prejudiciais poderia ser uma forma útil de enquadrar a análise do precedente. Mas quando os juízes estão divididos sobre como a Constituição deve ser entendida, deve haver algo mais do que uma convicção firme de erro para justificar uma revogação se o stare decisis deve impregnar a lei com um senso de durabilidade e impessoalidade que transcende os debates interpretativos[2]. (2017, p. 25)
É certo, entretanto, que as advertências feitas pela doutrina não foram suficientes para afastar a utilização desse argumento do Juízo de Superação, como visto quando do recente julgamento de Dobbs. v. Jackson Women’s Health Organization (2022), em que se superou o que havia sido decidido no famoso caso de Roe v. Wade (1973), em que se garantiu, em linhas gerais, com base em interpretação da Constituição, que os Estados não poderiam restringir os direitos das mulheres ao seu corpo, por corolário do direito constitucional de liberdade.
Referido precedente já havia, inclusive, sido submetido a diversos outros Juízos de Superação e mantido íntegro, por não se verificar alterações substanciais a justificar rever o que havia sido decidido (settled).
Todavia, a Suprema Corte dos Estados unidos, em sua composição atual, afirmou que o que fora ali decidido estava flagrantemente errado (“plainly wrong”) para proceder à sua superação.
Ao analisar esse caso, Pires (2023, p. 118) sintetiza:
Na justificação, a Corte perpassa novamente o princípio do stare decisis: (i) aponta que Roe e Casey estavam grave e evidentemente errados, pois se afastaram do princípio democrático ao retirar uma questão moralmente controvertida da decisão dos representantes do povo; (ii) ambos os precedentes tinham fundamentação precária, pois referiam-se a decisões que não davam embasamento ao direito ao aborto e continham fundamentação típica da atividade legislativa, o que evidencia que a Corte estava desbordando da sua competência; (iii) Casey tornou o precedente praticamente inexequível ao estipular que às mulheres não poderia ser imposto um ônus excessivo (“undue burden“) para obtenção do aborto, regra de difícil compreensão para os outros tribunais; (iv) o precedente equivocado estava repercutindo negativamente sobre outras áreas do direito; (v) não haveria violação à segurança jurídica, dado que o planejamento familiar e conjugal pode ser revisto imediatamente.
Em seguida, o autor bem observa que dessa superação se pode verificar uma mudança na perspectiva interpretativa e normativa sobre a qual a questão jurídica foi analisada, em verdadeiro embate entre as correntes da living constitution (que defende uma acepção ampla e evolutiva dos direitos fundamentais) e do originalismo e do textualismo (que buscam cristalizar o significado do texto constitucional ao tempo em que promulgado).
Pires (2023, p. 119) ainda comenta:
As Cortes Supremas, dado seu papel institucional, encaram pressão política. A questão em torno do aborto é moralmente controvertida, sendo que a Corte havia sido instada a superar o precedente algumas vezes. E, de fato, a superação se deu quando a composição da Corte passou a contar com uma maioria de Justices considerados de ideologias mais conservadoras. Esse pode muito bem ter sido o fator decisivo da superação, mas, ao menos, houve uma justificação na linha do que se espera de um tribunal que respeita o stare decisis.
Nota-se, assim, que o que se disse ser “erro flagrante” era, na verdade, na perspectiva bem indicada por Kozel (2017), uma divergência interpretativa razoável e que a utilização desse argumento no Juízo de Superação permitiu a superação de um precedente em razão da alteração da composição da corte, o que não é desejável.
O debate, contudo, é complexo, uma vez que deve se colocar á luz de questões morais, democráticas e institucionais, conforme passaremos a expor.
4. Instituições: Um Breve Estudo Conceitual
Conforme North (1991), as instituições nascem como “regra do jogo” (daí, inclusive, sua indissociável relação com a noção de direito), ou seja, correspondem à forma pela qual os governados restringem a aplicação do poder e da força, assumindo, em última análise, papel essencial para a garantia e manutenção da liberdade e do controle do poder pelos próprios governados (democracia).
Segundo Douglas C. North, em tradução livre:
As instituições são as restrições concebidas pelos seres humanos que estruturam a interação política, econômica e social. Elas consistem tanto em restrições informais (sanções, tabus, costumes, tradições e códigos de conduta) quanto em regras formais (constituições, leis, direitos de propriedade). Ao longo da história, as instituições foram criadas pelos seres humanos para criar ordem e reduzir a incerteza nas trocas. Juntamente com as restrições padrão da economia, elas definem o conjunto de escolhas e, portanto, determinam os custos de transação e produção, assim como a lucratividade e viabilidade de se envolver em atividades econômicas. Elas evoluem incrementalmente, conectando o passado com o presente e o futuro; em consequência, a história é amplamente uma narrativa de evolução institucional na qual o desempenho histórico das economias só pode ser compreendido como parte de uma história sequencial. As instituições fornecem a estrutura de incentivos de uma economia; à medida que essa estrutura evolui, ela molda a direção das mudanças econômicas em direção ao crescimento, estagnação ou declínio. Neste ensaio, pretendo elaborar sobre o papel das instituições no desempenho das economias e ilustrar minha análise a partir da história econômica.”[3]. (1991, p. 97)
Com base nesse conceito de instituições e partindo da teoria exposta, devemos avançar para determinar o seu papel no desenvolvimento do estado, conforme ideia que baseará os argumentos apresentados conforme avançamos deste artigo.
Para isso, forçoso que nos valhamos das palavras de Acemoglu (et. al.):
A política é o processo pelo qual uma sociedade escolhe as regras que a governarão. A política envolve instituições pela simples razão de que, enquanto instituições inclusivas podem ser benéficas para a prosperidade econômica de uma nação, algumas pessoas ou grupos, como a elite do Partido Comunista da Coreia do Norte ou os plantadores de açúcar de Barbados colonial, estarão em uma posição muito melhor ao estabelecer instituições extrativas. Quando há conflito sobre as instituições, o que acontece depende de qual pessoa ou grupo prevalece no jogo político — quem pode obter mais apoio, obter recursos adicionais e formar alianças mais eficazes. Em resumo, quem vence depende da distribuição do poder político na sociedade.
As instituições políticas de uma sociedade são um determinante-chave do resultado desse jogo. Elas são as regras que governam os incentivos na política. Elas determinam como o governo é escolhido e qual parte do governo tem o direito de fazer o quê. As instituições políticas determinam quem possui poder na sociedade e para quais fins esse poder pode ser utilizado. Se a distribuição de poder for estreita e desregrada, então as instituições políticas são absolutistas, como exemplificado pelas monarquias absolutistas que reinaram em todo o mundo durante grande parte da história. Sob instituições políticas absolutistas, como as da Coreia do Norte e da América Latina colonial, aqueles que podem exercer esse poder serão capazes de estabelecer instituições econômicas para enriquecerem a si próprios e aumentarem seu poder em detrimento da sociedade. Em contraste, as instituições políticas que distribuem o poder amplamente na sociedade e o sujeitam a restrições são pluralistas. Em vez de serem investidos em um único indivíduo ou em um grupo restrito, o poder político repousa em uma ampla coalizão ou em uma pluralidade de grupos. (2013, pp. 79-80).[4]
O papel das instituições políticas, dessa forma, é crucial na determinação da distribuição de poder entre indivíduos e grupos na sociedade.
Ronald Dworkin (2011) apresenta uma interpretação específica da divisão do trabalho entre o tribunal e os parlamentos representativos. Referido autor compreende os tribunais como instituições responsáveis pela salvaguarda dos direitos fundamentais e entende que os parlamentos representativos são responsáveis por deliberar sobre políticas públicas. Dworkin (2011) acredita que a objeção democrática contra a legitimidade da superação da lei pelos tribunais (revisão judicial ou judicial review) é equivocada, uma vez que o regime democrático tem alguns requisitos morais que não são necessariamente cumpridos por um procedimento majoritário.
Sobre o tema, Dworkin aduz:
O conceito de democracia é um conceito interpretativo e muito contestado. O que pode significar que “o povo” governa a si mesmo quando poucos têm poder significativo sobre quais serão as leis? O sistema majoritário de eleição de representantes parlamentares em cada distrito eleitoral, comum nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, é muito diferente do sistema de representação proporcional comum em outros países. Considerando a mesma distribuição de interesses, convicções e preferências, leis bastante diferentes tendem a emergir, dependendo de qual desses dois sistemas está em vigor. Um sistema é mais democrático que o outro? A prática da revisão judicial, que permite que juízes vitalícios declarem inconstitucionais atos legislativos e executivos, é ilegítima por ser antidemocrática? Ou essa prática é, antes, uma correção necessária e desejável à democracia? Ou – uma terceira possibilidade – essa prática é, na verdade, essencial para a criação de uma democracia genuína? Cada uma dessas posições é amplamente defendida, e não podemos escolher entre elas sem escolher entre concepções de democracia e defender nossa escolha. (2011, pp. 379-380)[5]. (grifamos)
E, em seguida, arremata:
Devemos ter cuidado para não confundir essa concepção majoritária de democracia com alguma teoria agregativa de justiça, como o utilitarismo, que sustenta que as leis são justas quando produzem a maior soma ou média possível de felicidade (ou qualquer outra concepção de bem-estar) dentro de uma comunidade específica. (A expressão “vontade da maioria” é perigosamente ambígua porque às vezes é usada para descrever um processo majoritário e, outras vezes, um resultado utilitarista ou outro resultado agregativo). Não há razão para pensar que um processo eleitoral majoritário produzirá tipicamente um resultado que seria considerado justo sob qualquer padrão agregativo específico. Pelo contrário, um processo majoritário pode muito bem produzir – e frequentemente tem produzido – leis que prejudicam o bem-estar total ou médio em qualquer concepção que se tenha disso. É por isso que os defensores da concepção majoritária consideram importante distinguir democracia de justiça. Um autocrata pode decretar uma distribuição mais justa de recursos do que uma maioria aprovaria. A concepção de parceria da democracia é diferente: ela sustenta que autogoverno significa governo não pela maioria das pessoas exercendo autoridade sobre todos, mas pelo povo como um todo agindo como parceiros. Inevitavelmente, deve ser uma parceria que se divide sobre políticas, é claro, já que a unanimidade é rara em comunidades políticas de qualquer tamanho. Mas ainda assim pode ser uma parceria se os membros aceitarem que na política devem agir com igual respeito e consideração por todos os outros parceiros. (Dowrkin, 2011, pp. 383-384)[6] (grifamos)
Assim, para Dworkin (2011), a questão posta pelo papel das instituições judiciais e do judicial review na garantia de direitos fundamentais e da liberdade deve ser encarada sob as lentes da democracia substantiva (em contraposição à ideia de democracia meramente majoritária), possuindo menor expressão, para fins de atribuição de legitimidade institucional, o procedimento decisório[7]. Nesse contexto, a concepção de democracia como parceria, fundamentada no tratamento igualitário e no respeito mútuo entre os cidadãos, legitima o processo de revisão judicial como um mecanismo de proteção da independência ética das minorias, superando a objeção tradicional dos defensores da democracia majoritária ao reconhecer que a autoridade moral da maioria para decidir questões controversas depende da legitimidade das instituições através das quais governa, e não apenas do processo majoritário em si[8].
Em conclusão, quando em debate os direitos fundamentais, a democracia seria uma questão de produção substantiva, sendo legítimo o processo de revisão judicial adotado pelas instituições jurídicas dele incumbidas (Mendes, 2008).
No bojo da superação dos precedentes, igualmente, o papel contramajoritário da corte é levado em consideração, pelo que mesmo o argumento democrático utilizado no julgado analisando anteriormente (Dobbs. v. Jackson Women’s Health Organization), por ignorar a visão substantiva bem delineada por Dworkin (2011) e o papel das instituições acima exposto, se apresenta, em nosso sentir, inadequado.
5. Das Consequências Institucionais da Superação dos Precedentes com Base no Acerto do que Foi Decidido
Kozel (2017) bem se debruça em sua sobre o difícil dilema de uma corte entre manter-se firme ao que decidido, mesmo divergindo, ou prolatar nova decisão de acordo com o que entende ser o direito certo, superando o precedente.
Referindo dilema, apesar de muito útil para o melhor entendimento do presente artigo, foge ao quanto pretendido, até mesmo pelo estrito escopo do presente escrito.
Conforme afirmamos em nossa introdução, quanto maior o influxo moral sobre a questão jurídica decidida, maior nos parece ser a tendência de utilização de argumentos com elevado grau de subjetividade.
No caso analisado (Dobbs. v. Jackson Women’s Health Organization), se está diante de um dos mais emblemáticos julgamentos do direito norte-americano e que jamais foi integralmente aceito (ou digerido) por boa parte daquela sociedade, sendo um ponto comum, inclusive, na sabatina dos Justices indicados desde então.
Assim, a divergência interpretativa é, de fato, severa e decorre, em grande parte, de convicções morais. Em razão disso, o efeito de (auto)contenção que se espera dos precedentes acaba sendo severamente enfraquecido, ou mais facilmente superável, em razão da contraposição com outros elementos (morais) igualmente persuasivos.
Com isso, a adoção do argumento do erro em decisão que adotou princípio interpretativo diverso para a sua superação acaba por fazer com que a alteração da composição da Corte se torne fator determinante para esse acontecimento, afetando-lhe em nível institucional.
Isso, pois as Cortes Supremas exercem, como muito felizmente categorizou André Ramos Tavares (2005), função arbitral[9], assumindo legítimo papel pacificador e resolutivo das fricções inerentes aos diálogos entre os poderes, o que acaba, todavia, prejudicado pela percepção de possível arbitrariedade na sua atuação.
Os efeitos dessa percepção, em nosso sentir, tendem a ser aproveitados por outros agentes políticos na constante disputa pelo poder que lhes é inerente, erodindo, por conseguinte, as bases que legitimam a própria atuação contramajoritária da instituição judicial em detrimento do controle que deve ser por ela exercido e prejudicando, em análise preliminar, o próprio desenho institucional pretendido constitucionalmente.
Considerações Finais
A superação dos precedentes representa um mecanismo essencial para a evolução do direito e sua adaptação às transformações sociais. Entretanto, este procedimento deve ser empregado com extrema cautela e apenas mediante justificação especial e específica, sob pena de comprometer a própria razão de ser do sistema de precedentes.
A análise desenvolvida ao longo do presente trabalho demonstra que mesmo a exigência de justificação especial não é suficiente para evitar que a superação do precedente ocorra de forma arbitrária ou em decorrência exclusiva da alteração da composição da Corte. Esse risco se intensifica quando a fundamentação para a superação se baseia em argumentos dotados de elevado grau de subjetividade, como aqueles que se limitam a apontar supostos erros na decisão anterior.
O caso citado no presente artigo – Dobbs v. Jackson Women’s Health Organization – evidencia como a utilização do argumento do “erro flagrante” (“plainly wrong”) pode mascarar uma simples divergência interpretativa, permitindo que mudanças na composição do tribunal determinem alterações jurisprudenciais em questões fundamentais. Esse fenômeno é particularmente preocupante em temas com forte carga moral, onde as convicções pessoais dos julgadores tendem a exercer maior influência.
Como visto, as consequências institucionais dessa prática são significativas. Ao admitir a superação de precedentes com base em argumentos essencialmente subjetivos, compromete-se não apenas a estabilidade e a previsibilidade do sistema jurídico, mas também a própria legitimidade das Cortes Supremas. A função arbitral dessas cortes, fundamental para a pacificação dos conflitos entre os poderes, resta ameaçada quando suas decisões passam a ser percebidas como resultado de preferências pessoais dos julgadores ou meras contingências em sua composição.
Vislumbra-se, assim, a erosão da autoridade institucional das Cortes Supremas, que pode ser especialmente danosa no contexto atual, em que o papel contramajoritário do Poder Judiciário enfrenta crescentes questionamentos. Como demonstrado através da análise da teoria democrática de Dworkin (2011), a legitimidade da revisão judicial depende da percepção de que as cortes atuam como garantidoras de direitos fundamentais e não como arena para embates ideológicos.
Portanto, impõe-se a necessidade de repensar os critérios para superação de precedentes, privilegiando argumentos objetivos – como alterações substanciais no contexto fático ou jurídico – em detrimento de valorações subjetivas sobre o acerto ou erro das decisões anteriores. Somente assim será possível preservar a integridade do sistema de precedentes e, por conseguinte, a própria funcionalidade das instituições democráticas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACEMOGLU, Daron. Why nations fail : the origins of power, prosperity, and poverty / Daron Acemoglu, James A. Robinson. p. cm. Includes bibliographical references. 1. Economics— Political aspects. 2. Economic history—Political aspects. 3. Poverty—Developing countries. 4. Economic development—Developing countries. 5. Revolutions—Economic aspects. 6. Developing countries—Economic policy. 7. Developing countries—Social policy. I. Robinson, James A., 1960– . II. Title. New York: Currency, Edição do Kindle, 2012.
ACKERMAN, Bruce. Adeus, Montesquieu. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 265, p. 13-23, jan./abr. 2014.
ALVIM, Teresa Arruda; BARIONI, Rodrigo. Recursos repetitivos: tese jurídica e ratio decidendi. Revista de Processo, v. 296, out. 2019.
ALVIM, Teresa Arruda; Precedentes, Recurso Especial e Recurso Extraordinário. Thonsom Reuters, São Paulo: 2023.
ALVIM, Eduardo Arruda, MARQUES, Mauro Campbell, NEVES, Guilherme Pimenta da Veiga e TESOLIN, Fabiano. Recurso Especial. 2 ed. Ed. Direito Contemporâneo, 2023
ALVIM, Teresa Arruda. O momento da eficácia do precedente – Texto extraído do Migalhas. Acesso em 26.01.2024
ALVIM, Teresa Arruda e DANTAS, Bruno – Recurso especial, recurso extraordinário e a nova função dos tribunais superiores no direito brasileiro, 4. ed., São Paulo: RT, 2017
BARIONI, Rodrigo. Precedentes no Direito brasileiro: desafios e perspectivas. Revista de
Processo, v. 310, p. 265-291, dez. 2020.
BARIONI, Rodrigo; ALVIM, Teresa. 34. Recursos Repetitivos: Tese Jurídica e Ratio Decidendi In: BIANCHI, José; PINHEIRO, Rodrigo; ALVIM, Teresa. Jurisdição e Direito Privado: Estudos em Homenagem aos 20 Anos da Ministra Nancy Andrighi no STJ. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2020. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/jurisdicao-e-direito-privado-estudos-em-homenagem-aos-20-anos-da-ministra-nancy-andrighi-no-stj/1196996441. Acesso em: 10 de Fevereiro de 2024.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Triagem 7°. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda, 2004.
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10 ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
CAMBI, Eduardo; NASSIF, Diego. Expansão da jurisdição constitucional e separação de poderes: uma análise sistêmica à luz da cidadania. Revista dos Tribunais, v. 916, Revista dos Tribunais, v. 916, p. 249-263, fev. 2012.
DWORKIN, Ronald. Justice for hedgehogs / Ronald Dworkin. Dworkin, Ronald. Justice for Hedgehogs . Harvard University Press. Edição do Kindle, 2011.
DWORKIN, Ronald. A Justiça de Toga. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
DWORKIN, Ronald. Levando os direito a sério. 2.ed.São Paulo: Martins Fontes, 2012.
KOZEL, Randy J. Settled versus Right. a theory of precedent. New York:
Cambridge University Press, 2017.
KOZEL, Randy J. Stare decisis as judicial doctrine. Wash ở Lee Law Review, v.
67 р. 411-466, 2010.
LIMONGI, Fernando. “A Democracia no Brasil: Presidencialismo, coalizão partidária e processo decisório”, Novos Estudos n. 76, 2006.
LOCKE, John. Segundo Tratado sobre o Governo. São Paulo: Martin Claret, 2002.
MARTINS, Ricardo Marcondes. Teoria Jurídica da Liberdade. São Paulo: Contracorrente, 2015.
MENDES, Conrado Hübner. Controle de Constitucionalidade e Democracia. Campus Elsevier, 2008.
MENDES, Conrado Hubner. Direitos Fundamentais, separação de poderes e deliberação. 2008. 224 f. Tese (Doutorado em Ciência Política). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
MITIDIERO, Daniel. Precedentes: da persuasão à vinculação. 3 ed. São Paulo, Thomson Reuters Brasil, 2018
MOREIRA, Lucas Pessoa. A expansão do Poder Judiciário e o espaço de sua autoridade fundada na separação dos poderes em sociedades democráticas plurais. 2016. 210 f.
Dissertação (mestrado em Direito). Faculdade de Direito. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2017.
NORTH, Douglass. Instituions, institutional change, and economic performance – political economy of instituions and decisions. Cambridge: Cambridge University Press, 1990. Edição do Kindle.
PIRES, Michel Hernane Noronha. A Superação dos Precedentes Vinculantes. Editora Direito Contemporâneo, 2023.
SCHEPPELE, Kim L. (2018) “Autocratic Legalism,” University of Chicago Law Review: Vol. 85: Iss. 2, Article 2. Disponível em < https://chicagounbound.uchicago.edu/uclrev/vol85/iss2/2/
>
ZANETI JÚNIOR, Hermes. Brasil; um país de “common law” As tradições jurídicas de “common law” e “civil lav” e a experiência da Constituição brasileira como constitucionalismo híbrido. DIDIER IR., Fredie; NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa; GOUVEIA FILHO, Roberto Campos. Pontes de Miranda e o direito processual. Salvador: Juspodivm, 2013.
________________. O valor vinculante dos precedentes. Salvador: Juspodivm, 2015.
________________. Precedentes normativos formalmente vinculantes. DIDIER IR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; ATAÍDE R., Jaldemiro Rodrigues de MACEDO, Lucas Buril de. Precedentes. Salvador: Juspodivm, 2015.
[1] Procurador do Estado de São Paulo, mestrando em direito processual civil pela PUC-SP, formado em Direito pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e especialista em direito constitucional, processo civil e em ciências criminais.
[2] No idioma original: “If there were consensus (or something close to it) about the manner in which the Constitution should be interpreted, focusing on a decision’s flawed reasoning or detrimental results could be a useful way of framing the analysis of precedent. But when the justices are divided over how the Constitution ought to be understood, there must be something more than a firm conviction of error to justify an overruling if stare decisis is to infuse the law with a sense of durability and impersonality that transcends interpretive debates”.
[3] No idioma original: “Institutions are the humanly devised constraints that structure political, economic and social interaction. They consist of both informal constraints (sanctions, taboos, customs, traditions, and codes of conduct), and formal rules (constitutions, laws, property rights). Throughout history, institutions have been devised by human beings to create order and reduce uncertainty in exchange. Together with the standard constraints of economics they define the choice set and therefore determine transaction and production costs and hence the profitability and feasibility of engaging in economic activity. They evolve incrementally, connecting the past with the present and the future; history in consequence is largely a story of institutional evolution in which the historical performance of economies can only be understood as a part of a sequential story. Institutions provide the incentive structure of an economy; as that structure evolves, it shapes the direction of economic change towards growth, stagnation, or decline. In this essay I intend to elaborate on the role of institutions in the performance of economies and illustrate my analysis from economic history”.
[4] No idioma original: “Politics is the process by which a society chooses the rules that will govern it. Politics surrounds institutions for the simple reason that while inclusive institutions may be good for the economic prosperity of a nation, some people or groups, such as the elite of the Communist Party of North Korea or the sugar planters of colonial Barbados, will be much better off by setting up institutions that are extractive. When there is conflict over institutions, what happens depends on which people or group wins out in the game of politics— who can get more support, obtain additional resources, and form more effective alliances. In short, who wins depends on the distribution of political power in society.
The political institutions of a society are a key determinant of the outcome of this game. They are the rules that govern incentives in politics. They determine how the government is chosen and which part of the government has the right to do what. Political institutions determine who has power in society and to what ends that power can be used. If the distribution of power is narrow and unconstrained, then the political institutions are absolutist, as exemplified by the absolutist monarchies reigning throughout the world during much of history. Under absolutist political institutions such as those in North Korea and colonial Latin America, those who can wield this power will be able to set up economic institutions to enrich themselves and augment their power at the expense of society. In contrast, political institutions that distribute power broadly in society and subject it to constraints are pluralistic. Instead of being vested in a single individual or a narrow group, political power rests with a broad coalition or a plurality of groups”
[5] No idioma original: “The concept of democracy is an interpretive and much contested concept. What can it mean that ‘the people’ govern themselves when very few of them have any significant power over what the laws will be? The winner-takes-all style of electing parliamentary representatives in each electoral district, common in the United States and Britain, is very different from the proportional representation system common in other countries. Given the same distribution of interests, convictions, and preferences, rather different laws are likely to emerge, depending on which of these two systems is in place. Is one system more democratic than the other? Is the practice of judicial review, which allows judges appointed for life to declare legislative and executive acts unconstitutional, illegitimate because it is undemocratic? Or is that practice rather a necessary and desirable corrective to democracy? Or—a third possibility—is the practice actually essential to creating a genuine democracy? Each of these positions is widely defended, and we cannot choose among them without choosing among conceptions of democracy and defending our choice.”
[6] O idioma original: “We must take care not to confuse this majoritarian conception of democracy with some aggregative theory of justice, like utilitarianism, that holds that laws are just when they produce the greatest possible sum or average of happiness (or some other conception of well-being) within a targeted community. (The phrase “majority will” is dangerously ambiguous because it is sometimes used to describe a majoritarian process and sometimes a utilitarian or other aggregative result.3) There is no reason to think that a majoritarian electoral process will even typically produce a result that would be deemed just on any particular aggregative standard. On the contrary, a majoritarian process might well produce—and often has produced—laws that injure total or average well-being on any conception of what that is. That is why proponents of the majoritarian conception believe it important to distinguish democracy from justice. An autocrat might decree a more just distribution of resources than a majority would approve. The partnership conception of democracy is different: it holds that self- government means government not by the majority of people exercising authority over everyone but by the people as a whole acting as partners. This must inevitably be a partnership that divides over policy, of course, since unanimity is rare in political communities of any size. But it can be a partnership nevertheless if the members accept that in politics they must act with equal respect and concern for all the other partners.”
[7] “That brief description reveals the most important difference between the two conceptions of democracy. The majoritarian conception defines democracy only procedurally. The partnership conception ties democracy to the substantive constraints of legitimacy. Because legitimacy is a matter of degree, so, on this conception, is democracy. It is an ideal toward which some political communities strive, some more successfully than others. But the partnership conception makes self-government at least an intelligible ideal. The majoritarian conception—or so I shall argue—does not, because it describes nothing that could count as self-government by members of a political minority. Or, for that matter, by individual members of a majority.” (Dworkin, 2011, p. 384)
[8] “Still, the majoritarian conception is wary of judicial review, and its acolytes reject judicial power to strike down laws that a steady and informed majority plainly favors: the death penalty, for instance, or prayer in public schools, or, in some American states, restrictions on early abortion. They understand that it is controversial whether a political majority should have the power to adopt such legislation. But they insist that because that question is controversial, the majority must be permitted to decide the question for itself. Allowing a small group of lawyers who cannot be dismissed in any general election to decide that fundamental question of governance is contrary to the whole point of majoritarian democracy. On that view, judicial review denies the positive liberty necessary to the dignity of ordinary citizens.
On the partnership conception, however, that familiar argument is starkly circular. It assumes that a political majority has moral authority to decide controversial issues for everyone, but on the partnership conception a majority has no moral authority to decide anything unless the institutions through which it governs are sufficiently legitimate. Judicial review is one possible (though I emphasize, only one possible) strategy for improving a government’s legitimacy—by protecting a minority’s ethical independence, for instance—and in that way securing a majority’s moral title to impose its will on other matters”. (Dworkin, 2011, p. 385)
[9] “Considera-se exercício da função arbitral apenas na hipótese de se reportar o Tribunal Constitucional à atuação normativa ou material dos ‘poderes’, procurando solver eventuais conflitos que surjam, fundamentada exclusivamente na preocupação de superar o atrito entre entidades constitucionais” (Teoria da Justiça Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 297).