NORMA ISENTIVA E A INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA SOB O ASPECTO PRAGMÁTICO

NORMA ISENTIVA E A INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA SOB O ASPECTO PRAGMÁTICO

31 de julho de 2023 Off Por Cognitio Juris

EXEMPTIVE STANDARD AND RESTRICTIVE INTERPRETATION UNDER THE PRAGMATIC ASPECT

Artigo submetido em 21 de junho de 2023
Artigo aprovado em 14 de julho de 2023
Artigo publicado em 31 de julho de 2023

Cognitio Juris
Ano XIII – Número 48 – Julho de 2023
ISSN 2236-3009

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Autor:
José Orivaldo Peres Júnior[1]
Argos Campos Ribeiro Simões[2]

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RESUMO: Dando enfoque à questão que envolve o alcance da interpretação da norma isentiva, tendo em vista o disposto no artigo 111 do Código Tributário Nacional, este trabalho se preocupa em tecer considerações relativamente ao instituto da isenção fiscal, bem como uma análise das expressões “interpretação literal” contidas na norma em testilha, tendo em vista sua finalidade. Utilizou-se como método o dedutivo, com pesquisas bibliográficas e jurisprudenciais, concluindo que não se admite uma interpretação restritiva da norma de isenção a tal ponto de se negar justiça e o próprio direito, eis que deve ser privilegiado o aspecto teleológico da isenção fiscal.

Palavras-chave: Norma Isentiva; Interpretação Restritiva; Pragmatismo; Finalidade.

ABSTRACT: The present work aims to investigate the limits of the interpretation of the exempt norm, in view of the provisions of article 111 of the National Tax Code. Therefore, it is appropriate to make considerations regarding the tax exemption institute, as well as an analysis of the expressions “literal interpretation” contained in the standard, in view of its purpose. The deductive method was used, with bibliographic and jurisprudential research, concluding that a restrictive interpretation of the exemption rule is not allowed to the point of denying justice and the right itself here is where the teleological aspect of tax exemption should be privileged.

Keywords: Exemption Standard; Restrictive Interpretation; Pragmatism; Goal.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por escopo investigar os lindes da interpretação da norma isentiva consoante o disposto no artigo 111 do Código Tributário Nacional. Para tanto, consideramos relevante tecer considerações sobre o instituto da isenção fiscal, além de uma análise das expressões “interpretação literal” contidas na norma em testilha, à vista de sua finalidade.

É cediço que o legislador elege fatos sociais que considera relevantes para juridicizar a regulação das condutas humanas, introduzindo normas no sistema jurídico por meio de normas introdutórias primárias. Nesse sentido, a “isenção” se constitui em instrumento de política fiscal e social, beneficiando contribuintes mais vulneráveis da sociedade, buscando o desenvolvimento e o equilíbrio de determinadas regiões do país, ou para o fomento de alguns segmentos da economia que são relevantes do ponto de vista macroeconômico.

Entretanto, o artigo 111 do Código Tributário Nacional é insuficiente em esclarecer o alcance da interpretação da norma de isenção. Com efeito, nosso objetivo é fazer uma análise da problemática interpretativa da norma de isenção, máxime para fins aplicação do direito.

Não temos a intenção, nem muito menos a pretensão de esgotar o tema, mormente por envolver questões tão amplas e complexas. A ideia é realizar uma abordagem do ponto de vista pragmático, provocando inquietações e reflexões sobre a restritividade hermenêutica da norma de isenção tributária, como proposta de composição de conflitos, diante de uma jurisprudência oscilante, tendo em vista os interesses antagônicos entre o fisco e o “contribuinte”.

1. DA INCIDÊNCIA E DA NÃO-INCIDÊNCIA DA NORMA JURÍDICA E SEUS EFEITOS

A fenomenologia da incidência tributária consiste na ocorrência de um fato, previsto no descritor da norma jurídica (tributária), relatado por meio de linguagem competente, fazendo nascer o vínculo jurídico entre o sujeito ativo (investido no direto de exigir a obrigação) e o sujeito passivo (que tem o dever de cumprir determinada obrigação). Irrompida a relação jurídica, nasce o crédito tributário, que será aperfeiçoado com a “comunicação” formal ao sujeito passivo.

A não-incidência, é o não enquadramento normativo a uma conduta, isto é, quando a conduta fática não encontra respaldo ou identificação com qualquer hipótese normativa, de modo que não provocará o nascimento de relação jurídico-tributária.

Por oportuno, adiantamos que nas isenções há incidência normativa, como ocorre com as imunidades tributárias.

Para o Professor Paulo de Barros Carvalho (2013, p. 193), as imunidades e as isenções são proposições normativas diferentes, ou seja categorias distintas que não se interpenetram, nem possuem qualquer tipo de relacionamento no processo de derivação. Entretanto, o insigne professor sublinha três sinais comuns: a) são normas jurídicas válidas no sistema; b) integram a classe das regras de estrutura; c) tratam de matéria tributária. A imunidade são normas constitucionais e a isenção estão no âmbito infraconstitucional. A imunidade colabora com o desenho das competências impositivas. Não cuida da problemática da incidência, mas atua no instante que antecede ao momento da percussão tributária. A isenção opera como redutor do campo de abrangência dos critérios da hipótese ou da consequência da regra-matriz do tributo.

A imunidade é referendada em sede Constitucional e a isenção através de normas infraconstitucionais, o que implica dizer que a imunidade não poderá ser modificada, pois trata-se de cláusula pétrea, enquanto a isenção poderá ser modificada ou revogada por outra norma infraconstitucional.

A norma imunizante situa-se no plano da definição da competência tributária alocando-se a isenção, por seu turno, no plano do exercício da competência tributária.

Logo, tanto na imunidade como na isenção, há incidência tributária. Por outro lado, Rui Barbosa Nogueira, faz adiferenciação entre não incidência, isenção e imunidade da seguinte forma:

 […] os campos de incidência e isenção cabem ao legislador ordinário. Este, dentro de sua competência, tem a faculdade de traçar o círculo da incidência e excepcionar a isenção. O da não incidência ficou fora do círculo da incidência. Em princípio a área de incidência ou de isenção podem ser aumentadas ou diminuídas pelo competente legislador ordinário, porém jamais ultrapassar a barreira da imunidade, porque esta é uma vedação constitucional. (NOGUEIRA, 1992, p. 55).

Portanto, para o referido jurista apenas a isenção encontra-se no campo da incidência, entendimento esse que não compactuamos.

Seja como for, partindo da premissa que a isenção é norma de incidência, revela notar que o instituto da isenção é regra de estrutura, dada sua autonomia normativa que investe contra um ou mais critérios da regra-matriz, mutilando-a parcialmente, seja no critério do antecedente, seja no critério do consequente. Assim, a regra da isenção atua no sentido de inibir ou paralisar a incidência da regra-matriz tributária. No antecedente ou hipótese, poderá atuar no “critério material” para desqualificar o verbo ou para subtrair o complemento. Também poderá atingir o critério espacial ou temporal. No consequente, a norma isentiva poderá atingir o sujeito ativo ou o sujeito passivo (critério pessoal), e ainda, impactar na base de cálculo ou na alíquota (critérios quantitativos).

Como é cediço, fica ao talante do legislador recortar do tecido social os fatos que considera relevantes para imputar efeitos jurídicos ou qualificá-los como fatos jurídicos, impondo direitos e deveres. Da mesma forma, o legislador, julgando relevante e oportuno, poderá “paralisar” a atuação da regra-matriz de incidência tributária para certos e determinados casos que nunca poderá ser total, mas sempre parcial (CARVALHO, 2013, p. 454).

Ainda no que se refere à isenção, infere-se que o artigo 175, inciso I, do Código Tributário Nacional ao prescrever que a isenção “exclui” o crédito tributário, não significa “extinção do crédito tributário”, até porque, o parágrafo único da norma em testilha impõe que o contribuinte mantenha o cumprimento das obrigações acessórias na forma prevista na legislação tributária. A isenção deve ser prevista em lei (artigo 176 do CTN), vedado para as taxas e contribuições de melhoria (artigo 177 do CTN), podendo ser revogada, ressalvadas as isenções com prazo certo, ou modificada, também por lei (artigo 178 do CTN).

2. INTERPRETAÇÃO LITERAL E INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA

O artigo 111 do Código Tributário Nacional dispõe com todas as letras que a interpretação da norma de isenção deverá ser “literal”. De plano, podemos questionar o sentido semântico da expressão “literal”. Seria sinônimo de interpretação restritiva ou estrita, tendo em vista o princípio da legalidade?

Na doutrina há muitas definições do que seja “interpretação literal”, podendo significar: interpretação irreflexiva, abstrata, formal, linguística, gramatical, imediata, óbvia, ordinária, patente, textual, própria, semântica, semiótica, expressa, não corretiva, acontextual, aparente e estrita (GUASTINI, 2021, p. 55).

Paulo de Barros Carvalho (2015) nos apresenta o percurso gerativo de percurso ou simplesmente a trajetória da interpretação,  que se manifesta sempre em quatro planos: 1. O das formulações literais; 2. o de suas significações enquanto enunciados prescritivos; 3. O das normas jurídicas como unidades de sentido obtidas mediante o agrupamento de significação que obedecem a determinado esquema formal (implicação); 4. O da forma superior do sistema, que estabelece vínculos de coordenação e subordinação entre as normas jurídicas criadas no plano anterior.

Assim sendo, a expressão “literal” está apenas no plano S1, ou seja aqueles enunciados que pertencem à plataforma da literalidade textual, suporte físico de significações. Logo, do ponto de vista jurídico, não há nada de “literal” na interpretação. A interpretação surge pela construção de sentido pelo sujeito dentro dos limites dos horizontes da cultura.

À propósito, o Professor Lourival Vilanova rechaça o método literal e gramatical de interpretação, pois, segundo o jusfilósofo, a norma jurídica é construída epistemologicamente, a partir das significações que a leitura dos documentos do direito positivo desperta no espírito pelo intérprete.

A norma não é a oralidade ou a escritura da ‘linguagem’, nem é o ‘ato-de-querer ou pensar’ ocorrente no sujeito emitente da norma, ou no sujeito receptor da norma, nem é, tampouco, a ‘situação objetiva’ que ela denota. A norma jurídica é uma estrutura lógico-sintática de significação: a norma concecptua fatos e condutas, representa-os não como desenho intuitivo, imagem reprodutiva (que somente pode ser do concreto – há normas abstratas) de ‘fatos-eventos’ e ‘fatos-condutas’. Representa-os como significações objetivas – endereçadas ao objetivo – confirmáveis ou não na espécie de eficácia ou ineficácia por parte das situações objetivas (os ‘states-of-affairs’). (VILANOVA, 2000, p. 10)

Também no sentido de refutar a “interpretação literal”, Carlos Maximiliano pontua que “uma lei é clara quando o seu sentido é expresso pela letra do texto, mas para saber isto, é preciso conhecer o sentido, o que só ocorre com a interpretação” (MAXIMILIANO, 2020, p.39).

Com essas breves considerações, assumimos que inexiste interpretação literal, mas sim, apenas interpretação restritiva do direito, vale dizer, sem que o aplicador do direito possa se valer dos institutos da analogia (inciso I, do artigo 108 do CTN) e da equidade (inciso IV, do artigo 108 do CTN) para expandir a construção de sentido dos enunciados jurídicos, desde que haja previsão expressa em lei prescrevendo essa limitação.

Neste sentido, o Professor Ricardo Lobo Torres aponta que a regra do artigo 111 apenas proíbe a aplicação da analogia e da equidade previstos no artigo 108 do CTN e que a “interpretação literal” se confunde com a própria interpretação:

Conseguintemente, quando o artigo 111 do CTN prescreve interpretação literal, está sendo confuso e ambíguo, eis que, do ponto de vista do início do processo interpretativo, não esclarece como se alcança a adequação entre a letra e o espírito da lei. Quando o art. 111 do CTN prescreve interpretação literal das isenções está apenas impedindo, em homenagem ao princípio da legalidade, o recurso à analogia e à equidade, como formas de integração, mas não está impondo qualquer método específico de interpretação. Do ponto de vista do limite do processo interpretativo, o art. 111 constitui uma demasia e uma redundância, posto que a interpretação literal se confunde com a própria interpretação; por outro lado, é ambíguo e insuficiente em virtude da imprecisão do limite de expressividade da letra da lei, que antes examinamos. (TORRES, 2020, p. 102)

É pertinente registrar, entrementes, que no âmbito do que denominamos “interpretação restritiva”, admissível a utilização dos princípios gerais do direito tributário (inciso II, do artigo 108 do CTN) e dos princípios gerais do direito público (inciso III, do artigo 108 do CTN). Qualquer restrição ou vedação neste sentido será inconstitucional, pois, implicaria em negar vigência à própria Constituição Federal, com seus princípios explícitos e implícitos.

3. A SEMIÓTICA NA FENOMENOLOGIA DA INCIDÊNCIA DA NORMA ISENTIVA

Tratando-se de norma de isenção é relevante sua finalidade que, como veremos, está totalmente jungida à interpretação dita “literal” que preferimos chamar de “interpretação restritiva” para fins da incidência tributária.

Para o desiderato deste trabalho, ganha expressão o instituto da “semiótica”, em especial, o aspecto “pragmático”, até porque, conforme aponta Paulo de Barros Carvalho (2012, p. 30), o Direito, como fenômeno da linguagem, todo o seu percurso será orientado pelas categorias semióticas, pesquisando as construções jurídico-prescritivas pelos ângulos da sintaxe, semântica e da pragmática.

Com efeito, no que tange à fenomenologia da incidência tributária ou sancionatória tributária, o aplicador do direito poderá se valer dos recursos da semiótica nos planos lógico (subsunção e imputação), semântico (denotação dos conteúdos normativos) e pragmáticos (interpretação e produção da norma individual e concreta) e da teoria das classes.

Assim, com três pontos de vista sobre mesmo objeto, fica mais rica a análise do fato-incidência. Sob o aspecto sintático, a incidência se perfaz em duas operações lógicas: (i) subsunção (inclusão de classes) do fato e da relação e (ii) imputação dos fatos aos efeitos jurídicos, que corresponde à implicação da relação jurídica. Sob o aspecto da semântica, a incidência é a determinação do conteúdo dos enunciados normativos gerais e abstratos, caracterizando-se como uma operação de denotação. Sob o ponto e vista pragmático, também se completa de duas operações: (i) interpretação (do fato e do direito); (ii) constituição da nova linguagem jurídica para a expedição da NIC-Norma Individual e Concreta (CARVALHO, 2014, p. 468).

É certo que a isenção tributária está afeta ao princípio da legalidade, a teor do inciso VI, do artigo 97 do Código Tributário Nacional, pouco importando a “intenção do legislador”. Todavia, não se pode olvidar que o instituto da “isenção” é instrumento de política fiscal ou de extrafiscalidade, ora realizando justiça tributária, ora um bem social, sem olvidar quanto ao escopo do fomento de segmentos da economia, de tal sorte que a carga axiológica contida na norma de isenção é fruto dos princípios insertos na Constituição Federal, influenciando o intérprete quando se depara com complexas questões semânticas do ordenamento jurídico. E não poderia ser diferente, na medida em que os valores são atribuídos pelo aplicador do direito ao interpretar as normas gerais e abstratas, os fatos alegados e as provas dos autos, consoante as máximas da experiência.

Eis portanto a ilação de que o pragmatismo deve nortear a chamada “interpretação restritiva”, pelo escólio do artigo 111 do Código Tributário Nacional.

Insta registrar que a “interpretação” tem como ponto de partida o texto jurídico, prosseguindo com o intercâmbio com outros discursos, conforme os materiais semânticos existentes no ordenamento, dentro do processo de positivação.

É lícito afirmar que a interpretação deve respeitar os primados da Carta Constitucional, bem como, as normas infraconstitucionais que estabelecem os lindes em que o aplicador do direito poderá transitar. Os predicados da “inesgotabilidade do sentido” e da “intertextualidade”, ínsitos no processo interpretativo, estão “restritos” ao traçado nos textos legislados. Em outras palavras, pertine afirmarmos que interpretar possui limites, de modo que não se pode transformar um texto ao bel-prazer do intérprete.

Destarte, o artigo 111 do CTN, ao prescrever que a interpretação deverá ser “literal”, vale dizer, “restritiva”, confirma o brocardo jurídico de que o Direito Tributário rege-se pelo princípio da legalidade estrita, tendo em vista o sistema tributário brasileiro em vigor (artigos 145 e seguintes, da Carta Constitucional e artigo 97 do CTN, já citado).

O ordenamento jurídico por meio dos textos legais pretende “dirigir” o ato de interpretação, trançando critérios de justificação e de legitimação para a segurança e certeza da escorreita significação. Todavia, sendo o direito um objeto cultural, o ato cognoscitivo para o seu conhecimento é a “compreensão” que somente pode ser alcançada com a “interpretação” que é um processo mediante o qual o conteúdo do texto é construído.

A hermenêutica contém a trilogia (método dialético): i) leitura (intérprete lê com base empírica); ii) interpretação (constrói sentido ou conteúdo); iii) compreensão (confronta num processo inesgotável até alcançar a compreensão). Por conta da inesgotabilidade da compreensão, é que o “dirigismo hermenêutico” não é possível.

São exemplos de dirigismo hermenêutico: a norma interpretativa prevista no inciso I, do artigo 106 do CTN; a vedação de alteração da definição, do conteúdo e o alcance de institutos, conceito ou forma do direito privado, conforme artigo 110 do CTN; e o próprio artigo 111 que determina que a interpretação seja “literal” nas hipóteses dos incisos da norma.

Note-se que nos três exemplos acima, sempre haverá uma interpretação e uma compreensão que à evidência não serão uníssonas, pois toda interpretação pressupõe um processo gerador de sentido considerando seu contexto.

Com efeito, reafirmamos em total concordância com o Prof. Ricardo Lobo Torres o que foi citado anteriormente, vale dizer, a restritividade da interpretação de que fala o artigo 111 do CTN atinge a analogia e a equidade (incisos I e IV, do artigo 108 do CTN), que são institutos que tendem a ampliar a interpretação da norma.

Nada impede que o aplicador do direito adote, verbi gratia o método sistemático de interpretação que é o mais completo. Por esse método, é proporcionada a compreensão do direito enquanto um conjunto de disposições normativas que se relacionam entre si, conduzindo o intérprete a uma visão plena do Direito Positivo. Com ele, observa-se todas as demais prescrições que formam o sistema jurídico. Numa análise sistemática, os enunciados, as proposições, e a normas em sentido estrito (H-C), só são compreendidas quando examinadas tendo em conta o todo que as envolve, atravessando todos os planos da linguagem (sintático, semântico e pragmático). (CARVALHO, 2014).

Sem prejuízo, também poderá ser adotado outros métodos como o histórico-evolutivo, o lógico e o teleológico, conforme o desiderato de cada caso.

Naturalmente que em muitas situações não haverá dificuldades na interpretação de normas isentivas. Em outras, porém, como foi dito alhures, poderá haver complexidades exigindo maior esforço do intérprete de tal modo que o aspecto pragmático, no que tange ao “benefício fiscal da isenção”, será fundamental para a política fiscal almejada, até porque o direito tem por escopo alcançar certas finalidades.

4. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA SOB O ASPECTO PRAGMÁTICO

A Constituição de um Estado contém princípios implícitos e explícitos que são normas que carregam valores com alta carga axiológica desenhando o perfil de determinada sociedade juridicamente organizada.

Já no preâmbulo da Constituição Federal de 1988 são indicados como sobrevalores: a garantia ao exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade, justiça, a busca por uma sociedade fraterna e sem preconceitos, a harmonia social, o respeito à ordem interna e internacional e a solução pacífica das controvérsias.

O artigo 5º da Carta Magna contempla a garantia de inúmeros direitos fundamentais individuais como: a vida, a saúde, a crença religiosa, a atividade profissional e intelectual, o acesso ao Poder Judiciário, o devido processo legal, dentre outros. Também está ínsito na atividade econômica o princípio dignidade da vida humana, a valorização do trabalho humano, a soberania nacional, a função social da propriedade e da atividade econômica, a livre concorrência, a defesa do consumidor, defesa do meio ambiente, a redução das desigualdades regionais e sociais, a busca pelo pleno emprego e o tratamento diferenciado às empresas de pequeno porte, nos termos do artigo 170.

No sistema jurídico tributário brasileiro destacam-se os sobreprincípios da segurança jurídica, da igualdade e da justiça que são realizados pela aplicação de outros princípios constitucionais como o da legalidade, da irretroatividade da norma, da anterioridade, do devido processo legal, da razoabilidade e da proporcionalidade, da capacidade contributiva e do não-confisco que estão contidos na Constituição Federal de 1988.

O legislador, no processo de enunciação da norma, inevitavelmente considera tais princípios insculpidos para atender aos anseios da sociedade.

Se a norma de isenção é largamente utilizada como política fiscal e social, tendo por finalidade implementar os princípios constitucionais acima indicados, insofismável que o pragmatismo há ser considerado pelo aplicador do direito.

O Supremo Tribunal Federal manifestou entendimento de que a concessão de isenção pelo Poder Público é instrumento de políticas fiscais e econômicas para o desenvolvimento e equilíbrio de determinadas regiões e segmentos da economia.

Muito embora o Pretório Excelso aponte que o Judiciário não possa avaliar o mérito das escolhas do Poder Executivo, inviabilizando a extensão da isenção fiscal pelo fundamento do princípio da isonomia, é certo também que a jurisprudência de nossos Tribunais tem manifestado entendimento pela possibilidade de serem adotados métodos de interpretação para a aplicação do direito de modo a alcançar o escopo da norma de isenção, à luz dos princípios do direito, da Constituição e consoante a legislação em vigor.

Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp 192.531 assim se manifestou:

ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO.  RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. MOLÉSTIA GRAVE. CARDIOPATIA. ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA.  AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 111, INCISO II, DO CTN. LEI N. 4.506/64 (ART. 17, INCISO III). DECRETO N. 85.450/80. PRECEDENTES.

1.  O art.  111  do  CTN,  que prescreve a interpretação literal da norma,  não pode levar o aplicador do direito à absurda conclusão de que  esteja  ele  impedido,  no  seu mister de apreciar e aplicar as normas  de  direito,  de  valer-se de uma equilibrada ponderação dos elementos    lógico-sistemático,    histórico   e   finalístico   ou teleológico,   os   quais   integram   a   moderna   metodologia  de interpretação das normas jurídicas.

2.  O STJ firmou o entendimento de que a cardiopatia grave, nos termos do art. 17, inciso III, da Lei n. 4.506/64, importa na exclusão dos proventos de aposentadoria da tributação pelo Imposto de Renda, mesmo que a moléstia tenha sido contraída depois do ato de aposentadoria por tempo de serviço.

3. Recurso especial conhecido e não-provido. (STJ, 2005)

Também trago à colação o entendimento do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Napoleão Nunes Maia Filho, inserto no AgInt no REsp n. 1.759.989 – DF (2018/0208564-7):

Dest’arte, embora na aplicação da Legislação Tributária, o CTN estabeleça, em seu art. 111, que o intérprete deve orientar-se pela literalidade da norma que disponha sobre outorga de isenção, não é possível admitir que prevaleça o pensamento redutor da justiça à lei escrita e ao seu cumprimento fiel ou literal, vedando ao intérprete do Direito qualquer margem de discricionariedade ou mesmo elasticidade na aplicação do conteúdo da norma escrita. Isso impediria que o benefício isencional fosse aplicado a casos semelhantes, ainda que não absolutamente idênticos, o que afrontaria os princípios e garantias fundamentais, em especial o da isonomia e da dignidade da pessoa humana, que devem reger todo o ordenamento jurídico, inclusive o Tributário. (STJ, 2019)

Os tribunais administrativos tributários, na esteira do Poder Judiciário, têm considerado o pragmatismo para a solução dos litígios entre a administração tributária e o contribuinte.

A Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas, órgão de julgamento administrativo competente para uniformizar a jurisprudência do Contencioso Administrativo Tributário paulista (art. 49, da Lei Estadual n. 13.457/09), no julgamento do AIIM n. 4.096.220-9, deixou assentado pela incidência da isenção em razão da finalidade do produto, sem ficar restrito à sua descrição. Em outro acórdão proferido, a 2ª Câmara Julgadora do Tribunal de Impostos e Taxas, no AIIM 4.136.606-2, aplicou a isenção fiscal relativamente a um determinado produto pela sua finalidade e semelhança em relação a outro produto expressamente isento pela legislação do ICMS do Estado de São Paulo.

No caso concreto, o lançamento fiscal foi de falta de pagamento do ICMS-Importação, pois segundo relato contido no Auto de Infração, o contribuinte deixou de pagar o imposto regularmente porque as mercadorias importadas foram indevidamente consideradas isentas. Houve errôneo enquadramento pelo contribuinte em determinados NCMs listados no Convênio ICMS 1/1999, mas, na verdade, tais produtos não eram contemplados pelo referido Convênio de modo que a isenção somente se aplicaria se houvesse previsão expressa quanto ao respectivo produto. A fiscalização, concluiu que os produtos não gozavam de isenção por não encontrar guarida na legislação vigente.

O contribuinte se defendeu alegando que as mercadorias se encaixavam no Convênio ICMS 1/1999, e muito embora as descrições não fossem totalmente coincidentes com os produtos listados na norma isentiva, a finalidade era a mesma para ambos os produtos.

Note-se que a discussão da lide administrativa cingiu-se quanto à descrição dos produtos para fins de incidência da norma de isenção e não quanto à finalidade.  Esse foi o ponto controvertido.

Nas duas decisões do Tribunal de Impostos e Taxas, o simples fato de as descrições não serem coincidentes, por si só não foram suficientes para afastar a isenção fiscal sob o argumento da “literalidade” da interpretação da norma, eis que o escopo da isenção em testilha é facilitar a aquisição por importação de produtos para salvar vidas ou proporcionar qualidade de vida para o ser humano.

Prevaleceu a ponderação e a razoabilidade na adoção de princípios jurídicos como do direito à vida, à saúde e à dignidade da pessoa humana, ex vi dos artigos 1º, inciso III, 3º, inciso I e 5º, da Carta Constitucional de 1988, diante da finalidade dos referidos produtos.

No entanto, em outro caso julgado proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, no REsp n. 1.410.259, foi analisada a aplicação da alíquota zero para as contribuições do PIS e da COFINS, estabelecida no art. 1º, inciso XIV, da Lei n. 10.925/2004, nas importações e nas operações do mercado interno de farinha de trigo. A pretensão do contribuinte era de aplicar a isenção também para a “farinha de rosca” que tinha outra classificação TIP daquela prevista para a farinha de trigo.

Pelo referido julgado, o fato de as classificações do código TIP serem diferentes de um produto para outro, o entendimento foi de que a isenção não poderia ser estendida para a “farinha de rosca” numa interpretação deveras restritiva.

A decisão está assim ementada:

RECURSO ESPECIAL No 1.410.259 – PR (2013/0343590-9)

EMENTA

TRIBUTÁRIO. BENEFÍCIO FISCAL. REDUÇÃO DE ALÍQUOTA. ART. 1o, XIV, DA LEI N. 10.925/2004. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA.

1. As disposições tributárias que concedem benefícios fiscais demandam interpretação literal, a teor do disposto no art. 111 do CTN.

2. O art. 1o, XIV, da Lei n. 10.925/2004 reduz à alíquota zero de PIS e COFINS incidentes na importação e sobre a receita bruta de venda no mercado interno de farinha de trigo classificada no código 1101.00.10 da TIPI, o que restringe o benefício apenas ao produto especificamente enquadrado no indigitado código classificatório.

3. A farinha de rosca não pode ser enquadrada no apontado código, pois as Notas Explicativas do Sistema Harmonizado (NESH), no Capítulo 11, ao explicitar as Considerações Gerais, apenas estabelecem que a farinha de rosca devem submeter-se à posição 1101 (Farinhas de trigo ou de mistura de trigo com centeio) para fins classificatórios, mas em nada a equiparam à farinha de trigo prevista no código 1101.00.10.

4. Ou seja, a farinha de rosca enquadra-se na posição 11.01, mas não se pode deduzir deste fato que sua classificação seja no específico código 1101.00.10, o que afasta a pretensão recursal da parte de beneficiar-se da alíquota zero, porquanto inviável a interpretação extensiva almejada.

Recurso especial improvido. (STJ, 2015)

No caso em apreço, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça desconsiderou a “finalidade do benefício isentivo” consignada na exposição de motivos da Medida Provisória 433/2008 que era de “reduzir o impacto de preços no pão comum, bem como evitar aumento de custos nos insumos e no transporte e ainda, para não faltar trigo na mesa dos brasileiros”, além do fato de ambos os produtos terem a mesma matéria prima.

Noutro julgado, a mesma 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.587.197/SP, afastou a isenção do IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados sobre a importação de depuradores por conversão catalítica prevista nas Leis 10.485/2002 e 10.637/2002, já que a  Lei 9.826/99, com as alterações da Lei 10.485/2002, teria previsto o benefício apenas para os estabelecimentos industriais sem estender o benefício a estabelecimentos “equiparados ao industrial” como no caso do contribuinte que foi ao Judiciário buscar o benefício fiscal.

A referida decisão está assim ementada:

RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 2. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ARTIGO DE LEI NÃO MENCIONADO NA PETIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA N. 284 DO STF. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – IPI. ART. 5º, DA LEI N. 9.826/99 E ART. 29, DA LEI N. 10.637/2002. IMPOSSIBILIDADE DE GOZO DA SUSPENSÃO POR ESTABELECIMENTO EQUIPARADO A INDUSTRIAL.
1. O presente recurso foi interposto na vigência do CPC/1973, o que atrai a incidência do Enunciado Administrativo Nº 2: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça”.
2. O recurso não merece conhecimento em relação à alegada violação ao Acordo Geral Sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT. Não foi indicado o artigo de lei que se teve por violado. Incidência da Súmula n. 284/STF: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”.
3. Nem o Código Tributário Nacional e nem a legislação específica do IPI tratam o “estabelecimento industrial” de forma idêntica ao “estabelecimento equiparado a industrial”. A equiparação, por óbvio, somente é útil porque é feita para determinadas finalidades expressas em lei. Não fosse assim, não haveria qualquer necessidade de se estabelecer uma equiparação, bastava incluir todos os equiparados dentro do conceito geral de “estabelecimento industrial”.
4. Não se pode presumir que todas as vezes que a legislação tributária mencione o estabelecimento industrial estaria a mencionar implicitamente também os estabelecimentos equiparados a industrial, sob pena de se tornar o sistema tributário, no que diz respeito ao IPI, imprevisível e inadministrável, mormente diante da função extrafiscal do tributo que exige intervenções calculadas e pontuais nos custos incorridos em cada etapa da cadeia econômica.
5. Nessa linha, da legislação tributária pode-se colher diversos exemplos onde a suspensão, isenção ou crédito presumido do IPI são concedidos expressamente e pontualmente aos estabelecimentos equiparados a industriais: art. 11, do Decreto-Lei n. 400/68; art. 15, §3º, do Decreto-Lei n. 1.455/76; art. 56, §§1º e 2º, da Medida Provisória n. 2.158-35/2001; art. 17, §§2º e 5º, da Medida Provisória n. 2.189-49/2001.
6. Desta forma, tanto o art. 5°, da Lei n. 9.826/99, quanto o art. 29, da Lei n° 10.637/2002, são claros ao apontar como beneficiário da suspensão do mencionado imposto apenas o estabelecimento industrial, sem estender ao equiparado, de modo que o art. 23, da Instrução Normativa da SRF n° 296/2003 não limitou o pretendido direito, mas apenas explicitou aquilo que a lei e o sistema já haviam determinado.
7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
“A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.”
A Sra. Ministra Assusete Magalhães, os Srs. Ministros Francisco Falcão, Herman Benjamin e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator.
SUSTENTAÇÃO ORAL Dr(a). MARISE CORREIA DE OLIVEIRA (mandato ex lege), pela parte RECORRIDA: FAZENDA NACIONAL (grifo nosso) (STJ, 2022)

Verifica-se das decisões da 2ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça acima mencionadas que o aspecto pragmático não foi adotado privilegiando-se a interpretação deveras restritiva.

A jurisprudência dos Pretórios no que tange à aplicabilidade da pragmática na interpretação da norma de isenção é oscilante a depender dos valores que estão envolvidos, em face da multiplicidade de situações fáticas que o intérprete se depara.

Defendemos que a finalidade e a similitude de hipóteses de incidência descritas no antecedente da regra-matriz são elementos de grande importância numa “interpretação restritivista” da isenção em razão da opção do legislador quando da “enunciação” da norma, considerando os valores que estão em jogo, sem implicar em violação ao artigo 111 do Código Tributário Nacional.

Eis que a “ponderação” pelo aplicador do direito quanto aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade são indispensáveis para limitar o poder e os abusos do Estado e também para que as políticas públicas sejam adequadamente implementadas na consecução de interesses comuns como: o bem-estar social, a justiça social e a proteção da dignidade humana; princípios esses que informam o Estado Democrático Social de Direito, que concorrem com o Estado Democrático de Direito.

Destarte, o aspecto pragmático é fundamental para o aplicador do direito implementar os princípios constitucionais aos destinatários, mormente nos casos em que o intérprete se depara com dificuldades e complexidades semânticas. É inadmissível uma interpretação restritiva da norma de isenção a ponto de negar a justiça e o próprio direito ao cidadão.

CONCLUSÃO

Consoante o exposto, o legislador considera determinados fatos como relevantes para juridicizar e regular as condutas humanas, introduzindo no sistema as normas jurídicas desinentes. Sob o prisma da fenomenologia da incidência tributária, a norma imunizante situa-se no plano da definição da competência tributária alocando-se a isenção no plano do exercício da competência tributária.

A “norma de isenção”, conforme já foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, é instrumento de política fiscal e social para beneficiar os contribuintes vulneráveis da sociedade para o desenvolvimento e equilíbrio de determinadas regiões do país e para fomentar alguns segmentos da economia.

Neste eito, é inegável que as isenções carregam grande carga axiológica em busca d’uma finalidade, segundo os princípios constitucionais vigentes, ganhando relevância os limites da interpretação “literal” pelo aplicador do Direito, à luz do artigo 111 do Código Tributário Nacional.

A partir da trajetória da interpretação defendida pelo professor Paulo de Barros Carvalho (2015), a chamada expressão “literal” se situa no plano S1, que são os enunciados pertencentes à plataforma da literalidade textual, suporte físico de significações. Forçoso concluir que ponto do vista jurídico não há nada de “literal” na interpretação da norma isentiva porque a interpretação surge pela construção de sentido pelo sujeito dentro dos limites dos horizontes da cultura.

Com a premissa de que a norma de isenção é largamente utilizada nas políticas governamentais para realizar princípios constitucionais vigentes e que a interpretação encontra limites apenas nos institutos da analogia e da equidade, segundo a doutrina indicada, o aspecto pragmático deve ser considerado pelo aplicador do direito sem acarretar desrespeito à regra do artigo 111 do CTN.

Deste modo, o referido artigo 111 do CTN tem o condão de apenas vedar a expansão da interpretação mediante a utilização da analogia e da equidade (art. 108, incisos I e IV), sem prejuízo da adoção de outros métodos de interpretação, como o histórico-evolutivo, o lógico e o teleológico e o sistemático.

É certo que a jurisprudência oscila entre aplicar interpretação teleológica à norma de isenção e afastar o pragmatismo (semiótica do direito) mediante hermenêutica restritivíssima. Contudo, a interpretação que não considera a finalidade do benefício fiscal, privilegiando aspectos formais, classificações numéricas, nomenclaturas, dentre outros, é absolutamente inconstitucional. O aplicador do direito deve total obediência à Constituição Federal, não podendo desprezar os valores constitucionais impregnados na norma isentiva, ainda que sob o argumento consuetudinário de “prejuízo ao erário”.

A sociedade hodierna é dinâmica, assim como a evolução da tecnologia, sendo recorrente a desatualização da legislação tributária, máxime quanto aos benefícios fiscais. Em razão da modernização da atividade econômica, de serviços e de produtos, como ocorre com as telecomunicações ou com os produtos médicos de alta tecnologia, a pragmática aparece como importante elemento hermenêutico para garantir justiça, isonomia e segurança jurídica.

REFERÊNCIAS

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[1] Possui graduação em Direito pela Faculdade de Direito de São Carlos (1986). Atualmente é Juiz – Tribunal de Impostos e Taxas e advogado – Peres e Aun Advogados Associados, associado do Instituto Brasileiro de Direito Tributário desde 1998, membro efetivo da Comissão do Contencioso Administrativo Tributário da OAB-SP, Mestre em Direito Tributário pela PUC-SP, Diretor Jurídico Adjunto do CIESP/SP

[2] Doutor em Direito pela PUC – SP.