MAUS TRATOS AOS ANIMAIS: A RESPONSABILIZAÇÃO CRIMINAL NA ATUALIDADE

MAUS TRATOS AOS ANIMAIS: A RESPONSABILIZAÇÃO CRIMINAL NA ATUALIDADE

28 de novembro de 2023 Off Por Cognitio Juris

ANIMAL ABUSE: A REALITY IN THE FACE OF CRIMINAL LIABILITY IN CON-TEMPORARY TIMES

Artigo submetido em 16 de novembro de 2023
Artigo aprovado em 26 de novembro de 2023
Artigo publicado em 28 de novembro de 2023

Cognitio Juris
Volume 13 – Número 50 – Novembro de 2023
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Rosana Karla da Silva [1]
Israel Andrade Alves [2]

RESUMO: O presente estudo tem em seu escopo discussões que tratam sobre maus tratos aos animais através de uma responsabilização criminal em todo território brasileiro. Neste contexto, todos os ritos de crueldade contra os animais inferem reflexões quando se pensa na importância da legalidade que promulga todos os atos de cuidado e zelo para evitar movimentos até mesmo contra a vida destes seres não humanos. Com o respectivo cenário de deliberar maiores documentos legais, ordenou-se a pergunta que norteou a pesquisa foi sistematizada em: as leis contemporâneas do ordenamento jurídico brasileiro versam para a responsabilização penal contra os maus tratos aos animais? Enquanto o objetivo geral foi analisar se as leis contemporâneas do ordenamento jurídico brasileiro versam para a responsabilização penal contra os maus tratos aos animais. Metodologicamente a abordagem foi qualitativa com objetivo exploratório-descritivo para consubstanciar uma revisão bibliográfica. Ao concluir o estudo verifica-se que se faz primordial legitimar novos atos legais que promovam a seguridade de cuidados com os animais em todo país.

Palavras-chave: Responsabilidade Penal. Maus-Tratos. Animais.

ABSTRACT: The scope of this study is to discuss the mistreatment of animals through criminal accountability throughout the Brazilian territory. In this context, all rites of cruelty against animals infer reflections when one thinks of the importance of legality that enacts all acts of care and zeal to avoid movements even against the life of these non-human beings. With the respective scenario of deliberating larger legal documents, the question that guided the research was systematized into: do the contemporary laws of the Brazilian legal system deal with criminal liability against the mistreatment of animals? While the general objective was to analyze whether the contemporary laws of the Brazilian legal system deal with criminal liability against the mistreatment of animals. Methodologically, the approach was qualitative, with exploratory-descriptive objective to substantiate a literature review. At the conclusion of the study, it is verified that it is essential to legitimize new legal acts that promote the safety of animal care throughout the country.

Keywords: Criminal Responsibility. Mistreatment. Animals.

INTRODUÇÃO

O reconhecimento dos direitos voltados especificamente ao zelo e proteção contra atos criminosos que revelam maus tratos aos animais tem sido uma temática com grandes discussões em tempos contemporâneos em relação a adoção de cuidados enquanto membros que compõem as famílias, além de serem motivos hodierno de alguns movimentos no combate de atos que inferem crueldade.

Nesse sentido, inicia-se a discussão deste estudo evidenciando a importância dos direitos dos animais enquanto objeto temático, que devem discorrer através de aportes científicos nos espaços de debates que asseguram a tutela protetiva destes seres que são dotados por sentimentos, sendo indispensável a culpabilidade daqueles que exibem e adotam condutas de desumanidade.

Não obstante, toda privação que trazem a demonstração de atos de negligência devem ser consideradas crimes no território brasileiro que assumem a promulgação de um Estado Democrático de Direito no combate de atitudes que inferem a vida dos animais ao realizarem procedimentos que atestam os ferimentos, a falta de alimentação incluindo a água, bem como os locais que esses animais são condicionadas no ambiente.

Diante deste cenário, muitas indagações de ordem social na visão dos autores devem ser asseguradas pelo ordenamento jurídico brasileiro quando ocorrem a institucionalização de legislações que impõem o direito protetivo contra agressores que efetivam maus-tratos contra os animais que acabam mensurando uma problemática de ordem pública nas áreas urbanas que apresentam um número excessivo de animais adoecidos e abandonados pelas ruas em situação de descuido.

Todavia, é um quadro de impiedade que deve ser discutido além dos aportes legais, mas através de buscas de ordem cientifica, visto que ao enfatizar as argumentações nota-se que na historicidade a primeira sanção no território brasileiro foi promulgada no ano de 1924 com sanções que determinava formas brandas daqueles que efetivavam crimes contra os animais, não havendo as punições de forma que viabilizasse a seguridade do cumprimento jurídico.

Em se tratando de suporte legislativo, dando um salto verifica-se que a discussão volta no Código Civil ao fazer a menção aos animais como objetos inanimados, sendo prioritário a compreensão de resguardar em todas as legislações a evolução do pensamento social, no qual a proteção deve ser preconizada para assegurar o ambiente para todos os sujeitos e animais.

Dessa forma, percebe-se a necessidade de maior rigor em documentos legais que determinam proteção aos animais no Brasil, assim a pergunta que norteou a pesquisa foi sistematizada em: as leis contemporâneas do ordenamento jurídico brasileiro versam para a responsabilização penal contra os maus tratos aos animais? Enquanto o objetivo geral ordenou-se para analisar se as leis contemporâneas do ordenamento jurídico brasileiro versam para a responsabilização penal contra os maus tratos aos animais.

Contudo, os objetivos específicos foram organizados para:

  • Descrever a evolução dos direitos dos animais através de processos históricos;
  • Identificar os atos que caracterizam os maus tratos;
  • Contextualizar as legislações que evidenciam sobre a responsabilização penal contra os maus tratos aos animais.

Em relação aos procedimentos metodológicos adotados seguiu as orientações da abordagem qualitativa, com objetivo exploratório-descritivo para consubstanciar uma revisão bibliográfica através de livros, artigos, dissertações, teses e legislações do ordenamento brasileiro.

Diante do contexto exposto, a organização do estudo permite ao futuro leitor ter a compreensão da importância temática para profissionais da área do direito, bem como para todas as demais áreas do conhecimento, assim todas as seções seguem um aparato sequencial e discursivo.

1        EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS DOS ANIMAIS

          Ao discorrer acerca dos direitos dos animais é necessário conhecer o aparato dessas normatizações legais, visto que ocorreu alguns ganhos concomitante ao desenvolvimento das relações humanas em relação aos fatores protetivos que transcendem resguardar a tutela destes seres irracionais.

          Em tempos hodiernos no território brasileiro no Plenário do Senado aprovou no dia 07 de agosto de 2018, o projeto de lei que classifica os animais como sujeitos de direito, e não como coisas. A decisão foi celebrada por ambientalistas e ativistas dos direitos animais. Com a aprovação do Projeto de Lei da Câmara (PLC) n° 27/2018, de autoria do deputado Ricardo Izar (PP-SP), os animais passam a ser reconhecidos como seres sencientes, ou seja, capazes de sentir emoções e passíveis de sofrimento (Vieira et al., 2023).

          Tão logo, diante dos avanços legislativos e da inserção tecnológica, ou até mesmo pelos fenômenos naturais, bem como as mudanças climáticas e o mundo globalizado norteia-se que estes foram fatores a serem observados na evolução dos direitos dos animais, assim como no movimento em torná-los detentores de direitos (Torres; Ferreira, 2020).

          Para tanto, os autores dialogam afirmando que o cerne da questão de tratar os animais como sujeitos de direitos está intimamente ligado com questões atuais. As relações humanas vêm evoluindo e a cada dia se vislumbra uma inter-relação das relações humanas com os animais, sejam eles selvagens ou domésticos.

          Ademais, se realizar um resgate histórico nota-se que ao longo de mais de três séculos do nosso passado, os animais silvestres e a natureza eram vistos como adversários dos colonizadores passíveis de serem mortos ou destruídos desregradamente, enquanto isso os animais domésticos eram vistos como escravos apenas para servir (Levai, 2012).

          Mais tarde, já no século XX, o filósofo Peter Singer trouxe para a contemporaneidade a introdução de questões éticas e políticas que envolvem os animais, publicou no ano de 1975, o livro Libertação Animal, com a ideia central de que animais possuem direitos inclusive o direito de viver e não sofrer, este autor defende a minimização do sofrimento animal. Entretanto, após a publicação da obra de Singer, Richard Ryder acarretou a um debate direcionado ao especismo, um fundamento que legaliza as práticas de uso animais (Singer, 2010).

          Com esse cenário, alterações tiveram que ser promulgadas para legitimar uma questão voltada para resguardar os direitos e proteções dos animais e impedir atos de maus tratos. Neste contexto, foi determinada a primeira norma legal que trouxe em sua redação a proibição de maus tratos aos animais, em âmbito nacional foi o Decreto 16.590 do ano de 1924, regulamentando as práticas ocorridas nas Casas de Diversões Públicas, proibindo as corridas e brigas de animais, dentre outras atividades consideradas como diversão as custas da dor dos animais (Brasil, 1924).

          Destarte, frisa-se que segundo Rezende, Peluzio e Sabraense (2008), é cediço que os animais possuem o direito à vida, que deve ser resguardado pelo Ordenamento Jurídico. Essa proteção está intimamente ligada aos valores culturais de cada povo. Todavia esse olhar voltado ao direito inicia no Brasil, em 1934, por meio do Decreto Federal nº 24.645/34, inaugurou-se a primeira preocupação do ponto de vista legal sobre o bem-estar dos animais, aplicando-se penas de multas e criminalizando os atos de abuso e crueldade em qualquer animal (Rezende; Peluzio; Sabarense, 2008).

          Tão logo, argumentos foram realizados para consubstanciar e legalizar o elencado direito, no qual Dias (2000, p. 158):

O argumento mais incisivo é que o decreto n° 24.645/34 surgiu com força de lei, e uma lei não pode ser revogada por um decreto. O que ocorre, assim nos afigura, é que a época de seu aparecimento ainda era incomum utilização do nomem juris decreto-lei, cuja figura surgiu com a Constituição de 1946. Aliás, a ter-se em conta o conteúdo do decreto n° 19.398, de 11 de novembro de 1930, vê-se plenamente confirmado o entendimento que acima esposamos.

          Em continuidade as discussões deste processo evolutivo dos direitos aos animais, pode-se contextualizar a importância deste Decreto 24.645/34 como lago de extrema essencialidade, visto que determinava a tutela dos animais, na área civil e penal, além de dispor que o Ministério Público deverá ser o representante deles, na qualidade de substituto legal. O mesmo, ainda elencou em seu art. 3º, situações que se caracterizam como maus tratos (Campelo, 2017).

          Dando sequência aos aspectos legais, verifica-se que no ano de 1941, uma nova promulgação foi efetivada através do Decreto-Lei 3.688, denominada como a Lei de Contravenções Penais que ao tratar deste assunto, estabeleceu em seu art. 64 que a ação de maus tratos aos animais iria caracterizar-se como Contravenção Penal, tendo como consequência sua punição (Lemos, 2008). No ano de 1967, foi criada a Lei 5.197, intitulada de Lei de Proteção a Fauna, determinando uma alteração na situação dos animais: de objetos não pertencentes a ninguém, para domínio da União (Brasil, 1967).

          Chegando no ano de 1972 a Organização das Nações Unidas – ONU elaborou a Conferência Mundial sobre o homem e o meio ambiente que ficou reconhecida como a “Conferência de Estocolmo” que começou a enfatizar esse olhar humanístico em relação a proteção dos animais, mesmo tendo o maior enfoque as questões ambientais.

Estocolmo, 1972 é tido como o ano em que o direito ambiental passou a ser reconhecido como ramo jurídico, embora diversos tratados importantes a respeito tivessem sido assinados com anterioridade e as legislações internas de diversos países tenham se ocupado com problemas ambientais, como a matéria florestal, água e outros. A Conferência de Estocolmo teve o grande mérito de haver alertado o mundo para os malefícios que a deterioração do ecossistema poderia causar à humanidade como um todo (Jones; Lacerda; Silva, 2005, p. 103).

          Nesta conferência, observou-se a defesa de perspectivas radicais, com sentidos opostos, embora balizadas por valores preservacionistas e conservacionistas. Uma delas, “preocupada com a ameaça da vida humana e dos recursos naturais necessários para manter a qualidade de vida; a outra, preocupada com a destruição das belezas naturais e das espécies animais em extinção” (Ramos, 2001, p. 204).

          No entanto, no ano de 1978 surgiu a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, o principal instrumento a respeito da matéria (Ackel Filho, 2001). A Declaração Universal dos Direitos dos Animais conta com quatorze artigos que versam sobre a proteção ao animal:

Art. 1º – Todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os mesmos direitos à existência. Art. 2º 1. Todo o animal tem o direito a ser respeitado. 2. O homem, como espécie animal, não pode exterminar os outros animais ou explorá-los violando esse direito; tem o dever de pôr os seus conhecimentos ao serviço dos animais. […] (UNESCO, 1978).

            Nessa perspectiva, Rodrigues (2012, p. 66), enfatiza que a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, proclamada pela Unesco em 27 de janeiro de 1978 e apresentada em Bruxelas, adotou uma nova filosofia de pensamento sobre os direitos dos Animais, reconhecendo o valor da vida de todos os seres vivos e propondo um estilo de conduta humana condizente com a dignidade e o devidamente merecido respeito aos Animais.

          Neste percurso da historicidade evolutiva, menciona-se a Constituição Federal de 1988 foi a primeira Constituição brasileira a contemplar em seu rol a tutela da fauna, visto que as demais apenas se referiam a caça, limitando o conceito de fauna a sua exploração. Com a chegada da CF/88, a fauna passou a ser propriedade do povo, como um bem difuso (Levai, 2012).

          Todavia, com todo o aparato já instituído pelas legislações que foram delineando um panorama protetivo, no ano de 1992 na cidade do Rio de Janeiro sediou a Rio-92 que ampliou as discussões para o meio ambiente e consequentemente as proteções a serem asseguradas aos animais.

          Especificamente, no art. 5º da Constituição que trouxe a possibilidade da propositura de ação popular para anulação de prática lesiva ao meio ambiente, e em seu art. 23, incumbiu a União, Estados e Municípios a responsabilidade de proteger o meio ambiente, além de preservar a fauna (Almeida, 2010).

          Chegando a evolução em tempos contemporâneos com sancionamento da lei nº 14.064 em 2020 em que um novo texto normativo aumenta a punição para quem praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais. Conforme a nova legislação, a pena agora vai de dois a cinco anos de prisão, além de multa e a proibição de guarda de novos bichos (Brasil, 2020).

          Diante da explicitação verifica-se na próxima seção um arcabouço que trata especificamente dos crimes contra os animais nas legislações brasileiras que se torna objeto de verificação do estudo.

2        DOS CRIMES CONTRA OS ANIMAIS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

          De acordo com Rodrigues (2018, p. 1), a Declaração Universal dos Direitos dos Animais Declara em seus artigos:

A dignidade do animal, razão essa que assevera o respeito ao animal vivo e morto. Reconhece os animais como seres sencientes. Fortalecendo o posicionamento de sempre evitar o sofrimento, dor e exploração dos animais de modo desnecessário em vários campos, como experiências, trabalho físico, comercial e entretenimento, pois são práticas não compatíveis com a dignidade animal. E dispõe que o direito dos animais deve ser defendido pela lei como os direitos dos homens, e que os organismos de proteção e de salvaguarda dos animais devem estar presentados a nível governamental.

          Segundo Rodrigues (2008, p. 66), enfatiza que a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, proclamada pela Unesco em 27.01.1978 e apresentada em Bruxelas, adotou uma nova filosofia de pensamento sobre os direitos dos Animais, reconhecendo o valor da vida de todos os seres vivos e propondo um estilo de conduta humana condizente com a dignidade e o devidamente merecido respeito aos Animais.

          Os maus-tratos podem ser corroborados nas mais diversas formas, seja no interior de uma residência, em pet shop, laboratórios, abatedouros, práticas intituladas esportivas, rinhas de galo), em espetáculos como a farra do boi e touradas), e até mesmo no tráfico ilegal de animais etc. (Hora, 2022).

          Doravante, a autora aponta que algumas práticas podem denotar o delito em apreço, como, as agressões físicas; o abandono do animal; espancamento; amputação dos membros; envenenamento; a inobservância de levar o animal enfermo a um especialista; o ato de deixar o animal exposto ao tempo, sol, chuva, ou frio intenso; a submissão do animal a tarefas fadigosas; o incentivo a confrontos entre animais; a não alimentação do animal rotineiramente, o arremesso o animal de um prédio etc.

          Ackel Filho (2001), frisa que é complicado elencar todas as práticas que podem resultar em maus tratos, e por isso o legislador teria escolhido a espécie, incumbindo ao aplicador da norma, diante no caso concreto, analisar se a conduta foi inaceitável ou maldosa e se por decorrência dela, o animal foi machucado.

          Porém, ao pensar sobre tal ato, Rothbard (2010, p. 19) faz um importante destaque:

O crime de maus-tratos aos animais possui ligação com a filosofia libertária. Essa filosofia se funda no princípio da não-agressão. Esse princípio ético propõe que não deve haver nenhum tipo de agressão ou violação ao direito à vida, a liberdade e a propriedade. Essa filosofia libertária compreende que somente ao homem são conferidos direitos em razão de sua capacidade individual de escolha consciente, necessidade de utilização da mente e da energia para a adoção de objetivos e valores para fins de alcançar sobrevivência e prosperidade por meio de sua capacidade de comunicação e interação com outros seres humanos.

          Neste diálogo, é salutar que a compreensão acerca dos maus-tratos é inerente ao entendimento de tratamentos de crueldade, privação, falta de alimentos e cuidados contra os animais, que na concepção dos agressores são praticados de forma consciente sem preocupações por realizar prejuízos a vida dos seres não humanos.

          Scheffer proporciona aos leitores:

A autora procura proporcionar uma reflexão sobre o que são atos de crueldade e defender sua criminalização independentemente de qualquer outro interesse, pretendendo afastar assim condutas específicas, abrindo espaço para um ponto de vista bio – cientista. Lembrando, que já existe a criminalização para tais conduta de maus-tratos aos animais (Scheffer, 2018, p.1).

          Lima (2015) delineia que na maioria das vezes os maus-tratos contra animais não são denunciados, pois já se encontram banalizados dentro da sociedade devido ao seu alto índice de ocorrência. Para a autora, existem pessoas que maltratam animais pelo simples prazer, todavia vários são os motivos, que vão desde a sensação de poder até sérios problemas psicológicos.

          Mas independentemente do motivo, esses atos devem ser denunciados às autoridades competentes, uma vez que maus-tratos é crime previsto na Lei nº 9605  criada em 12 de fevereiro de 1998, reconhecida como Lei dos Crimes Ambientais, no qual determinou a tipologia de crime é praticado pelo ser humano, no caso, em relação aos animais, domésticos ou silvestres, o que o fazem por motivos de ordem cultural, social e psicológica, ato praticado, em muitos casos, sem a consciência de que se trata de um crime que viola os direitos dos animais, como se somente ao homem fossem concedidos direitos e dignidade (Brasil, 1998).

          Em continuidade das legislações, ordenou-se a lei Arouca nº 11.794 de 2008 que regulamentou o inciso VII, do parágrafo 1°, do artigo 225 da Constituição Federal de 1988 estabelece procedimentos para o uso científico de animais, esta lei possui 27 artigos estruturada em 6 capítulos, que regulamenta o uso de animais somente para o Ensino Superior, tornando o Brasil com regras definidas sobre o uso de animais em laboratórios (Campos, 2010, p. 139-141).

          Neste aspecto a Lei dos Crimes Ambientais prever no art. 32  sanções para os infratores ou quem praticar ato de abuso contra qualquer animal, estabelecendo a redação:

Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.” O parágrafo 1º deste artigo disciplina que “Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos (Brasil, 1998).

          Tão logo, Lima (2015) enfatiza que nos crimes previstos elencada lei, a ação penal é pública e incondicionada, ou seja, qualquer cidadão poderá recorrer ao Ministério Público que é o titular da ação penal, por conseguinte compete ao órgão ingressar em ampla defesa do animal e executar a punição com base no art. 32 da Lei dos Crimes Ambientais, mesmo ocorrendo o estabelecimento de uma pena inferior a dois anos de prisão ou penas alternativas.

          Destarte, a jurista Maria Helena Diniz aduz que:

A crueldade (ação ou omissão) contra animal é crime ambiental consistente em fazer experiências científicas dolorosas em animal vivo, infligir lhe maus-tratos, mantê-lo em local anti-higiênico, submetê-lo a trabalho excessivo ou superior às suas forças, feri-lo ou mutilá-lo ou mata-lo, etc. (Diniz, 2018, p. 105).

          Diante dessa fala, que insere os maus-tratos como crime, passados alguns anos Hora (2022) frisa que foi anuída a Lei nº 14.064 de 2020, alcunhada de Lei Sansão, que alterou a Lei nº 9.605/98 e aumentou as penas cominadas ao crime de maus-tratos quando tratar-se de cão ou gato, além de suscitar maior percepção da sociedade acerca do problema, proporciona ao indivíduo a segurança de que ao denunciar o animal será resgatado e o agressor penalizado.

3        A RESPONSABILIZAÇÃO PENAL CONTRA OS MAUS TRATOS AOS ANIMAIS

          A partir da seção anterior, que tratou dos crimes contra os maus-tratos de animais, observa-se que ao discutir sobre as legislações um número reduzido de medidas protetivas no ordenamento jurídico brasileiro delineando uma lacuna.

          Nota-se que ao longo do tempo o animal foi tratado como objeto dos quais se extraia elementos básicos para satisfazer a necessidade humana. Diante deste cenário, se tornou cada vez mais necessário a criação de normas de proteção aos animais, levando em consideração seus direitos e até mesmo a preservação do meio ambiente.

          Neste rol de discussões, a Constituição Federal de 1988 inovou ao dispor que incumbe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente, incluindo, nesse contexto, a proteção aos animais contra a crueldade e os maus-tratos (art. 225, §1º, VII) (Brasil, 1988).

          A proteção ao meio ambiente está resguardada pela Constituição Federal da República em seu artigo 225, cujo caput dispõe que:

todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (Brasil, 1988).

          As proteções ocorrem como essenciais para o bem-estar e a dignidade das presentes e futuras gerações, já que integram o meio ambiente, que tem ampla proteção do Estado.

          Os crime de maus – tratos a animais, após a constituição foi previsto no artigo 32 da Lei Ambiental da Lei 9.605/98 supracitada na seção anterior vinha sendo objeto de muitas críticas devido à brandura das penas ali previstas, que o classificavam, em qualquer caso, como infração de menor potencial ofensivo (Cabette; Cabette, 2020).

          Ao buscar por proteção aos animais, o Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/2002) também regulamenta a proteção aos animais, considerando-os como coisa, isto é, como um objeto semovente enquadrado no artigo 82 que dispõe: São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social (Brasil, 2002).

          Nessa esteira, entende-se que os animais não são reconhecidos pelo ordenamento jurídico como sujeitos de direitos, pois são tidos como bens sobre os quais incide a ação do homem, uma vez que a proteção do meio ambiente existe para favorecer o próprio homem e somente por via reflexa para proteger as demais espécies (Almeida, 2013).

          Ressalta-se que os atos de abuso, crueldade e maus tratos contra animais foram definidos pelo Conselho Federal de Medicina (CFMV) através da Resolução nº 1236/2018, que em seu artigo 2º estabelece que para os fins desta Resolução, devem ser consideradas as seguintes definições:

II – maus-tratos: qualquer ato, direto ou indireto, comissivo ou omissivo que intencionalmente ou por negligência, imperícia ou imprudência  provoque dor ou sofrimento desnecessários aos animais;

III – crueldade: qualquer ato intencional que provoque dor ou sofrimento desnecessários nos animais, bem como intencionalmente impetrar maus tratos continuamente aos animais;

IV – abuso: qualquer ato intencional, comissivo ou omissivo, que implique no uso despropositado, indevido, excessivo, demasiado, incorreto de animais, causando prejuízos de ordem física e/ou psicológica, incluindo os atos caracterizados como abuso sexual (CFMV, 2018).

Em atendimento a essa reação crítica da sociedade diante da subestimação de certos atos crudelíssimos perpetrados contra animais por pessoas aparentemente despidas de qualquer sentimento de empatia ou piedade, o Congresso Nacional aprovou e o Presidente da República sancionou a Lei 14.064/20 para criar uma forma qualificada dessa infração penal, com previsão de pena de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda de animais (Cabette; Cabette, 2020).

O crime de maus tratos, assim como os demais delitos previstos na Lei de Crimes Ambientais, tem natureza de ação penal incondicionada, isto é, que independente de representação, que é promovida exclusivamente pelo Ministério Público (Capez, 2014).

Contudo na Lei 14.064/20 o novo parágrafo do artigo 32 refere-se apenas a cães e gatos, por serem os animais domésticos que fazem parte da comunidade e, para algumas pessoas, são consideradas como integrantes da família. O intuito dessa nova modalidade qualificada tem o propósito de reconhecer os direitos dos animais e efetivamente punir o agressor que comete tais atos de crueldade (Brasil, 2020).

          Destarte ao ressaltar sobre a responsabilização penal verifica-se que todo cidadão tenha o conhecimento acerca da legislação sobre os maus-tratos com animais, por ser de extrema importância para uma possível prevenção contra os abusos cometidos a esses, uma vez que a falta de conhecimento da população sobre os direitos dos animais implica na ausência de reivindicação de direitos junto às autoridades públicas (Lima, 2015).

          Ao contextualizar a seção, destaca-se que ao falar sobre responsabilização inexiste aspectos legais que referendam uma maior viabilização e rigor dos processos protetivos para evitar os maus-tratos.

4        CONSIDERAÇÕES FINAIS

          Ao chegar nas palavras que fecham a respectiva pesquisa que tratou dos maus-tratos dos animais enquanto responsabilização criminal uma significativa reflexão ocorre, e ao mesmo tempo delineia a inserção de uma problemática que ainda carece de maior ampliação discursiva e legal no ordenamento jurídico brasileiro.

Mesmo havendo a ciência que em tempos contemporâneos é possível notar que a sociedade obteve algum avanço no sentido de conscientização pelo respeito ao animal, vindo a surgir cada vez mais o interesse dos seres humanos nesta causa e é notável também um avanço na criação de organizações não governamentais que visam proteger os animais das mais diversas formas possíveis, algumas oferecendo cuidados à saúde, outras se preocupando com a disponibilização de animais abandonados para uma adoção responsável, entre outras atividades.

Assim, ao finalizar, e trazer os resultados para o profissional de direito verifica a essencialidade de promover movimentos que deliberam de legislações que referendam a aplicabilidade penal em situações de crimes contra os seres não humanos.

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[1] Graduanda em Direito pela Faculdade Serra do Carmo – FASEC. E-mail: colocar seu em

[2] Mestre em Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins e Escola Superior da Magistratura Tocantinense. Pós-graduado em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professor de Direito Penal, Processo Penal e Prática Criminal no curso de Direito na Faculdade Serra do Carmo – FASEC. Delegado de Polícia Civil do Estado do Tocantins. Email: prof.israelalves@fasec.edu.br