INSALUBRIDADE NA FUNÇÃO DO POLICIAL MILITAR

INSALUBRIDADE NA FUNÇÃO DO POLICIAL MILITAR

6 de janeiro de 2025 Off Por Cognitio Juris

UNHEALTHINESS IN THE FUNCTION OF THE MILITARY POLICE

INSALUBRIDAD EN EL ROL DE POLICÍA MILITAR

Artigo submetido em 28 de dezembro de 2024
Artigo aprovado em 04 de janeiro de 2025
Artigo publicado em 06 de janeiro de 2025

Cognitio Juris
Volume 15 – Número 58 – 2025
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Ricardo Nascimento Fernandes[1]
Ana Paula Gouveia Leite Fernandes[2]

RESUMO: O presente trabalho vem abordar a insalubridade na função do policial militar. O presente trabalho visa demonstrar que o servidor público estadual da Polícia Civil e Militar tem direito ao adicional de insalubridade desde o início do ingresso na carreira e não depende de laudo técnico para determinar a data na qual se inicia seu direito a ser remunerado por tal adicional. O principal objetivo deste trabalho é analisar a possibilidade de percebimento e cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade aos policiais militares. A metodologia adotada será uma análise de revisão bibliográfica da literatura, com ênfase em livros e artigos mais atuais sobre o tema abordado. Conclui-se que a relevância do tema à medida que se considera a grande importância da tutela de direitos fundamentais aos militares, que desempenham atividades de alta periculosidade estão submetendo-se a situações insalubres de exposição a agentes físicos e biológicos para o exercício de suas atividades profissionais.

Palavras-Chave: Insalubridade; Policial Militar; Direitos Fundamentais; Periculosidade.

ABSTRACT :This paper addresses the unhealthy conditions in the role of military police officers. This paper aims to demonstrate that state civil servants of the Civil and Military Police are entitled to an unhealthy conditions bonus from the beginning of their career and do not depend on a technical report to determine the date on which their right to receive such bonus begins. The main objective of this paper is to analyze the possibility of receiving and cumulating unhealthy conditions and dangerous conditions bonuses for military police officers. The methodology adopted will be a bibliographic review of the literature, with emphasis on the most recent books and articles on the topic addressed. It is concluded that the relevance of the topic is due to the great importance of protecting the fundamental rights of military personnel, who perform highly dangerous activities and are subjected to unhealthy situations of exposure to physical and biological agents in the exercise of their professional activities.

Keywords: Unhealthiness; Military Police; Fundamental Rights; Dangerousness.

RESUMEN: Este trabajo aborda las condiciones insalubres en el rol de los policías militares. El presente trabajo tiene como objetivo demostrar que los servidores públicos estatales de la Policía Civil y Militar tienen derecho a una prestación por riesgo de salud desde el inicio de su carrera y no dependen de un informe técnico para determinar la fecha en que se cumple su derecho a ser remunerados por dicha remuneración. comienza. El principal objetivo de este trabajo es analizar la posibilidad de percibir y acumular bonificaciones insalubres y peligrosas para los policías militares. La metodología adoptada será una revisión bibliográfica de la literatura, con énfasis en los libros y artículos más actuales sobre el tema tratado. Se concluye que la relevancia del tema ya que se considera la gran importancia de proteger los derechos fundamentales del personal militar, quienes realizan actividades altamente peligrosas y se están sometiendo a situaciones insalubres de exposición a agentes físicos y biológicos en el desempeño de sus actividades profesionales.

Palabras clave: Insalubridad; Policía militar; Derechos fundamentales; Peligrosidad.

1 INTRODUÇÃO

No mundo contemporâneo, a humanidade vivencia a reconfiguração do pensamento ocidentalizado, cujas relações sociais estão, cada vez mais, estruturadas através de dispositivos tecnológicos interligados via internet. Nesse cenário sociomidiático, as relações interpessoais são delineadas pelo processo interacional de referência midiatizado. A sociedade vivencia os desdobramentos da midiatização e a emergência de novos formatos de sociabilidade, valores, costumes e tendências comportamentais, cuja vida coletiva é regida por leis e normas, tal como é definido no Estado Democrático de Direito (Cataldi, 2022).

O direito é uma ciência que está em consta devir, cuja natureza é representada pelo constante vir-a-ser, por representar a aplicabilidade do rigor da lei. Isto é, o direito pode ser compreendido como sendo um fruto das Ciências Jurídicas. A tal ponto que o direito tem sua relação intrínseca com a lei, assim como a alma está atrelada a alma (França e Coelho, 2023). Portanto, a lei é a aplicabilidade prática, matéria e substancial do direito, pois o contexto sociocultural e político-econômico do diretito dá margem para o entendimento jurídico pautado na moldura do ordenamento jurídico.

A justificativa da realização desta pesquisa decorre do fato de haver lacunas normativas acerca da legislação pertinente à temática da insalubridade e periculosidade na atividade do polical militar. Contudo, a formulação de um problema pra introduzir o objeto desse estudo nas Ciências Jurídicas recai às múltiplas definições e variadas doutrinas, que ora divergem e em outros momentos convergem em plena sintonia acerca da normatização jurídica do adicional de periculosidade aos agentes de Segurança Pública Estadual: Polícia Civil, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar.

A relevância social em inserir à temática proposta nas arenas centrais das Ciências Jurídicas representa um esforço de dar visibilidade ao fato de ser dever do Estado garantir a ordem e a pacificação social, através de políticas públicas e legislações específicas que visam o enfrentamento ao aumento da violência urbana e os crimes violentos. A segurança pública é um direito de todos os brasileiros, tal como determina a Constituição Federal (CF) de 1988.

O principal objetivo deste trabalho é analisar a possibilidade de percebimento e cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade aos policiais militares. A metodologia adotada será uma análise de revisão bibliográfica da literatura, com ênfase em livros e artigos mais atuais sobre o tema abordado.

Nesse cenário delineado, a polícia militar tem um papel relevante na segurança pública, cuja atuação do policial remete à preservação da ordem pública, no enfrentamento à criminalidade, ao perigo e ao dano. Cabe ao polical militar a missão de enfrentamento ostensivo à violência, marginalidade e criminalidade. Portanto, esse estudo busca responder à seguinte questão de pesquisa: à luz do ordenamento jurídico brasileiro, quais são os limites e admissões para a normatização do adicional de insalubridade e periculosidade para aos policiais militares?

2 PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE

A luta pela sobrevivência através do ofício é tão antiga quanto a existência da civilização. Nesta batalha, em que há relações de hierarquia entre empregador e empregado, a saúde do trabalhador é um bem incalculável e considerado um direito humano (Martins Filho, 2022). Em toda a história da humanidade, sempre existiu o trabalho considerado perigoso, insalubre e penoso, mas houve progressos no reconhecimento das questões da saúde e proteção do trabalhador.

O histórico do problema pode ser encontrado no ano de 1713, citando Bernardino Ramazzini, considerado Pai da Medicina do Trabalho, que escreveu a intitulada “De morbis artificum diatriba” (As doenças de Trabalhadores), em que há relatos da experiência deste médico de operários; e uma segunda edição da obra relacionando cinquenta e quatro profissões do período. No trabalho deste médico italiano traduzido por Cataldi (2022), é possível ter uma visão sobre a determinação social da doença, através das suas contribuições metodológicas, de como abordou a relação saúde-doença dos trabalhadores, sistematizando o estudo das doenças e das profissões, bem como as relações do trabalho e do meio-ambiente, com ênfase na prevenção primária.

Portanto, há aproximadamente 300 anos já havia uma preocupação bem atual sobre as doenças adquiridas no trabalho e o risco oriundo de determinadas profissões. O próprio França e Coelho (2023, p.19) comenta que:

[…] os governos bem constituídos têm criado leis para conseguirem um bom regime de trabalho, pelo que é justo que a arte médica se movimente em favor daqueles que a jurisprudência considera com tanta importância, e empenhe-se […] em cuidar da saúde dos operários, para que possam, com a segurança possível, praticar o ofício a que se destinaram.

Cataldi (2022, p.237), já comprovava a existência de trabalhos insalubres, antes da Revolução Industrial, ao dizer que:

[…] o variado campo semeado de doenças para aqueles que necessitam ganhar salário e, portanto, terão de sofrer males terríveis em consequência do ofício que exercem, prolifera, […] devido a duas causas principais: a primeira, e a mais importante, é a natureza nociva da substância manipulada, o que pode produzir doenças especiais pelas exalações danosas, e poeiras irritantes que afetam o organismo humano.

A Revolução Industrial inglesa transformou os métodos de produção e, consequentemente, o trabalho, expondo a fragilidade do homem a novos riscos e doenças relacionadas às atividades econômicas. Mutilações, doenças ocupacionais, relações de trabalho injustas entre o empregado e empregador se intensificaram a ponto de utilizarem crianças e mulheres para aumentarem a produção a um custo menor. Martins Filho (2022, p.33) relata que muitos “obreiros perderam o controle do processo produtivo, antes artesanal, uma vez que passaram a trabalhar para um patrão que determinava regras e detinha as ferramentas (máquinas), a matéria prima e o lucro”. A Inglaterra passou a ser um império econômico e tecnológico que além de exportar manufaturas, influenciou costumes de consumo às colônias exportadoras de matérias primas, as quais, em sua grande maioria, ainda se utilizavam do trabalho escravo.

As máquinas agora determinavam a economia e as condições de trabalho, e necessitavam de energia proveniente do carvão extraído das minas inglesas. França e Coelho (2023) explica que os obreiros das minas inglesas Emile Zola de carvão, de tão expostos às condições insalubres e perigosas, causaram um clamor na sociedade, fazendo com que o Estado percebesse a importância da vida, pelos inúmeros acidentes e doenças nestes trabalhadores. Geralmente, todos os membros de uma família trabalhavam nas minas de carvão, e quando estes adoeciam não tinham garantias contratuais nem tratamentos assegurados, podendo ainda ser vendidos ou comprados por dívidas, o que poderia ser caracterizado como escravidão.

O Estado Inglês deixou de ser abstencionista para ser intervencionista nas relações de trabalho através dos primeiros decretos, entre 1774 e 1779, que objetivavam proteger os trabalhadores das minas de carvão. Cataldi (2022) relacionou os problemas de saúde na Revolução Industrial com os direitos humanos. A situação da população nas grandes cidades no período era de pobreza, devido à migração estimulada do campo para as cidades com fins de aumentar a mão de obra para a indústria. Esse sistema de exploração capitalista, decorrente da industrialização, motivou as lutas por melhores condições de trabalho. Os trabalhadores e suas formas de organizações reagiam aos métodos adotados na época de produção e passaram a reagir com relação às condições precárias e desumanas das indústrias. O Manifesto Comunista em 1848, de Marx e Engels foi o resultado desse processo, acobertado por intelectuais e políticos que no campo sindical procuravam a regulação dos mercados.

O resultado dessa motivação da sociedade foi a resposta dada pelo Estado, ainda no séc. XIX, através dos primeiros decretos (entre 1774 e 1779) e outras leis protetivas que surgiram posteriormente e projetaram as políticas sociais. Meirelles (2022) comenta que apenas no século XX, em 1917, com a promulgação de uma nova Constituição do México, é que se deu o reconhecimento histórico aos direitos sociais na qualidade de Direitos Fundamentais e liberdades individuais em uma nação: direito ao trabalho, à saúde, à educação e à previdência social.

No Brasil de 1910 eclode a Revolta dos Marinheiros, buscando melhores condições de trabalho e o fim dos castigos. A Fundação Banco do Brasil (2008), ao homenagear o marinheiro João Cândido, relatou o sofrimento e as punições que eram legalizadas até o Decreto nº 3, de 16 de novembro de 1889. Mesmo após a abolição da lei supracitada, eram comuns punições. Antigos hábitos do período colonial e escravocrata permaneciam; inclusive na Marinha do Brasil, pela reintrodução legal de punições corporais por meio do Decreto 328, de 12 de abril de 1890, revisado por Martins Filho (2022). Este procedimento legal renovava a permanência dos referidos castigos corporais e condições inadequadas de trabalho, que afrontava a dignidade, a saúde e, consequentemente, a vida.

Esse fato histórico não relata apenas o descaso com os direitos humanos dentro das forças armadas do período em questão, mas também situações inadequadas do ambiente em que viviam os militares da Marinha. A Fundação Banco do Brasil (2008), em revisão dos fatos ocorridos na época, relata que o marinheiro e líder da revolta, João Cândido, durante os 15 anos em que serviu à Marinha, foi preso inúmeras vezes e que durante o serviço contraiu tuberculose, sendo considerado curado pela corporação. Entretanto, essa doença adquirida em ambiente insalubre o acompanhou durante anos, mesmo após ter deixado o serviço militar e não houve nenhuma compensação pela doença adquirida (Meirelles, 2022).

França e Coelho (2023) relata que somente após a Primeira Guerra Mundial é que alguns Estados soberanos decidiram incluir nas suas constituições princípios de proteção às pessoas, direitos fundamentais sociais e do trabalho. Em 1919, através do Tratado de Versalhes, é que se definiu a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata das relações entre empregador e empregado com a proteção do Estado.

O Decreto-Lei nº 2162, de 1º de maio de 1940, do Presidente Getúlio Vargas, é um marco importante à proteção da saúde do trabalhador, além de conceder a fixação de valores ao salário mínimo no Brasil. Neste Decreto está inserido o entendimento de compensações às atividades insalubres tendo como base o salário mínimo vigente à época, como também, prevê sansões a quem o descumprir, além das demais garantias sociais aos trabalhadores. Vejamos o texto nos seus artigos 1º, 6º e 7º, respectivamente (Martins Filho, 2022, p.232):

Art. 1º: Fica instituído, em todo o país, o salário mínimo a que tem direito, pelo serviço prestado, todo trabalhador adulto, sem distinção de sexo, por dia normal de serviço, como capaz de satisfazer, na época atual e nos pontos do país determinados na tabela anexa, às suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte. (…) Art. 6º: Para os trabalhadores ocupados em operações consideradas insalubres, conforme se trate dos graus máximo, médio ou mínimo, o acréscimo de remuneração, respeitada a proporcionalidade com o salário mínimo que vigorar para o trabalhador adulto local, será de 40 %, 20 % ou 10 %, respectivamente. Art. 7º: Os infratores do presente decreto-lei serão passíveis da penalidade de 50$0 (cinquenta mil réis) a 2:000$0 (dois contos de réis), elevada ao dobro em caso de reincidência.

Antes da atual Constituição, os direitos trabalhistas eram inseridos na ordem social e econômica. Somente com a Constituição Federal de 1988, em seu Capítulo II, é que os trabalhadores foram compreendidos e incluídos como titulares de dentro do rol dos direitos sociais. É no art. 7º deste capítulo que os princípios de todas as leis que tratam qualquer trabalhador, seja celetista ou estatutário, estão inseridos, e no qual há proteção à vida e a saúde. Vejamos o art. 7º (Meirelles, 2022, p.514):

São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(…) V – piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;

(…) XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

XXIII – adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei; (CF/88).

A CF/88 possui diversos princípios de proteção ao trabalhador. A saúde foi considerada como direito social, sendo garantida aos trabalhadores a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” previstos no art 7º, XXII. Ficou estabelecido, também, que a saúde é direito de todos e dever do Estado, havendo sintonia com as declarações internacionais e tratados e suas convenções. No entando, as leis ordinárias que complementam a Constituição Federal de 1988 ainda precisam ser revisadas quanto às normas de segurança e saúde (Meirelles, 2022).

De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (2006), as Convenções da OIT são proposições que podem ser encaminhadas ao Congresso com a finalidade de revisar as nossas políticas internas de proteção à saúde, como exemplos as Convenções de números 161 e 155. Em 18 de maio de 1990 o Brasil ratificou a Convenção n. 161 da OIT sobre Serviços de Saúde do Trabalho através do Decreto Legislativo nº 86, aprovado em 1989. Esta Convenção determina uma política nacional que estabelece serviços de saúde no trabalho para todos os trabalhadores, incluindo os do setor público. Entre as funções previstas desta norma encontra-se a identificação e avaliação dos riscos à saúde nos locais de trabalho (Pereira, 2023).

Em 18 de maio de 1992 foi ratificada a Convenção n. 155, também da OIT, trata da segurança e saúde dos trabalhadores, através de Decreto Legislativo nº 2, aprovado em 17 de março de 1992, que é aplicável a todos os ramos da atividade econômica, incluindo a administração pública. Esta norma é de suma importância ao nosso estudo, pois trata da cumulatividade dos agentes nocivos à saúde, sendo aprovada na íntegra. Vejamos o Decreto presidencial nº 1.254, de 29 de setembro de 1994, referente ao Decreto Legislativo nº 2, no seu art. 1º, que comprova a ratificação comentada (Martins Filho, 2022, p.220):

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º É aprovado o texto da Convenção nº 155, adotada na 67ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho, realizada em Genebra, no ano de 1981, que dispõe sobre a segurança e saúde dos trabalhadores e o meio ambiente de trabalho.

É possível confirmar o pensamento de Meirelles (2022), sobre à evolução das normas referentes aos direitos sociais, tanto internacionais como internas, quando afirma que a saúde do trabalhador se trata de um direito humano. Mesmo sendo lento o processo de proteção dos trabalhadores desde o primeiro estudo relatado por Ramazzini até a nossa Constituição, aos poucos está sendo incorporado às nossas leis como um direito natural de todos, em qualquer tempo ou lugar.

Atualmente, governos, empregadores e trabalhadores compreendem a necessidade de reduzirem os riscos ocupacionais e melhorarem a saúde dos trabalhadores. O resultado dessa evolução na história da saúde dos trabalhadores e do conhecimento dos riscos decorrentes das atividades profissionais foi a proposta das diretrizes da OIT (Pereira, 2023) na política nacional dos Estados-membros, contribuindo assim para “proteger trabalhadores contra fatores de risco e eliminar lesões, doenças, incidentes, degradações da saúde e mortes relacionadas ao trabalho”.

4 ADICIONAL DE INSALUBRIDADE

O adicional de insalubridade é uma contraprestação ao salário base do trabalhador, seja estatutário ou celetista, com intuito de compensá-lo no exercício das atividades laborais que possam acarretar danos à saúde por agentes nocivos. Martins Filho (2022) refere-se ao adicional no sentido de ser alguma compensação que se acrescenta ao salário em consequência de serviços do obreiro em condições mais gravosas.

O conceito definido na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), pelo art. 189, considera que são atividades ou operações que “por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados, em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos”. Ou seja, são aquelas situações que afetam ou causam danos à saúde, podendo provocar doenças pela exposição em longo prazo. Pereira (2023, p.1160) conceitua “insalubre como algo não saudável, doentio. É um trabalho inadequado para o trabalhador”.

Segundo Saliba e Corrêa (2023) a prestação laboral em condições de insalubridade é responsável em parte por afastamentos e faltas ao trabalho, concessão de licenças e aposentadorias por invalidez, comprometendo o futuro do trabalhador e a qualidade de vida de toda sua família.

Pereira (2023) comenta que existe insalubridade geradora do direito ao adicional quando o trabalhador suporta a agressão de agentes físicos, químicos ou biológicos além dos níveis de tolerância normais. Estes níveis devem ser averiguados por perícia técnica, em virtude da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos. A exposição eventual a agentes insalubres não caracteriza direito ao recebimento do adicional de insalubridade.

O tempo de exposição é o meio técnico que qualifica o trabalhador a ter o direito de perceber o adicional, desde que passe a ser medido juntamente com a quantidade de agentes nocivos e estes devem ser suficientemente agressivos para tornar insalubre a condição de trabalho. Na visão de Saliba e Corrêa (2023), o trabalhador precisa de segurança e ambiente saudável para exercer suas obrigações. Quanto maior a segurança, menor a insalubridade ou a ocorrência de danos ao homem e ao meio ambiente.

No Brasil, é o Ministério do Trabalho que determina as normas e regulamentos a respeito de agentes nocivos a que são expostos aos trabalhadores celetistas, e que, por parâmetro e analogia, serviria aos estatutários por ausência de outro órgão que regule e normatize a situação desta categoria. A Norma Regulamentadora número 15 (Pereira, 2023) descreve as atividades e operações consideradas insalubres, inclusive seus limites de tolerância, bem como define as situações vivenciadas nos ambientes de trabalho pelos trabalhadores que caracterizem o exercício insalubre, além dos meios de proteger os trabalhadores de tais exposições nocivas à sua própria saúde.

Os anexos da Norma Regulamentadora número 15 (NR-15) referem-se a diversos agentes causadores de insalubridade, tais como: ruído contínuo ou intermitente, ruídos de impacto, exposição ao calor, radiações ionizantes, trabalho sobre condições hiperbáricas, radiações não ionizantes, vibrações, frio, umidade, agentes químicos específicos, poeiras minerais e agentes biológicos (Saliba e Corrêa, 2023).

Os limites de tolerância da NR-15 referem-se à concentração ou intensidade máxima ou mínima, relacionada com a natureza e o tempo de exposição ao agente, para que não cause dano à saúde do trabalhador, durante o tempo laboral. A eliminação ou neutralização da insalubridade ficará caracterizada através de avaliação pericial por órgão competente, que comprove a inexistência de risco à saúde do trabalhador (Saliba e Corrêa, 2023).

Os critérios para caracterização da NR-15 da insalubridade que deverão ser levados em consideração pelo perito são: avaliações quantitativas, qualitativas e qualitativas inerentes à atividade e seus riscos. Estão inseridas nos anexos da norma e podem ser resumidos respectivamente a seguir (Pereira, 2023, p.204):

a) em razão da intensidade do agente agressivo existente, do tempo de exposição caso o limite ou tolerância for ultrapassado e o tipo de natureza agressiva e prejudicial;

b) em função dos agentes biológicos ou químicos, será avaliado qualitativamente por perito no local do trabalho sem limite de tolerância para os agentes agressivos previstos na norma em seus anexos;

c) e, qualitativa em função de riscos inerentes à atividade é estabelecido que será insalubre o que estiver mencionado nos anexos 6, 13 e 14, quando não for possível eliminar ou neutralizar a insalubridade devido a atividade profissional.

Entretanto, mesmo que esse contato não seja contínuo ao longo do dia, não significa que o militar do quadro de saúde exposto a condições insalubres nesta condição não terá o direito à percepção do respectivo adicional, a exposição deve ser diária, e contínua pelo tipo de atividade profissional. Esse entendimento é previsto na Súmula n. 47 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), situação em que o trabalhador fica exposto a agentes insalutíferos. Vejamos (Saliba e Corrêa, 2023, p.233):

SÚMULA TST Nº 47 INSALUBRIDADE: O trabalho executado em condições insalubres, em caráter intermitente, não afasta, só por essa circunstância, o direito à percepção do respectivo adicional. (RA 41/1973, DJ 14.06.1973)

Silva (2023) compreende que a perícia é obrigatória para caracterizar qualitativamente e quantitativamente a atividade insalubre, por se tratar de prova técnica na qual deverão ser apurados o grau da insalubridade e os agentes causadores. Mesmo que a perícia técnica determine que o ambiente seja insalubre, ainda é necessário que a profissão esteja inserida ou classificada como atividade insalubre, essa informação ou quadro de atividades insalubres é elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, de acordo com o Recurso de Revista n. 130.777/94.4 do TST.

Segundo Sussekind (2023), os militares estaduais do quadro de saúde podem estar expostos a agentes físicos, que são representados pela radiação e ionização; pelos agentes biológicos, que são microrganismos presentes no ambiente de trabalho, como fungos, bactérias, bacilos, vírus, protozoários, parasitas, entre outros que podem estar presentes no sangue e saliva de ambulatórios e laboratórios; e agentes químicos listados na NR-15 do Ministério do Trabalho. E, de acordo com as características do local de trabalho, podem ocasionar danos à saúde do militar pelo longo tempo de exposição que caracteriza a atividade (ex facto temporis) e pela função exclusiva e técnica desses profissionais (ex facto officii).

Silva (2023) fez um estudo sobre os conhecimentos dos cirurgiões-dentistas à respeito dos riscos quanto à insalubridade na profissão e formas de prevenção, além de observar a quais agentes insalubres esses profissionais e os auxiliares poderiam estar sendo expostos. Constataram que na atividade profissional, agentes físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e mecânicos estão presentes. Os agentes físicos aos quais os profissionais de saúde mais estão expostos são os derivados de ruídos, radiações ionizantes, calor e radiações não ionizantes. Os químicos podem ser desde o mercúrio, ainda constante no ambiente odontológico, quanto os fenóis ou demais produtos manipulados ou presentes na farmácia de manipulação hospitalar.

O ruído excessivo contínuo ou intermitente caracterizado pela NR-15 está definido em uma tabela para fins de limite de tolerância e são medidos em decibéis (dB), podendo oscilar de 85 a 116 dB, dentro da exposição máxima diária permissível respectiva aos decibéis, entre 7 minutos e 8 horas. O conceito de ruído, segundo Sussekind (2023, p.116), é:

[…] o termo expressa uma sensação subjetiva auditiva, originada por movimento vibratório e propagada através de meios sólidos, líquidos ou gasosos, com uma velocidade diferente, segundo o meio empregado em sua propagação; psicologicamente, entendemos por ruído uma sensação auditiva desagradável.

Silva (2023), em relação ao ruído das turbinas de alta rotação dos cirurgiões-dentistas, afirma que estas peças de mão rotatórias conhecidas também como canetas odontológicas, produzem níveis de sons agudos extremamente altos e que são considerados como causa da perda de audição.

Segundo Sussekind (2023), nos resultados de sua pesquisa verificou que diversos pesquisadores obtiveram resultados diferentes a respeito do ruído de canetas de alta rotação, oscilando entre 75 a 104dB, fator que dependia da marca do fabricante e da metodologia usada nas pesquisas.

O mercúrio é fator gerador grau máximo pela NR-15. Silva (2023) verifica que quando ocorre um derramamento do mercúrio, este se dispersa em partículas menores, que tendem a se vaporizar principalmente se forem movimentadas, produzindo aerossóis, caso permaneçam perto de fontes de calor e em um local com pouca ventilação.

O TST já interpreta através da Orientação Jurisprudencial (OJ) nº 4 da SDI-1 do TST, com sua redação vigente à época, que além da exposição aos agentes insalutíferos que o manuseio de mercúrio inorgânico proporciona, quando é extrapolado o limite fixado no quadro 1 do anexo 11 da NR-15, para gerar o direito ao percebimento do adicional de insalubridade é necessário que a atividade seja classificada como insalubre. Vejamos a OJ nº 4 (Gasparini, 2023, p.500):

OJ-SDI1-4 ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. LIXO URBANO. (nova redação em decorrência da incorporação da Orientação Jurisprudencial nº 170 da SBDI-1) – DJ 20.04.2005. I – Não basta a constatação da insalubridade por meio de laudo pericial para que o empregado tenha direito ao respectivo adicional, sendo necessária a classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho. II – A limpeza em residências e escritórios e a respectiva coleta de lixo não podem ser consideradas atividades insalubres, ainda que constatadas por laudo pericial, porque não se encontram dentre as classificadas como lixo urbano na Portaria do Ministério do Trabalho. (ex-OJ nº 170 da SBDI-1 – inserida em 08.11.2000)

Histórico Redação original – Inserida em 25.11.1996 4. Adicional de insalubridade. Necessidade de classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho, não bastando a constatação por laudo pericial. CLT, art. 190. Aplicável. (Fonte: DJ – 20.04.2005)

A NR-15, em seu Anexo 14, ainda refere a agentes biológicos, que são considerados atividades de insalubridade de grau médio e máximo, por avaliação qualitativa da atividade profissional. Entre os fatores geradores biológicos estão “os trabalhos e operações que estão em contato permanente com pacientes, animais ou com material infecto-contagiante, em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana”. Aplicando-se “unicamente ao pessoal que tem contato com os pacientes, bem como aos que manuseiam objetos de uso desses pacientes, não previamente esterilizados” (Silva, 2023).

A mesma norma caracteriza o grau médio de insalubridade por agentes biológicos, como sendo “as operações em contato permanente com pacientes, animais ou com material infecto-contagiante, em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana (aplica-se unicamente ao pessoal que tenha contato com os pacientes, bem como aos que manuseiam objetos de uso desses pacientes, não previamente esterilizados)” (Nogueira, 2023).

5 DIREITO DE INSALUBRIDADE DO POLICIAL MILITAR

O trabalho policial é considerado uma ocupação estressante. Ao lidar com a violência rotineira, espera-se que os policiais tenham padrões elevados de saúde física e mental. Entretanto, não é o que as evidências têm apontado. Após um estudo com o objetivo de identificar fatores associados à qualidade de vida relacionados à saúde de policiais militares, Comparato (2023) afirma que eles apresentaram baixa qualidade de vida relacionada à saúde. Essa foi uma constatação preocupante, posto se tratar de trabalhadores responsáveis por garantir a segurança da sociedade.

Observa-se que na sua atuação os riscos mais comuns são decorrentes de ferimentos por projéteis de arma de fogo, acidentes de trânsito, esforços físicos, lutas corporais e problemas relacionados ao estresse (Gasparini, 2023). O “risco epidemiológico” materializa-se nos confrontos armados, nos quais eles se expõem e podem perder a vida. Diante de tantos riscos, aspectos relacionados à insalubridade tornam-se pequenos, entretanto, podem ser objeto de questionamentos, não devendo ser ignorados. Ao considerar-se a insalubridade do policial militar, outros aspectos relacionados à sua atividade laboral vêm à tona.

Os fatores de riscos mais comuns relativos à saúde e segurança dos trabalhadores podem ser divididos em cinco grupos: físicos, ergonômicos, químicos, biológicos e psicossociais. Assim sendo, a ocorrência dos acidentes de trabalho relacionados com os tipos de riscos varia de acordo com o ambiente laboral do indivíduo (Marras e Veloso, 2022).

Consideram-se agentes físicos as diversas formas de energia a que possam estar expostos os trabalhadores, tais como: ruído, vibrações, temperaturas extremas, radiações ionizantes, dentre outros (NR9). O fato de o policial militar manusear uma arma de fogo, o torna exposto a um ruído e é sabido que a exposição a ruídos intensos pode repercutir em diminuição da capacidade auditiva. Nesse diapasão, estudos sugerem que militares têm demonstrado elevado índice de perda auditiva, fato este associado à exposição excessiva a ruídos de impacto sem o uso de equipamento de proteção individual (EPI) (Nogueira, 2023).

Por outro lado, foi possível verificar em um estudo com policiais rodoviários federais que, apesar destes trabalhadores se configurarem como uma população que apresenta risco para desenvolver alterações auditivas, os sujeitos avaliados na amostra, em sua maioria, apresentaram audição dentro dos padrões de normalidade (Marras e Veloso, 2022).

De acordo com a NR15, as atividades ou operações que exponham os trabalhadores, sem EPI adequado, a níveis de ruído de impacto superiores a 140 dB (LINEAR), medidos no circuito de resposta para impacto, ou superiores a 130 dB (C), medidos no circuito de resposta rápida (FAST), oferecerão risco grave e iminente. Vale lembrar que o uso de EPI’s deve ocorrer em situações de treinamento, entretanto, ele não é possível em um momento de confronto, uma vez que nessa situação a audição é necessária para uma ação de sucesso (Comparato, 2023).

Durante a atividade laboral do policial, dentre outras particularidades, eles podem passar longos períodos em pé, além de longas caminhadas e/ou corridas com equipamentos pesados como o colete balístico e cinto de guarnição. Nesse caso, há uma significativa relação entre trabalhadores que tem a permanência prolongada na postura em pé durante o desenvolvimento de suas atividades e os problemas no âmbito da saúde ocupacional (Buck, 2021).

Tendo conhecimento de tal fato, os pés devem ser objeto de cuidado por parte do militar para manutenção da sua saúde. Após uma revisão sistemática na qual se pesquisou a incidência de fascite plantar (FP) em militares americanos, concluiu-se que, dentre outros fatores, a atividade militar no Exército e na Marinha configura fator de risco para desenvolvimento de tal patologia (Nogueira, 2023).

Gasparini (2023) trouxe alguns dados interessantes relacionados a FP, como por exemplo: identificou como fatores de risco o gênero feminino, pronação do antepé, dentre outros. Além disso, foi sugerida a rotação de sapatos como um fator de proteção contra o desenvolvimento de FP. A dor lombar crônica é uma importante causa de sofrimento e incapacitação no ambiente de trabalho. Neste caso, as implicações são mais preocupantes. Dados apontam que problemas de coluna correspondem cerca de 25% de todas as incapacidades por lesão ocupacional nos Estados Unidos. No Brasil, as doenças da coluna são a primeira causa de pagamento de auxílio-doença e a terceira causa de aposentadoria por invalidez, tornando-se evidente que a lombalgia onera os cofres públicos estaduais e diminui a disponibilidade de policiais para o policiamento ostensivo. Deste modo, é preciso que o poder público estadual desenvolva estratégias de prevenção e reforce as medidas de tratamento, visando reabilitar esses militares no menor tempo possível.

Foi realizado um estudo exploratório com o objetivo de analisar, dentre outras coisas, a percepção de policiais militares em relação ao conforto do colete balístico, a presença de dores na região dorso-lombar durante o trabalho, a dor e a fadiga no final da jornada de trabalho, concluído-se que os policiais se mostraram insatisfeitos em relação ao conforto com o colete, queixando-se de fadiga e dor. Entretanto, não foi possível apontar que ele cause desconforto, fadiga e dor a todos os policiais militares (Buck, 2021).

Foi realizada uma revisão da literatura com o objetivo de descrever as queixas osteomusculares em militares do policiamento ostensivo. Entre os achados, ressaltam-se alguns sintomas musculoesqueléticos na região lombar, cervical e joelhos, com a maior prevalência de quadro álgico e parestesias. Tais achados podem servir como base para implementar alterações na rotina laboral, contribuindo para a prevenção de novas queixas (Comparato, 2023).

Ao abordar os riscos ambientais, neles também se incluem os riscos químicos e biológicos. No que se refere aos policiais militares, tais riscos estão muito mais relacionados aos militares do quadro da saúde, do que aos demais. Considerando os riscos biológicos, os militares médicos são os profissionais que estão enquadrados no maior percentual de insalubridade pela possibilidade de trabalhar diretamente com pacientes em isolamento por doenças infecto-contagiosas (Marras e Veloso, 2022).

Já considerando os riscos químicos, os militares odontólogos são os que podem vir a incidir o maior percentual de insalubridade, por manipular o amálgama e com isso, estar exposto ao mercúrio, que é o agente químico de maior grau de risco laboral. Contudo, a redução do uso do amálgama na rotina clínica do cirurgião-dentista têm gradativamente diminuído essa possibilidade (Nogueira, 2023).

O estresse ocupacional dos policiais militares é percebido tanto nos grupos pertencentes aos órgãos de execução, quanto nos órgãos de gestão, pois segundo Gasparini (2023) os gestores se vêem em muitos momentos obrigados a tomar decisões imediatas e solitárias, das quais acabam pondo em risco seus subordinados, elevando os riscos estressores desencadeados pela tensão de grandes responsabilidades.

Uma pesquisa documental, acompanhamento do cotidiano de trabalho e realização de entrevistas em um grupo de militares do posto de Capitão com funções voltadas diretamente para o policiamento, ou com atuação recente nessa área avaliou aspectos deste ofício que geram prazer e sofrimento. Os Capitães destacaram a satisfação que sentem quando conseguem solucionar conflitos, recuperar bens ou salvar a vida de pessoas. Os resultados apontaram que apesar da excessiva carga de trabalho administrativo e dos perigos inerentes à profissão, o prazer está relacionado ao exercício de atividades de gestão, as quais proporcionam espaços de criação no trabalho (Comparato, 2023).

Por outro lado, Buck (2021) destaca que existem focos de insatisfação dentro das corporações policiais. Ela vem dos indivíduos que entram na corporação apenas para ter um emprego, porque se acomodaram, ou ainda por parte dos que estão engajados, mas que se ressentem das condições adversas de trabalho. Os principais motivos de insatisfação decorrem geralmente da frustração e ressentimento pela falta de reconhecimento dos superiores e da população; das queixas sobre salários, condições de trabalho, qualidade de vida e inadequação organizacional e dos equipamentos de uso pessoal; descontentamento com a justiça que consideram leniente, e do fato de se sentirem quase sempre ameaçados.

Questões negativas relacionadas a saúde mental impactam na capacidade laboral, podendo levar os policiais a optar por deixar o trabalho, enquanto aqueles que apresentam saúde física e mental ótima tendem a permanecer no emprego. Autores afirmaram que os componentes físicos e mentais da qualidade de vida foram fortemente associados à baixa capacidade para o trabalho, sendo que o componente mental foi menor entre os bebedores pesados e aqueles mais jovens (Nogueira, 2023).

Conforme a NR-15, o exercício de trabalho em condições de insalubridade assegura ao trabalhador a percepção de adicional, incidente sobre o salário mínimo da região, equivalente a 40% (quarenta por cento) para insalubridade de grau máximo; 20% (vinte por cento), grau médio; 10% (dez por cento), grau mínimo. O percentual depende do grau de risco do agente insalubre ao qual está submetido. Já de acordo com o decreto 16.529/16, que disciplina a concessão dos adicionais de insalubridade e periculosidade para os servidores públicos dos órgãos da Administração direta, das autarquias e fundações do Poder Executivo Estadual, de que tratam os artigos 86 a 88 da Lei 6.677/94 (Estatuto do Servidor Público), comprovado o labor em condições de insalubridade, o servidor fará jus à percepção de adicional de insalubridade, com base nos percentuais de 20, 30 e 40%, de acordo com riscos mínimo, médio e máximo, respectivamente (Marras e Veloso, 2022).

A legislação brasileira sobre Segurança e Saúde no Trabalho (SST) baseia-se em critérios internacionais e confere importantes garantias no que tange a segurança, saúde e integridade física no ambiente de trabalho. Mas, a proteção do trabalhador brasileiro destina-se notoriamente àqueles regidos pela CLT, excluindo dessa forma os trabalhadores do serviço público, pois estes se submetem ao regime estatutário e não ao regime celetista (Gasparini, 2023).

De acordo com o art. 166, a empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, EPI adequado ao risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento, sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes e danos à saúde dos empregados. Por outro lado, o art. 191 afirma que haverá “eliminação ou a neutralização da insalubridade caso haja adoção de medidas que conservem o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância e/ou com a utilização de EPI ao trabalhador que diminuam a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância” (Marras e Veloso, 2022).

De acordo com tais leis, o direito ao adicional de insalubridade cessa com a eliminação das condições ou dos riscos que deram causa à concessão. Daí a importância da adoção pelo empregador de mecanismos de prevenção, tais como o fornecimento de EPI, mobiliário ergonômico, e informação sobre prevenção. Embora no regime da CLT a disciplina legal e regulamentar a respeito da insalubridade seja bastante adequada, no serviço público a realidade não é a mesma. Nesse regime, a regulamentação do tema limita-se a tratar dos adicionais ocupacionais, deixando de lado importantes programas e medidas que são utilizadas no regime celetista com grande êxito há décadas, a exemplo do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – PPRA, e a Comissão Interna de Prevenção de Acidente CIPA, entre outros (Buck, 2021).

Informações obtidas após a identificação de fatores associados à qualidade de vida relacionada à saúde podem ser úteis para propor políticas adequadas e implementar um atendimento eficaz aos policiais militares. Gasparini (2023) a respeito da qualidade de vida do policial militar são preocupantes e levaram os autores a concluir que a descoberta de tais fatores é importante para o planejamento das atividades de um programa de saúde para esse grupo ocupacional particularmente vulnerável.

CONCLUSÃO

A segurança e saúde no trabalho é tema de grande relevância, principalmente em virtude do elevado custo financeiro, além do aspecto social e da saúde do trabalhador diretamente relacionados aos agravos decorrentes dos riscos das atividades laborais. Para o Policial Militar, observa-se como principais riscos à saúde o ruído, o uso de colete a prova de balas, o tempo de permanência em pé e a exposição aos raios solares.

Vale salientar que o aspecto financeiro, garantido no regime de trabalho do policial, não deve excluir preocupações com a sua saúde, uma vez que a boa saúde física e mental repercute em um trabalho de maior excelência. Observa-se a importância de que as corporações militares instituam ações que permitam uma atividade laboral segura, incluindo a adoção de campanhas sócioeducativas e o fornecimento de EPI’s de modo a minimizar os efeitos dos agentes agressores.

Nesse sentido, o objetivo delineado inicialmente foi atingido, em virtude de demonstrar as lacunas, omissões e disparidades acerca da normatização do adicional de insalubridade e periculosidade aos agentes de Segurança Pública Estadual da Polícia Militar.

Entende-se que há escassez de compreensão do Governo do Estado em cumprir com as determinações legais da Constituição, confundindo o ato de declaração com o ato de Constituição de direito. Logo, para a atividade supracitada, o direito trabalhista evidencia-se como ex lege. Também foi possível averiguar contradições em relação ao direito provido por lei maior e sua execução de fato no ambiente de trabalho das forças policiais civis e militares, sendo reconhecidamente insalubres e perigosas suas operações pela Lei Complementar Estadual.

Pode-se concluir que para sanar as inquietações dos policiais militares e, portanto, reduzir o sentimento de desvalorização da categoria em detrimento da diferenciação normativa, da lacuna e omissão legislativa, principalmente no âmbito federal, a normatização do adicional de insalubridade e periculosidade no âmbito federal tem presunção jurídica de pacificar essa problemática. Assim, pode-se afirmar que o policial militar, no cumprimento do dever par com a sociedade brasileira, caracteriza-se com pertencente à moldura jurídica acerca do recebimento do adicional de periculosidade, inclusive em consonância com o principio da dignidade da pessoa humana, com o princípio da igualdade e com o princípio de proteção do trabalhador.

REFERÊNCIAS

BUCK, Regina Célia. Cumulatividade dos Adicionais de Insalubridade e Periculosidade. ed.6. Editora LTR. São Paulo, 2021.

CATALDI, Maria José Giannella. O stress no meio ambiente de trabalho. ed.6. Editora LTR. São Paulo, 2022.

COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. ed.9. Editora Saraiva. São Paulo, 2023.

FRANÇA; COELHO. Polícia e Segurança Pública: relatos de pesquisa. ed.2. Editora Idea. João Pessoa, 2023.

GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. ed.11. Editora Saraiva. São Paulo, 2023.

MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Manual esquemático de direito e processo do trabalho. ed.11. Editora Saraiva. São Paulo, 2022.

MARRAS, J. P.; VELOSO, H. M. Estresse Ocupacional. ed.3. Editora Elsevier. Rio de Janeiro, 2022.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. ed.33. Editora Malheiros. São Paulo, 2022.

NOGUEIRA, D. P. Riscos ocupacionais de dentistas e sua prevenção. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional. v.11, n. 41, p. 16-24, jan./mar.2023.

PEREIRA, Bruno Yepes. Curso de direito internacional público. ed.7. Editora Saraiva. São Paulo, 2023.

SALIBA, Tuffi Messias; CORRÊA, Márcia Angelim Chaves. Insalubridade e periculosidade. ed.14. Editora LTR. São Paulo, 2023.

SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. ed.10. Revista Atualizada e Ampliada Malheiros. São Paulo, 2023.

SUSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho. ed.7. Editora Renovar. Rio de Janeiro, 2023.


[1] Militar da Reserva, Professor Doutorando em Filosofia do Direito, Advogado Especialista em Direito Processual Civil, Direito Administrativo, Direito da Pessoa com Deficiência e Concurso Público, Escritor e Palestrante. E-mail: ricardonfernandes@hotmail.com

[2] Administradora e Advogada Especialista em Concurso Público, Direito do Trabalho e Previdenciário. E-mail: anagouveiajp@gmail.com