CONSTELAÇÃO SISTÊMICA FAMILIAR COMO ALTERNATIVA DE PRÁTICA RESTAURATIVA DE RESSOCIALIZAÇÃO DE MENORES INFRATORES

CONSTELAÇÃO SISTÊMICA FAMILIAR COMO ALTERNATIVA DE PRÁTICA RESTAURATIVA DE RESSOCIALIZAÇÃO DE MENORES INFRATORES

28 de novembro de 2023 Off Por Cognitio Juris

SYSTEMIC FAMILY CONSTELLATION AS AN ALTERNATIVE RESTORATIVE PRACTICE FOR THE RESOCIALIZATION OF MINOR OFFENDERS

Artigo submetido em 24 de outubro de 2023
Artigo aprovado em 6 de novembro de 2023
Artigo publicado em 28 de novembro de 2023

Cognitio Juris
Volume 13 – Número 50 – Novembro de 2023
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Cleonice Patrícia Becker[1]
Cleverson Aldrin Marques[2]
Clara Heinzmann[3]

RESUMO: A constelação sistêmica familiar é uma abordagem terapêutica que se originou no campo da psicoterapia familiar e sistêmica. Ela tem sido aplicada em diversas áreas, incluindo na justiça restaurativa e reabilitação de menores infratores. A constelação parte do pressuposto de que os problemas individuais, incluindo o comportamento do menor infrator, muitas vezes têm raízes em dinâmicas familiares e sistêmicas. Portanto, essa abordagem busca entender as relações familiares e comunitárias para identificar causas subjacentes dos comportamentos delinquentes.  Para alcançar o objetivo da pesquisa, foram adotados o método dedutivo e a pesquisa de natureza bibliográfica explicativa. A justiça restaurativa é uma parte essencial da constelação sistêmica familiar. Isso implica que o infrator seja responsabilizado por suas ações, mas em um contexto que também ofereça oportunidades de reparação e reconciliação com a vítima e a comunidade, essa abordagem considera a pessoa infratora como parte de um sistema maior. Ela não olha apenas do ponto de vista individual, mas também do ponto de vista das interações familiares e sociais. A constelação sistêmica familiar pode contribuir para o desenvolvimento pessoal do menor infrator, ajudando-o a compreender suas próprias motivações e a tomar decisões mais conscientes e responsáveis.

Palavras-chave: Constelação sistêmica familiar; Justiça restaurativa; Menor infrator.

ABSTRACT: Family systemic constellation is a therapeutic approach that originated in the field of family and systemic psychotherapy. It has been applied in several areas, including restorative justice and rehabilitation of juvenile offenders. The constellation is based on the assumption that individual problems, including the behavior of juvenile offenders, often have roots in family and systemic dynamics. Therefore, this approach seeks to understand family and community relationships to identify underlying causes of delinquent behaviors. To achieve the research objective, the deductive method and explanatory bibliographical research were adopted. Restorative justice is an essential part of the systemic family constellation. This implies that the offender is held accountable for their actions, but in a context that also offers opportunities for reparation and reconciliation with the victim and the community, this approach considers the offender as part of a larger system. She not only looks at it from an individual point of view, but also from the point of view of family and social interactions. The systemic family constellation can contribute to the personal development of the juvenile offender, helping him to understand his own motivations and make more conscious and responsible decisions.

Keywords: Family systemic constellation; Restorative justice; Minor offender.

1.   INTRODUÇÃO

A crescente judicialização de conflitos, das mais diversas áreas tem sobrecarregado o judiciário ao longo dos anos, tornando ineficiente a solução alcançada, no momento que ela ocorre.

          Raríssimas vezes proporcionam o sentimento de paz e justiça aos envolvidos, visto que além do aparente há dores e sentimentos profundos que dão origem ao conflito e que não encontram numa sentença aplicado por um terceiro a solução definitiva para a questão.

          Para o Direito Sistêmico, cada parte de um conflito estão inseridas num sistema em si, o conflito propriamente dito, bem como, pertencem a outros sistemas simultaneamente, uma família, uma empresa e uma comunidade.

O conflito nunca será isolado, sempre estará vinculado a outros sistemas que interagem com o campo sistêmico do conflito. Quando há desequilíbrio nessas ordens, a tendência é o distúrbio das relações, quer sejam individuais ou coletivas, que refletem na conduta do indivíduo em sociedade e no convívio social.

2.   JUSTIÇA RESTAURATIVA

A Justiça Restaurativa busca a conscientização do infrator, através de métodos que visam não simplesmente a punição do transgressor, mas sim, a reflexão das ações realizadas e suas consequências, não só para quem cometeu o ato, mas para aqueles que estão próximos, assim como para a vítima. Neste sentido, ela atua na prevenção, para que novos eventos não ocorram.

A Justiça Restaurativa é um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato são solucionados de modo estruturado. (PROJURIS, 2022).

É através dela que o ofensor tem a oportunidade de, além de cumprir com a medida socioeducativa que lhe é atribuída, a reabilitação perante a sociedade, através da mudança em sua conduta.

Conforme o site Projuris, a Justiça restaurativa tem o condão de apresentar uma resposta mais eficaz a sociedade, no sentido de que além da aplicação da medida socioeducativa, o infrator tenha a possibilidade da mudança de comportamento, de forma conscientizada.

Isto vem ao encontro da ânsia da sociedade de que aqueles que cometem um ato infracional ou um crime aprendam com a “punição”, não que apenas a cumpram para depois estarem livres.

Pesquisas internacionais, aplicadas em países com sistemas restaurativos consolidados, mostram que a taxa de satisfação pode superar os 80%.  Outro efeito do encontro entre as partes envolvidas e o ofensor é a redução dos efeitos emocionais da vitimização. Já há estudos mostrando, por exemplo, a mitigação do estresse pós-traumático nas vítimas, após passarem por processos restaurativos. A assunção de responsabilidade pelo ofensor também traz outra consequência positiva. Especialistas têm apontado queda significativa nas taxas de reincidência, bem como na frequência e na gravidade desses episódios. (Projuris, 2022.)

Neste sentido, tem-se que a Justiça Restaurativa tem alcançado o objeto a que se presta, visto que além da satisfação com as soluções propostas, há a queda significativa na reincidência de prática das infrações, bem como na frequência e gravidade dos episódios.

Para Vasconcelos a Justiça Restaurativa se preocupa não apenas com a resposta adequada para o comportamento reprovável, mas sim, com a reparação do dano, vejamos:

A Justiça Restaurativa transforma o paradigma da intervenção penal, uma vez que não está apenas preocupada com a determinação de uma resposta adequada ao comportamento criminal, mas também com a reparação, seja ela material ou simbólica, dos danos causados pelo crime. Encoraja vítima e ofensor a resolverem o conflito por intermédio do entendimento e da negociação, reservando para os agentes públicos ou para mediadores contratados o papel de facilitadores dotados de um só instrumento de intervenção: a linguagem, o que os coloca no mesmo nível de poder das partes (uma vez que, aqui, o poder limita-se à comunicação). Mais do que reparação material, podem ser reparadas as relações e a confiança afetadas pelo crime. (Vasconcelos, p.209).

Ainda, de acordo com este Manual, a Justiça Restaurativa oferece as vítimas e a comunidade um caminho alternativo para a justiça, promovendo a participação segura das vítimas para resolução do conflito, bem como a responsabilização daquele que cometeu o ato com ações que dão oportunidade de reabilitação. Neste sentido, os programas de Justiça Restaurativa buscam a participação ativa dos envolvidos e afetados na reparação do dano e também na punição do infrator.

Os programas de justiça restaurativa têm como fundamento a crença de que as pessoas envolvidas ou afetadas pelo crime devem ter participação ativa na reparação do dano, amenizando o sofrimento que o crime causou e, sempre que possível, tomando providências para prevenir a recorrência do dano. Essa abordagem também é vista como um meio de promover a tolerância e a inclusão, descobrir a verdade, encorajar a expressão pacífica e a resolução de conflitos, construir o respeito pela diversidade e promover práticas comunitárias responsáveis. (Unodc, 2020, p. 11).

Por fim, é claro que a Justiça Restaurativa é uma proposta alternativa para aplicação da Justiça, levando em consideração a participação do ofensor e do ofendido, para que a além da aplicação da sanção haja a conscientização do ofensor quanto a extensão e efeitos de sua conduta e, principalmente, para que a conscientização de seus atos resulte na mudança de comportamento.

3.   DIREITO SISTÊMICO

O conceito ou expressão “Direito Sistêmico” foi criada pelo juiz brasileiro Sami Storch, ao introduzir a técnica das Constelações Familiares no Judiciário. O Direito Sistêmico, nas palavras de Storch não é um novo ramo do Direito, mas sim, uma análise do Direito considerando o pensamento e as leis sistêmicas introduzidas por Bert Hellinger.

Assim, o então denominado Direito Sistêmico nos propõe a busca de uma solução, não mais focada apenas na ótica competitiva, mas sim cooperativa e pacífica, o que vem perfeitamente ao encontro da necessidade de pacificação social e se distancia salutarmente da visão opositiva, até então perpetrada pelos construtores do Direito. (Oldoni; Lipmann; Girardi, 2018, p. 44).

Para Nerone o Direito Sistêmico nada mais é do que o direito sensível, humanizado e inclusivo, que busca a causa das ações que resultaram no fato delituoso, sem, contudo, deixar de estabelecer responsabilidade aquele que deu causa a ação.

O direito sistêmico é a tradução de um direito sensível, humanizado, inclusivo, que se sustenta na autonomia da vontade, na dignidade da pessoa, valendo-se de ações e intervenções sistêmicas que conduzam à responsabilização individual e reflexiva por  meio de uma experiência pessoal de enfrentamento da realidade (verdade) imperceptível, que movimenta as relações humanas e por consequência atinge as relações processuais e o todo o sistema judiciário. (Nerone, 2017, p.5).

Ou seja, para Stella Maris Nerone, o Direito Sistêmico pode ser caracterizado como um direito inclusivo, sensível e que sustenta na autonomia da vontade. Para Batista, o Direito Sistêmico pode ser conceituado como:

O Direito Sistêmico, por sua vez, constitui-se em um novo paradigma para a ciência jurídica, trazendo um novo contorno na percepção dos vínculos entre os indivíduos e os grupos tutelados pelo Direito, podendo ser conceituado como a aplicação das leis ou ordens do amor de Bert Hellinger ao campo do Direito. (Barista, 2019, p. 24).

Dito isto, ao movimentar as relações humanas, consequentemente há reflexos na relação processual.

Sobre o tema, José de Magalhães Campos Ambrósio e Décio Fábio de Oliveira Júnior (2018) esclarecem:

É importante compreender o foco da Justiça Sistêmica. Diante de um conflito é muito comum que as partes envolvidas acreditem que a outra parte precisa mudar o seu comportamento sem que ela própria aja de modo recíproco. Isto é obviamente uma ilusão, a justiça tem seus sistemas de controles normativos, formais e um conjunto de regras e instrumentos para impor esse constrangimento legal, mas parece faltar aos operadores do Direito uma visão que pode ser acrescentada, a saber: um modo não formal de agir a que denominamos postura. Daí a chave fundamental da Justiça Sistêmica: o Direito e a Lei fornece o-que-fazer, os princípios sistêmicos e sua postura articulam o como-fazer – assim o trabalho da Justiça adquirirá mais leveza e efetividade para todos, contribuindo de fato para que uma sentença não seja apenas uma decisão, mas uma solução para a paz.

Para o Direito Sistêmico, a verdadeira solução é encontrada a partir do envolvimento das partes, que buscam pela melhor solução do conflito.

Neste sentido, Storch viu na necessidade da construção de soluções efetivas a partir da aproximação dos operadores do Direito com as partes litigantes uma alternativa de inserção das Constelações Familiares no mundo jurídico.

Quando me tornei juiz, já estava fazendo a formação em constelações e logo percebi como na prática o conhecimento das leis sistêmicas auxilia na condução dos processos, a se posicionar de maneira a produzir mais conciliações. Por isso, passei a aplicar alguns princípios nas audiências. Dizendo algumas frases, pedindo que as pessoas fechassem os olhos e se imaginassem olhando para a outra e dizendo frases de reconhecimento. (Revista online época, 2014).

          É neste sentido que a Constelação Familiar pode ser uma alternativa de solução de conflitos que é construída pelas partes, onde a solução que se chega é a mais justa e que é tomada levando em consideração tudo que envolve o conflito, não apenas aquilo que está aparente.

Assim, a Constelação Familiar, aplicada aos conflitos judiciais e extrajudiciais, tem o poder de revelar o que está oculto. Por meio da sensibilização das partes envolvidas, possibilita a obtenção de uma decisão justa, uma vez que é construída pelas próprias partes, por meio da tomada de consciência da origem da lide. (Oldoni; Lippman; Girardi, 2019).

          A partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015 a realização de audiências de conciliação e mediação nos processos judiciais somada a resolução nº 125 do CNJ, que abriu possibilidade para a adoção de métodos alternativos de resolução de conflitos, a técnica das Constelações Familiares ganhou presença e força no judiciário.

          Sami Storch iniciou a aplicação do método desde 2012 na resolução de conflitos no Tribunal de Justiça da Bahia, especificamente no Município de Castro Alves, a 191 km de Salvador, e afirma que 91% das questões são solucionadas através da conciliação.

A maior parte dos conflitos dizia respeito a guarda de filhos, alimentos e divórcio. Foram seis reuniões, com três casos “constelados” por dia. Das 90 audiências dos processos nos quais pelo menos uma das partes participou da vivência de constelações, o índice de conciliações foi de 91%; nos demais, foi de 73%. Nos processos em que ambas as partes participaram da vivência de constelações, o índice foi de 100%” (CNJ, 2014).

          A aplicação de Oficinas Sistêmicas pode trazer bons resultados ao Poder Judiciário, mas em especial aqueles que optam por ela, como uma alternativa para entender a motivação ou a origem de seu comportamento que resultou na inobservância das regras do convívio em sociedade.

Neste sentido entende Cherulli, 2020, p.7 sobre as oficinas:

(…) um espaço no litígio onde os indivíduos envolvidos no litígio são vistos (e vistos sem julgamento) e podem reconhecer tanto suas limitações quanto o que suas ações estão causando para si e para os outros, com isso, primeiramente, uma tomada e ampliação de consciência do sujeito, o que libera para a adoção de novas posturas diante da vida que como reflexo, levem à resolução da lide, com uma perspectiva de se evitar uma possível reincidência ou nova judicialização de questões.

Como defende Cherulli, as Constelações não buscam um culpado, buscam tratar a causa que leva alguém agir de forma reprovável e ser um culpado. A aplicação do Direito Sistêmico pode ocorrer de formas distintas, conforme Oldoni, Lipmann e Girardi (2019, p.49), “Mediante uma postura sistêmica-fenomenológica; realizando intervenções com frases de soluções, exercícios e dinâmicas sistêmicas e através da aplicação das constelações familiares.”

3.1 Constelações sistêmicas

          A Constelação Sistêmica ou também conhecida como Constelação Familiar, foi desenvolvida por Bert Hellinger, ao experimentar diversos métodos relacionados com a psicoterapia.

Trata-se de uma técnica que estuda o passado de um indivíduo, sem, contudo, deixar de considerar o grupo ao qual pertence e suas histórias conscientes e inconscientes.

O método foi desenvolvido pelo psicoterapeuta alemão Bert Hellinger, nascido na Alemanha em 1925. Trabalhando como missionário na África de Sul, entre os zulus, durante 16 (dezesseis) anos, atuando neste período como padre, desde os 20 anos de idade, e atuando como diretor de várias escolas, então, ele desenvolveu sua técnica. Bert Hellinger, pensador e pesquisador, escreveu vários livros sobre Constelação Familiar. Afirma que possibilita descobrir as inúmeras leis que governam nossa vida e nosso destino. Ao abordar essas leis ele recomenda não sermos categóricos. Dá-nos, assim, a liberdade de as colocarmos à prova, validando, adaptando e até mesmo revogando a lei através do método que ele chama de “fenomenológico”. Por meio dele, então, é possível identificar acontecimentos que, mesmo desconhecidos, podem trazer problemas para a vida de uma pessoa (Freitas, 2019, p.1).

Hoje esta técnica é conhecida mundialmente e utilizada em várias áreas diferentes como empresarial, familiar, organizacional, justiça, assistência, educação, saúde, dentre outras.

As constelações familiares consistem em um trabalho no qual pessoas são convidadas a representar membros da família de uma outra pessoa (o cliente) e, ao serem posicionadas umas em relação às outras, sentem como se fossem as próprias pessoas representadas, expressando seus sentimentos de forma impressionante, ainda que não as conheçam. Vêm à tona as dinâmicas ocultas no sistema do cliente que lhe causam os transtornos, mesmo que relativas a fatos ocorridos em gerações passadas, inclusive fatos que ele desconhece. Pode-se propor frases e movimentos que desfaçam os emaranhamentos, restabelecendo-se a ordem, unindo os que no passado foram separados, proporcionando alívio a todos os membros da família e fazendo desaparecer a necessidade inconsciente do conflito, trazendo paz às relações. (Storch, 2018, on-line).

Através desta técnica terapêutica é possível enxergar a realidade no papel de um terceiro, pois permite que o indivíduo constelado coloque outra pessoas para representar os envolvidos na situação e assim ter um panorama geral, não apenas do seu ponto de vista como envolvido, mas vendo como os outros membros do sistema de comportam e sentem em relação a aquilo que está sendo constelado.

A constelação familiar consiste em uma dinâmica coletiva, por meio da qual é possível observar e sentir a realidade como ela é, pressupondo a ausência de intenção e de medo para que seja visto aquilo que conscientemente não é possível visualizar – o oculto. Ela apresenta a verdade da alma, que “reside na experiência; é sentida como algo real. Distingue-se da mente e do corpo, mas está à vontade entre ambos” (Beaumont; Hellonger; Weber, 2008, p.12).

De acordo com as premissas das Constelações Sistêmicas, cada indivíduo que nasce numa família pertence a esse sistema. Ao pertencer está envolvido na consciência familiar e por esta razão compartilha do destino comum desta família inconscientemente.

Cada ser humano nasce numa família. Isso gera um vínculo que o liga a todos os membros dessa família. Uma instância oculta, que Bert Hellinger chama de “consciência familiar” vela pelas condições que reinam na família enquanto compartilha de um destino comum. A essas condições estamos expostos e subordinados, independentemente da nossa vontade. (Hausner, 2010, p. 23).

Essa consciência familiar, capaz de transmitir informações sobre todos os indivíduos que pertencem, atua de forma oculta sobre os membros influenciando em suas atitudes e ações, mesmo que de forma inconsciente. Neste sentido, Scheneider (2007, p12) afirma que:

Nos grupos a que pertencemos estamos interligados na alma, de uma forma que ultrapassa a transmissão consciente de informações, a comunicação, o comportamento e os sentimentos individuais. Na alma participamos de algo que confere individualidade a cada grupo particular, a cada família, a cada empresa, a cada círculo de amigos. Nas constelações familiares podemos perceber e “ver” a alma, essa força que une. Muitos se surpreendem muito ao sentirem, durante uma constelação, esse vínculo ao contexto profundo da família.

Com seus estudos e observações, Hellinger observou padrões de comportamento que se repetem em um sistema ao longo de várias gerações. A partir desse padrão de comportamento, chegou a três leis ou ordens que regem as relações dos indivíduos num sistema.

Nossa consciência pessoal tem diferentes padrões, um para cada tipo de relacionamento: um padrão para o relacionamento com o pai, outro para o relacionamento com a mãe, um para a igreja, outro para o trabalho, ou seja, um para cada grupo a que pertencemos. (Hellinger, 2015, p. 23).

Os seres humanos possuem necessidades fundamentais para a convivência, que atuam umas sobre as outras e estão conectadas entre si, a saber:

1. A necessidade de pertencer, de vinculação no sentido social que liga um indivíduo a seu grupo de referência;

2. A necessidade de preservar o equilíbrio entre o dar e receber da dinâmica familiar, bem como dos laços ocultos e lealdades que atuam nos sistemas familiares;

3. A necessidade da segurança proporcionada pela convenção e previsibilidade social, isto é, a necessidade de ordem. (Hellinger, 2015, p. 25).

Hellinger aponta três leis que norteiam o conceito das Constelações, a lei do pertencimento, do equilíbrio e da hierarquia. De acordo com o autor essas leis trabalham juntas para preservar os grupos sociais que o indivíduo pertence e os relacionamentos tornam-se bem-sucedidos quando estas leis estão equilibradas.

3.2    Lei do Pertencimento

A Lei do Pertencimento revela que toda pessoa tem o direito de pertencer ao seu sistema de origem em virtude do vínculo formado na fecundação não apenas com pai e mãe, mas também com o sistema familiar a que eles pertencem.

Neste sentido, todos os membros do sistema devem ser reconhecidos em seus respectivos lugares, dos antepassados às crianças, sejam elas adotadas, natimortas, esquecidas, entregues à adoção ou meios-irmãos.

Pertencer à nossa família é a nossa necessidade básica, é o nosso desejo mais profundo manter esse vínculo. A necessidade de pertencer à família vai além mesmo da nossa necessidade de sobrevivência. Isso significa que estamos dispostos a sacrificar nossa própria vida pela necessidade de pertencimento (Hellinger, 2007, p. 17).

Todos pertencem, independente do que ocorreu com elas, do seu destino. O fato de um ou mais membros de um sistema não pertencer pode resultar em comportamentos reprováveis socialmente, visto que, esse indivíduo está buscando honrar aquele que não pertence.

Quando alguém se sobrepõe a ou membro desse sistema, muitas vezes inconscientemente, está desrespeitando a Lei do Pertencimento e excluindo esse membro que buscará de alguma maneira ser visto pelo sistema.

O rompimento às regras familiares ou sociais pode gerar no indivíduo a sensação de ameaça de exclusão do grupo. Como consequência, o indivíduo adota atitudes e comportamentos que busquem reparar sua possibilidade de participação, obedecendo novamente a esta trama invisível de expectativas grupais” (Andolfi; Dinicola, 1989 apoud Gonçalves, 2013, p. 45).

Se um membro é esquecido ou deixado de lado dentro de um sistema, a consciência familiar ou coletiva do grupo entente que este membro foi excluído.

E para buscar a inclusão deste membro, por amor a ele, o sistema influencia os membros atuais para haver uma compensação, motivando, por vezes, o desequilíbrio deste membro, que atua no papel do excluído e busca de alguma forma buscar a consciência dos demais membros do sistema.

Comparada com a consciência pessoal, a coletiva se mostra como totalmente imoral ou amoral. Não faz distinção entre o bem e o mal nem entre a culpa e a inocência. Por isso, não se pode imaginar essa consciência como uma pessoa que persegue objetivos pessoais após uma reflexão amadurecida. Ela age, antes, como uma pulsão, uma pulsão de grupo, que só quer uma coisa: salvar e restaurar a integralidade. Desse modo, é cega na escolha de seus meios. Praticamente se apropria de um membro inocente da família e o vincula ao destino do excluído. (Hellinger, 2020, p. 147).

Quando há a exclusão de um membro de um sistema, a consciência coletiva faz com que outro membro do sistema, em algum momento, se posicione de forma que os demais membros incluam aquele que foi excluído.

O sistema se molda de forma que todos os membros do sistema olhem para o indivíduo que representa aquele excluído buscar a inclusão e o respeito do membro. Somente a partir disto é que o sistema estará em paz e poderá voltar ao equilíbrio.

3.3 Lei da Hierarquia

A Ordem da Hierarquia tem relação com o tempo que o indivíduo pertence ao sistema. De acordo com essa ordem, os mais velhos precedem os mais novos e, por esta razão tem prioridade e se encontram em uma posição mais elevada dentro do sistema. Esta lei determina que os filhos são pequenos diante dos pais, que vieram antes e por tal razão tem uma posição a ser respeitada no sistema.

Quem chegou primeiro, chegou primeiro, quem chegou depois, chegou depois. E nada que venha depois desse ponto final, altera a ordem. Quando há ruptura da ordem, os posteriores se sentem compelidos a atuar como se fossem melhores que os anteriores, como se diante de situações vivenciadas por esses últimos, houvessem eles mesmos tomados decisões e atitudes “melhores” ou “mais acertadas”. Hellinger também viu que aqueles que estão mais abaixo na ordem hierárquica, por exemplo, os filhos, não devem se meter nos assuntos dos antecessores. (Hellinger, 2008 apud Oldoni, et al., 2018, p. 41).

Quando a ordem de chegada no sistema não é respeitada, aquele que a desrespeita se sente fraco, sem forças e sente-se melhor do que aquele a quem julga estar no mesmo patamar. Essa postura causa confusão dentro de um sistema e consequentemente causa o desequilíbrio na relação.

Quem chegou primeiro, chegou primeiro, quem chegou depois, chegou depois. E nada que venha depois desse ponto final, altera a ordem. Quando há ruptura da ordem, os posteriores se sentem compelidos a atuar como se fossem melhores que os anteriores, como se diante de situações vivenciadas por esses últimos, houvessem eles mesmos tomados decisões e atitudes “melhores” ou “mais acertadas”. Hellinger também viu que aqueles que estão mais abaixo na ordem hierárquica, por exemplo, os filhos, não devem se meter nos assuntos dos antecessores. (Hellinger, 2008 apud Oldoni, et al., 2018, p. 41).

Quem veio primeiro tem prioridade, razão pela qual aquele que veio depois deve respeitar essa posição, contudo, deve ser protegido e guiado por quem veio primeiro.

Para as Constelações Familiares todos pertencem. Todos são importantes e todos devem ser respeitados e aceitos dentro do sistema que está inserido. As Leis influenciam no comportamento dos indivíduos dentro da um grupo, quer seja familiar, escolar, trabalho, amigos, etc., e quando são desrespeitadas há a ruptura do equilíbrio e harmonia da relação do grupo.

3.4 Lei do Equilíbrio

Esta Lei, também conhecida como o “dar e o receber”, é fundamental para a manutenção e continuidade de qualquer relação e preconiza que em toda relação as trocas precisam ser iguais, equilibradas, leves.

Quando um parceiro dá menos do que toma, coloca em risco a relação. Ilustro com um exemplo. A alternância entre o dar e tomar, assim como o seu incremento, pode ser comparada ao caminhar para a frente. Quando quero avançar, preciso estar em constante mudança, saindo do equilíbrio e voltando a ele. O mesmo se passa numa relação entre parceiros, quando um dá e o outro se nega a tomar e a equiparar. Quando nos limitamos a manter o equilíbrio, por exemplo, numa relação de casal, retribuindo apenas na medida do que recebemos e sem aumentar o dom, ficamos estacionados. Quando, numa relação, uma pessoa dá menos do que toma, a outra também lhe dará menos. Então a troca diminui e, em lugar de progredir, eles regridem, e sua felicidade e sua ligação diminuem. (Hellinger, 2007, p. 168)

De acordo com essa Lei, cada um deve dar dentro dos seus limites, respeitando o que o outro pode dar, recebendo dele.

Quando há um desequilíbrio nessa relação entre dar e receber, ocorre o desrespeito entre os membros, onde aquele que dá sente que o outro está em dívida consigo e aquele que recebe muito se sente em dívida por não conseguir retribuir como gostaria.

Assim, quando alguma das três ordens sistêmicas (pertencimento, equilíbrio e hierarquia) não é observada, ocorre o que Hellinger define como “emaranhamento”, ou seja, alguém do sistema familiar irá retomar e reviver inconscientemente o destino de outro familiar, emaranhando-se no destino alheio. A Constelação, através de sua forma simples e clara, busca trazer para o sistema, seja ele familiar ou organizacional, a inclusão do que estava separado, rejeitado ou esquecido. O movimento de inclusão e reconciliação possibilita liberação dos conflitos, gerando força e sucesso aos indivíduos e ao sistema. (Quadros, 2021, p. 4).

A partir do processo de Constelação, aqueles membros do sistema que foram rejeitas, excluídos, desrespeitados ou não vistos ganham um lugar e com isso, o outro indivíduo que estava assumindo o papel daquele pode se libertar e seguir seu caminho.

De acordo com os estudos de Hellinger, essas leis sistêmicas são a base da constelação familiar e vigoram sobre qualquer sistema, seja uma família, empresa ou setor público, independente de conhecimento sobre sua atuação pelos envolvidos.

4.   APLICAÇÃO DAS CONSTELAÇÕES SISTÊMICAS AO ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI

A iniciação dos jovens, cada vez mais cedo no crime e na reincidência vem preocupando o Sistema Judiciário. Assim, surge a necessidade de encontrar formas de diminuir essas ocorrências, buscando não apenas a punição, mas, principalmente, buscando pela real origem do problema e soluções cabíveis.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), introduziu no Sistema Judiciário Brasileiro uma nova alternativa para resolução de conflitos, através da resolução nº 125/2010.

Referida resolução atribuiu ao Judiciário a responsabilidade de organizar e incentivar a aplicação de mecanismos e métodos de solução consensual de conflitos, alternativos aos tradicionais, até então aplicados.

O Estado também é responsável pela ressocialização dos jovens que escolheram o mundo do crime, através de políticas sociais voltadas para a reeducação, gerando assim, a prevenção e o amparo. Portanto, este é o principal responsável por prover infraestrutura nas ações de ressocializações, disponibilizando equipamento necessários para gerar educação exemplar, e suporte às famílias. Ressalta-se que há diversas maneiras de modificar o caminho dos jovens infratores. A sociedade e a família precisam se juntar para amparar o jovem infrator falho, que apesar de suas condutas negativas, são indivíduos em formação, que precisam de cuidados especiais, atenção, dedicação e assistência (Rodrigues; Souza, 2016).

Importante destacar que a ressocialização deve ser encarada como um conjunto de ações que envolvem o Estado, a família e a sociedade que juntas devem buscar pela mudança de postura do infrator, conscientização de seus atos reprováveis e oportunidades de mudança de comportamento através de oportunidades de à eles disponibilizadas. É fundamental que os jovens em processo de ressocialização encontrem na sociedade opções para recomeçar.

Para os juízes, que têm se capacitado para aplicá-la, a Constelação permite que a Justiça ofereça outras soluções ao litígio que não somente a sentença, que soluciona o problema de forma momentânea, mas, soluções que permitem viabilizar a paz, de forma que o conflito seja visto e compreendido pelas partes. A Constelação Familiar pertence a mãos responsáveis. O constelador deve estar diante das pessoas e da vida de forma consciente, cuidadosa, respeitosa e aberta, atento aos detalhes. Esta é a tarefa de aprendizagem, de observar o não falado. O constelador atua na vida prática com as ordens do amor e com as ordens de ajuda. (Bitencourt, 2019, p.1).

Com a entrada em vigor do atual Código de Processo Civil, a utilização de meios que facilitem e estimulem a resolução dos conflitos de forma consensual recebeu grande incentivo, a fim de descongestionar o sistema judiciário.

Por esta inovação hoje é possível a utilização das Constelações Familiares como alternativa de medida restaurativa para recuperação e ressocialização dos envolvidos.

A Constelação Sistêmica, à primeira vista, encaixa-se perfeitamente dentro do paradigma de humanização do direito, tratando-se de uma terapia fenomenológica que trabalha relações de forma a encontrar os fatores causadores de uma desordem. (Scheider, 2007).

A técnica, utilizada como instrumento de medida restaurativa, aplicada ao processo de ressocialização de infratores, além de contribuir com a melhoria da condição de vida do constelado, traz reflexos no Judiciário, visto que a partir do momento que o jovem entende quais são as causas ou o problema que o leva a delinquir, ele pode mudar de comportamento e, por consequência ter um novo recomeço.

5.   APLICABILIDADE DA CONSTELAÇÃO SISTÊMICA COMO ALTERNATIVA DE RESSOCIALIZAÇÃO

A Constelação já é adotada no Judiciário como alternativa de resolução de conflitos em diversas áreas. Está vinculada ao Direito Sistêmico e busca encontrar a verdadeira solução do conflito, considerando as verdadeiras razões que o ocasionaram.

A terapia ocorre em um local onde haja espaço para um grupo de pessoas e sua movimentação. Sempre haverá um terapeuta que comanda a sessão, chamado de constelador/facilitador. A sessão ocorre em forma de movimentos: a energia surge do inconsciente do constelado e um grande fenômeno acontece (Ramos, 2017, p.1).

A Constelação é dinâmica e os representantes se movimentam no espaço delimitado, comandados por um terapeuta ou constelador.

Sobre o método, há possibilidade de ser realizada individual ou em grupo, havendo a seguinte distinção de uma técnica para a outra:

Uma constelação pode ser realizada em grupo ou individualmente. No método individual, são utilizadas representações simbólicas, que podem ser bonecos, cartas, almofadas, entre outros elementos. Nesse caso, explica Luci, ocorre uma sinergia muito grande entre terapeuta e constelado, pois o processo e as imagens internas de quem está sendo tratado podem ser atentamente acompanhados pelo constelador, por meio da observação corporal, da expressão dos sentimentos e das falas. Já quando a terapia é aplicada em grupo, deixam-se de lado esses elementos representativos e são os participantes da sessão que simbolizam os laços familiares e as situações de conflito. Ou seja, em vez de o constelado eleger, por exemplo, uma carta, uma almofada ou um boneco que simbolize o pai, ele escolhe um indivíduo do grupo para isso. (Rios; Sócrates, 2018, p.1).

Conscientes das formas como ocorre o procedimento, bem como das vantagens que o uso das constelações apresenta aos participantes desse método, é que no âmbito judicial tais terapias têm ganhado força.

Além disso, é possível afirmar que as técnicas de constelação sistêmica em muito se assemelham à mediação, amplamente incentivada no ordenamento processual nacional, visto que:

Os preceitos básicos para atuação de um mediador se une aos dos consteladores, em uma espécie lógica e próxima, no que tange estes estarem em contato direto ao sentimento do paciente em questão. A mediação é como “uma terapia constelar”, obviamente, com menos técnicas “espirituais e sentimentais” aplicadas, porém, vale dizer, que se equipara sim e tem, também, grandioso resultado quando bem direcionado (Ramos, 2019, p.2).

Apesar de semelhantes as técnicas de Mediação e Conciliação, a Constelação é tema novo, o qual está sendo inserido no contexto judiciário devido sua característica de revelar aquilo que está oculto e com isso, trazer a consciência a causa do problema que até então estava inacessível no campo morfogenético dos envolvidos. O campo morfogenético do indivíduo é acessado durante o procedimento da Constelação. É este campo que estão as informações ocultas (inconscientes) do indivíduo.

Os campos mórficos de todas as espécies têm a sua história e contêm uma memória intrínseca dada pelo processo que chamo de ressonância mórfica. Essa ressonância se estabelece pela semelhança entre os padrões de atividade dos sistemas auto- organizadores. A ressonância mórfica se dá no espaço e também no tempo, do passado para o presente. Através da ressonância mórfica, cada indivíduo de uma espécie faz uso da memória coletiva da espécie e contribui para essa memória. (Sheldrake, 2004, p. 296).

Ao acessar esse campo o indivíduo toma consciência daquilo que estava oculto e partir do acesso destas informações tem a possibilidade de compreender por que determinadas atitudes e comportamentos são repetidos em seu sistema ou porque se predispõe a determinadas condutas, mesmo que reprováveis social e legalmente.

A partir dessa premissa os membros do sistema sentem alívio, conforto e força para mudança de postura, que se reflete em todos aqueles que pertencem a este sistema. Todos encontram a paz.

Desta forma, é possível compreender que aquilo que antes era excluído por desconhecimento ou por um segredo, por exemplo, vem à luz e o indivíduo consegue se libertar pois acolheu o que o influenciava inconscientemente, como já dito, a memória coletiva do grupo que o conflito está inserido.

O que há de extraordinário nas constelações familiares é primeiramente o próprio método. É singular e fascinante observar, quando um cliente coloca em cena pessoas estranhas para representar seus familiares em suas relações recíprocas, como essas pessoas, sem prévias informações, vivenciam sentimentos e usam palavras semelhantes às deles e, eventualmente, até mesmo reproduzem os seus sintomas.  Quando os representantes são instados a expressar em movimentos o que sentem, eles frequentemente exprimem uma dinâmica da alma que revela destinos ocultos, que o próprio cliente desconhecia. (Scheider, 2007, p. 11).

É através deste procedimento que nasce no constelado a consciência do que gera o conflito interno que resulta na(s) conduta(s) reprovável(is), que sendo reconhecido, não tem mais razão de ser.

O próprio Hellinger afirma que a aplicação do método alternativo de resolução de conflitos, com base nas Leis Sistêmicas, seria propícia para combater a reiteração de atos infracionais, vejamos:

Nesse tocante, a aplicação das Leis Sistêmicas como método alternativo de resolução de conflitos seria propícia para combater a reiteração em atos infracionais e indicar as medidas socioeducativas mais adequadas, já que a técnica consteladora trabalha o sistema familiar de forma a expor os emaranhamentos emocionais ocultos, que podem ser causadores de divergências comportamentais. (Hellinger, 2003)

Isto pois, conforme já demonstrado alhures, a Constelação busca a inclusão, não a exclusão dos membros de um sistema e, comumente quando um indivíduo pratica uma conduta contrária a consciência social e coletiva, ele é excluído, julgado, levando o indivíduo a reiteração dos atos cometidos ou cometimento de outros, por vezes até mais graves e reprováveis, vejamos:

Ao passar por algum conflito, a pessoa sente-se perdida e pode alterar seu comportamento e, assim, a sociedade passa a excluí-la, evitando que ela provoque situações indesejáveis. No entanto, essa não á a solução viável para quem pede socorro, ainda que involuntariamente, sendo que é nesse momento que entra a solução sistêmica, ou seja, cada um precisa ser atendido conforme o seu problema, tendo como base a Constelação Sistêmica Familiar, cuja finalidade é buscar decisões judiciais mais humanizadas e harmoniosas entre os envolvidos, analisando as dificuldades pessoais envolvidas na ação. (Alves, Costa, Gimenez, 2019, p. 53).

É neste sentido que a aplicação das Constelações como alternativa de ressocialização pode ser adotada como uma alternativa para ressocialização.

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça, desde 2018, 16 Estados e o Distrito Federal aplicam Constelação Familiar nos procedimentos judiciais. (CNJ, 2018). Algumas Comarcas já adotam essa metodologia como alternativa, vejamos:

A 1ª Vara Civil e da Infância e Juventude de João Monlevade – Minas Gerais, lançou o Projeto Laços de Família, para atender as situações envolvendo crianças e adolescentes, tanto os que estão em situação de risco e vulnerabilidade emocional quanto aos de apuração de ato infracional oriundos do juízo da Infância e da Juventude. O Coordenador do Centro Judiciário de Resolução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) e titular da 1ª Vara Cível e da Infância e Juventude de João Monlevade, juiz Estevão José Damazo, afirma que: diante da complexidade dos casos que tramitam nas varas da infância e juventude, nem sempre as decisões judiciais se mostram suficientes para a resolução dos conflitos e para a pacificação familiar e social. É importante que, de forma ampla, o Poder Judiciário, junto à rede de atendimento e proteção às crianças e adolescentes, às instituições públicas e privadas, adotem novas formas de parceria e ferramentas. (TJMG, 2021).

De acordo com o magistrado, inicialmente foi escolhida a competência civil e infracional para aplicação do projeto, tendo em vista a prioridade absoluta prevista na Constituição Federal. Sobre a Constelação Sistêmica Familiar, afirma o magistrado que:

Por meio dessa metodologia, é possível conscientizar as partes sobre os problemas vivenciados, de forma que seja possível alcançar o restabelecimento dos laços familiares. Esse método psicoterapêutico é capaz de auxiliar na busca do equilíbrio pelas famílias, de modo que cada membro tenha consciência de seu papel e possa passar a exercê-lo em harmonia com os demais conviventes. (TJMG, 2021).

As práticas iniciaram-se em agosto de 2021, após a regulamentação para adoção do método pelo TJMG. Tal regulamentação norteia a aplicação das constelações nos CEJUSCS do Estado e também nas iniciativas que envolvam a justiça restaurativa. O Juizado Especial da Infância e da Juventude de Cuiabá iniciou a aplicação de oficinas de Direito Sistêmico em agosto de 2019.

O principal objetivo da atividade é resolver ou amenizar os problemas decorrentes da falta de estrutura familiar. Um dos participantes da oficina foi um adolescente de 16 anos, usuário de drogas, filho de um policial militar e de uma mãe que fazia uso de drogas que faleceu, realizou um assalto para chamar atenção. O pai que acompanhou o processo assim afirmou:

Foi excelente. Tem que abrir o coração dessa gurizada mesmo. Eu senti isso, que ele abriu o coração, expôs o que sente, o que quer e não quer. Agora cabe a ele fazer a escolha. Pode ser uma nova visão de vida, está com mais uma oportunidade, se não aprender terá que continuar respondendo pelos seus erros. Foi muito importante, saio esperançoso daqui. (Poder Judiciário de Mato Grosso, 2019).

A Coordenadora do CEJUSC de Cuiabá, assim explicou a funcionalidade da oficina, conseguimos perceber o desequilíbrio familiar por meio do ato infracional. Após o diálogo restaurativo identificamos a ausência ou carência em determinada família e encaminhamos à pratica a ser realizada. Elas podem utilizar ferramentas como o Círculo de Construção de Paz, Constelação e Mediação entre familiares. A Justiça Restaurativa atua como protetiva e isso independe da sentença que irei aplicar. Temos a advertência, liberdade assistida, semiliberdade e internação, e o Estatuto da Criança ainda prevê a aplicação de uma medida de proteção (Oficina de direito Sistêmico). Um dos objetivos é fazer com que o infrator/agressor se coloque no lugar da vítima e assim evitemos que volte a cometer delitos. A partir do momento que o adolescente se sente pertencente, que ele se empodera e toma uma escolha diferente, ele retorna ao seio familiar. Por isso temos que fortalecer as famílias. (Poder Judiciário de Mato Grosso, 2019).

Outra experiência de práticas de Constelações Familiares é aplicada aos reeducandos e servidores do Centro de Ressocialização (CR) de Atibaia, que participam de sessões de Constelação Familiar, por meio do projeto PertenSer.

Os encontros estão acontecendo uma vez por mês, ministrados por uma terapeuta familiar. De acordo com a Secretaria Administrativa Penitenciária do Estado de São Paulo (2023), o projeto consiste em auxiliar os participantes a identificar padrões comportamentais, dar apoio emocional, criar empatia e promover o autoconhecimento. Um dos reeducandos, participante do projeto assim se manifestou:

O momento foi importante para que eu pudesse ressignificar a minha dor. Eu me perdoei e isso me permitiu encarar a representação dos meus pais como se eles estivessem presentes. O meu pai faleceu há 14 anos, já a minha mãe está viva, com 82. Estou me sentindo reconciliado com a minha família. (Secretaria Administrativa Penitenciária do Estado de São Paulo, 2023).

Esse relato demonstra que o objetivo da prática foi alcançado, ao proporcionar ao reeducando a oportunidade de se reconciliar com sua família, mesmo sem a presença física dos pais, já falecidos.

É fato notório que o reeducando, através da prática entendeu quais são os motivos que o levaram a conduta que o levou a reeducação.

Todo o processo se deu pelo campo sistêmico familiar do constelado que agora, consciente e leve, pode retomar sua vida, livre da dor que sentia. No Distrito Federal, o Projeto Constelar e Conciliar, está em vigor no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, desde março de 2016.

6.   considerações finais

Em que pese a existência de Leis tem o condão de normatizar a conduta em sociedade e sua infringência é penalizada com sansões preestabelecidas, ou seja, o ordenamento jurídico cria a norma e ao mesmo tempo apresenta a sanção a quem não a respeita, sua aplicação não é satisfatória. Isto em termos de acesso à justiça e sua resposta ao caso concreto ou na eficácia da sanção aplicada.

A conduta ilícita praticada por menores de 18 anos é regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que estabelece medidas socioeducativas que objetivam a responsabilização do menor pelo ato praticado e sua ressocialização, que nem sempre, alcançam seu fim.

Muito embora a sociedade clame por uma punição, a fim de penalizar aquele que desrespeita as regras de convívio em sociedade, a eficiência destas medidas é objeto de questionamento, uma vez que ela é imposta pelo judiciário e o apenado muitas vezes não compreende o caráter ilícito de seu ato. Assim, o Direito Sistêmico, através das Constelações Sistêmicas surge como uma alternativa para ressocialização destes jovens.

Referida prática vem ganhando corpo no judiciário, nas mais diversas áreas, como família, sucessão e empresarial.

Restou comprovado no decorrer deste trabalho que o indivíduo, mesmo desconhecendo a história de sua família ou do ambiente que está inserido, é influenciado pela denominada consciência coletiva ou campo morfogenético de seu sistema.

Esse método, ao ser adotado para ressocialização de menores infratores e seus familiares pode oportunizar um novo recomeço, uma nova trajetória, exatamente aquilo que as medidas de socioeducativas almejam, mas que permanecem no campo do mundo material, apenas. Neste sentido, ao observar os exemplos de práticas de aplicação das Constelações em infratores, é possível verificar que aquilo que a técnica se propõe é alcançada.

Por tais razões, considero ser possível adoção da Constelação Sistêmica como alternativa de prática restaurativa para ressocialização para menores infratores.

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[1]Acadêmica do Curso de Direito da Faculdade Educacional de Medianeira – UDC Medianeira.

[2] Doutor em Desenvolvimento Sustentável. Mestre em Direito. Professor do Curso de Direito da Faculdade Educacional de Medianeira – UDC Medianeira.

[3] Doutora em Desenvolvimento Sustentável. Mestre em Direito. Professora do Curso de Direito da Faculdade Educacional de Medianeira – UDC Medianeira.