A IMPORTÂNCIA DA IMPLEMENTAÇÃO DA LGPD NO ÂMBITO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO E QUESTÕES ATINENTES A DADOS PESSOAIS SENSÍVEIS DOS EMPREGADOS NAS ORGANIZAÇÕES DE TENDÊNCIA
30 de dezembro de 2024THE IMPORTANCE OF IMPLEMENTING THE LGPD IN THE CONTEXT OF LABOR RELATIONS AND ISSUES RELATING TO SENSITIVE PERSONAL DATA OF EMPLOYEES IN TREND ORGANIZATIONS
Artigo submetido em 12 de novembro de 2024
Artigo aprovado em 25 de novembro de 2024
Artigo publicado em 30 de dezembro de 2024
Cognitio Juris Volume 14 – Número 57 – Dezembro de 2024 ISSN 2236-3009 |
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Autor(es): Jéssica Thuany de Moura Lima[1] |
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RESUMO: Este artigo visa explorar a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no ambiente de trabalho, focando em organizações com fortes viéses políticos ou religiosos. O problema central reside na compatibilidade entre a preservação dos dados pessoais sensíveis dos empregados e as práticas de instituições que possam impor ou refletir tendências ideológicas. Assim, investiga-se o papel da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) na regulação, bem como os benefícios e desafios de implementar a LGPD nas relações trabalhistas. Conclui-se que a proteção de dados fortalece o respeito à privacidade, mesmo em cenários onde o perfil ideológico da organização influencia as práticas de gestão de pessoal, promovendo equilíbrio entre o respeito à identidade do trabalhador e o alinhamento às diretrizes institucionais.
Palavras- chave: Lei Geral de Proteção de Dados, empresas, organizações de tendência.
ABSTRACT: This article aims to explore the application of the General Data Protection Law (LGPD) in the workplace, focusing on organizations with strong political or religious biases. The central issue lies in the compatibility between safeguarding employees’ sensitive personal data and the practices of institutions that may impose or reflect ideological trends. The role of the National Data Protection Authority (ANPD) in regulation is examined, along with the benefits and challenges of implementing the LGPD in labor relations. It concludes that data protection strengthens respect for privacy, even in settings where the organization’s ideological profile influences personnel management practices, promoting a balance between respect for worker identity and alignment with institutional guidelines.
Keywords: General data protection law, companies, trend organizations.
INTRODUÇÃO
A criação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) foi impulsionada pelo crescimento das interações virtuais, o que resultou em uma maior exposição de dados e, consequentemente, na necessidade urgente de uma proteção mais robusta da privacidade – um direito já previsto constitucionalmente. No contexto das relações trabalhistas, a proteção de dados dos trabalhadores tornou-se ainda mais relevante, uma vez que as empresas coletam informações pessoais dos empregados que devem ser utilizadas estritamente para os fins previamente acordados.
Para se adequar a essa nova realidade, as empresas precisaram se adaptar, muitas vezes contratando profissionais especializados para garantir o cumprimento da lei, sob o risco de sanções legais. Na prática, a implementação de sistemas de controle de vazamento de dados traz benefícios coletivos significativos, pois o controle de informações se tornou fundamental para a soberania nacional, como demonstrado em episódios de manipulação de dados, como nas recentes eleições norte-americanas. Dessa forma, a LGPD concretiza o direito constitucional à privacidade, aplicando-o de forma prática e efetiva.
Contudo, nas organizações de tendência ideológica, surge o desafio de equilibrar a liberdade econômica com a propagação de suas ideologias – frequentemente de cunho político, social ou religioso – enquanto se garante o acesso restrito aos dados sensíveis dos trabalhadores. Assim, torna-se necessário limitar o tratamento de dados exclusivamente aos fins essenciais para a manutenção da organização dentro de seu perfil ideológico, assegurando a privacidade do trabalhador e o respeito aos limites da finalidade no contexto dessas organizações peculiares.
Tem-se, pois, que se chegar ao mérito da necessidade de limitação da prospecção desses dados pautados tão somente nos limites da finalidade imposta à necessidade de manutenção da empresa adstrita a organização tendenciosa.
- HISTÓRICO DA IMPLEMENTAÇÃO DA LEI NO BRASIL E AS QUESTÕES CORRELATAS AS RELAÇÕES TRABALHISTAS
A Lei Geral de Proteção de Dados -LGPD (Lei nº 13.709/2018) foi criada para coibir, de forma justa e necessária a exposição de dados, evidenciando algo que já estava previsto de forma constitucional desde 1988, sobre as questões correlatas ao direito à privacidade (art. 5º, inc. X).
Não podendo perder de vista o histórico da implementação da referida lei, que não surgiu de forma desconectada do avanço da utilização da internet e exposição constante de dados.
Isto porque, entre 1989 e 1990 o Brasil conseguiu implementar o domínio de sites por meio do “br” e, dentre outras conquistas, também abriu espaço para o avanço da internet em território nacional, e também possibilitou a busca e troca de dados de forma internacional.
Em 1994 o Brasil passa a destinar mais investimentos na tecnologia e em 1995 a Embratel de modo exclusivo passa a disponibilizar o serviço de internet; referido mercado avança em 1996 com mais disponibilidade de domínios e já em 1998 o Brasil contava com mais de 2,1 milhões de usuários.
De lá pra cá, o acesso a internet tem se modernizado, modificando por completo a vida dos indivíduos, que passaram a ser quase que completamente dependente do mundo conectado à `internet, se sub-rogando a intrínseca necessidade de viver dela e por ela.
De forma evidente, o direito surge com a civilização por meio do conflito de interesses e a necessidade de regulamentação do meio social. De modo que, nessa situação não poderia ser diferente. Para Montesquieu (1979, p. 25):
As leis, em seu significado mais extenso, são as relações necessárias que derivam da natureza das coisas; e, nesse sentido, todos os seres têm suas leis, a Divindade possui suas leis, o mundo material possui suas leis, as inteligências superiores ao homem possuem suas leis, os animais possuem suas leis, o homem possui suas leis.
Impera, portanto, o entendimento de que diante de novas relações e novos conflitos é natural o surgimento de novas leis.
Dessa forma, o referido “mundo da internet” e a praticidade por ele ofertada, geraram conflitos e uma nova forma de vivenciar a experiência no meio social, por isso, também gerou um marco, que foi denominado como o sendo “Marco Digital da Internet”. (Pratti, Gabriela e Mariana Soares,2024 p.125) afirmaram que:
Mesmo diante de inúmeras questões novas surgindo todos os dias, a primeira lei específica sobre a internet, surgiu apenas em 23 de abril de 2014, visando estabelecer princípios e garantias, direitos e deveres para o usuário. Essa lei ficou conhecida como marco civil da internet -MCI- Lei nº 12.965/2014.
Juntamente com a referida lei, estava tramitando a Lei Geral de Proteção de Dados no Congresso, que só veio a ser sancionada em 14 de agosto de 2018, ano em que se criou a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) – Lei nº 13.709/2018.
A referida lei, buscou o enfoque maior na privacidade Garcia, Lara R (2020. Pg. 17), traz uma diferenciação do que seria a privacidade e distinção entre a intimidade:
Neste 2º artigo da lei, o primeiro fundamento é a privacidade. É importante destacar que proteção de dados e privacidade são questões diferentes. Por exemplo, se uma pessoa publicar um dado em sua página pessoal numa rede social, ele se torna público. Entretanto, isso não significa que esse dado pode ser utilizado indiscriminadamente. Aquele que vier a utilizá-lo, deve respeitar os direitos do Titular do dado, previstos na LGPD. Tais dados, portanto, não estão sob a égide do princípio constitucional da privacidade, mas sim sob o escopo da proteção de dados.
Sob o olhar constitucional, o direito a privacidade seria a forma como um dado pessoal é utilizado, respeitando a vontade do seu particular.
Nesse formato, essa lei é aplicável a qualquer operação de tratamento realizada por pessoa natural ou jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de comercializar bens ou serviços que envolvam o fornecimento, tratamento, ou qualquer outra atividade correlata que envolva a utilização de dados de indivíduos localizados em território nacional.
Portanto, o referido regramento se aplica as relações de trabalho executadas ou que envolvam trabalhadores localizados no Brasil, uma vez que, embora não seja em si uma legislação trabalhista, seus impactos sobre a relação de trabalho são enormes, uma vez que a relação trabalhista envolve, dentre outras coisas, a coleta, transmissão e tratamento dos dados de trabalhadores para organização funcional.
Referidos dados, caso comercializados ou vazados sem os critérios obedecidos na lei, podem causar sérios danos a vida dos trabalhadores.
Assim, a análise e implementação da LGPD esbarra nas questões correlatas a matéria trabalhista.
- LGPD E DIREITO DO TRABALHO – COMO SE DESTINA?
Como já dito, o enfoque da LGPD (Lei nº 13.709/2018) está na preservação dos dados, no tocante as relações de trabalho, resguarda a disponibilidade dos dados dos trabalhadores para fins econômicos obtidos pela empresa.
Quando o possível empregado, ainda no caráter de pré-seleção a empresa disponibiliza seus dados ao RH, por si só resta caracterizada a obrigação de zelo e cuidado no tratamento estando nos conformes à lei aplicável a proteção das informações, principalmente, as informações sensíveis.
Nesse sentido, Neves; Guilherme (2024. p. 130) ressalta que a inspiração da lei de proteção de dados brasileira foi a legislação aplicada a proteção de dados europeia e que, nesse contexto, a garantia da finalidade da solicitação.
A Lei Geral de Proteção de dados no Brasil foi inspirada na legislação da União Europeia GDPR (do inglês, General Data Privacy Regulation, aplicável nos países do bloco desde maio de 2018). Uma das principais características da GDPR na Europa é garantir que o usuário, real detentor dos seus dados pessoais, saiba exatamente qual é a finalidade para a solicitação de tais informações. Como as áreas de aquisição de talentos utilizam dados de candidatos para realizar seus processos, este departamento é um dos mais impactados pela GDPR na Europa como pela LGPD no Brasil.
Ou seja, a lei tenta garantir que aquele que fornece seus dados saiba qual o objeto para o qual eles serão utilizados.
Nas relações de trabalho, desde o processo de contratação do empregado é papel crível da empresa demonstrar aos candidatos a real necessidade e o que será feito com os dados ali coletados.
Sendo que a empresa, a depender de sua capacidade de operação poderá atribuir a um encarregado de dados, ou seja, uma pessoa contratada para coletar e melhor selecionar os dados dos possíveis colaboradores, bem como tratar e melhor fornecer informações no processo de seleção ou até mesmo, para estabelecer qual o melhor tipo de trabalho para aquele perfil de trabalhador. Porém, a referida aferição merece cuidados nos moldes da legislação de dados atual. Conforme entendimento da Adriane (2022,p. 23):
No Brasil, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) poderá estabelecer normas complementares sobre a definição e as atribuições do encarregado (DPO), inclusive hipóteses de dispensa da necessidade de sua indicação, conforme a natureza e o porte da entidade ou o volume de operações de tratamento de dados. Uma empresa pode ter tanto um funcionário contratado como CLT ou contratar o serviço prestado por outra pessoa jurídica.
Cada contrato e situação poderão prever um determinado direito se não for corretamente verificado, dessa forma nota-se que no Brasil está ocorrendo uma evolução no que diz respeito à proteção dos dados pessoais com novas funções e atribuições para o tratamento correto dos dados.
Resta definido, portanto, que a LGPD nas relações de trabalho se destina a conservação dos dados dos trabalhadores aplicados ao à finalidade que lhes foram descritas quando da sua solicitação, sendo que qualquer outro tratamento dado a esses dados pode configurar violação literal ao regramento atual.
- A LGPD E O IMPACTO ATÉ O MOMENTO NAS RELAÇÕES DE TRABALHO – FISCALIZAÇÃO EFETIVA DA ANPD.
Não é possível falar em impacto sem antes observar o literal dispositivo da lei que traça as sanções e autoridade – Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD)- competente para imposição de sanções cabíveis:
Art. 31. Quando houver infração a esta Lei em decorrência do tratamento de dados pessoais por órgãos públicos, a autoridade nacional poderá enviar informe com medidas cabíveis para fazer cessar a violação.
Art. 32. A autoridade nacional poderá solicitar a agentes do Poder Público a publicação de relatórios de impacto à proteção de dados pessoais e sugerir a adoção de padrões e de boas práticas para os tratamentos de dados pessoais pelo Poder Público.
Quanto às sanções cabíveis a LGPD estabeleceu por meio do Art. aplicáveis, dentre elas, a depender da gravidade uma multa no valor de 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais). De modo a completitude do que poderia resvalar o “impacto” da aplicação da referida lei, colaciona-se o artigo em sua íntegra:
Art. 52. Os agentes de tratamento de dados, em razão das infrações cometidas às normas previstas nesta Lei, ficam sujeitos às seguintes sanções administrativas aplicáveis pela autoridade nacional:
I – advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas;
II – multa simples, de até 2% (dois por cento) do faturamento da pessoa jurídica de direito privado, grupo ou conglomerado no Brasil no seu último exercício, excluídos os tributos, limitada, no total, a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) por infração;
III – multa diária, observado o limite total a que se refere o inciso II;
IV – publicização da infração após devidamente apurada e confirmada a sua ocorrência;
V – bloqueio dos dados pessoais a que se refere a infração até a sua regularização;
VI – eliminação dos dados pessoais a que se refere a infração;
X – suspensão parcial do funcionamento do banco de dados a que se refere a infração pelo período máximo de 6 (seis) meses, prorrogável por igual período, até a regularização da atividade de tratamento pelo controlador; (Incluído pela Lei nº 13.853, de 2019)
XI – suspensão do exercício da atividade de tratamento dos dados pessoais a que se refere a infração pelo período máximo de 6 (seis) meses, prorrogável por igual período; (Incluído pela Lei nº 13.853, de 2019)
XII – proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados. (Incluído pela Lei nº 13.853, de 2019)
§ 1º As sanções serão aplicadas após procedimento administrativo que possibilite a oportunidade da ampla defesa, de forma gradativa, isolada ou cumulativa, de acordo com as peculiaridades do caso concreto e considerados os seguintes parâmetros e critérios:
I – a gravidade e a natureza das infrações e dos direitos pessoais afetados;
II – a boa-fé do infrator;
III – a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator;
IV – a condição econômica do infrator;
V – a reincidência;
VI – o grau do dano;
VII – a cooperação do infrator;
VIII – a adoção reiterada e demonstrada de mecanismos e procedimentos internos capazes de minimizar o dano, voltados ao tratamento seguro e adequado de dados, em consonância com o disposto no inciso II do § 2º do art. 48 desta Lei;
IX – a adoção de política de boas práticas e governança;
X – a pronta adoção de medidas corretivas; e
XI – a proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção.
Cumpre esclarecer que muito se esperou quanto a aplicação da referida lei e os impactos que ela poderia gerar no meio social como um todo, porém, até o presente momento, muito embora o esforço pela adequação de alguns setores da economia, o que se tem é uma lei com pouca eficácia no sentido pragmático.
Entretanto, com enfoque nas relações de trabalho, Climaco; Emerson (2024. p. 71) ressalta que quanto a fiscalização do uso de dados dos trabalhadores um dos impactos a serem observados é a correto armazenamento das informações com o fito de resguardar os interesses dos trabalhadores e da própria empresa, para ele:
As adequações para o zelo e informações pessoais é um dever de todos, seja empresa privada ou órgão público. Seu meio de armazenamento deve ser seguro, seja digital ou físico. E, por fim, seu meio de transferência deve ser adequado, seja por meio de website ou por meio de programas e aplicativos.
Com a vigência da lei, e a imposição da fiscalização de dados pela ANPD frente a atuação das empresas nas relações de trabalho, criou-se a figura do controlador de dados[2], que é o responsável por fornecer todas as informações e relatórios ao órgão regulamentador, bem como esclarecer qualquer ocorrência, se constatado alguma irregularidade, a empresa sofrerá sanções e os responsáveis pelo referido vazamento, poderão sofrer ações regressivas. Nesse interim, LIMA, Adrianne (2022 p.21) discrimina as sanções aplicáveis aos empregadores:
O empregador, por sua vez estará sujeito a inúmeros riscos com consequências, vejamos: uma ação trabalhista com pleito de obrigações de fazer ou não fazer por práticas discriminatórias na obtenção ou no uso da informação relativa ao empregado ou dano moral individual ou coletivo por práticas discriminatórias quanto as que são de algum modo ilícitas (vazamento de dados pessoais sigilosos) poderá ser procedente com indenizações pecuniárias de danos morais e materiais, podendo inclusive a expedição de ofícios denunciativos pelo juiz para averiguação da conduta ilícita da empregadora pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) que concomitantemente fará sua análise do descumprimento da LGPD podendo aplicar multas de até 2% do faturamento da empresa (limitada a 50 milhões de reais) entre outras penalidades (advertência, suspensão, publicização etc.). O Ministério Público do Trabalho poderá ser envolvido na hipótese de repercussão social com riscos aos empregados podendo inclusive determinar a feitura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).
Evidencia-se que, além das sanções aplicáveis quanto ao uso incorreto dos dados dos trabalhadores, o impacto da validade da legislação criou a figura do “controlador” e do “encarregado”[3] na empresa, que devem se adequar para com o zelo quanto às informações pessoais dos empregados e o dever de armazenar em local seguro e, principalmente, transferir, tratar ou realizar qualquer atividade com a coleta de dados correspondentes àquelas previstas na lei.
- DA NECESSIDADE E ETAPAS DE IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE PROTEÇÃO DA LGPD NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS
Diante dos impactos com a vigência da LGPD, resta inferido que as empresas, de modo geral, tiveram que se adequar a sistemática de fiscalização, inclusive, com o surgimento de uma categoria de profissionais voltados a preservação dos dados coletados, nesse interim, todas as empresas seja ela de grande ou pequeno porte que quiseram se adequar, tiveram que investir em conhecimento e nos profissionais especialmente para essa finalidade. No tocante à cadeia de ações à serem estabelecidas, Neves; Guilherme (2024. p. 130) corrobora com o seguinte entendimento:
Desde a atração e seleção de talentos, até o armazenamento de dados pessoais de seus funcionários e o término das relações de emprego. A maneira que uma empresa debate e entende os objetivos da lei, revisa seus processos e investe em novas tecnologias vai determinar a contribuição para os negócios atingirem resultados.
É preciso que os profissionais de RH assumam a liderança das discussões que vão impactar a vida profissional dos trabalhadores e, apresente propostas que estejam alinhadas com a missão, visão e valores da empresa. Simplesmente adequar a legislação não pode e não deve ser o único objetivo.
Do processo seletivo e mesmo após a saída do funcionário da empresa, é necessário a preservação dos seus dados, sob pena de sofrear as sanções já descritas no texto legal.
Eis que, a mera receptação dos dados é um tratamento, assim, ainda que sejam descartados, os dados coletados fazem da empresa contratante em qualquer processo seletivo, uma agente de tratamento.
Daí em diante, todas as empresas estão sujeitas a fiscalização pela ANPD.
Dessa forma, indispensável que as empresas, de um modo geral passem por etapas de implementação da proteção de dados e busquem meios de se adequar a legislação vigência, por isso, é necessário ter cautela e ainda trabalho de forma conjunta das áreas do jurídico (trabalhista) e recursos humanos, como ponto de partida para uma melhor aplicação da lei, uma vez que as equipes dos recursos humanos devem compreender que apesar de burocrática a LGPD é uma evolução e melhoria rumo a uma maior segurança dos dados que, se bem aplicada, será uma grande aliada às estratégias de pessoas da empresa. (Neves; Guilherme. p. 134).
No processo de implementação da LGPD, Lima, Montes e Samaniego (et al, 2021, p. 127), pondera quanto a obtenção de alguns dados sensíveis, tais como a ficha registro de filiação a sindicato e os atestados médicos:
No que concerne, por exemplo, à ficha de registro (que, por vezes, poderão conter dados pessoais sensíveis tais como filiação a sindicato), por força da lei de proteção de dados brasileira, será necessário limitar o seu acesso e garantir que o seu armazenamento se dará de forma segura. O mesmo raciocínio se aplica aos atestados médicos, apesar da ausência de obrigatoriedade do preenchimento do CID (Classificação Internacional de Doenças), tendo em vista que sempre haverá a possibilidade de identificação da doença ou das razões que ensejaram o afastamento, demandando, dessa forma, uma política robusta que possa assegurar o sigilo desses dados, considerados sensíveis pela LGPD.
A coleta de informações sensíveis por parte dos empregadores gera mais carga de responsabilidade sobre a efetividade do seu armazenamento, e, por via de consequência, o tratamento dele deve obedecer de forma definitiva o regramento legal que lhe é imposto.
As etapas de implementação da LGPD transcorrem, portanto, a necessidade de estruturação das empresas, com investimento nos setores de recursos humanos, bem como com a contratação de controladores e encarregados na melhor provisão e conscientização do objetivo da lei, que está na preservação da colheita de dados, principalmente os sensíveis, para que se cumpra com o objetivo previamente entabulado entre as partes quando da seleção, período trabalhado e após a saída do trabalhador da empresa.
- DOS OBJETIVOS DA IMPLEMENTAÇÃO DA LGPD NAS EMPRESAS.
O objetivo da implementação da LGPD nas relações de trabalho, é, sem dúvidas, preservar a privacidade dos trabalhadores. Isto porque, a relação trabalhista é por sua natureza, uma relação com polos desiguais de provisão de vontades, assim, muito embora não faça parte da lei que rege os trabalhadores, a proteção de dados abrange todo o ordenamento jurídico, e, nessa condição, deve ser claramente aplicada as relações de trabalho, nesse viés, Lima, Adriane (2022,p. 20) correlaciona tal aproveitamento sob uma análise constitucional:
A relação de trabalho constitui uma fonte inesgotável de dados pessoais e no tocante a proteção de dados pessoais nas relações empregatícias um dos pontos que merecem maior atenção é o atinente à categoria dos dados pessoais sensíveis. A Constituição Federal do Brasil de 1988 protege os direitos da personalidade do trabalhador e a sua condição de dignidade: “Art. 5º […] X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
No campo infraconstitucional do Direito do Trabalho brasileiro, o art. 1º da Lei n. 9.029/95 proíbe a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor, previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal de 1988.
Mesmo antes da implementação da LGPD, a proteção aos dados dos trabalhadores já estava abrangida na constituição federal por meio do Art. 5º; bem como, do uso dos dados dos trabalhadores, já havia previsão de impossibilidade de prática discriminatória (art. 1º da Lei n. 9.029/95).
Nas duas situações a maior ocorrência e finalidade material seria a preservação do uso de dados dos trabalhadores para o não cometimento de violação quando aos seus direitos fundamentais.
Pode-se concluir, portanto, que a LGPD como legislação específica veio para prevenir, respaldar e de fato estabelecer a implementação da ordem aplicada a preservação dos direitos fundamentais no uso de dados dos trabalhadores, sob esse viés é importante salientar que a legislação imposta visa proteger, antes de mais nada o comercio por meio do vazamento, que esbarra em fatores que podem expor a população a vícios de vontades quando do estudo massificado do perfil dos trabalhadores vazados.
Com efeito, o objetivo principal, sem dúvidas, é a prevenção de vazamento de dados com fulcro na preservação da intimidade e a privacidade dos trabalhadores.
- DOS BENEFÍCIOS DA IMPLEMENTAÇÃO DA LGPD;
Além da segurança entre as partes decorrentes do contrato de trabalho, a implementação da LGPD é, sem dúvidas, uma fonte de segurança da ordem nacional.
Isto porque, a segurança dos dados dos trabalhadores perpassa a ideia de que somente serão coletados os dados estritamente necessários a adequação de uma atividade previamente definida.
Nesse viés, a importância de boas práticas e governança de proteção de dados pessoais pelos empregadores, visando a proteção do empregado no âmbito laboral e mitigando o risco para os direitos e liberdades cuja probabilidade e gravidade podem ser variáveis nas operações de tratamento de dados pessoais suscetíveis de causar danos físicos, materiais ou imateriais, em especial quando o tratamento possa dar origem à discriminação.(Lima, Adrianne, 2022. P. 20).
Pode-se considerar que o maior benefício quanto a implementação da LGPD não só correlacionado às relações de trabalho como de ordem nacional resvala na preservação da democracia, uma vez que o mundo já assistiu de perto o que o vazamento de dados pode ocasionar, por exemplo, quando se fala em eleições democráticas em que um dos candidatos tem acesso à dados sensíveis do seu eleitorado:
A história conta que em 2018, nos Estados Unidos, o escândalo envolvendo a Cambridge Analytica foi noticiado pelos jornais The Guardian e New York Times depois de entrevista feita com Christopher Wylie, que trabalhou nessa agência. O vazamento de dados sensíveis de 50 milhões de usuários implicaram no favorecimento ao candidato à época, Donald Trump. A notícia terminou por recair também sobre o fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, que foi sabatinado por 5 horas no Senado Americano (Estadão, 2019).
Diante do ocorrido, as nações passaram a se preocupar cada vez mais com o uso e a violação a soberania da vontade da população em detrimento do acesso dos dados principalmente os de natureza sensível, e, diante dessa maior atenção o conceito de privacidade tem sofrido avanços e maior cuidado na tutela dos direitos.
A LGPD, além de tutelar direitos intrínsecos aos trabalhadores, sob um viés laboral é indispensável em qualquer âmbito possibilitando, inclusive, para o Brasil atingir a compatibilidade em proteção de dados com a GDPR e a LGPD consolidar muitas garantias e direitos que eram tratados anteriormente de forma esparsa, trazendo maior estabilidade e segurança jurídica para o país, visando, ainda, à concretização dos direitos fundamentais do titular dos dados.” (Gaspar, Gabriela, 2021).
Pode-se, por assim dizer, que a LGPD retirou do ordenamento jurídico uma norma constituidora de cláusula pétrea do abstratismo constitucional e deu a ela real aplicação com fulcro na objetivação da garantia ao acesso da privacidade, e, mais que isso, da soberania nacional.
- DO TRATAMENTO DE DADOS PESSOAIS SENSÍVEIS E OS EMPREGADOS NAS ORGANIZAÇÕES DE TENDÊNCIA.
Nesse capítulo central, veremos que o tratamento de dados tão caro a sociedade, contém certas especificidades quanto as organizações de tendência, uma vez que concentram um viés excêntrico quanto a necessidade de coleta de dados específicos para o seu funcionamento.
Referida excentricidade faz dela uma empresa que detém convergência a imposição de seu papel social correlatos a viabilidade dos seus interesses enquanto organização tendenciosa e, ao mesmo tempo, deve respeitar seus trabalhadores quanto a preservação dos dados sensíveis.
O referido estudo visa apresentar o caráter diferenciador do tratamento de dados pessoais sensíveis nas relações de trabalho voltadas para as organizações de tendência, suas principais características e diferenças das empresas acima supramencionadas, no caráter geral.
- DAS ORGANIZAÇÕES DE TENDÊNCIA E SEU PAPEL SOCIAL.
As organizações de tendência são empresas independente do modo societário, fundações e associações conhecidas pelo seu caráter ideológico definido, autorizadas pela lei ante o acesso à livre iniciativa que autoriza o empregador a gerir seu negócio de forma cultural específica, não vedada em lei.
Para Pugliesi, Márcio. (2023. p. 245), o conceito de ideologia seria:
A ideologia, subsistema da cultura, percorre o mesmo iter: as ideias não estão desvinculadas da realidade que por sua vez, de alguma forma, a elas se vincula.
A ideologia é produzida enquanto vivida, sendo assim, tradicional e dinâmica, e integra o passado e o futuro, dando sentido para a realidade histórica e social, embora não componha a única possibilidade interpretativa vez que é dependente da realidade social a que se dá sentido.
Nesses moldes, a manutenção de uma organização de tendência uma vez que esta é pautada na ideologia, só é possível com a vivência dinâmica e integra no passado e no futuro de suas tradições e história, salvo contrário, resta impossibilitado o funcionamento desse tipo de empresa.
Gimeno, Francisco (1986, p..6) coloca de forma geral o que a doutrina entende sobre o conceito das organizações:
No que tange, especificamente, às Organizações de Tendência, a maior parte da doutrina estrangeira apresenta conceitos vagos do que seriam propriamente essas organizações, note-se: aquelas organizações cuja finalidade é realizar programas ideológicos ou de crença; as empresas com fins políticos, religiosos, sindicais, culturais ou cuja atividade seja indissolúvel de um determinado postulado ideológico; empresas ou atividades que implicam a defesa ou o acatamento de um determinado princípio ideológico; empresas criadoras ou sustentadoras de uma determinada ideologia em função da qual existem e cuja própria estrutura organizativa é senão uma forma de manifestação daquela e também as empresas privadas que administram bens ou serviços de componente quase exclusivamente ideológico”
Pode-se assim dizer, que enquanto as demais empresas colocam o lucro acima de qualquer outro “ganho”, as organizações de tendência têm como maior objeto a difusão, propagação e vivência de sua ideologia.
Ideologia essa que pode ter várias raízes, quer sejam históricas, políticas, jurídicas, esportiva, religiosa ou qualquer outra atividade que se vincule ao propósito da existência humana agregada àquele conjunto de pessoas.
Por assim dizer, as Organizações de Tendência podem ser definidas como aquelas cuja a finalidade é a difusão de determinada ideologia, independente de lucro, formadas por pessoas (ou apenas por uma pessoa) que se utilizam dessa para expressar seu pensamento, credo, religião ou ideologia, vale dizer, são instrumentos de realização de direitos fundamentais de seu titular, embasados pela livre-iniciativa, liberdade de associação, plasmando, dessa forma, o pluralismo, tão caro às sociedades democráticas contemporâneas. (Gaspar, Gabriela, 2021).
Por assim dizer, o papel das organizações de tendência é viver de um propósito que agregam pessoas que detém a mesma correspondência ideológica, ou seja, ela é por sua vez, tendenciosa a um credo.
- DAS ORGANIZAÇÕES DE TENDÊNCIA E A LIMITAÇÃO QUANTO A NECESSIDADE DE DADOS PESSOAIS SENSÍVEIS EM CONTRAPONTO AO FIM QUE SE DESTINA
Sabe-se que a colheita dos dados sensíveis dos trabalhadores é uma forma de tratamento, no caso das organizações de tendência esse tratamento e essa obtenção de informações deve ser ainda mais cuidadosa uma vez que pela natureza das organizações de tendência, conforme acima mencionado, um dos critérios para a sua atuação é a correspondência ideológica ao qual se destina.
Para (Gaspar, Gabriela, 2021), o empregador das organizações de tendencia encontram uma maior diferença na colheita de dados, uma vez que há a necessidade do tratamento dos dados sensíveis desses trabalhadores:
No caso do empregador que é uma Organizações de Tendência, essa realidade é diferente, já que, além do tratamento desses dados exigidos para cumprimento de obrigação legal ou regulatória, esta coleta dados sensíveis é possível (ou seja, dados referentes à convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político), em virtude da sua finalidade precípua que é a difusão de determinada ideologia. Nesse caso, apenas duas hipóteses seriam passíveis de utilização para justificar o tratamento: quando houver sido dado o consentimento do titular de forma específica e destacada ou exercício regular de direitos, inclusive em contrato e em processo judicial, administrativo e arbitral.
Nesse contexto, desde o processo seletivo, o trabalhador se vê obrigado a conceder informações cujo caráter é puramente sensível.
A LGPD em seu Art. 5º coloca o que seria dado pessoal e dado sensível:
Art. 5º Para os fins desta Lei, considera-se:
I – dado pessoal: informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável;
II – dado pessoal sensível: dado pessoal sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural;
Ainda no tópico concernente a possibilidade desse fornecimento, é viável desde que haja o consentimento do titular de forma específica e destacada –, insta salientar que esse é um dos importantes institutos trazidos pela LGPD, respeitando-se finalidades determinadas e explícitas. Contudo, tal determinação deverá ser modulada pelos demais ramos do Direito, levando-se em conta as peculiaridades das relações jurídicas específicas.” (Gaspar, Gabriela, 2021)
A abrangência que abre espaço a possibilidade do tratamento dos dados sensíveis, mesmo sem o com nesses casos correlatos às organizações de tendência, estão especificados no Art. 11, inc. I da LGPD:
Art. 11. O tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer nas seguintes hipóteses:
I – quando o titular ou seu responsável legal consentir, de forma específica e destacada, para finalidades específicas;
No caso, o tratamento pode ser dado por meio das organizações de função com fulcro na finalidade específica de identidade ideológica, ou mesmo, algumas organizações fazem o tratamento desses dados sem a anuência dos seus trabalhadores, com base no inc. II, alínea d, desse mesmo Art. 11:
Art. 11. O tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer nas seguintes hipóteses:
II – Sem fornecimento de consentimento do titular, nas hipóteses em que for indispensável para:
d) exercício regular de direitos, inclusive em contrato e em processo judicial, administrativo e arbitral, este último nos termos da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996 (Lei de Arbitragem) ;
Porém, mesmo no âmbito das Organizações de Tendência, não deve ser utilizada de maneira irrestrita, devendo obedecer sobretudo aos princípios instituídos pela Lei.
Isto porque, é certo que as organizações de tendencia tem o viés social aflorado, e que o não seguimento ideológico por meio dos seus titulares através de seus funcionários poderá gerar um conflito de atuação internamente.
Dessa forma, a organização de tendencia deve cumprir suas funções específicas por meio dos princípios da liberdade econômica podendo realizar o tratamento dos referidos dados, porém, deve respaldar-se nos limites da finalidade da realização do tratamento apenas no âmbito da manutenção de sua atividade, caso contrário perderá o interesse legítimo e poderá, assim, ser responsabilizada pelos vazamentos dos dados com objetivo distinto ao já mencionado.
- DA IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DOS DADOS PESSOAIS DOS TRABALHADORES EM CONTRAPONTO A POLÍTICA SOCIAL APURADA AS RELAÇÕES DE TENDÊNCIA E A NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DA SUA IDENTIDADE IDEOLÓGICA/CULTURAL
A maior distinção entre a coleta de dados realizada pelo empregador comum e o empregador das organizações de tendência está no fato de que este último para se manter no mercado tem que contratar empregados sob o viés da coleta de dados pessoais sensíveis compatíveis com a natureza ideológica do seu negócio.
O empregador comum, no entanto, respalda o fundamento de sua contratação na maioria das vezes, puro e simplesmente na aferição da capacidade profissional do empregado, para assim obter maior eficiência na organização dos ativos trabalhistas.
Dessa forma, é possível assim chegar à conclusão de que nas Organizações de Tendência, além da capacidade técnica, esse empregador visa aferir se aquele empregado ou candidato comunga daquela ideologia, uma vez que para exercer determinadas tarefas, essa identidade fará total diferença no exercício daquela atividade organizacional e essa finalidade será legítima para essas organizações. Gaspar, Gabriela, 2021 p.21 destaca a possibilidade da fuga da finalidade legitima em alguns casos e a invasão da privacidade:
Porém, não se descarta a possibilidade de coleta de dados para fins que exorbitem dessa finalidade legítima, tanto para os empregadores comuns quanto para os empregadores ideológicos. Dessa forma, o armazenamento de dados pode acabar por invadir a vida privada do candidato ao emprego, do empregado em exercício e do ex-empregado, de forma a apreender circunstâncias e características pessoais desnecessárias fora do contexto da relação de trabalho e desnecessárias para a realização da atividade para o qual foi contratado.”
Resta claro e posto, que a LGPD não deixa esse tipo de situação no vazio de uma obrigatoriedade de adequação, isso poquem, o tratamento de dados sensíveis não pode exorbitar a esfera de uma série de limitações em atenção aos Princípios da Proporcionalidade em sua tripla dimensão, da Razoabilidade e da Concordância Prática, que norteiam o sopesamento de direitos fundamentais quando esses entram em rota de colisão.
É possível assim chegar no ponto crítico dessa temática, uma vez que de um lado está o grupo de pessoas que exercem seus direitos fundamentais através das Organizações de Tendência e, de outro, os empregados que têm o direito ao exercício dos seus direitos fundamentais, em especial o direito à privacidade, também no âmbito das relações de trabalho, em virtude da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
Essa é, senão a conjectura da vida social aplicada às organizações de tendência e a legislação trabalhista, uma vez que desse conflito gera o resultado constante de cada interesse seja ele o elemento básico da conduta social, ou as suas condições concretas preponderantes nas ações do agir humano. (Pugliese, Márcio. 2023. p. 257).
Ademais, essa preservação de dados é encontrada de forma específica e clara na legislação trabalhista que detém um caráter normativo aplicado ao protecionismo impondo a imperatividade e indisponibilidade, bem como nos institutos de Direito Civil, a exemplo da Boa-fé Objetiva.” (Miziara, 2021).
Conforme já mencionado anteriormente, resta claro que as organizações de tendencia são importantes para o desenvolvimento atrelado a política, a sociedade, a religião e todos os vieses que a liberdade econômica pode trazer, entretanto, é preciso estar atento que a deflagração de vazamento de dados por meio dessas instituições pode causar um dano inenarrável a comunidade em geral no arbítrio de suas vontades e, até mesmo, soberania nacional.
CONCLUSÃO
A conclusão desse estudo sobre o tratamento de dados pessoais sensíveis no contexto das organizações de tendência permite observar a complexa interação entre o direito à privacidade dos trabalhadores e o papel social ideológico dessas organizações. As organizações de tendência, definidas pela finalidade de difusão de uma ideologia específica, exigem que seus empregados compartilhem e representem determinados valores culturais, religiosos, filosóficos ou políticos. Esse caráter peculiar distingue-as das empresas convencionais, cujo objetivo principal é o lucro, e posiciona-as como instrumentos de expressão e exercício de direitos fundamentais, como a liberdade de crença e associação.
No entanto, o tratamento de dados sensíveis nas organizações de tendência deve ocorrer com extrema cautela. Esses dados – que incluem informações sobre convicção religiosa, filiação política, participação sindical e outras identidades pessoais profundas – exigem respeito e proteção, assegurando-se o consentimento explícito do empregado e restringindo-se ao que é estritamente necessário para a finalidade ideológica da organização. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) fornece um quadro jurídico que limita a coleta e o uso de dados sensíveis, impondo princípios de proporcionalidade, finalidade e transparência, essenciais para evitar abusos e invasões à privacidade.
Os desafios, no entanto, não se restringem à aplicação da LGPD. Como organizações baseadas em ideologias, essas empresas operam em um espaço onde interesses empresariais e individuais colidem. O princípio da proporcionalidade deve ser rigorosamente observado para equilibrar os direitos dos trabalhadores à privacidade e à dignidade com o direito das organizações de manter sua identidade ideológica. A preservação dos dados pessoais dos trabalhadores deve respeitar a finalidade expressa e legítima da organização; qualquer desvio para objetivos que extrapolem essa finalidade pode resultar em infrações jurídicas e danos à confiança nas relações de trabalho.
As normas da LGPD e o princípio da boa-fé objetiva, presentes no direito civil, tornam-se fundamentais nesse contexto, atuando como limites para a proteção dos direitos dos trabalhadores dentro das organizações de tendência. Isso é essencial não só para assegurar a privacidade individual, mas também para evitar que o uso indevido desses dados comprometa o ambiente de trabalho, causando discriminação ou abuso de poder.
Conclui-se, portanto, que as organizações de tendência, por estarem intimamente ligadas à propagação de ideologias, devem adotar uma postura transparente e ética no tratamento de dados sensíveis. A integridade do ambiente de trabalho e a proteção dos direitos fundamentais dos empregados dependem de práticas de conformidade que respeitem não apenas as exigências legais, mas também a dignidade humana e a liberdade individual. Dessa forma, a aplicação da LGPD nas relações trabalhistas nas organizações de tendência reflete a importância de harmonizar o direito à privacidade com o papel social dessas empresas, promovendo um equilíbrio saudável entre identidade organizacional e respeito aos direitos dos trabalhadores.
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[1] Mestranda em Direito do Trabalho pela PUC/SP, São Paulo (Brasil) – Pesquisadora, bolsista pelo programa CAPES
[2] A LGPD entende como controlador e operador o responsável por manter registro das operações de tratamento de dados pessoais que realizarem, especialmente quando baseado no legítimo interesse. (Art. 37 da lei 13.709/2018)
[3] O encarregado é aquele designado pelo controlador para receber as comunicações, bem como as reclamações da ANPD; bem como orientar os demais funcionários quanto ao regramento da LGPD (Art. 41 da lei 13.709/2018)