PARTICIPAÇÃO CIDADÃ E DESOBEDIÊNCIA CIVIL: MANEIRA DE AGIR PELA EFICÁCIA DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE
31 de maio de 2023CITIZEN PARTICIPATION AND CIVIL DISOBEDIENCE: WAY OF ACTING FOR THE EFFICACY OF THE RIGHT TO THE ENVIRONMENT
Artigo submetido em 16 de abril de 2023
Artigo aprovado em 24 de abril de 2023
Artigo publicado em 31 de maio de 2023
Cognitio Juris Ano XIII – Número 46 – Maio de 2023 ISSN 2236-3009 |
Resumo: este artigo trata de uma pesquisa bibliográfica para refletir sobre a importância da intervenção da sociedade na proteção do meio ambiente; em primeiro lugar através da forma institucionalizada ou formal como é a participação cidadã e, dada a sua ineficiência, surge resistências à intervenção com base na lei, desobediência civil, como último recurso da sociedade, para enfrentar o conflito gerado entre a ação de degradação do meio ambiente e os anseios de conservação e preservação do meio ambiente da sociedade, que atingiu dimensões planetárias, graças à comunicação e ao avanço da educação, conclui-se que está criando-se uma consciência de cidadania planetária que faz da conservação do meio ambiente uma luta comum da humanidade.
Palavras-chave: participação social, proteção ambiental, cidadania planetária
Abstract: this article deals with a bibliographical research to reflect on the importance of society’s intervention in the protection of the environment; firstly, through the institutionalized or formal form of citizen participation and, given its inefficiency, there is resistance to intervention based on the law, civil disobedience, as a last resort for society, to face the conflict generated between the action of degradation of the environment and society’s aspirations for conservation preservation of the environment, which has reached planetary dimensions, thanks to communication and the advancement of education, it is concluded that an awareness of planetary citizenship is being created that makes conservation of the environment a common struggle of mankind.
Keywords: social participation, environmental protection, planetary citizenship
INTRODUÇÃO
O meio ambiente é constituído pelo espaço do desenvolvimento humano, portanto, a própria existência da vida depende de suas condições, por isso, é do interesse de todos intervir individual ou coletivamente, no processo de transformação ou conservação, por isso existe uma relação de interdependência entre os direitos humanos e a proteção do meio ambiente, pois é essencial para o pleno gozo dos direitos, daí a participação na vida cultural e o desenvolvimento de todos os seres humanos.
Conforme destacado por BOBBIO (1991), o estado atual dos direitos humanos não discute sua fundação, o importante hoje é garantir sua implementação, como e de que forma os direitos podem ser cumpridos, como evitar a sua relativização. A ação dos cidadãos é decisiva para a conquista do respeito pelos direitos humanos e da justiça social e do bem-estar humano.
As Constituições regulam as formas de participação cidadã, tais como as formas de intervenção cidadã nas políticas públicas e nos eventos institucionais dos estados, mas a eficácia dessa participação dependerá em grande parte do aprofundamento das formas democráticas e do fortalecimento institucional dos estados, por um lado, mas por outro, dependerá do nível de consciência participativa e de protagonismo da sociedade, que se concretiza com a educação dos cidadãos e com um diálogo constante entre o poder público e a sociedade, que permita a sua intervenção efetiva na tomada de decisões em todas as áreas, mas principalmente nas questões ambientais, pela importância que têm no próprio desenvolvimento humano.
Por isso, o fortalecimento da cidadania, por meio da participação protagonista da população nas tomadas de decisão, leva à efetivação dos direitos em geral, daí a importância de se valer de todos os meios e formas de participação cidadã estabelecidos e desenvolvidos de justiça e bem-estar social, numa relação harmoniosa entre o poder público e a sociedade, que permita alcançar um desenvolvimento sustentável, que garanta um ambiente ecologicamente equilibrado.
Desta forma, a participação cidadã é fundamental para a efetivação dos direitos, por isso, os estados, formalmente, estabelecem formas e meios para o cidadão intervir nas questões públicas e as políticas públicas devem ser concebidas e estabelecidas, com a intervenção do cidadão efetivamente na decisão, efetuar, mas que é dever de ser aspiração o objetivo da consagração normativa, mas seu cumprimento e implementação depende de múltiplos fatores e enfrentamento de interesses que colocam o cidadão em situação de constante luta pelo reconhecimento e respeito de seus direitos, onde o meio ambiente se tornou nos últimos anos um dos direitos que mais tem aglutinado e promovido a participação cidadã para o seu respeito e conservação.
PARTICIPAÇÃO CIDADÃ
s pessoas, ao viverem em sociedade, têm diferentes formas de intervir e interagir na comunidade, dado que o desenvolvimento humano é um leque variado de interações entre os indivíduos e entre eles e as instituições. Por este motivo, a intervenção humana é constante em seu ambiente, gerando mudanças em busca de bem-estar. Uma dessas intervenções é a participação cidadã, entendida como a ação do cidadão nos eventos sociais e institucionais, em suas relações com o Estado e as instituições, regidas pelo sistema regulatório.
Nesse sentido, a constituição brasileira, como tantas outras constituições, estabelece todo um conjunto de normas que regulam a participação cidadã, em um esquema de democracia participativa, o que lhe confere grande destaque na concepção e desenvolvimento de políticas públicas e no exercício de seus próprios direitos. Assim, estabelece um catálogo de direitos fundamentais onde no Artigo 5: prevê a liberdade de expressão, o direito de acesso à informação, a liberdade de associação para fins lícitos, a criação de associações e cooperativas, a proibição da interferência do Estado em seu funcionamento, e a iniciativa cidadã, que constitui o elemento fundamental do desenvolvimento legislativo das formas de participação cidadã, uma vez que esses direitos devem ser garantidos em qualquer regulamento.
Da mesma forma, a participação política é referida no artigo 14 (Capítulo IV) que estabelece o exercício da soberania popular por sufrágio universal, incluindo o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular, o qual é complementado pelo artigo 49, inciso XV: a faculdade de convocação do Congresso um plebiscito ou referendo. Dessa forma, a participação cidadã é concebida como o pilar do sistema democrático.
Mas é preciso entender que a participação cidadã não é apenas o exercício do voto na eleição dos representantes do poder público, mas que a Constituição também estabelece outras formas de participação cidadã que implicam na criação e funcionamento do gerenciamento municipal, estadual e federal, conselhos de caráter, paridade entre sociedade civil e poder público na área da saúde, por exemplo. Prevê, ainda, conferências locais, municipais, estaduais e federais para incorporar o cidadão no desenho das linhas estratégicas do gerenciamento público, permitindo a criação de conselhos, conferências e comitês gestores que promovam a participação da população na preparação, execução e monitoramento de políticas públicas.
Em matéria ambiental, a constituição estabelece no artigo 225 o princípio da participação cidadã, como um compromisso das pessoas na conservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado, para as gerações atuais e futuras, do qual deriva a obrigação de garantir a participação cidadã. Normas legislativas sobre a questão ambiental. Esse cumprimento é observado na Lei núm. 9.795, que dispõe sobre a educação ambiental. Lei núm. 6.938, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, Lei núm. 9.433, que dispõe sobre o sistema nacional de recursos hídricos, entre outras. São instituídas as que obrigam o respeito à participação cidadã, através de sua inserção nas instituições e na formulação e tomada de decisões sobre políticas públicas ambientais, dando-lhe destaque.
Ainda, em relação ao meio cultural, o artigo 216 inciso 1 da Constituição estabelece que “O Poder Público, como colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro”. Como se pode verificar, a participação cidadã se estabelece em colaboração com o poder público a quem impõe o dever de conservação, porém, não difere do que está indicado em relação ao artigo 225, já citado, visto que continua a ser o mesmo, princípio do compromisso da sociedade atual com a preservação do patrimônio cultural como parte de um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as gerações atuais e futuras.
Conforme o exposto, a participação cidadã está vinculada ao exercício da cidadania e ao exercício dos direitos fundamentais, portanto, está vinculada à nacionalidade ou vínculo jurídico que se tenha com um determinado Estado. Por isso, é entendida como uma intervenção institucionalizada dos cidadãos, individual ou coletivamente, nos acontecimentos de um determinado Estado.
Não obstante, o que foi dito, participação cidadã pode ser definida em termos simples como as pessoas intervêm a título pessoal ou coletivo, conforme as regras e segundo as condições por elas estabelecidas, nos processos de decisão ou sociais, econômicos, culturais, políticos, que estão relacionados com o bem-estar social e o desenvolvimento humano. Nesse sentido, o cidadão participa dos aspectos políticos de um país, vinculado essa participação ao conceito de nacionalidade, uma forma de participação política que tem a ver com a intervenção na eleição dos representantes dos entes públicos, também na possibilidade de apresentar-se como candidato ou elegível para esses cargos públicos.
Mas quando o assunto é meio ambiente, a participação cidadã deixa de estar vinculada à nacionalidade, por ser uma questão que transcende as fronteiras dos estados, onde as decisões e ações tomadas a esse respeito podem afetar e incumbir a toda a humanidade, ao ser dever de todos a preservação do meio ambiente. Assim, a participação cidadã nas questões ambientais adquire conotação planetária, onde independentemente da nacionalidade, a intervenção das pessoas é por um direito natural à preservação da natureza e das condições ambientais essenciais à vida no planeta.
Então, a participação cidadã adquire dimensões planetárias enquanto intervenho no confronto de interesses entre a busca do desenvolvimento econômico, a justiça social e a conservação do meio ambiente, produzindo um antagonismo na intervenção do cidadão, nos processos de desenvolvimento, uma vez que a dada altura o cidadão participa do processo de degradação ambiental, visto que o homem é o principal predador ambiental, apoiando ações de estados e empresas transnacionais, em suas políticas de desenvolvimento em busca do bem-estar humano. Mas também, em outros momentos, pode atuar confrontando as políticas dos estados nessa mesma ação predatória, de forma que a posição do cidadão dependerá das circunstâncias e dos interesses em jogo conforme o momento histórico que ocorrer.
A partir disso, infere-se que a participação cidadã, por não ter uniformidade, pode ser vista como um confronto de interesses entre determinados grupos sociais e, refletida como uma luta de classes e interesses, como um confronto institucionalizado, entre governantes e governados, entre os grupos econômicos e sociais, entre patrões e empregados, entre latifundiários e grandes empresários. Em suma, a participação cidadã se articula na evolução dos tempos e das circunstâncias do momento, apoiada nas lideranças sociais ou políticas que a dirigem e dirigem, conforme os interesses em jogo.
É por isso que a participação do cidadão nas questões ambientais, muitas vezes, permanece uma mera formalidade, nas consultas aos cidadãos, nas conferências simuladas ou meramente explicativas, sem um verdadeiro diálogo, onde as decisões sobre ações, projetos ou medidas que levem à degradação ou mudanças ambientais acabam de fato sendo assumidos pelos grupos econômicos dominantes ou setores do poder público, mesmo contra a opinião dominante na sociedade.
Vale ressaltar, como diz PEREDA (2005), que a participação não existe no abstrato, mas em um ambiente social condicionado, entre outras coisas, por uma estruturação das atividades econômicas sob a égide do capitalismo global, uma institucionalização da política e algumas ideologias ou diretrizes culturais capazes de permear a forma de ver a vida e enfrentar os acontecimentos, produzida pelo desenvolvimento comercial e tecnológico que esgota indiscriminadamente os recursos naturais para atender a um mercado cada vez mais crescente, onde uma mesma sociedade participa ativamente do consumo, sem previsão de futuro, ou espírito de conservação, porém, “A participação do cidadão ajuda a melhorar a qualidade das decisões tomadas nos aspectos ambientais” (PACHECO, VEGA, 2001).
Em suma, como diz ALFARO (2005) “a participação é um processo de geração de consciência crítica e propositiva dos cidadãos, que se tornou um fator-chave no processo de empoderamento dos grupos sociais”, que, como disse, há uma luta constante na sociedade, entre vários fatores de poder e uma evolução constante para corrigir as injustiças sociais, onde o cidadão luta pelo seu próprio bem, mas num conglomerado social que reúne interesses comuns e se identifica e participa com consciência, No entanto, “A participação cidadã não é propriamente eficaz enquanto não modifique e amplie as relações de poder ”(ALFARO 2005)
DESOBEDIÊNCIA CIVIL
Em primeiro lugar, destaca-se que a desobediência civil, nos termos como historicamente se desenvolveu, sempre esteve desmarcada das ações violentas, sendo o pacifismo uma delas de suas características distintivas, enquanto seu fundamento se encontra
no direito de resistência à lei injusta, aos atos injustos que a autoridade incentiva ou executa, visto que desobedecer é não cumprir, recusar-se a executar o mandato da lei ou da autoridade e de caráter civil, está vinculado à cidadania, a não violência. Portanto, a desobediência civil é uma reação, uma resposta do cidadão à injustiça que certas ações do Estado acarretam.
Nesse sentido, como aponta BOBBIO (1991), o direito de resistência é um direito secundário, da mesma forma que aqueles destinados à proteção de normas primárias são normas secundárias, que intervêm em um segundo momento, quando são violados os direitos de liberdade, propriedade e segurança que são direitos primários. Por isso o autor o considera um direito “diferente” porque intervém para proteger os demais direitos, mas também não pode ser protegido, portanto, deve ser exercido assumindo o perigo e o risco. No entanto, algumas constituições, como a constituição de Portugal, ao contrário da tese de BOBBIO (1991), regulamentaram expressamente o direito de resistência, tal como se lê no artigo 21.º da citada constituição que disse: “Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública”.
A constituição venezuelana também consagra o direito de resistência, no artigo 350, nos seguintes termos:”El pueblo de Venezuela, fiel a su tradición republicana, a su lucha por la independencia, la paz y la libertad, desconocerá cualquier régimen, legislación o autoridad que contraríe los valores, principios y garantías democráticos o menoscabe los derechos humanos.”
No caso da constituição brasileira, não há menção expressa ao direito de resistência, porém, como sustenta a autora Maria Garcia, (2003), da interpretação da norma do § 2.º do artigo 5º que faz referência expressa a outros direitos e garantias não previstos na constituição, mas que ainda devem ser considerados protegidos por serem direitos e garantias reconhecidos, pelo regime de direitos humanos.
Pode-se dizer, então, que o direito de resistência, como essência da desobediência civil, já se concretiza e se reconhece como um direito individual e coletivo, caracterizado pela reação pacífica às situações de injustiça, as quais são historicamente referenciadas nos casos de Henry David Thoreau, um ativista norte-americano do século IXX, Rosa Parks uma das grandes líderes do movimento pelos direitos dos negros e dos Estados Unidos durante as décadas de 1950 e 1960. Martin Luther King e líder desse movimento e Mahatma Gandhi, que com sua residência pacífica conquistou a independência da Índia.
Trazendo essas explicações para o campo do direito ao meio ambiente e da crise ambiental, observa-se que grande parte das legislações nacionais, inclusive a brasileira, incorporou formas de participação cidadã nas políticas ambientais, bem como em conferências internacionais, como a recente realizadas na Escócia sobre mudanças climáticas, abriram a participação de várias organizações da sociedade, porém, até agora a sociedade civil permanece relegada na tomada de decisões, transcendental nas questões ambientais.
Essas formas de participação cidadã parecem não ser suficientes para garantir o direito ao meio ambiente, haja vista que, como foi dito, há falta de diálogo social, permitindo a verdadeira incorporação da sociedade formal e materialmente na tomada de decisões sobre a política ambiental dos países, daí os movimentos ambientalistas e muitas comunidades afetadas pela degradação ambiental, tomam o caminho da resistência, da desobediência civil, para protesto e demonstração de reação ao avanço das obras de infraestrutura que degradam o meio ambiente, assim como a falta de ação e cumprimento dos compromissos dos estados com a proteção do meio ambiente.
No mundo tem havido atos de resistência da população em defesa do meio ambiente, onde algumas organizações civis já consideram que o atual estado de crise ambiental merece atos de desobediência civil ao nível planetário que gerem a divulgação e força necessárias que governos e grandes corporações internacionais e organizações internacionais, tomem medidas sobre a questão ambiental, e podem ocorrer mudanças nos padrões de vida e produção econômica que impeçam a degradação ambiental insustentável e a sustentabilidade da vida e da Biodiversidade.
A desobediência civil pela questão ambiental, compartilha os mesmos princípios do exercício do direito de resistência, contudo tem amplitude em termos de objeto, tanto na especialidade quanto na extensão, ao englobar tanto a ação quanto a omissão do Estado perante certas situações que o cidadão considera injustas e, pode ser estendida, não só à lei injusta, mas também a qualquer situação que gere injustiça e se estenda além das fronteiras dos países. Nesse sentido, a desobediência civil ambiental é um ato de oposição de resistência concreta a uma determinada ação que implica a execução de atos que podem causar danos ao meio ambiente e produzir mudanças na natureza, tentando tornar público o problema, para gerar uma matriz geral de opinião e intervenção das instituições e das esferas de poder, para a situação mudar e parem os acontecimentos que degradam o ambiente.
Nesse caso, há o exemplo no Brasil da construção das Usinas Hidrelétricas na Amazônia, o Bello Monte e o Rio Madeira, onde ribeirinhos e indígenas praticaram atos de desobediência civil e resistência às ditas construções, bem como organizações ambientais e de direitos humanos, denunciando as consequências negativas que tais projetos teriam para a biodiversidade da Amazônia, porém, apesar das ações, tanto institucionais quanto de protesto cidadão, esses projetos foram realizados com consequências para o meio ambiente ainda estudou hoje.
Por isso as ações de desobediência civil, por muitas vezes enquadradas em atos contrários à lei e desconhecimento do ordenamento jurídico, geram consequências negativas, comprometendo a liberdade dos envolvidos, que se arriscam e muitas vezes não alcançam os resultados desejados, porém, as ações de resistência da sociedade civil geram atualmente grande publicidade, devido ao avanço das comunicações, com repercussão planetária, o que lhe permite dar relevância e aumentar a força de pressão sobre os governos e as empresas executoras ou financiadoras dos projetos degradantes do meio ambiente, que permite uma globalização das lutas ambientais,, com a questão ambiental em primeiro lugar nos fóruns internacionais, como algo incontornável na tomada de decisões sobre qualquer esquema de desenvolvimento.
As ações de desobediência civil em defesa de situações de injustiça ambiental têm projeção planetária imediata, o que tem conduzido esta via de licitações da efetivação do direito ao meio ambiente, como a de maior divulgação e alcançada ao nível planetário, ao contrário da participação cidadã, institucionalizado e faz parte da normalidade democrática; por isso, é percebido como o desenvolvimen to da participação democrática institucional, nunca é visto como um evento publicitário relevante, o que se acontecer são atos de desobediência civil.
A desobediência civil tem-se revelado um instrumento fundamental de intervenção dos novos movimentos sociais a que nos referimos, os quais, o nosso ver, souberam rearranjá-la conceptual e discursivamente como estratégia de ‘práxis’ política adaptada às atuais circunstâncias caracterizadas globalmente., como dizemos, devido às restrições legais nos espaços de intervenção cidadã, construindo-a como um novo instrumento de intervenção social democrática (IGLESIAS, 2002).
Como destaca o referido autor, a desobediência civil está passando por uma transformação quanto às formas de se projetar na sociedade e aos meios que utiliza, somados à visão planetária de seus objetivos. Ao se distanciar cada vez mais dos atos de violência e estabelecer o protesto pacífico e simbólico como formas de luta por direitos, chama a atenção do planeta para a execução ou desenvolvimento de políticas de desenvolvimento que prejudicam o planeta, por meio da comunicação, redes sociais e fóruns internacionais, para potencializar a questão da luta pelo meio ambiente.
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
A ideia de desenvolvimento sustentável é desenvolvida a partir da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, presidida pela Dra. Harlem Brundtland, que apresenta o relatório “Nosso Futuro Comum”, também conhecido como “Brundtland Relatório”, onde é definido como“ um desenvolvimento que atenda às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender às suas próprias”, conceito que se torna um novo paradigma no processo de busca do bem-estar humano, que busca o equilíbrio das ações humanas de modo a satisfazer as necessidades e obter bens e serviços com a biodiversidade e a conservação da natureza, mas também, todos os aspectos do pleno exercício dos direitos e da justiça social, que garantam a paz e a harmonia no meio social, econômico, desenvolvimento político e cultural da humanidade, portanto, a busca qualidade de vida em harmonia com a natureza.
O desenvolvimento sustentável é proposto como um modelo de desenvolvimento que permitiria às sociedades atuais e futuras manter e/ou elevar a qualidade de vida, além de conservar e restaurar os recursos naturais, desenvolvendo níveis crescentes de consciência, sensibilidade e responsabilidade social. Para tanto, é necessária a articulação e a participação de todos os setores da sociedade comprometidos com a redefinição e construção de uma democracia com sustentabilidade (ALFARO 2005)
Como se pode verificar, a participação de todos os setores da sociedade é uma atividade necessária e essencial para o desenvolvimento sustentável. Além disso, como diz o mesmo autor (ALFARO 2005), também supõe a preservação da diversidade em seu sentido mais amplo; ou seja, a preservação dos valores, práticas e símbolos de identidade que determinam a integração nacional ao longo do tempo (Sustentabilidade Cultural). A conscientização deve ser gerada para os problemas da sustentabilidade, por meio da educação e articulação do saber humano em busca de enfrentar os desafios dessa sustentabilidade representa.
Por tudo isso, no discurso sobre desenvolvimento sustentável, o conceito de participação cidadã é enaltecido como a pedra nodal sobre a qual se pode construir um modelo de desenvolvimento economicamente próspero, ecologicamente protetor e socialmente aceitável” (PACHECO; VEGA, 2001) de uma condição mínima de desenvolvimento é impensável sem o fortalecimento das formas de participação democrática da população e a consolidação do pleno exercício de seus direitos, em um ambiente de justiça social e harmonia com a natureza. Portanto, “O envolvimento da sociedade na construção, desenho e implementação da política ambiental não é mais uma opção, mas um pré-requisito se falamos em desenvolvimento sustentável” (PACHECO. VEGA, 2001)
PARTICIPAÇÃO PLANETÁRIA
Como já foi dito, o termo participação cidadã, até o momento, tem sido entendido como intervenção cidadã institucionalizada, ou seja, como o cidadão se incorpora aos processos participativos democráticos, conforme a legislação de cada país, para garantir efetividade dos seus direitos, o âmbito da justiça social e do bem-estar. Mas quando se aborda a questão ambiental, surge a necessidade de uma amplitude territorial nessa participação, devido à própria natureza do direito ao meio ambiente, que tem que ser ecologicamente equilibrado e esse equilíbrio só se consegue pela compreensão do meio ambiente na totalidade integração do planeta.
Esta visão planetária, que engloba o ser humano como habitante do planeta e não apenas no seu contexto local, permite uma projeção planetária da cidadania e consequentemente a sua participação nos assuntos ao nível planetário, onde o cidadão intervirá em todas as decisões fazer espaços, na tentativa de obter garantias para o exercício dos seus direitos, o alcance do bem-estar e a conservação do seu meio ambiente.
Essa participação planetária tem sido promovida, graças à democratização da educação e seu avanço, bem como à consolidação dos sistemas democráticos, por a participação ser a essência da democracia e a educação é o instrumento do desenvolvimento humano para o exercício dos direitos e o conhecimento capacita os seres humanos e facilita o acesso às novas tecnologias de informação, com as quais se podem disseminar ideias e iniciativas em busca do bem comum.
Desta forma, a educação tornou-se um fator determinante do desenvolvimento humano, ampliando o conhecimento dos seus direitos e projetando o espectro de visão dos cidadãos, sobre suas formas de intervenção em uma sociedade globalizada que se estende para além do local, efetuando O cidadão se sentir parte de um sociedade planetária, onde interage graças à comunicação e pode participar de diferentes formas, na sua ocorrência e desenvolvimento, tendo a questão ambiental em primeira ordem, como objetivo e interesse motivar e gerar essa participação, visto que os eventos ambientais acontecem com os planetários, incidência e terá uma influência direta na qualidade de vida dos cidadãos.
Por isso, criou-se uma consciência cidadã para intervir em todas as questões ambientais, independentemente da nacionalidade ou do local de residência, sendo as redes de comunicação, o meio de publicidade e divulgação das diferentes frentes de luta, sendo agora a desobediência civil, materializada como uma ação desenvolvida por meio de campanhas publicitárias que visualizam, mundialmente, as ações realizadas em detrimento do meio ambiente ou em violação aos direitos humanos, em geral, onde as ONGs desempenham papel de protagonista, aglomerando recursos financeiros e tecnológicos, para projetar sua participação, buscando mudanças que permitem a implementação de direitos. Assim, existem organizações como a Anistia Internacional e o Greenpeace, que investem grandes recursos na documentação e divulgação de situações de violação de direitos humanos no mundo e situações de degradação ambiental.
Sem dúvida, esta participação planetária ainda não se consolidou, sendo considerada mais um ideal do que uma realidade, mas o importante é que são dados passos na prossecução que, como diz IGLESIAS, (2002), é conhecido por ser um pensamento utópico de uma cidadania planetária onde a humanidade se conforma na totalidade, onde há superação de todo conflito, mas participação e desobediência, deve ser explicada como um fenômeno enraizado em determinadas circunstâncias, fases e processos, que constitui um complexo mecanismo de intervenção política em desenvolvimento ao nível planetário.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para a efetivação do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, é necessária a participação de todos, estado e sociedade, conforme estabelece o artigo 225 da Constituição brasileira, por se tratar de um direito de natureza social, que determina a qualidade vida das pessoas e seu desenvolvimento em democracia e com sustentabilidade. “Para uma sociedade ser considerada democrática e sustentável, deve ter como objetivo a justiça social, e isso é possível enquanto haja uma mudança no plano institucional, que viabilize e o real exercício desses ideais por meio processos sociais concretos”(ALFARO 2005).
A participação cidadã gera as mudanças institucionais necessárias à sustentabilidade democrática, abrindo espaços de diálogo e consenso na tomada de decisões para a formulação e execução de políticas públicas que permitam a sustentabilidade da sociedade e seu desenvolvimento em harmonia com a natureza, gerando dialogo intercultural, tolerância y solidariedade com as minorias e avanço na “radicalização” da democracia para garantir o acesso e a participação de todos os setores do Estado-Nação na tomada de decisões. (ALFARO 2005).
A participação cidadã não deve ser vista apenas na perspectiva formal da relação Estado-sociedade, mas também, é preciso valorizar na busca do desenvolvimento sustentável, as relações entre os diferentes membros da sociedade, ou seja, a sociedade civil organizada que tem promovido formas de intervenção em cooperação com o Estado, que hoje são decisivas para a concretização do direito ao meio ambiente, o denominado terceiro setor, que constitui uma forma de participação cidadã protagonista, porque constitui uma forma da sociedade constrói e desenvolve o seu próprio destino, com ações concretas como o desenvolvimento da investigação e da educação, onde a universidade é o eixo e motor das transformações sociais, através da formação cidadã, bem como da investigação e inovação em novas tecnologias e empreendimentos geradores de positividade mudanças na sociedade, não apenas localmente, mas também com projeção planetária, visto que as ONGs souberam aproveitar os avanços da comunicação e da globalização, para identificar objetivos comuns da sociedade, para se projetar além das fronteiras dos estados e promover a participação cidadã ao nível planetário.
A desobediência civil constitui uma forma de garantir o cumprimento dos direitos do cidadão, ao ser uma forma de resistência às injustiças geradas pelo exercício do poder por Estados e Grandes Empresas que geram situações de injustiça social, onde a participação Cidadão permanece na mera formalidade, o cidadão tendo que reagir, resistir pacificamente para garantir a visibilidade do conflito, que gera injustiças e estimular outras ações solidárias que permitem a mudança das situações.
Porém, a desobediência civil não visa alterar o estatuto ou o sistema político, o que pretende com ela é gerar mudanças nas decisões que permitam acabar com a situação de injustiça que a gera, razão pela qual é considerada um recurso da Sociedade para fazer cumprir a seus direitos e, especificamente, no que se refere ao direito ao meio ambiente, o que busca é chamar a atenção para evitar danos ao meio ambiente.
É por isso que protestos e ações de resistência nas comunidades e na sociedade em geral ao desenvolvimento de projetos autorizados pelos estados, que degradam o meio ambiente, tornaram-se ações locais que alcançam projeção planetária, com ressonância e repercussão Imediatamente, graças aos avanços na comunicação e o aumento da consciência de preservação ambiental que vem sendo fomentado nos últimos anos, vem consolidando uma cidadania ambiental.
REFERENCIAS
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[1] Possui graduação em Direito pela Universidade Presidente Antônio Carlos (1990), mestrado em Direito pela Universidade Gama Filho (2005) e doutorado em Ciências Jurídicas pela Universidade Castilla La Mancha (2015) e pós-doutorado pela Universidade de Santiago de Compostela (2019). Atualmente é professora titular da Universidade do Estado do Amazonas e Assessora junto à Comissão Geral de Concursos da Universidade do Estado do Amazonas. Correio eletrônico:pferreira@uea.edu.br
[2] Graduado Advogado pela Universidade Central de Venezuela. (1990), Especialista em Direito Processual pela mesma Universidade (2006). Atualmente Mestrando em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas. Bolsista O Programa de Alianças para a Educação e a Capacitação (Bolsas Brasil – PAEC OEA-GCUB) FAPEAM.. Correio Electronico: jacc.mda21@uea.edu.br.