A NOVA ATUAÇÃO DA CIPA NO COMBATE AO ASSÉDIO NO MEIO AMBIENTE DE TRABALHO

A NOVA ATUAÇÃO DA CIPA NO COMBATE AO ASSÉDIO NO MEIO AMBIENTE DE TRABALHO

31 de maio de 2023 Off Por Cognitio Juris

THE NEW CIPA´S ACTIONS TO COMBAT HARRASMENT AT WORKPLACE

Artigo submetido em 28 de abril de 2023
Artigo aprovado em 05 de maio de 2023
Artigo publicado em 31 de maio de 2023

Cognitio Juris
Ano XIII – Número 46 – Maio de 2023
ISSN 2236-3009

Autor:
Geovanna Carvalho Parede[1]

RESUMO: Esse artigo científico tem por objetivo demonstrar, por meio do método dedutivo, como o preconceito e a discriminação originam o assédio no meio ambiente de trabalho. A manutenção da integridade moral da pessoa física é um direito assegurado pela Constituição Federal (CF), ao dispor no art. 5º, X, como bens juridicamente tutelados das pessoas, a intimidade, a privacidade a honra e a imagem das pessoas. A prática dos ilícitos trabalhistas de assédio moral e sexual causam danos extrapatrimonial à vítima com o consequente surgimento do direito à reparação. Ocorre que, a indenização monetária não repara, tampouco impede a prática do assédio. Isto posto, este trabalho se propõe a constatar a essencialidade da transformação cultural das práticas dentro do meio ambiente de trabalho como forma de combate às violências psicológicas.

PALAVRAS-CHAVES: Assédio. Assédio Moral e Sexual. Dano Extrapatrimonial. CIPA.

ABSTRACT: This Article has the purpose to demonstrate, by deductive method, how the prejudice and discrimination create harassment at the workplace. The maintenance of personal integrity is a right guaranteed by the federal constitution, at article 5th, X, proposing as juridical personal assets, the intimacy, the honor privacy, and personal image. The illicit work acts such as moral and sexual harassment cause damage Extra patrimonial. Fact is, the financial compensation does not repair, nor repel the harassment at workplace. Therefore, this paper intends to discuss the need for a cultural transformation of the practices at the workplace to counter phycological violence.

KEYWORDS: Harassment. Moral and Sexual Harassment. Extra patrimonial Damage. CIPA.

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 O Assédio no Meio Ambiente de Trabalho. 2.1. Assédio Moral. 2.2 Acesso Sexual. 2.3 Quadros Decorrentes do Assédio. 3 Formas de Combate ao Assédio. 3.1 O Direito a Indenização e a Punição Educativa 3.2. O Programa Emprega + Mulheres. 3.3 Atuação da CIPA. 4 Conclusão. 5 Referências.

  1. INTRODUÇÃO

Aristóteles sintetizou a igualdade como sendo: tratar os iguais de maneira igual, os desiguais de maneira desigual na medida de suas desigualdades. Nesse mesmo sentido, para o Direito, a igualdade não é compreendida como uma simples questão aritmética em que, para ser considerado igual, ambos os lados devem possuir os mesmos números de elementos[2].

O Estado, mediante sua atividade legislativa, cria e mantém uma igualdade legal, tal como restou elencado no art. 3º, IV, CF, ao prescrever como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação e, ainda, pelo princípio da isonomia, disposto no art. 5º, caput, CF, ao determinar que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Somos uma sociedade constituída de pessoas que trazem diferenças entre si, em razão de cada contexto biopsicossocial (biológico, psicológico e sociológico) vivenciado pelo povo, que deve ser valorizado e integrado constantemente. E, tais diferenças, podem criam preconceitos e discriminação. A diferença entre os dois termos é de que:

o preconceito é uma indisposição ou um julgamento prévio, negativo que se faz de pessoas estigmatizadas por estereótipos. Já a discriminação se refere a conduta, ativa ou omissa, que viola direitos das pessoas com base em critérios injustificados e injustos, tais como raça, gênero, idade, opção religiosa e outros[3].

Uma pessoa será vítima de discriminação, alvo de preconceito, quando ela é marginalizada e deixa de receber tratamento igualitário em razão da cor da sua pele, de sua idade, de seu gênero ou da sua orientação sexual, política e religiosa[4].

E por que é importante falar em preconceito e desigualdade? Porque o assédio advém de atitudes preconceituosas e discriminatórias, praticadas por uma pessoa ou por um grupo de pessoas em relação a outra, de maneira reiterada e com diferentes graus de intensidade.

Por tais apontamentos, e utilizando o método dedutivo, desenvolveremos neste artigo, no primeiro item, o estudo do assédio, moral e sexual, como ilícito trabalhista, o conceituando com base na interdisciplinaridade dos ramos da Psicologia e do Direito. De mais a mais, pretendemos identificar quais são as consequências psicológicas que o assédio pode acometer à vítima, destacando, em especial, o estresse ocupacional, a síndrome de burnout e o transtorno de estresse pós-traumático.

No segundo item será examinado as formas de controle e combate do assédio no meio ambiente de trabalho, através da análise da forma de tarifação do dano extrapatrimonial previsto no Direito do Trabalho a título de compensação e não efetiva reparação, bem como, de uma punição educativa ao ofensor. Finalmente, através da promulgação do novo Programa Emprega + Mulheres, disposto na Lei n. 14.457/2022, como a nova atuação da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Assédio (CIPA), poderá, efetivamente, atuar no combate ao assédio laboral.

Esperamos, ao fim, concluir que, para combater a prática de assédio no meio ambiente de trabalho, de rigor se faz a mudança, a efetiva transformação cultural, não só das empresas e de quem as representa, mas também dos empregados, orientando-os e ensinando-os acerca do respeito ao próximo, ao respeito de sua personalidade, autoestima, intimidade, privacidade, liberdade, enfim, de todos os bens inerentes a pessoa humana.

  1. O ASSÉDIO NO MEIO AMBIENTE DE TRABALHO

Assédio é o termo utilizado para designar toda conduta que cause constrangimento psicológico ou físico à pessoa. Tal ilícito trabalhista se divide em assédio moral e assédio sexual, este último sendo um crime tipificado pelo Código Penal (CP).

Em 2018, foram ajuizadas na Justiça do Trabalho, mais de 56 mil ações envolvendo o tema assédio moral[5], ao passo que, em 2019, o assédio sexual foi tema de 4.786 processos na Justiça do Trabalho[6]. Mas estes números podem ser maiores, pois inúmeras pessoas têm receio de denunciar práticas abusivas como estas e sofrer retaliação.

  1.       ASSÉDIO MORAL

Os termos assédio moral, terror psicológico ou assédio moral entre nós, além de outras denominações, inicialmente foram utilizados por psicólogos e, somente no Século XXI que tais expressões passaram a receber tratamento jurídico doutrinário, legislativo e jurisprudencial[7].

Evani Zombom Marques da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro, psicólogas atuantes no ramo da psicologia judiciária, definem assédio moral como sendo um tipo de agressão psicológica, em que uma pessoa ou um grupo de pessoas age em relação a outra de forma preconceituosa e discriminatória, de maneira reiterada, em diferentes graus de intensidade[8]. Para Adalberto Martins, o assédio moral resume as diversas formas de perseguição no trabalho que objetivam tornar o ambiente de trabalho insuportável para o empregado[9].

O assédio moral pode ser descendente, quando praticado de um superior hierárquico para com seu subordinado, ascendente, se praticado de um subordinado contra seu superior ou, ainda, paritário, isto é, praticado entre pares[10].

O assédio moral é, para o Direito do Trabalho, uma forma de dano extrapatrimonial, que fere, além dos bens materiais da vítima, a sua dignidade, a sua personalidade, a sua intimidade e, especialmente, a sua autoestima, pois, como assevera Vólia Bomfim, o assédio moral acontece de forma velada, oculta e se caracteriza pela prática de atos sucessivos que levam a vítima a acreditar em sua incompetência ou fracasso no trabalho.[11]

São situações de assédio moral atos como retirar a autonomia do empregado ou contestar todas as suas decisões, estabelecer metas impossíveis de serem cumpridas, atribuir apelidos pejorativos, impor punições ou atividades vexatórias, como danças ou prendas, isolar fisicamente a vítima das demais pessoas do time, manipular ou não entregar informações essenciais ao trabalho, vigiar e punir de forma arbitrária, dentre diversas outras atitudes violentas[12].

Se analisados de forma isolada, os atos acima descritos não geram por si só, o psicoterrorismo. No entanto, se praticados de forma conjunta e reiterada, poderá ser configurado a prática do assédio moral.

É a epidemia do novo século ou câncer do mercado de trabalho[13]. O assédio moral é um ilícito trabalhista, pois, como vimos, decorre de posturas autoritárias, injustas, que afrontam os limites existentes na relação de emprego, tal como determina, de forma geral, o art. 3º da CLT.

  1.       ASSÉDIO SEXUAL

A prática do assédio sexual, diferentemente do assédio moral, é crime previsto no art. 216-A, CP, que tipifica o ilícito como o ato de “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”.

Para a configuração do assédio sexual no meio ambiente de trabalho é necessário que a conduta seja praticada por superior hierárquico ou esteja presente a ascendência do assediador sobre o assediado, além do constrangimento da vítima, para obter vantagem sexual, mediante chantagem ou ameaça, implícita ou explícita, que possa lhe acarretar prejuízos no trabalho.

Alice Monteiro de Barros[14], entende que o assédio sexual pode ser de iniciativa do empregado, para com outro colega, com o próprio empregador ou, ainda, contra a pessoa que se utiliza de serviços da empresa. Nesse mesmo sentido, Vólia Bomfim defende que o conceito de assédio sexual deve abranger toda conduta sexual praticada, normalmente de forma reiterada, contra alguém que a repele[15].

Entretanto, amparados pelos ensinamentos de Adalberto Martins[16], não podemos conceber a ideia de que o assédio sexual possa ser praticado entre pares ou ainda, do subordinado para com o seu superior hierárquico, o que não excluí a configuração do fato como um outro delito, tal como a violação sexual mediante fraude (art. 215, CP), a importunação sexual (art. 215-A, CP) ou até mesmo o estupro (art. 213, CP), pois é indispensável a interpretação gramatical deste dispositivo legal, haja vista o Direito Penal não aceitar interpretações que abranjam a tipificação de um crime, em respeito ao princípio da legalidade (art. 5º, XXXIX, CF).

Finalmente, importante comentar, tal como defende Rodolfo Pamplona Filho, que o assédio sexual é um atentado à liberdade humana[17]. Inclusive, o Código Penal ao tipificar o assédio sexual como um crime, o inseriu como Capítulo VI – Do Crimes Contra os Costumes, onde se encontram os crimes contra a liberdade sexual.

  1.       QUADROS DECORRENTES DO ASSÉDIO

No livro Psicologia Judiciária para Concursos da Magistratura, Evani Zombom Marques da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro indicam como quadros decorrentes do assédio o estresse ocupacional, a síndrome de burnout e os transtornos de estresse pós-traumático.

O estresse ocupacional se refere a forma como o nosso organismo responde face aos estímulos negativos do ambiente laboral, que são entendidos como pressões que podem desencadear desequilíbrios físicos e psíquicos. Cada indivíduo reagirá de uma forma diante das situações de pressão e os sintomas podem variar de um mero desconforto à morte, de dores de cabeça aos problemas coronarianos, de indigestão a úlceras gástricas, de fadiga à hipertensão arterial[18].

            A síndrome de burnout, é formada por um conjunto de sintomas que acomete a pessoa que trabalha sob intensa pressão psicológica e tem por principal característica o estresse crônico, causada pelas exigências excessivas e desproporcionais do meio ambiente de trabalho. O termo burnout provém do inglês, que significa “queima total”, o que indica que a pessoa acometida por essa síndrome sofre de um esgotamento físico e emocional[19]. Hoje a síndrome do burnout está disseminada em todos os cargos e funções e é compreendida como um processo com três dimensões: a exaustão emocional, a despersonalização e a baixa realização profissional[20].

Além do estresse ocupacional e da síndrome de burnout, existe ainda a possibilidade de surgir transtornos psicopatológicos mesmo após o término do evento traumático, denominados de transtornos de estresse pós-traumáticos[21]. Para o diagnóstico, é preciso que surja após o evento traumático, que dure por mais de um mês, mas que tenha duração limitada, e deve causar prejuízos significativos ao convívio social e ocupacional[22].

Ainda, referente a esses transtornos psicológicos, importante comentar que em 2020 com o advento da pandemia do Covid-19, 576 mil segurados do INSS foram afastados, mediante a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (sendo, respectivamente, benefício por incapacidade temporária e benefício por incapacidade permanente), por sintomas e dificuldades que envolvem a inadaptação do home office, o repentino acúmulo de tarefas profissionais e domésticas, o endividamento com a redução de jornada e salários, ansiedades, síndrome do pânico etc.[23]  Esse número representa um aumento de 26% a mais de afastamento do que em 2019 e são consequências que até hoje empregados e segurados ainda sofrem.

Desta feita, esses quadros de transtornos mentais decorrentes das situações de assédio e pressões vivenciadas nas relações de trabalho carecem de atenção, estudo e combate.

  • FORMAS DE COMBATE AO ASSÉDIO

Objetivando o combate ao assédio no meio ambiente de trabalho, o empregador pode se valer de cartilhas educacionais, palestras, treinamentos, dentre outras atividades que têm por objetivo informar e educar seus colaboradores. No entanto, se constatados a ocorrência de assédio, moral ou sexual, através de um processo judicial trabalhista, o empregador, responsável pelos atos de seus empregados, poderá incorrer na condenação de reparar os danos extrapatrimoniais sofridos pela vítima, como será estudado a seguir.

Fato é que os números de vítimas de assédio são exorbitantes e, com vistas a efetivamente combater essa conduta ilícita do meio ambiente laboral, em meados de setembro de 2022 foi promulgado e publicado a Lei n. 14.457/2022, que instituiu o “Programa Emprega + Mulheres”.

  • O DIREITO A INDENIZAÇÃO E A PUNIÇÃO EDUCATIVA

Para os danos ocorridos nas relações de trabalho, a Reforma Trabalhista introduziu na CLT o Título II-A, artigos compreendidos do 223-A a 223-G, de forma a tutelar e a regularizar a tarifação do Dano Extrapatrimonial.

Gustavo Filipe Barbosa Garcia define dano como sendo todo prejuízo causado à pessoa, isto é, a lesão a um bem ou interesse juridicamente tutelado, ao passo que, dano extrapatrimonial, nomenclatura utilizada pelo legislador reformista, é aquele que abrange os de natureza moral, estética e existencial[24].

De forma sucinta, dano moral é a lesão a direitos imateriais da pessoa; dano estético é a lesão a integridade física, em especial, ao que se refere a imagem ou aparência externa da vítima; e, por fim, dano existencial é quando o ilícito cometido frustra um projeto de vida da vítima, ou ainda, impossibilita ou restringe a sua convivência social e familiar[25].   

De acordo com o art. 223-C, CLT, os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa física, isto é, do empregado, são a honra, a imagem, a intimada, a liberdade, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física. De uma simples leitura de referido artigo, a primeira impressão que temos é que se trata de um rol taxativo, todavia, nos valendo do método teleológico e constitucional de interpretação, é incontestável que se incluem nos bens juridicamente tutelados da pessoa do empregado, os dispostos no art. 5º, X e §2º, CF.

Art. 5º. X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

§2º. Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

A prática de assédio, moral ou sexual, causará ao empregado um dano extrapatrimonial que deverá ser indenizado pelo empregador. A tarifação desta indenização está disposta no art. 223-G, que traz um rol, elencados em 12 incisos, de causas agravantes ou atenuantes desta monetização e, sobretudo, nos §§1º a 3º preconiza as regras para classificação do dano (se leve, médio, grave ou gravíssimo) e efetiva tarifação com base no salário contratual do ofendido.

Entretanto, entendemos que a tarifação do dano extrapatrimonial com base no último salário do ofendido é inconstitucional pois dá, à mesma situação, tratamento desigual, em razão única e exclusiva do salário que a vítima recebe ou recebeu, em nítida afronta ao princípio da isonomia disposto no art. 5º, caput, CF. Nas palavras de Adalberto Martins, referida tarifação “prestigia os trabalhadores com salários superiores em detrimento dos trabalhadores menos qualificados e com salários mais baixos”[26]. Fato é que deveriam ser aplicados aos casos de indenização por dano extrapatrimonial, nas relações de trabalho, os arts. 186, 187 e 927 do Código Civil (CC)[27], tal como era de praxe nos Tribunais do Trabalho antes da Reforma Trabalhista.  

Independentemente da aplicação do art. 223-G, CLT ou dos arts. 186, 187 e 927 do CC, para a tarifação do dano, fato é que, por se tratar de um bem extrapatrimonial, é impossível que o ofensor efetivamente repare o dano causado. Ainda, indenização não tem por objetivo a satisfação da vítima, e sim castigar o autor da ofensa;tal castigo se refere a uma sanção educativa ao ofensor, de forma a inibir que volte a praticar atos da mesma natureza[28].

Podemos afirmar, então, que essa indenização tem natureza de mera compensação pelo dano causado, bem como, de punição educativa ao empregador.

  • O PROGRAMA EMPREGA + MULHERES

Em 22 de setembro de 2022 foi publicada a Lei n. 14.457, que instituiu o Programa Emprega + Mulheres, com entrada em vigor no mesmo dia de sua publicação.

Referido programa tem por objetivo principal a inserção e a manutenção de mulher no mercado de trabalho, por meio de estímulos à aprendizagem profissional de mulheres e medidas de apoio aos cuidados de filhos pequenos, a chamada parentalidade na primeira infância, bem como, a prevenção e combate ao assédio sexual e outras formas de violência no âmbito do trabalho, incluindo aí, o assédio moral.

Nada obstante, aspirando a adesão e efetiva observância do Programa em um maior número de empresas, o legislador instituiu o Selo Emprega + Mulher, disposto nos arts. 24 a 28 da Lei 14.457/2022. As microempresas e empresas que pequeno porte que receberem referido Selo, serão beneficiadas com estímulos creditícios adicionais (art. 25), ao passo que as demais empresas, incluindo as microempresas e empresas de pequeno porte, detentoras deste Selo, poderão utilizá-lo para fins de divulgação e propaganda de sua marca, produtos e serviços (art. 27), como uma forma de afirmar que são empresas que incentivam o desenvolvimento profissional de mulheres, que protegem a parentalidade e que buscam um meio ambiente de trabalho mais seguro e saudável a todos os seus colaboradores.

Inclusive, o Selo Emprega + Mulher será concedido às empresas que instituírem boas práticas que visem o efetivo apoio aos empregados que forem vítimas de assédio, violência física ou psicológica no local de trabalho (art. 24, §1º, II, f).

E para tanto, o Capítulo VII, composto pelo art. 23, institui as medidas de prevenção e e de combate ao assédio sexual e outras formas de violência no âmbito do trabalho, que devem ser adotadas pelas empresas que aderirem ao Programa Emprega + Mulher, compreendida, especialmente, pela atuação da CIPA, renomeada pela Lei n. 14.457/2022 de Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Assédio.   

  • ATUAÇÃO DA CIPA

A CIPA, como ensina Paulo Roberto Barsano e Rildo Pereira Barbosa, surgiu através de uma reunião de trabalhadores de diversos países, na Organização Internacional do Trabalho, que em 1921 sugeriram a organizaram de um comitê para estudos de assuntos de segurança e higiene do trabalho, bem como de recomendações de medidas preventivas de doenças e acidentes do trabalho, que poderiam ser adotadas pelos países, que objetivassem promover melhoria nas condições de trabalho de seu povo[29].

No Brasil, a CIPA está regulamentada na NR 5, publicado pela Portaria do Ministério do Trabalho n. 3.214, de 08 de junho de 1978 e tem por objetivo a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador (art. 5.1, da NR 5)[30].

É obrigatório a constituição de CIPA, em conformidade com o disposto na NR 5, para os estabelecimentos com número superior a 20 empregados (Quadro I – Dimensionamento da CIPA, NR 5) e será composta por representantes da empresa, indicados por ela, e representantes dos empregados, eleitos por votação direta (art. 164, CLT), com mandato de duração de 1 ano, permitida uma única reeleição (art. 164, §1º, CLT).

A CIPA, a partir da promulgação do Programa Emprega + Mulheres, incluiu aos objetivos da comissão, dentre aqueles já previstos na NR 5, a prevenção e combate ao assédio sexual e às demais formas de violência no âmbito do trabalho (art. 23, Lei n. 12.457/2022). E, dentre as novas atribuições da CIPA, destacamos a inclusão de regras de conduta a respeito do assédio e outras violências, a fixação de procedimentos para receber, acompanhar e se necessário aplicar sanções às denúncias recebidas e realizar, a cada 12 meses, ações de capacitação e orientação sobre assédio.

O prazo para a implementação destas novidades na atuação da CIPA é de 180 dias após a entrada em vigor do Programa Emprega + Mulheres (art. 23, §2º), portanto, qualquer mudança efetiva no combate ao assédio e outras violências no meio ambiente de trabalho será de constatação futura.  

4. CONCLUSÃO:

            Pelo desenvolvimento deste artigo, constatamos que o assédio é uma conduta que deriva da discriminação, isto é, de uma ação ou omissão, que viola, ofende e atenta contra os direitos de uma pessoa, de forma infundada ou ainda, com base em critérios injustos, tais como a raça, o sexo, a idade, a religiosidade e a posição política. Direitos estes que, para além da integridade física, compreendem os direitos de personalidade, como por exemplo, a liberdade, a privacidade, a honra, a imagem, a sexualidade, a autoestima, a saúde, o lazer, o convívio social.

Constatado a prática de assédio e efetivo dano extrapatrimonial, surge para a vítima o direito à indenização. Todavia, essa indenização monetária, por se tratar de dano à um direito imaterial, não possuí o condão de reparação ou, até mesmo, devolução do bem ofendido, tal como aconteceria com um bem material, como um carro. Posto isso, a indenização possuí, meramente, natureza de compensação monetária ao ofendido, bem como, uma punição educativa ao ofensor, de modo a inibir a reincidência na prática desses atos.   

            No entanto, ante o elevado número de processos interpostos na Justiça do Trabalho que discutem e abordam a prática de assédio moral e sexual, percebemos que a punição financeira não é suficiente para combater a prática desse ilícito no meio ambiente de trabalho. É preciso transformar a cultura.

            Nesse sentido, em meados de setembro de 2022 foi publicada a Lei n. 14.457, instituindo o Programa Emprega + Mulheres que, dentre outros objetivos, trouxe em seu texto, medidas de combate ao assédio sexual e outras violências no meio ambiente de trabalho.

A partir deste programa, a CIPA, para além de prevenção de acidentes, passa a incluir em seu escopo de atuação a prevenção de assédio e demais violências do ambiente laboral, através de criação e promoção de regras de conduta a respeito do assédio e outras violências, a fixação de procedimentos para acolhimento de denúncias, criação de regras para instauração de investigação interna e, se necessário, aplicação de sanções, enfim, de uma efetiva modificação na cultura.

REFERÊNCIAS:

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BOMFIM, Vólia. Direito do Trabalho. 19ª Edição. Rio de Janeiro: Forense; Método, 2022.

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MARTINEZ, Luciano. Curso de Direito do Trabalho: relações individuais, sindicais e coletivas do trabalho. São Paulo: Editora Saraiva, 2022. E-book. ISBN 9786553622128. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553622128/. Acesso em: 28 nov. 2022.

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Tribunal Superior do Trabalho. TST lança cartilha e vídeos sobre assédio moral. Disponível em: https://www.tst.jus.br/assedio-moral Acesso em: 29 nov. 2022. Tribunal Superior do Trabalho. Assédio Sexual: o que é, quais são seus direitos e como prevenir? Disponível em: https://www.tst.jus.br/assedio-sexual Acesso em: 29 nov. 2022.


[1] Mestranda em Direito pela PUC-SP. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela FGV-SP. Advogada.

[2] Evani Zambom Marque da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro. Psicologia Judiciária para Concursos da Magistratura. P. 33

[3] Ministéro do Trabalho e Emprego apud Evani Zambom Marque da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro. Psicologia Judiciária para Concursos da Magistratura. P. 34 e 35.

[4] Evani Zambom Marque da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro. Psicologia Judiciária para Concursos da Magistratura. P. 36

[5] Tribunal Superior do Trabalho. TST lança cartilha e vídeos sobre assédio moral. Disponível em: https://www.tst.jus.br/assedio-moral

[6] Id. Assédio Sexual: o que é, quais são seus direitos e como prevenir? Disponível em: https://www.tst.jus.br/assedio-sexual

[7] Alice Monteiro de Barros. Curso de Direito do Trabalho. P. 927.

[8] Evani Zambom Marque da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro. Psicologia Judiciária para Concursos da Magistratura. P. 36

[9] Adalberto Martins. Manual Didático de Direito do Trabalho. P. 341.

[10] Carla Pinheiro. Manual de Psicologia Jurídica. P. 146.

[11] Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. P. 951.

[12] Tribunal Superior do Trabalho. Cartilha de Prevenção ao Assédio Moral: Pare e Repare por um Ambiente de Trabalho + Positivo. P. 11.

[13] Evani Zambom Marque da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro. Psicologia Judiciária para Concursos da Magistratura. P. 37.

[14] Alice Monteiro de Barros. Curso de Direito do Trabalho. P. 949.

[15] Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. P. 953.

[16] Adalberto Martins. Manual Didático de Direito do Trabalho. P. 337

[17] Rodolfo Pamplona Filho. O assédio sexual na relação de empego. P. 62.

[18] Evani Zambom Marque da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro. Psicologia Judiciária para Concursos da Magistratura. P. 49

[19] Carla Pinheiro. Manual de Psicologia Jurídica. P. 55.

[20] Evani Zambom Marque da Silva e Lídia Rosalina Folgueira Castro. Psicologia Judiciária para Concursos da Magistratura P. 50 e 51.

[21] Id Ibidem. P. 54.

[22] Id Ibidem. P. 55

[23] Notícias do TST. Saúde mental no trabalho: a construção do trabalho seguro depende de todos nós.

[24] Gustavo Filipe Barbosa Garcia. Curso de Direito do Trabalho. P. 90

[25] Id Ibidem. Mesma página.

[26] Adalberto Martins. Manual Didático de Direito do Trabalho. P. 345.

[27] Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

[28] Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. P. 944.

[29] Paulo Roberto Barsano e Rildo Pereira Barbosa. Higiene e Segurança do Trabalho. P. 53.

[30] Carla Teresa Martins Romar. Esquematizado – Direito Processual do Trabalho. P. 1010.