MÉTODOS ADEQUADOS DE PREVENÇÃO E SOLUÇÃO DE CONFLITOS: DESAFIOS E OPORTUNIDADES NA CONSTRUÇÃO DE UMA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA CONSENSUAL

MÉTODOS ADEQUADOS DE PREVENÇÃO E SOLUÇÃO DE CONFLITOS: DESAFIOS E OPORTUNIDADES NA CONSTRUÇÃO DE UMA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA CONSENSUAL

APPROPRIATE METHODS OF CONFLICT PREVENTION AND RESOLUTION: CHALLENGES AND OPPORTUNITIES IN BUILDING A CONSENSUAL PUBLIC ADMINISTRATION

Artigo submetido em 25 de abril de 2024
Artigo aprovado em 07 de maio de 2024
Artigo publicado em 30 de junho de 2024

Cognitio Juris
Volume 14 – Número 55 – Junho de 2024
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Carla Thamilis Fonseca Chaves[1]

RESUMO: Este artigo proporciona reflexões sobre os métodos de prevenção e resolução de conflitos aplicáveis à Administração Pública, tanto em sua atualidade quanto em seu histórico de interações com agentes privados do setor de infraestrutura. O objetivo da pesquisa foi verificar como o uso da arbitragem, da mediação, da conciliação e dos comitês de resolução de disputa foi historicamente previsto no arcabouço normativo e quais as implicações da legislação recente, que assimila a noção de consensualidade, em face dos princípios e regras próprios do regime jurídico administrativo. Subsidiariamente, foi analisado o emprego das mediações e dos comitês de resolução de disputa, tendo em vista sua aptidão para dirimir e prevenir conflitos em contratos de infraestrutura. Para abordar estes temas, foi realizada uma pesquisa exploratória de natureza qualitativa, seguindo um método dedutivo fundamentado na revisão da literatura e em pesquisa documental. A evolução legislativa revelou a inclusão de regras sobre solução de controvérsias nos setores de infraestrutura regulados pelas agências reguladoras desde 1996. No entanto, foi somente a partir de 2015 que a legislação dissipou as incertezas quanto ao uso de soluções alternativas nos conflitos envolvendo a Administração Pública, estimulando a utilização de instrumentos como conciliação, mediação, arbitragem e comitês de disputa. Esta abertura tem provocado um debate intenso sobre a adoção de soluções consensuais em conformidade com os princípios e normas do regime jurídico administrativo, destacando-se o princípio da indisponibilidade do interesse público. Observa-se uma tendência favorável aos métodos consensuais como um caminho adequado para prevenir e resolver conflitos na esfera pública, fortalecendo, assim, as estruturas institucionais que incorporam a mediação e a regulamentação dos comitês de disputa.

Palavras-chave: Prevenção e solução de conflitos; administração pública; soluções consensuais, infraestrutura.

ABSTRACT: This article provides reflections on conflict prevention and resolution methods applicable to Public Administration, both presently and historically in its interactions with private agents in the infrastructure sector. The research objective was to examine how the use of arbitration, mediation, conciliation, and dispute resolution boards was historically envisaged in the regulatory framework and what the implications of recent legislation, which assimilates the notion of consensuality, are considering the principles and rules inherent to the administrative legal regime. Additionally, the utilization of mediations and dispute resolution boards was analyzed, considering their aptitude for resolving and preventing conflicts in infrastructure contracts. To address these topics, an exploratory qualitative research was conducted, following a deductive method grounded in literature review and documentary research. Legislative evolution revealed the inclusion of dispute resolution rules in infrastructure sectors regulated by regulatory agencies since 1996. However, it was only from 2015 onwards that legislation dispelled uncertainties regarding the use of alternative solutions in conflicts involving Public Administration, encouraging the utilization of instruments such as conciliation, mediation, arbitration, and dispute committees. This openness has sparked intense debate on the adoption of consensual solutions in accordance with the principles and norms of the administrative legal regime, with the principle of non-availability of public interest standing out. There is a favorable trend towards consensual methods as a suitable path to prevent and resolve conflicts in the public sphere, thus strengthening institutional structures that incorporate mediation and the regulation of dispute boards.

Keywords: Conflict prevention and resolution; public administration; consensual solutions; infrastructure.

1 INTRODUÇÃO

O conflito é um fenômeno presente em diversas relações jurídicas, especialmente naquelas que envolvem a Administração Pública e agentes privados. Sendo inerente às relações, é inegável a necessidade de um tratamento eficaz dos conflitos, envolvendo a análise detalhada do problema e o desenvolvimento de estratégias de resolução adequadas aos interesses das partes envolvidas. Essa tarefa se torna progressivamente mais desafiadora à medida que as questões se complexificam no mundo moderno (Rossi; Mendes, 2023, p. 5).

Diante deste cenário, o emprego de métodos adequados de prevenção e solução de conflitos[2] torna-se desejável, pois contribui para conferir mais segurança às relações, na medida em que se as partes de comprometem em aplicar o instrumento mais hábil para resolver a controvérsia.

A solução do conflito envolve meios que podem ser autocompositivos, cujas principais formas são a negociação, a conciliação e a mediação, ou heterocompositivos, promovidos através do processo judicial e pelos procedimentos realizados na arbitragem. Este tema dos métodos alternativos integra aquilo que se designou como terceira onda renovatória do direito processual civil, que inclui a utilização de mecanismos privados ou informais de solução dos litígios (Cahali, 2022, p. 41).

Tal onda renovatória adentrou de vez o campo do direito administrativo com a inclusão do art. 151 da Lei 14.133/2021, que estabeleceu claramente que nas contratações regidas por esta lei podem ser empregados métodos “alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, tais como conciliação, mediação, comitê de resolução de disputas e arbitragem” (Brasil, 2021, s.p.).

Em face dessa disposição, o presente artigo propõe reflexões a respeito dos métodos de prevenção e solução de conflitos aplicáveis à Administração Pública, tanto na atualidade como em seu histórico de relações com agentes privados no âmbito da infraestrutura. O objetivo da pesquisa foi verificar como o uso da arbitragem, da mediação, da conciliação e dos comitês de resolução de disputa foi historicamente previsto no arcabouço normativo e quais as implicações da legislação recente, que assimila a noção de consensualidade, em face dos princípios e regras próprios do regime jurídico administrativo. Subsidiariamente, buscou-se analisar o emprego das mediações e dos comitês de resolução de disputa, tendo em vista sua aptidão para dirimir e prevenir conflitos em contratos de infraestrutura.

Para tanto foi empreendida pesquisa exploratória, de caráter qualitativo, por método dedutivo, baseada na revisão da literatura e na pesquisa documental. Inicialmente foram sistematizados os trechos da legislação que tratam das soluções extrajudiciais de conflito e identificada a evolução dos institutos atrelados a essa temática. Na sequência foram examinados o paradigma da indisponibilidade do interesse público vis-à-vis à ideia de consensualidade. Por fim, para aferir a prática do setor de infraestrutura, foram detalhadas duas alternativas para prevenção e solução de conflitos: a mediação e os comitês de resolução de disputas.

2 HISTÓRICO DE UTILIZAÇÃO DOS MÉTODOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS QUE ENVOLVEM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Embora a ideia de uma administração pública autocompositiva e aberta a outros meios de solução de conflitos possa parecer inovadora no contexto brasileiro atual, ao examinar legislações do Império, em que as relações entre o poder público e investidores privados envolviam segmentos da infraestrutura pública, percebe-se que outros meios de solução já foram formalmente reconhecidos em outros períodos da história.

Por exemplo, o Decreto nº 24, de 1835, que autorizava o Governo a conceder serviços de navegação a uma determinada companhia privada, imponha como condição a avaliação por “árbitros” de terrenos privados destinados à infraestrutura. Aos proprietários destes terrenos eram garantido o recurso a “Tribunal competente” somente em relação à qualidade desta avaliação[3]. Além disso, o decreto determinava que o “juízo de árbitros” seria responsável por decidir sobre investimentos que não fossem amortizados ou recuperados ao término do período de concessão, quando os bens seriam revertidos ao Estado[4] (BRASIL, 1835, s.p.).

Outro exemplo é o Decreto de 8 de janeiro de 1836, no trecho em que tratava da concessão de navegação e determinava a maneira de “remir as obras”, ou seja, de amortizar os investimentos. Tal este procedimento seria definido por um colegiado de árbitros composto por três nomeados pelo Governo Geral e três pela Companhia, sendo pelo menos dois engenheiros especialistas na matéria (Brasil, 1836).

Posteriormente, o Decreto nº 1.746, de 1869[5], autorizou a contratação de construção nos portos do Império e permitiu a resolução de questões entre o governo e os empresários por árbitros, definidos de forma que um fosse indicado pelo governo, outro pelos empresários, e o terceiro fosse escolhido por acordo entre as partes ou sorteado (Brasil, 1869, s.p.).

Nestes exemplos, há a figura de um terceiro, denominado árbitro, ou de um colegiado de árbitros, que possuía autoridade para resolver a controvérsia sem a intervenção do Estado. Este modelo se assemelha ao empregado na arbitragem contemporânea, que é considerada o método mais adequado para uma variedade de situações, especialmente em conflitos de natureza complexa (Cahali, 2022, p. 123).

A arbitragem é atualmente reconhecida como um mecanismo global de criação de direito. Devido à sua padronização técnica e ao autocontrole profissional, esse mecanismo está relacionado à tendência de desenvolvimento de formas de coordenação em escala mundial, nas quais a intervenção política é mínima (Teubner, 2003, p.11).

No cenário brasileiro, a análise das legislações federais que regulam os setores de infraestrutura, apresentada no Apêndice 1, revela que as soluções extrajudiciais de conflitos ganharam destaque a partir de 1996, com a instituição da Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307) (Brasil, 1996, s.p.). Nas leis promulgadas nos anos subsequentes, tornou-se obrigatória a inclusão de cláusulas sobre resolução de disputas como componente essencial dos contratos de concessão, conforme evidenciado nos excertos apresentados no quadro do Apêndice 1.

Em 2005, Lei nº 11.196 alterou a Lei Geral das Concessões (Lei 8.987/95) de modo a estender a previsão de emprego de mecanismos privados para resolução de disputas a todos os contratos de concessão (Brasil, 1995, s.p.). Uma década depois, as legislações reforçaram o uso da arbitragem pela administração pública, e o Código de Processo Civil, editado em 2015, tratou da criação de câmaras de mediação e conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de conflitos no âmbito administrativo (Brasil, 2015, s.p.).

No contexto das contratações públicas, o Regime Diferenciado de Contratações Públicas, a partir de 2015, passou a admitir o emprego de mecanismos privados de resolução de disputas, incluindo a arbitragem (Brasil, 2011, s.p.). Essa previsão foi ampliada na nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei 14.133/2021), que estabeleceu a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem como meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias em contratos administrativos (Brasil, 2021).

Mesmo antes da vigência da Lei 14.133/2021 a doutrina e jurisprudência já encontravam nos enunciados uma referência para aplicação da arbitragem, mediação e dispute boards envolvendo a Administração Pública[6]. O debate e estudo de relevantes temas de Direito Administrativo voltou aos olhos do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal dada sua atualidade e inúmeros conflitos e controvérsias que desaguam na Justiça Federal e em todo o Judiciário brasileiro (Brasil, 2020, p. 3).

O Direito Administrativo brasileiro tem experimentado mudanças, em face das “rápidas e complexas transformações do modelo de Estado, notadamente a partir da década de 90 do século XX, após o advento da Constituição Federal de 1988, com o surgimento de temas novos, inexistentes na sua construção clássica” (Brasil, 2020, p. 3).

Tais mudanças, nas palavras de DI PIETRO, estão intimamente relacionadas à globalização, ao neoliberalismo e ao neoconstitucionalismo, fenômeno que, no Brasil, inseriu princípios da Administração Pública no art. 37 da Carta de 1988, ampliou os mecanismos de controle da Administração Pública, com reflexos na redução da discricionariedade administrativa, na valorização dos direitos fundamentais e no crescimento do consensualismo, entre outros, sob inspiração do direito comunitário europeu e do direito norte-americano (Brasil, 2020, p.3).

É crucial entender que a ideia de uma administração pública que prioriza o consensualismo e a resolução de conflitos por meios extrajudiciais ainda precisa ser mais explorada[7].

Alguns teóricos, como Martins (2010; 2021), se posicionam contra a utilização da arbitragem em concessões de serviços públicos, sustentando que isso viola a natureza indisponível do interesse público. A resistência à resolução consensual de conflitos é fundamentada, ainda, em outros elementos estruturais do direito administrativo, como a vinculação à lei (princípio da legalidade) e a falta de um marco legal para facilitar o controle da atuação administrativa (Neves; Ferreira Filho, 2017, passim)

No entanto, existe uma corrente que argumenta que os princípios do Direito Administrativo têm sido reinterpretados pela doutrina contemporânea. Esses princípios, segundo essa visão, não devem ser usados como barreiras para que a Administração Pública evite adotar métodos alternativos de resolução de conflitos (Petine, 2023, p. 23).

Dada a relevância deste assunto, procede-se à análise da interação entre a indisponibilidade do interesse público e a consensualização para, a partir disso, explorar dois relevantes métodos: a conciliação e o comitê de resolução de disputa.

3 A INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO E AS SOLUÇÕES CONSENSUAIS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

As relações jurídicas estabelecidas pela administração se fundamentam em dois princípios essenciais: a supremacia do interesse público e a indisponibilidade, pela Administração, desse interesse. O interesse público, entendido como o interesse do conjunto social, corresponde à dimensão pública dos interesses individuais, ou seja, dos interesses de cada membro da sociedade, os quais são juridicamente representados pelo Estado.

Nesse contexto, o interesse público não se opõe ao interesse individual, mas representa sua vertente coletiva. Por serem interesses qualificados como pertencentes à coletividade, os interesses públicos não estão sujeitos à livre disposição de qualquer pessoa, sendo considerados inapropriáveis (Mello, 2023, p. 63). Ou seja, no âmbito administrativo, os bens e interesses não estão sujeitos à livre vontade do administrador. A incumbência da Administração é salvaguardar o interesse público conforme os propósitos delineados na legislação.

O principal fundamento teórico que se emprega para se admitir a consensualidade em face da indisponibilidade do interesse público é a distinção entre interesse público primário e secundário, discutido por Renato Alessi[8], cujo entendimento foi seguido pela jurisprudência e doutrina brasileiras (Di Pietro; Martins Junior, 2022, p. RB-18.9).

Segundo Di Pietro e Martins Junior (2022, p. RB-18.9), este cenário promove alterações no panorama das relações de administração ao estabelecer a consensualidade como um dos princípios na transição do modelo burocrático do Estado para a administração gerencial. Isso implica substituir, sempre que possível, a imposição pelo consenso nas interações entre o poder público e os cidadãos, por meio de iniciativas voltadas para o aumento da coordenação (cooperação e colaboração) e parcerias.[9]

Klein e Marques Neto (2022) sustentam, ainda, que

a celebração de acordos não implica renúncia ao exercício de competências administrativas nem omissão no desempenho de poderes. Trata-se apenas da adoção de determinado procedimento para se chegar à decisão final. A eventual vulneração ao interesse público decorrerá do próprio conteúdo da decisão, tenha sido ela formalizada como ato unilateral ou acordo. (Klein e Marques Neto, 2022, p. RB-19.3)

A adoção de métodos consensuais tem sido considerada uma alternativa viável para atender aos interesses públicos envolvidos em disputas. Odete Medauar (2003, s.p. apud Rosa, 2023, p. 26), ao citar enfatiza que considerar a indisponibilidade como uma barreira para as práticas consensuais da Administração Pública seria “uma negação da realidade”, uma vez que diversas práticas consensuais são rotineiramente realizadas na atividade administrativa, tais como acordos, negociações, conciliações, mediações, arbitragens, entre outras.

Desta maneira, a doutrina majoritária tem se orientado no sentido de admitir a elaboração de transação entre o administrado e a Administração Pública, em concordância com o enunciado 21 do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo que considera os artigos 26 e 27 da LINDB cláusula geral que autoriza o uso de solução consensual de controvérsias (Dal Pozzo; Rocha, 2024, p. RB-3.5):

Os artigos 26 e 27 da LINDB constituem cláusulas gerais autorizadoras de termos de ajustamento, acordos substitutivos, compromissos processuais e instrumentos afins, que permitem a solução consensual de controvérsias.

Para Cuéllar e Moreira (2018, s.p.) já se passou o tempo do preconceito e da negação. A ênfase atual está na busca por formas mais eficazes e pacíficas de solução de conflitos.

4          MEDIAÇÃO ENVOLVENDO A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: O QUE TEMOS DE NOVO

Após a Resolução CNJ nº 125/2010, a Lei nº 13.129/2015[10], a Lei nº 13.140/2015 e o Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), a Administração Pública tem assimilado os desdobramentos dessa política de consensualização de conflitos (Silva; Bezerra Júnior, 2021, p.2).

A prática se espraiou para diversas esferas, como para os conflitos ambientais, onde passam a existir incentivos às práticas de conciliação (Silva; Bezerra Júnior, 2021, passim); para os conflitos dos entes federativos estaduais e municipais, com a criação das Câmaras de Prevenção e Resolução Administrativas de Conflitos (Lacerda; Mello, 2021, passim); e para os ajustamentos de conduta, que tendem a substituir decisões unilaterais por soluções negociadas e compartilhamento de poder com o Ministério Público (Martins Júnior, 2019, passim).

No âmbito das contratações públicas, sobretudo nos contratos atinentes às obras e concessões de infraestrutura, a Lei nº 14.133/2021 conferiu reforço ao emprego dos diversos instrumentos que viabilizam o consenso entre as partes, como a conciliação, a mediação e o comitê de resolução de disputas, o que pode significar a intensificação da consensualização de conflitos.

Para tratar da mediação, que tudo indica ser o instrumento adequado aos conflitos que envolvem contratos, primeiro se faz necessária a distinção entre conciliação e mediação, dada a proximidade dos conceitos. 

A diferenciação entre conciliação e mediação é especialmente delineada pela origem do conflito (seja objetivo ou subjetivo), pela abordagem do facilitador e pelas técnicas empregadas (Cahali, 2023, p. 47). Segundo o Código de Processo Civil, o conciliador atuará “preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem”.  O mediador, por sua vez, “atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreenderem as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos” (Brasil, 2015, s.p.).

Em se tratando de conflito que envolve a Administração Pública, a mediação busca estabelecer uma transação direta entre as partes, em um ambiente chancelado por instituições imparciais, como câmaras de mediação e os próprios mediadores, entidades que funcionam como facilitadores e incentivadores para a resolução de controvérsias (Cuéllar; Moreira, 2018, p. 3).

Cuéllar e Moreira (2018, p. 13) lecionam que ao participar de uma mediação, os órgãos e entidades da Administração Pública seguem seus respectivos regimes jurídicos específicos, desde os das empresas estatais até os da Administração direta, passando pelas leis que regem as autarquias, fundações públicas e agências reguladoras, entre outros. Desta maneira, Administração deve cumprir a legislação específica relacionada ao pacto que gerou o conflito.

Quando se menciona uma solução consensual na Administração Pública, implementada por meio de transações mediadas por terceiros imparciais, está a se tratar de modulações da discricionariedade administrativa, pautadas pela legalidade específica do caso concreto. “O que o mediador faz é estimular o exercício legítimo da discricionariedade administrativa por parte da autoridade a quem foi normativamente atribuída” (Cuéllar e Moreira, 2018, p. 14).[11]

Para além do aparato normativo, a implementação da política de consensualização de conflitos no âmbito da Administração Pública também tem exigido a criação de estruturas dentro da própria administração, voltadas para a prevenção e solução consensual de conflitos. No âmbito federal foram identificadas duas delas: Câmara de Mediação e Conciliação da Administração Pública Federal – CCAF/AGU, criada em 2007; e a Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos – SecexConsenso, instituída em 2022.

A Câmara de Mediação e Conciliação da Administração Pública Federal – CCAF/AGU atua na prevenção e solução consensual de conflitos envolvendo órgãos públicos federais, autarquias ou fundações públicas federais (Brasil, 2020a, s.p.).

Inicialmente denominada Câmara de Conciliação[12] e Arbitragem da Administração Federal, a CCAF foi criada com a finalidade de dar continuidade às atividades conciliatórias que já eram desenvolvidas no âmbito da Advocacia-Geral da União pelas Câmaras de Conciliação ad hoc[13]. A CCAF foi instituída prevendo a competência de promover o deslinde, no âmbito da Advocacia Geral da União, em sede administrativa, de controvérsias de natureza jurídica entre órgãos e entidades da Administração Pública Federal, por meio de conciliação ou arbitramento (Brasil, 2012, p. 9).

Em 2008, foi estendida a possibilidade de solução administrativa pela via da conciliação para controvérsias de natureza jurídica entre a Administração Pública Federal e a Administração Pública dos Estados ou do Distrito Federal. Tal possibilidade, em 2009, foi estendida para municípios capitais de estado ou que possuam mais de duzentos mil habitantes (Brasil, 2012, p. 10).

Com o passar dos anos, a função de promover arbitragem deixou de ser aplicada conforme seu escopo de atuação foi ampliado ao longo do tempo, incluindo Estados, municípios e entes privados.  Os acordos promovidos pela CCAF/AGU não exigem necessariamente concessões de ambas as partes, mas sim uma análise do que é fundamental para cada uma e dos riscos envolvidos em levar a questão ao Judiciário. Trata-se de uma negociação investigativa, na qual é importante compreender os interesses além dos pedidos em si (Olivon, 2023, s.p.).

Dados de 2023 (Olivon, 2023, s.p.)[14] apontam que nos últimos cinco anos a Câmara concluiu 143 processos, com um montante negociado de R$ 278,5 bilhões. Em setembro de daquele ano havia 218 casos em tramitação – cerca de 70 admitidos e o restante em exame de admissibilidade – sob responsabilidade dos 15 mediadores da entidade.

Os 143 casos resolvidos representam cerca da metade do total levado à Câmara. A solução desses casos ocorreu, em média, em um ano e sete meses (634 dias), mais rapidamente do que no Judiciário, que leva em média 3,4 anos por meio do processo eletrônico, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) (Olivon, 2023, s.p.).

Diante do volume de recursos negociados por essa via, é pertinente destacar que o Decreto nº 10.201, de 2020, estabelece os valores de alçada para a autorização de acordos ou transações celebradas por pessoa jurídica de direito público federal e por empresas públicas federais, para prevenir ou terminar litígios, inclusive os judiciais. O Decreto estabelece ainda a quem compete autorizar a realização de acordos ou transações, que varia a depender do valor em questão[15] (Brasil, 2020c, s.p.).

Outra via de mediação de conflitos que envolvem a Administração Pública federal é a Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos – SecexConsenso, instituída em dezembro de 2022, pertencente à estrutura do Tribunal de Contas da União[16] (Brasil, 2022, s.p.).

A unidade é dividida em quatro eixos principais, que priorizam transversalmente: a construção colaborativa de soluções consensuais na administração pública; o diálogo com as instituições na prevenção dos conflitos; o compartilhamento de informações entre entidades públicas durante a fase de negociação dos acordos de leniência, com a inclusão dos processos do TCU no escopo desses acordos; a elaboração e execução de estratégias para a participação cidadã no dia a dia do TCU, com o intercâmbio nacional e internacional de boas práticas; e a articulação de ações do controle externo com os Tribunais de Contas do Brasil, além do compartilhamento de boas práticas de políticas públicas descentralizadas (Brasil, 2022, s.p.).

Os novos arranjos normativos e institucionais criam condições para a consolidação de uma Administração Pública autocompositiva, atuante na busca pela melhor e mais célere solução para conflitos. Para além da solução, os métodos consensuais também alcançam a prevenção dos conflitos, como é o caso dos comitês de resolução de disputa, tópico que abordaremos a seguir.

5 COMITÊ DE RESOLUÇÃO DE DISPUTAS: UMA ALTERNATIVA PARA PREVENIR CONFLITOS EM CONTRATOS COMPLEXOS

Os comitês de resolução de disputas, também conhecidos como Dispute Boards, consistem em comitês compostos por especialistas, cujas competências e âmbito de atuação são estipulados contratualmente pelas partes. Em geral, esses comitês assumem a responsabilidade pelo acompanhamento da execução de contratos complexos de médio ou longo prazo. Eles respondem aos questionamentos das partes e a eventuais controvérsias entre elas, com o objetivo de evitar a instauração formal de litígios que possam atrasar a execução contratual (Silva, 2019, p. 7).

O modelo de Dispute Resolution Boards, ou simplesmente Dispute Boards, que passou a ser previsto expressamente na legislação pátria no art. 151 da nova Lei de Licitações e Contratos foi idealizado pela indústria de construção na década de 70, nos Estados Unidos (Brasil, 2021, p. 25). Em sua origem mais remota, o modelo remonta à figura do “engenheiro consultor” nos primeiros modelos contratuais da Fédération Internationale des Ingénieurs-Conseils (FIDIC), sediada na Suíça (Silva, 2019, p. 29).

Na prática atual, um Comitê de Resolução de Disputas (CRD) é formado por um grupo de profissionais especializados, frequentemente composto por engenheiros e advogados, que supervisionam o andamento do contrato desde o início e são chamados para intervir em situações de conflito (Feitosa; Braulino, 2023, p. 8).

Mesmo antes de a Lei nº 14.133/2021 incluir a previsão destes comitês, a sua adoção, mediante a inserção da cláusula correspondente nos contratos, já era altamente recomendável para os contratos de construção ou obras de infraestrutura, por considera-lo mecanismo é direcionado à prevenção de litígios e à redução dos custos correlatos, permitindo a resolução imediata de conflitos que possam surgir durante a execução dos contratos. Quando os contratantes acordam pela sua adoção obrigatória, as decisões proferidas por um Comitê de Resolução de Disputas, vinculam as partes até que o Poder Judiciário ou o juízo arbitral competente emita nova decisão ou a confirme, caso sejam provocados pela parte inconformada[17]  (Brasil, 2016, s.p.).

Um dos diferenciais dos Dispute Boards em relação a outros mecanismos alternativos de resolução de controvérsias é que, em regra, são estabelecidos desde o início do empreendimento. Eles realizam visitas presenciais ao local da obra e se envolvem ativamente no desenvolvimento dos projetos. Isso confere ao Dispute Board um valor de “tempo-real” (“‘real-time’ value“), tornando-o parte da administração do projeto. Durante a execução do contrato, o Dispute Board pode influenciar a performance das partes contratantes para evitar problemas que, se ignorados, poderiam resultar em disputas (Silva, 2019, p. 36-37).

Quanto ao momento de instauração, os Dispute Boards podem ser considerados “permanentes” (ou “full-term“) quando estão ativos desde a celebração ou início da execução do contrato, exercendo sua função independentemente da existência de qualquer controvérsia. Por outro lado, são considerados Dispute Boards “ad hoc” quando são instaurados somente após o surgimento de uma controvérsia entre as partes (Silva, 2019, p. 38-39)[18].

No que diz respeito à eficácia das decisões, os Dispute Boards são geralmente divididos em três modalidades: Dispute Review Boards (DRB), que que aconselha as partes com sugestões apenas; Dispute Adjudication Boards (DAB), o qual o comitê desempenha função decisória, impondo as soluções; e Combined Dispute Boards (CDB), que pode tanto emitir recomendações não vinculantes quanto proferir decisões vinculantes (CAC, 2024, s.p.).

Após a edição da Lei nº 14.133/2021, o Conselho de Justiça Federal editou enunciados que orientam a aplicação deste instituto nos contratos administrativo (BRASIL, 2021b). Quanto à modalidade, é recomendado que seja utilizada, preferencialmente, a modalidade combinada, na qual o comitê pode emitir recomendações e decisões. Quanto à natureza dessas decisões, convencionou-se que se trata de natureza contratual, que refletem a vontade das partes que optaram por essa forma de resolução de conflitos, devendo ser cumpridas obrigatória e imediatamente, sem prejuízo de eventual questionamento fundamentado em ação judicial ou procedimento arbitral[19].

Embora se considere a inclusão na Lei nº 14.133/2021 um avanço substancial no sentido de utilização dos comitês de resolução de disputas nos contratos administrativos, a legislação brasileira sobre a matéria ainda está em construção.

Na Câmara dos Deputados, tramita o Projeto de Lei nº 9.883, de 2018, apensado ao Projeto de Lei nº 2.421, de 2021, de iniciativa do Senado Federal, ambos dispondo sobre o uso dos Comitês de Resolução de Disputas (Dispute Boards) em contratos administrativos (Brasil, 2024).

No âmbito da regulação de transportes terrestres, a regulamentação do Comitê de Prevenção e Solução de Disputas foi objeto de audiência pública, em 2023. Na análise de impacto regulatório apresentada naquela ocasião (Brasil, 2023, s.p.), foram apresentados uma série de experiências, relacionadas no Quadro 1, que exemplificam o emprego deste instrumento em casos práticos.

Quadro 1 – Contrato de obra pública que se tem conhecimento de utilização do Comitê de Prevenção e Solução de Disputas:

LegislaçãoDisposições acerca das soluções extrajudiciais de conflitos
Obra da linha 4 do metrô em São Paulo, sendo um requisito demandado pelo Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento – BIRD, em função do financiamentoO comitê foi constituído em 2004 e foi denominado “Junta de Revisão de Litígios”, composta por três membros. Considera-se esse caso o primeiro a utilizar o Comitê de Prevenção e Solução de Disputas (Dispute Board) no âmbito da administração pública brasileira. A atuação da Junta ocorreu de forma permanente ao longo do prazo da obra e a natureza de suas manifestações era recomendatória, ou seja, não vinculante.
Prorrogação antecipada do contrato de concessão da Estrada de Ferro Vitória à MinasProposição de utilização do Dispute Board (denominado nesses contratos como Comitê de Prevenção e Resolução de Divergências) exclusivamente para divergências oriundas da execução da obra de implantação da infraestrutura e superestrutura ferroviária de trecho da Ferrovia de Integração Centro-Oeste – FICO. O dispositivo previu um comitê formado por 3 membros com o objetivo de prevenir e solucionar divergências de natureza eminentemente técnica, sendo listados os temas passíveis de submissão ao Comitê, em rol taxativo, na subcláusula
Delegação de trecho da Rodovia MG-050, mediante concessão patrocinadaO Contrato nº 007/2007 previu a instituição de um comitê técnico com as características do Dispute Board. O Comitê foi composto por três membros e tem por objetivo solucionar eventuais divergências de natureza técnica. O seu funcionamento observaria as regras dispostas no Regimento Interno do comitê, que seria aprovado por todos os membros em até 30 dias após a designação. Os membros do comitê teriam mandato de três anos, não prorrogáveis, e direito a remuneração especial, por evento, a ser definida pelo Poder Concedente e paga pela concessionária. As demais despesas necessárias para o funcionamento do comitê também seriam de responsabilidade da concessionária. Assim, o comitê teria um caráter permanente, mas atuará, efetivamente, apenas após a solicitação de umas das partes para solucionar determinada controvérsia. No contrato não havia indicação expressa da natureza da manifestação do comitê técnico, entretanto, fazendo um exercício de interpretação da redação contratual foi possível concluir que se trata de decisões vinculantes.
Rodoanel Metropolitano de Belo HorizonteAbertura de propostas ocorreu em 12/08/2022, prevê em seu contrato a possibilidade de utilização de um Comitê de Acompanhamento e de Solução de Divergências (Dispute Board), para solucionar controvérsias que versam sobre direitos patrimoniais disponíveis de natureza técnica ou econômico-financeira relacionadas à interpretação e execução do contrato. Utiliza-se o tipo institucional, já definindo o regramento da Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial Brasil – CAMARB como o balizador dos procedimentos a serem observados pelo comitê. O comitê será instaurado em até 90 dias contados do início da vigência da concessão e permanecerá ativo até a efetiva conclusão de todas as alças do Rodoanel. Para o acionamento do comitê, a controvérsia deverá referir-se a um valor mínimo de R$ 100.000.000,00.
Hidrelétrica de Ertan na ChinaBarragem contratada pelo Estado Chinês, construída no período de 1991 – 1999, por meio de joint ventures internacionais. A referida contratação foi instrumentalizada em dois termos, ambos com Dispute Board instalados com três membros que se reuniam três vezes por ano, sendo que suas decisões eram recomendações não vinculantes. Nenhuma das quarenta análises foram enviadas para arbitragem. Tratou-se do primeiro projeto que adotou o Dispute Board na China.
Construção da Barragem de Katse Dam, em Lesoto, na China.A Barragem foi construída entre 1993 e 1998 por um consórcio de empresas de diversos países. O painel foi composto por três membros, sendo que cada parte escolheu um membro e estes escolheram o presidente do comitê. Foram submetidas doze controvérsias ao comitê, sendo que somente uma foi enviada à arbitragem, que corroborou o entendimento do painel. A manifestação do comitê tinha caráter não vinculante. A experiência foi a primeira no continente africano.
Construção da Barragem do Rio Paraná, na ArgentinaNo período de 2003 a 2006. O comitê era formado por três profissionais que tinham encontros trimestrais. As decisões tinham caráter vinculante, podendo ser submetidas à arbitragem e judicialização, porém, das oito decisões exaradas nenhuma foi reavaliada.
Rodovia de Dockland, na InglaterraContrato de concessão que abrange a construção e manutenção da rodovia. A construção ocorreu entre os anos 1996 e 1999 e não houve qualquer conflito que demandasse o auxílio do comitê, cuja manifestação tinha natureza vinculante.

Fonte: Quadro sistematizado pela autora com informações do relatório de Análise de Impacto Regulatório da Agência Nacional de Transporte Aquaviário (Brasil, 2023).

Com estes avanços, a Administração Pública federal confere maior robustez a este meio de prevenção de conflitos, de modo a viabilizar a sua aplicação nos contratos administrativos que se referem a obras e concessões de infraestrutura.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa exploratória permitiu uma visão abrangente sobre a prevenção e resolução de conflitos por meio de métodos que priorizam o consenso e a autocomposição.

O histórico revelou que, embora nos anos mais recentes tenha ocorrido uma abertura da administração pública às soluções extrajudiciais de conflito, o uso de métodos alternativos de resolução de controvérsias já era previsto em legislações do Império, que mencionavam decisões proferidas por árbitros em questões patrimoniais e remuneratórias dos contratos de concessão de bens públicos.

A evolução da legislação, a partir de 1996, demonstra que a regulação de diversos setores de infraestrutura incluía regras sobre a solução de controvérsias nos contratos regulados pelas agências. Contudo, foi somente a partir de 2015, com o novo Código de Processo Civil (CPC), que a legislação dissipou as dúvidas que pairavam sobre o uso das soluções alternativas nos conflitos que envolvem a Administração Pública, conferindo novo impulso ao uso da conciliação, mediação, arbitragem e comitês de disputa.

Com essa abertura, intensificou-se o debate sobre o emprego de soluções consensuais em um ambiente jurídico sujeito ao princípio da indisponibilidade do interesse público. Como observado, a maior parte da doutrina tem acolhido essas novas tendências por considerá-las um caminho adequado para a prevenção e resolução dos conflitos que envolvem a Administração Pública.

Na prática, a Administração Pública tem incorporado os desdobramentos desta política de consensualização de conflitos, por meio da criação e fortalecimento de estruturas organizacionais e normativas que possibilitam que as negociações ocorram em um ambiente juridicamente seguro para a realização do interesse público.

No que se refere à resolução de controvérsias por meio da mediação, foi destacado o histórico de desenvolvimento da Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal – CCAF/AGU e a criação da Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos – SecexConsenso, pertencente à estrutura do Tribunal de Contas da União.

No tocante à prevenção de controvérsias, a utilização dos Comitês de Resolução de Disputas (Dispute Boards), com a inclusão da respectiva cláusula contratual, revelou-se prática recomendável para os contratos complexos, como os de construção ou de obras de infraestrutura, por criar alternativas para evitar a instauração formal de litígios que podem atrasar ou inviabilizar a execução contratual. Ainda que pouco utilizado, o instrumento é objeto de regulamentação tanto pelo Congresso Nacional quanto pela Agência Nacional de Transporte Terrestre.

A criação de uma administração pública autocompositiva favorece o alcance do interesse público, uma vez que proporciona condições para que as relações entre o Estado e agentes privados, materializadas nos contratos, se desenvolvam com fluidez, eficiência e transparência. A expectativa é que esses instrumentos se consolidem e tragam ganhos substanciais para o desenvolvimento da infraestrutura nacional.

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APÊNDICE 1

AnoLegislaçãoDisposições acerca das soluções extrajudiciais de conflitos
NormaAplicabilidade
  1996Lei nº 9.307NacionalDispõe sobre a arbitragem.
1997  Lei Federal nº 9.472  Agência Nacional de Energia Elétrica  Dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações Inciso XV, art. 93 Art. 93. O contrato de concessão indicará: XV – o foro e o modo para solução extrajudicial das divergências contratuais.
Lei Federal nº 9.478  Agência Nacional do PetróleoDispõe sobre a política energética nacional Inciso X do art. 43 Art. 43. O contrato de concessão deverá refletir fielmente as condições do edital e da proposta vencedora e terá como cláusulas essenciais: X – as regras sobre solução de controvérsias, relacionadas com o contrato e sua execução, inclusive a conciliação e a arbitragem internacional;
2001Lei Federal nº 10.233                 Agência Nacional de Transportes Terrestres Agência Nacional de Transportes Aquaviários  Dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre Inciso XVI do art. 35 Art. 35.  O contrato de concessão deverá refletir fielmente as condições do edital e da proposta vencedora e terá como cláusulas essenciais, ressalvado o disposto em legislação específica, as relativas a: XVI – regras sobre solução de controvérsias relacionadas com o contrato e sua execução, inclusive a conciliação e a arbitragem;
2005  Lei nº 11.196  NacionalInsere o art. 23-A na Lei 8.987/95 (Lei geral das concessões) Art. 23-A. O contrato de concessão poderá prever o emprego de mecanismos privados para resolução de disputas decorrentes ou relacionadas ao contrato, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996.    
2015Lei nº 13.105 NacionalNovo Código de Processo Civil Art. 174. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios criarão câmaras de mediação e conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de conflitos no âmbito administrativo, tais como: I – dirimir conflitos envolvendo órgãos e entidades da administração pública; II – avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de conciliação, no âmbito da administração pública; III – promover, quando couber, a celebração de termo de ajustamento de conduta.
Lei nº 13.129NacionalAltera a Lei nº 9.307/96 (Lei de Arbitragem) § 1º A administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis. § 2º A autoridade ou o órgão competente da administração pública direta para a celebração de convenção de arbitragem é a mesma para a realização de acordos ou transações.” § 3º A arbitragem que envolva a administração pública será sempre de direito e respeitará o princípio da publicidade.”
Lei nº 13.140NacionalDispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública
Lei nº 13.190NacionalAltera a LEI Nº 12.462 (Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC) Art. 44-A. Nos contratos regidos por esta Lei, poderá ser admitido o emprego dos mecanismos privados de resolução de disputas, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, e a mediação, para dirimir conflitos decorrentes da sua execução ou a ela relacionados.
Decreto nº 8.465Setor portuárioRegulamenta o § 1º do art. 62 da Lei nº 12.815/2013, para dispor sobre os critérios de arbitragem para dirimir litígios no âmbito do setor portuário.
2016Lei nº 13.303Sociedade de economia mistaDispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.   Art. 12. […] Parágrafo único. A sociedade de economia mista poderá solucionar, mediante arbitragem, as divergências entre acionistas e a sociedade, ou entre acionistas controladores e acionistas minoritários, nos termos previstos em seu estatuto social
2020  Lei nº 13.448      Federal (Programa de Parcerias de Investimentos – PPI)                                           Federal (Programa de Parcerias de Investimentos – PPI)                        Estabelece diretrizes gerais para prorrogação e relicitação dos contratos de parceria definidos nos termos da Lei nº 13.334 (Programa de Parcerias de Investimentos – PPI) Inciso III do Art. 15 e Art. 31: Art. 15. A relicitação do contrato de parceria será condicionada à celebração de termo aditivo com o atual contratado, do qual constarão, entre outros elementos julgados pertinentes pelo órgão ou pela entidade competente: III – o compromisso arbitral entre as partes com previsão de submissão, à arbitragem ou a outro mecanismo privado de resolução de conflitos admitido na legislação aplicável, das questões que envolvam o cálculo das indenizações pelo órgão ou pela entidade competente, relativamente aos procedimentos estabelecidos por esta Lei. Art. 31. As controvérsias surgidas em decorrência dos contratos nos setores de que trata esta Lei após decisão definitiva da autoridade competente, no que se refere aos direitos patrimoniais disponíveis, podem ser submetidas a arbitragem ou a outros mecanismos alternativos de solução de controvérsias. § 1º Os contratos que não tenham cláusula arbitral, inclusive aqueles em vigor, poderão ser aditados a fim de se adequar ao disposto no caput deste artigo. § 2º As custas e despesas relativas ao procedimento arbitral, quando instaurado, serão antecipadas pelo parceiro privado e, quando for o caso, serão restituídas conforme posterior deliberação final em instância arbitral. § 3º A arbitragem será realizada no Brasil e em língua portuguesa. § 4º Consideram-se controvérsias sobre direitos patrimoniais disponíveis, para fins desta Lei: I – as questões relacionadas à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos; II – o cálculo de indenizações decorrentes de extinção ou de transferência do contrato de concessão; e III – o inadimplemento de obrigações contratuais por qualquer das partes.
2021                                                 2021  Decreto nº 10.025Administração pública federalRevoga o Decreto nº 8.465/2015 e dispõe sobre a arbitragem para dirimir litígios que envolvam a administração pública federal nos setores portuário e de transporte rodoviário, ferroviário, aquaviário e aeroportuário
Lei nº 14.026   Atualiza o marco legal do saneamento básico: Altera a Lei nº 9.984/2000: criação da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) Altera a Lei º 11.44/2007: Diretrizes nacionais para o saneamento básico Lei nº 9.984/2000, Art. 4º-A, § 5º: A ANA disponibilizará, em caráter voluntário e com sujeição à concordância entre as partes, ação mediadora ou arbitral nos conflitos que envolvam titulares, agências reguladoras ou prestadores de serviços públicos de saneamento básico. Lei º 11.44/2007, Art. 10-A. Os contratos relativos à prestação dos serviços públicos de saneamento básico deverão conter, expressamente, sob pena de nulidade, as cláusulas essenciais previstas no art. 23 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, além das seguintes disposições:  § 1º Os contratos que envolvem a prestação dos serviços públicos de saneamento básico poderão prever mecanismos privados para resolução de disputas decorrentes do contrato ou a ele relacionadas, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996.
Lei nº 14.133  NacionalLei de Licitações e Contratos Administrativos Art. 138. A extinção do contrato poderá ser: III – determinada por decisão arbitral, em decorrência de cláusula compromissória ou compromisso arbitral, ou por decisão judicial. DOS MEIOS ALTERNATIVOS DE RESOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS Art. 151. Nas contratações regidas por esta Lei, poderão ser utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem.   Parágrafo único. Será aplicado o disposto no caput deste artigo às controvérsias relacionadas a direitos patrimoniais disponíveis, como as questões relacionadas ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e ao cálculo de indenizações. Art. 152. A arbitragem será sempre de direito e observará o princípio da publicidade. Art. 153. Os contratos poderão ser aditados para permitir a adoção dos meios alternativos de resolução de controvérsias. Art. 154. O processo de escolha dos árbitros, dos colegiados arbitrais e dos comitês de resolução de disputas observará critérios isonômicos, técnicos e transparentes.
Fonte: tabela consolidada pela autora.

[1] Mestranda em Direito Administrativo na PUC-SP; especialista em Avaliação de Políticas Públicas (ISC-TCU); graduada em Direito (IDP) e Engenharia (UFOP). Atua como Analista de Infraestrutura do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos.

[2] Apresenta-se como meios “adequados” para a solução de conflitos, tendo em vista que se deve pensar no método mais correto para a solução do conflito trazido pela parte. É também empregada a nomenclatura “meios alternativos de solução de conflitos”, derivada da doutrina de língua inglesa (Alternative dispute resolution – ADR), assim como “meios extrajudiciais de solução de conflitos”. (Cahali, 2022, p. 23).

[3] A redação original do art. 8º, do Decreto nº 24, dispõe que: “Os terrenos, de que a Companhia houver de necessitar para a construcção de estradas, pontes, caes, comportas, canaes, diques ou reprezas, se forem devolutos, ser-lhe-hão cedidos gratuitamentes, se de propriedade particular, serão prévia e definitivamente avaliados por arbitros, e o seu importe entregue por ella aos proprietarios, ou depositado em juizo no caso de que elle recusem recebe-lo; não devendo por pretexto algum ser a Companhia estorvada em seus trabalhos, salvo aos proprietarios o recurso para o Tribunal competente, sómente no que respeita á boa ou má avaliação” (Brasil, 1835, s.p.).

[4] Segundo Decreto nº 24, art. 9º, “As taxas, que a Companhia estabelecer em seu beneficio pelo transito das estradas, pontes, canaes, ou pela navegação que lhe é privativa, serão consideradas interesse do capital nos primeiros 40 annos, reservando-se á Nação, passado esse prazo, o direito de remir as obras pelo valor, e modo que fôr estabelecido a juizo de arbitros, ou de prorogar o privilegio por mais outros 40 annos, findos os quaes, sem indemnisação alguma, obrigada a Companhia e entrega-las em bom estado” (Brasil, 1835, s.p.).

[5] Conforme sua redação original, o Decreto nº 1.746, de 1869 autorizou o Governo a “contractar a construcção, nos differentes portos do Imperio, de dócas e armazens para carga, descarga, guarda e conservação das mercadorias de importação e exportação” (Brasil, 1869).

§ 13. As emprezas estrangeiras serão obrigadas a ter representantes nas localidades em que tiverem seus estabelecimentos, para tratarem directamente com o governo imperial. As questões que se suscitarem entre o governo e os emprezarios, a respeito dos seus direitos e obrigações, poderão ser decididas no Brasil por arbitros, dos quaes um será de nomeação do governo, o outro do emprezario, e o terceiro por accordo de ambas as partes, ou sorteado.

[6] “O tema da arbitragem, mediação e dispute boards envolvendo a Administração Pública foi objeto de cinco enunciados, que complementam os aprovados na Jornada do CJF sobre resolução de controvérsias, realizada em 2016. O enunciado n. 10 prevê que, nos contratos sujeitos à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, cabe a celebração de aditivo para introduzir métodos extrajudiciais adequados como mediação, arbitragem e dispute board (junta de prevenção e solução de conflitos). Esse enunciado trata da inclusão de cláusula compromissória, enquanto o enunciado nº 18 reconhece o cabimento da celebração de compromisso arbitral para a resolução de controvérsia por arbitragem mesmo sem previsão de arbitragem no edital e, por conseguinte, no contrato de origem. O enunciado n. 15 confirma o entendimento adotado na Jornada de 2016 e consigna que a Administração Pública deve promover a publicidade ativa das arbitragens de que é parte, sujeita à Lei de Acesso à Informação. O enunciado n. 19 afasta qualquer dúvida que pudesse existir sobre a submissão de temas ligados ao equilíbrio econômico-financeiro aos meios adequados de solução de conflitos, inclusive conciliação, mediação, dispute boards e arbitragem. Por fim, o enunciado n. 39 retrata o entendimento consolidado e afasta eventuais preocupações da Administração Pública em relação à nomeação ou aceitação de árbitros: não há necessidade de qualquer seleção pública formal, apenas a motivação adequada, com a formalização própria” (Brasil, 2020, s.p.).

[7]Prova disso é a iniciativa do Tribunal de Contas da União, que recentemente promoveu um concurso de monografias para fomentar o desenvolvimento de conhecimento sobre soluções consensuais de controvérsias e prevenção de conflitos na administração pública (Brasil, 2023, s.p.).

[8] O interesse primário é aquele “pertinente à sociedade como um todo e só ele pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a lei consagra e entrega à compita do Estado como representante do corpo social.” O interesse secundário, por sua vez, “é aquele que atina tão só ao aparelho estatal enquanto entidade personalizada, e que por isso mesmo pode lhe ser referido e nele encarnar-se pelo simples fato de ser pessoa, mas que só pode ser validamente perseguido pelo Estado quando coincidente com o interesse público primário” (Mello, 2023, p.84).

[9] Di Pietro e Martins Junior (2022, p. RB-18.9) destaca que “Embora o Estado brasileiro ainda não tenha completado o curso do modelo burocrático de gestão pública e sequer tenha superado o tipo patrimonialista (ou regaliano), registra-se, todavia, certa desconfiança sobre a “adoção indiscriminada de vertentes do modelo gerencial” pela ausência do “amadurecimento cultural dos valores burocráticos” (como meritocracia, racionalidade, impessoalidade e isonomia), o que pode conduzir ao restabelecimento de “formas pré-burocráticas de gestão, que se orientam para o spoil system (sistema patrimonialista de despojo e partilha), tendo em vista o predomínio do nepotismo e da pessoalidade nas relações funcionais”.

[10] Altera a Lei nº 9.307/96 (Lei de arbitragem) e a Lei nº 13.140/2015 (“Lei de Mediação”)

[11] Cuéllar e Moreira (2018, p. 16) explicam que a possibilidade de realização de mediação para a Administração Pública “envolve o exercício da respectiva competência ao interior dos espaços de escolha que lhe foram legislativamente cometidos, combinados com as reais exigências do caso concreto”. Na prática, cabe à Administração Pública avaliar, dentre as alternativas existentes para a solução, os interesses em jogo, os riscos, as cronologias e as vantagens que podem ser obtidas pelas partes, visando à solução mais eficiente possível para o caso concreto, bem como os eventuais impedimentos normativos à mediação.

[12] A CCAF, em Cartilha (Brasil, 2012, p. 12), adotava o conceito de conciliação e mediação como sinônimos, mediante a justificativa de não haver nenhum efeito jurídico distinto decorrente da utilização desses termos e por se tratar de uma tendência moderna e já adotada em diversos países como o Canadá, o Reino Unido e Austrália.

[13] Tais câmaras eram assim designadas porque eram instaladas pelo Advogado-Geral da União para atuar exclusivamente na solução de cada caso concreto, conforme previsto no parágrafo único do art. 11 da Medida Provisória nº 2.180-35, de 24 de agosto de 2001, e na Portaria AGU nº 118, de 1º de fevereiro de 2007 (posteriormente revogada pela Portaria AGU nº 1.281, de 27 de setembro de 2007) (Brasil, 2012, s.p.).

[14] Os dados sobre a atuação da CCAF/AGU foram publicizados em matéria jornalística assinada por Beatriz Olivon (2023, passim).

[15] Conforme Decreto nº 10.201/2020, compete ao Advogado-Geral da União, diretamente ou mediante delegação, e aos dirigentes máximos das empresas públicas federais, em conjunto com o dirigente estatutário da área à qual estiver afeto o assunto, autorizar a realização de acordos ou transações para prevenir ou terminar litígios, inclusive os judiciais, que envolvam, respectivamente, a União e empresas públicas federais. Créditos ou débitos com valor igual ou superior a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) dependem de prévia e expressa autorização do Advogado-Geral da União e do Ministro de Estado a cuja área de competência estiver afeto o assunto. Em litígios que envolvam valores de até R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), a realização de acordos para prevenir ou terminar, judicial ou extrajudicialmente, pode ser autorizada diretamente ou mediante delegação do Procurador-Geral da União, do Procurador-Geral Federal e do Procurador-Geral do Banco Central (Brasil, 2020c).

[16] A Instrução Normativa 91/2022 institui, no âmbito do Tribunal de Contas da União, procedimentos de solução consensual de controvérsias relevantes e prevenção de conflitos afetos a órgãos e entidades da Administração Pública Federal.

[17] Conforme se extrai dos enunciados nº 76 e 80 da Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios, realizada pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CJF), em 2016.

[18] Silva (2019, p. 39) reforça que embora a categoria “ad hoc” seja comum em projetos menores, em especial considerando os custos envolvidos na manutenção de um Board permanente, é altamente recomendável que as partes optem por estabelecer os Dispute Boards desde o início do contrato. A doutrina reconhece que este é um dos “pontos-chave” para o sucesso desse mecanismo contratual.

[19] Conforme se extrai dos enunciados nº 137 e nº 131, respectivamente, da II Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios, realizada pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CJF), em 2021.