JOGOS DE AZAR: RESPONSABILIDADE E REGULAMENTAÇÃO NA LEGISLAÇÃO PENAL BRASILEIRA E A PUBLICIDADE DOS INFLUENCIADORES

JOGOS DE AZAR: RESPONSABILIDADE E REGULAMENTAÇÃO NA LEGISLAÇÃO PENAL BRASILEIRA E A PUBLICIDADE DOS INFLUENCIADORES

30 de junho de 2024 Off Por Cognitio Juris

GAMING: RESPONSIBILITY AND REGULATION IN BRAZILIAN CRIMINAL LEGISLATION AND ADVERTISING BY INFLUENCERS

Artigo submetido em 04 de junho de 2024
Artigo aprovado em 19 de junho de 2024
Artigo publicado em 30 de junho de 2024

Cognitio Juris
Volume 14 – Número 55 – Junho de 2024
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Mateus Pereira da Silva[1]
Enio Walcácer[2]

RESUMO: Os jogos de azar têm sido objeto de debate em várias esferas sociais e legais, apresentando uma gama complexa de questões em diferentes contextos. No Brasil, a regulamentação dessas atividades tem sido alvo de discussões e propostas de alterações na legislação, suscitando debates sobre seus impactos sociais, econômicos e legais. Esta pesquisa visa explorar e analisar a problemática dos jogos de azar sob uma perspectiva multidimensional, examinando seus efeitos na sociedade brasileira. Esta pesquisa busca contribuir para uma compreensão mais ampla dos impactos sociais, econômicos e legais dos jogos de azar no Brasil. Os resultados podem oferecer conhecimentos valiosos para a formulação de políticas públicas mais embasadas e informadas sobre a regulamentação dessas atividades.

Palavras-chave: Influencia digital, Jogos de azar, regulamentação.

ABSTRACT: Gambling has been the subject of debate in various social and legal spheres, presenting a complex range of issues in different contexts. In Brazil, the regulation of these activities has been the subject of discussions and proposals for changes to legislation, sparking debates about their social, economic and legal impacts. This research aims to explore and analyze the problem of gambling from a multidimensional perspective, examining its effects on Brazilian society. This research seeks to contribute to a broader understanding of the social, economic and legal impacts of gambling in Brazil. The results can offer valuable knowledge for the formulation of more informed and informed public policies on the regulation of these activities.

Keywords: Digital influence, Gambling, regulation.

INTRODUÇÃO

Os jogos de azar têm sido objeto de intensos debates no contexto legal brasileiro, principalmente devido às suas implicações sociais, econômicas e, sobretudo, jurídicas. Com o advento da internet e das mídias sociais, a forma como esses jogos são promovidos e acessados mudou drasticamente, levantando novos desafios regulatórios e éticos. Neste contexto, a publicidade realizada por influenciadores digitais emerge como um fenômeno complexo que merece uma análise cuidadosa.

Historicamente, os jogos de azar têm sido regulados no Brasil por uma legislação que oscila entre proibições rigorosas e tentativas de regulamentação controlada. A Constituição Federal de 1988 delegou aos Estados a competência para legislar sobre jogos de azar, resultando em uma heterogeneidade significativa nas abordagens adotadas pelas unidades federativas. No entanto, a legislação federal, como o Decreto-Lei nº 3.688/1941 (Lei das Contravenções Penais), ainda impõe restrições severas à prática e à promoção de jogos de azar.

A relevância deste estudo reside na necessidade de compreender como a legislação penal brasileira aborda os jogos de azar, especialmente à luz das novas formas de publicidade digital, onde influenciadores desempenham um papel central na promoção dessas atividades. Além disso, investigar as responsabilidades legais dos influenciadores nesta área contribui para um debate informado sobre ética e regulamentação.

Diante do panorama jurídico atual, quais são os desafios enfrentados na regulamentação e controle dos jogos de azar no Brasil, considerando a publicidade realizada por influenciadores digitais?

A hipótese deste estudo é que a falta de clareza na legislação e a dificuldade de monitoramento eficaz contribuem para um ambiente onde a publicidade de jogos de azar por influenciadores digitais pode ocorrer de maneira inadequada e até ilegal, desafiando os princípios de proteção ao consumidor e de prevenção ao vício.

Este trabalho tem como objetivo geral analisar como a legislação penal brasileira aborda a regulamentação dos jogos de azar e a publicidade por influenciadores digitais, investigando especificamente suas responsabilidades legais. Os objetivos específicos incluem: examinar o quadro normativo atual relacionado aos jogos de azar no Brasil; Investigar o papel dos influenciadores digitais na promoção de jogos de azar e os desafios éticos e legais associados; propor recomendações para aprimorar a regulamentação e o controle dessas práticas, visando maior proteção ao consumidor e prevenção de práticas ilegais.

Para alcançar os objetivos propostos, este estudo utilizará uma abordagem qualitativa, envolvendo revisão bibliográfica, análise documental de legislação pertinente, estudo de casos e entrevistas com especialistas em direito penal e regulamentação de mídias digitais. A análise crítica dessas fontes permitirá uma compreensão aprofundada das dinâmicas legais e sociais envolvidas na temática.

2 CONTEXTO HISTÓRICO DOS JOGOS DE AZAR

Em Roma, os jogos de azar eram tão comuns que podiam ser encontrados nas ruas, durante campanhas militares, em tabernas e até mesmo nas termas. Contudo, essa popularidade resultou em uma má reputação social para tais jogos, levando à sua proibição, exceto durante o festival da Saturnália, celebrado anualmente no final do ano em honra ao deus Saturno (Reis, 2018).

Ao longo da história, os jogos de azar foram objeto de distinção entre aqueles considerados lícitos e os ilegais. Essa distinção remonta aos tempos mais antigos e baseia-se na diferença percebida entre habilidade e sorte, assim como entre passatempo e vício. Como resultado, sempre houve oposição ao jogo. Por exemplo, Aristóteles os considerava como atividades de avareza e roubo. No Egito antigo, os jogos de azar foram até mesmo atribuídos à invenção do demônio (Oliveira, 2019).

Quando os europeus chegaram a Pindorama, já traziam consigo as práticas de jogos de azar, enraizadas há milênios na Europa. Contudo, nesse continente, o jogo há séculos era um tema controverso, muitas vezes entrando em conflito com as proibições impostas pela Igreja (Silva, 2013).

Quase dois séculos mais tarde, com a presença lusitana firmemente estabelecida no território que viria a ser chamado de Brasil, os jogos de azar tornaram-se cada vez mais comuns entre os colonizadores, apesar da oposição do braço religioso da colonização. Havia, inclusive, grande preocupação com os excessos que ocorriam em certas situações, como relatado por um capitão-general do sul do Brasil ao Rei de Portugal em 1698, quando mencionou que as aldeias estavam à beira da extinção, em parte devido à prática de apostar e escravizar indígenas em jogos de azar (Hemming, 2016).

De acordo com Reis (2018, p. 30):

À medida que o período colonial se aproximava do fim, em Minas Gerais surgiu uma iniciativa relevante em 1784, quando o governador Luiz da Cunha Menezes solicitou à Presidência da Câmara Municipal autorização para realizar uma loteria. O objetivo era angariar fundos para concluir as obras da Casa de Câmara e Cadeia de Vila Rica, a atual Ouro Preto, então capital da Capitania.

No que tange ao surgimento do Jogo do Bicho é uma das formas de jogo de azar mais populares no Brasil, mas sua origem é cercada por lendas e histórias controversas. Acredita-se que tenha sido criado no final do século XIX, no Rio de Janeiro. O fundador mais frequentemente citado é o barão João Batista Viana Drummond, que supostamente teria criado o jogo em 1892 como uma forma de angariar fundos para o zoológico local (Pereira, 2018).

A versão inicial do jogo envolvia a venda de bilhetes numerados, cada um correspondendo a um animal diferente. Os resultados eram determinados com base nos sorteios dos resultados de jogos de animais reais, como corridas de cavalo, por exemplo. Com o tempo, o jogo evoluiu para incluir várias modalidades e formas de apostas, tornando-se ilegal no país, mas ainda amplamente praticado, especialmente em regiões urbanas (Stolze Gagliano, 2022).

O Jogo do Bicho teve e ainda tem um impacto significativo na cultura e na sociedade brasileira, gerando debates sobre sua legalização, seu papel na criminalidade e sua relação com a cultura popular. Os cassinos tiveram uma presença significativa na história do Brasil, especialmente durante o século XX. Sua história é marcada por períodos de legalização e proibição, bem como por eventos políticos e sociais que moldaram sua trajetória (Peres, 2022).

Os primeiros cassinos foram estabelecidos no Brasil durante o século XIX, influenciados pelo modelo europeu e trazidos ao país por imigrantes e viajantes estrangeiros. No entanto, sua presença era limitada e muitas vezes associada a clubes sociais e hotéis de luxo. Durante as décadas de 1920 e 1930, os cassinos se multiplicaram, especialmente no Rio de Janeiro, atraindo uma clientela diversificada, incluindo turistas estrangeiros e elites locais. Nesse período, os cassinos eram centros de entretenimento de alto padrão, oferecendo não apenas jogos de azar, mas também shows, restaurantes e vida noturna (Pimenta, 2022).

Em 1934, o presidente Getúlio Vargas legalizou os jogos de azar no Brasil, visando gerar receitas fiscais e impulsionar o turismo. Isso levou a um aumento ainda maior no número de cassinos. No entanto, em 1946, Vargas proibiu novamente os jogos de azar, em parte devido a pressões morais e religiosas, bem como à associação dos cassinos com a máfia e a corrupção (Azevedo; Magalhães, 2021).

Sendo assim, o fechamento dos cassinos no Brasil ocorreu em 1946, com a promulgação do Decreto-Lei 9215, que proibia explicitamente os jogos de azar no país. Esse período marcou o fim de uma era de glamour e extravagância nos cassinos brasileiros, levando muitos estabelecimentos a fecharem suas portas ou a mudarem de atividade (Gomes, 2023).

Desde então, os cassinos permanecem proibidos no Brasil, com algumas exceções, como cassinos localizados em resorts integrados em determinadas áreas turísticas, exemplo: cruzeiro em alto mar. No entanto, há debates frequentes sobre a legalização dos jogos de azar, impulsionados pela necessidade de receitas fiscais adicionais e pelo potencial de desenvolvimento econômico que os cassinos poderiam trazer para certas regiões do país.

Sendo assim, os jogos de azar são nada mais que atividades em que o resultado é determinado predominantemente pelo acaso, com os participantes apostando dinheiro ou outros bens em um evento incerto. O termo “azar” refere-se à ausência de controle sobre o resultado final e à dependência do acaso ou da sorte (Reis, 2018).

A característica central dos jogos de azar é a presença de risco e incerteza. Os participantes investem algo de valor – como dinheiro, fichas, bens materiais ou mesmo tempo – na esperança de obter um retorno maior. No entanto, o resultado é influenciado por fatores aleatórios que estão fora do controle dos jogadores, como um lançamento de dados, uma carta distribuída, o giro de uma roleta ou o resultado de um evento esportivo (Oliveira, 2019).

Portanto, segundo Pimenta (2022) os jogos de azar podem assumir diversas formas e serem praticados em uma ampla variedade de contextos, incluindo cassinos, loterias, apostas esportivas, corridas de cavalos, jogos de cartas e máquinas caça-níqueis, entre outros. Em muitos países, os jogos de azar são regulamentados por leis e políticas específicas, destinadas a proteger os jogadores, prevenir a fraude e o abuso, e gerar receita fiscal para o Estado.

2.1 Da legislação do jogo no Brasil até a atualidade

Quase todos jogos de azar são proibidos no Brasil, até recentemente com a mudança, no qual regularizou os jogos de azar esportivo, trazendo grande novidade ao um assunto tão polêmico.

A legislação específica sobre filatelia inclui a Lei nº 3.987, promulgada em 2 de janeiro de 1920:

O Artigo 14 trata da concessão de autorização para a realização de jogos de azar em clubes e cassinos localizados em estações balneárias termais e climáticas. As permissões são concedidas mediante prévia licença da autoridade competente e devem incluir detalhes como prazo da concessão, natureza dos jogos, medidas de controle, taxas a serem cobradas e formas de pagamento. As salas de jogos devem ter entrada livre para maiores de idade. A autorização pode ser revogada em caso de descumprimento das cláusulas estabelecidas, mediante pedido do Conselho Municipal. Cada clube ou cassino deve ser organizado em sociedade e ter um gerente responsável. Uma vez licenciados, os estabelecimentos podem operar sem incorrer em penalidades previstas nas leis de jogos de azar (BRASIL, 1920).

Foi durante este período que os primeiros estabelecimentos de jogos começaram a surgir no Brasil. No entanto, operavam com poucas garantias de estabilidade, uma vez que a legalização do jogo era vista com desconfiança e enfrentava oposição da parte mais conservadora da sociedade.

Após a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, especialmente a partir de 1937 com o Estado Novo instaurado após um Golpe de Estado, a situação em relação aos cassinos no Brasil começou a mudar significativamente. Vargas, que governava com poderes centralizados através de Decretos-lei, mostrava simpatia pela ideia de ter cassinos luxuosos na Capital Federal e em outras partes do país, visando atrair turistas e gerar retorno financeiro para os cofres públicos (Reis, 2018).

O marco inicial dessa mudança foi o Decreto-lei nº 241, de 4 de fevereiro de 1938, que estabelecia o imposto de licença para o funcionamento dos cassinos-balneários no Distrito Federal, inaugurando a chamada “época de ouro” dos cassinos brasileiros. Contudo, anos mais tarde, o Decreto-lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941, conhecido como a Lei das Contravenções Penais, proibiu a prática e a exploração de jogos de azar (Peres, 2022).

Posteriormente, em 30 de abril de 1946, o Decreto-lei nº 9.215 foi promulgado, proibindo a prática e a exploração de jogos de azar em todo o território nacional. Esse decreto revogou os anteriores, como os de números 241/1938, 5.089/1942 e 5.192/1943, que regulamentavam e cobravam impostos sobre a atividade dos cassinos (Gomes, 2023).

Com a promulgação da Lei 14.790/23, em dezembro de 2023, marca um marco significativo no cenário das apostas esportivas no Brasil, ao permitir que empresas privadas operem tanto online quanto em estabelecimentos físicos, como casas de apostas e cassinos. Esta mudança substancial traz consigo uma série de transformações importantes para o panorama das apostas esportivas no país (BRASIL, 2023).

Anteriormente, as apostas esportivas eram limitadas às lotéricas, sob controle do governo federal. Com a nova legislação, empresas privadas agora têm permissão para oferecer apostas esportivas em plataformas online e em locais físicos, ampliando significativamente o acesso e a diversidade de opções para os apostadores. (Oliveira, 2019).

Além disso, a idade mínima para participar de apostas esportivas foi elevada de 18 para 21 anos, visando uma maior proteção aos jovens e prevenindo potenciais problemas associados ao jogo em idades mais precoces. A lei também proíbe explicitamente a veiculação de propaganda ou publicidade de apostas esportivas direcionada a menores de idade, reforçando a preocupação com a proteção da juventude contra práticas inadequadas de jogo (BRASIL, 2023).

Outro aspecto fundamental introduzido por essa legislação é a obrigação de identificação dos apostadores. Os participantes devem ter sua identidade verificada e validada por meio de métodos de identificação apropriados, garantindo uma maior segurança e transparência nas transações e atividades de apostas. (Gomes, 2023).

Além disso, a nova lei estabelece a necessidade de implementação de políticas por parte das empresas de apostas, abordando temas cruciais como prevenção à lavagem de dinheiro, jogo responsável e prevenção de transtornos de jogo patológico. Este enfoque em políticas de proteção do consumidor e responsabilidade social reflete a preocupação do legislador em garantir uma prática saudável e ética das apostas esportivas no Brasil.

Um ponto crucial ressaltado na legislação é a obrigatoriedade do uso de métodos de identificação para verificar a autenticidade dos apostadores. Isso inclui a verificação e validação das informações fornecidas pelo apostador, bem como a confirmação da identidade por meio dos canais de contato informados no cadastro do usuário, como e-mail e telefone. Essas medidas visam assegurar a integridade do processo de apostas e prevenir possíveis fraudes ou abusos.

3 A PUBLICIDADE E O CONCEITO DE INFLUENCIADORES NO BRASIL

Nos últimos anos, testemunhou-se uma mudança significativa na forma como os jogos de azar são promovidos e acessados, especialmente com o advento das redes sociais e o surgimento de influenciadores digitais. Em meio a esse cenário, os influenciadores tornaram-se atores-chave na divulgação e popularização de várias marcas e produtos, incluindo o setor de jogos de azar.

A ascensão dos influenciadores digitais como figuras de autoridade e confiança para milhões de seguidores criou um ambiente propício para parcerias comerciais entre esses influenciadores e empresas de jogos de azar. Através de estratégias de marketing digital, esses colaboradores promovem ativamente cassinos online, apostas esportivas, jogos de poker e outras formas de entretenimento relacionadas ao jogo (Stolze Gagliano, 2022).

A natureza persuasiva e envolvente dos influenciadores, aliada à sua capacidade de criar conteúdo autêntico e cativante, levanta questões éticas e práticas sobre o papel deles na promoção de atividades de jogos de azar. Enquanto alguns influenciadores adotam uma abordagem transparente e responsável ao divulgar essas práticas, outros podem enfrentar críticas por potencialmente influenciar negativamente seus seguidores, especialmente um público mais jovem e suscetível.

3.1. Conceito de influenciador digital

Em 2015, surgiu no Brasil o termo “influenciador digital”, englobando criadores de conteúdo de diversas redes sociais. Anteriormente, essas categorias eram distintas: os blogueiros eram os responsáveis por conteúdos em blogs, hoje menos comuns, enquanto os youtubers ainda mantêm uma denominação própria, criadores de conteúdo exclusivo do YouTube (Peres, 2022).

O surgimento do conceito de influenciador digital transcendeu a limitação a uma plataforma específica, abrangendo todas as plataformas digitais. Dessa forma, um influenciador digital é alguém comum que se torna uma figura midiática ao compartilhar sua vida pessoal para atrair um público específico e, por vezes, aproveita esse conteúdo mais pessoal para incluir publicidades (Baptista, 2022, p. 17).

Atualmente, o termo influenciador digital, traduzido do inglês digital influencer, é reconhecido como uma profissão na qual indivíduos utilizam suas redes sociais para criar e compartilhar vídeos, textos, opiniões, habilidades e outros conteúdos. Esses indivíduos têm seguidores, aqueles que se identificam de alguma maneira com os influenciadores e passam a acompanhar regularmente o que eles produzem (Pimenta, 2022).

Os influenciadores têm a habilidade de atrair pessoas por meio do conteúdo que geram, ganhando assim visibilidade, confiança e respeito. Os seguidores começam a acompanhar esses indivíduos, e estes sentem a responsabilidade de continuar produzindo conteúdo, estabelecendo uma relação cada vez mais próxima com seu público ao mostrar sua vida e rotina diária. Muitas dessas pessoas passaram do anonimato à fama rapidamente, algumas já estão produzindo conteúdo há anos, e é suficiente que um vídeo se torne viral para que experimentem uma mudança significativa em suas vidas (Pimenta, 2022, p. 11).

De acordo com Baptista (2022), o surgimento dos influenciadores digitais trouxe para o foco público assuntos que anteriormente eram abordados principalmente por figuras influentes nos campos artístico, jornalístico, político e outros. Estes eram temas que raramente eram discutidos fora da esfera pessoal das pessoas.

Em fevereiro deste ano, o Ministério Público do Trabalho começou a reconhecer oficialmente a profissão de influenciador digital, incluindo-a na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) com o código 2.534-10. É importante ressaltar que esse reconhecimento não constitui a regulamentação da profissão, a qual requer um processo legislativo envolvendo tramitação no Congresso Nacional e sanção presidencial, algo que ainda não ocorreu (Marchezine, 2022).

Dessa forma, os influenciadores digitais estabeleceram uma conexão inédita com seu público nas relações interpessoais, revelando desafios e partilhando aspirações, planos e metas de natureza pessoal.

3.2. Conceito de publicidade

A publicidade é a atividade de tornar algo ou alguém conhecido publicamente, visando à aceitação pelo público. Essa prática acompanha a sociedade há séculos, tendo sua origem na palavra latina “publicus”, que significa público, e evoluindo para o termo “publicité” na língua francesa (Pimenta, 2022, p. 12).

Sob uma perspectiva mercadológica, conceitua-se a publicidade como o meio de divulgação de produtos e serviços com o objetivo de estimular seu consumo. (Dias, 2018). Essa prática tem um impacto significativo na vida dos consumidores. É crucial destacar que, na atualidade, o público tem à sua disposição uma vasta gama de produtos e serviços, o que pode influenciar suas escolhas além da simples necessidade de compra e das características dos itens. A atividade publicitária, realizada por meio dos diversos meios de comunicação, desempenha um papel crucial nesse processo (Chiachiri, 2018).

Através da publicidade, o consumidor decide adquirir um produto ou serviço de um fornecedor específico com o objetivo de satisfazer suas necessidades. Qualquer forma de publicidade pode impactar a vida dos consumidores, tanto de maneira positiva quanto negativa.

3.3. Regulamentação da Publicidade de acordo com CDC e CONAR

Com o avanço tecnológico, os padrões de consumo estão em constante transformação, como discutido neste estudo. Atualmente, uma parcela significativa das interações de consumo ocorre online, onde as marcas promovem seus produtos e serviços, enquanto os consumidores podem adquiri-los, expressar opiniões e engajar-se, tudo em um único ambiente digital. Nesse contexto, a publicidade digital tem como objetivo impulsionar marcas, produtos e serviços (Lery e Kerr, 2020).

Além disso, é importante ressaltar que a publicidade vai além da simples transmissão de informações; seu propósito é persuadir o consumidor. É fundamental destacar que essa prática encontra respaldo na legislação brasileira, tanto constitucional quanto infraconstitucional. No que tange à legislação infraconstitucional, concentramos nossa atenção nas regulamentações referentes à publicidade presentes no Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei 8.078/90).

É relevante notar que o CDC é considerado pela doutrina como uma norma principiológica, em virtude da proteção constitucional aos consumidores, conforme estabelecido no art. 5º, inc. XXXII, da Constituição Federal de 1988, que determina que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor” (Tartuce; Neves, 2021).

O alcance da proteção do CDC abrange não apenas o consumidor em potencial, ou seja, aquele que pode vir a adquirir ou utilizar o produto ou serviço como destinatário final, mas também todas as pessoas expostas às práticas comerciais. A mensagem publicitária é dirigida tanto aos consumidores em potencial quanto ao público em geral, caracterizado pela sua indeterminação e abrangência (Breviglieri, 2015).

É importante destacar que a publicidade aqui discutida tem um objetivo econômico, buscando despertar o interesse de compra no consumidor (Dias, 2018). Desde sua criação em 1990, o Código de Defesa do Consumidor aborda a publicidade na Seção II – Da oferta e na Seção III – Da publicidade, compreendendo os artigos 30 a 38. Entre esses dispositivos, o artigo 30 se destaca ao afirmar que a publicidade faz parte integrante do contrato a ser celebrado entre fornecedor e consumidor.

Além disso, o artigo 36 merece atenção, pois estipula que a publicidade deve ser facilmente identificável e acessível aos consumidores.

A publicidade regulada pelo CDC não deve ser confundida com a publicidade obrigatória em certos negócios jurídicos, referindo-se à ação de tornar público e, portanto, oponível a todos. O CDC concentra-se na publicidade que divulga fatos, serviços, ideias ou produtos de interesse dos fornecedores, refletindo, assim, no âmbito econômico-social (Breviglier, 2015, p.44).

A publicidade atua como uma ponte entre o consumidor e o produto, estando sujeita às normas estabelecidas pelo CDC. É crucial que essa prática esteja em consonância com os princípios que regem o sistema jurídico brasileiro, conforme os quatro princípios de Breviglieri relacionados à plataforma do TripAdvisor, sob a perspectiva da proteção do consumidor:

I) O princípio da veracidade, conforme estabelecido no art. 37, § 1º, do CDC, que diz respeito à correspondência entre as afirmações sobre o produto ou serviço e sua realidade;

II) O princípio da clareza, também conhecido como princípio da identificação, da autenticidade ou da ostentação, presente nos artigos 4º, VI e 36 do CDC;

III) O princípio da correção, que vai além da veracidade e clareza, exigindo que a publicidade não viole os valores sociais, sejam eles expressamente previstos em lei ou reconhecidos como relevantes em determinado contexto histórico. Alguns doutrinadores o chamam de princípio da ordem pública ou da legalidade;

IV) O princípio da informação, ou princípio da fundamentação, que requer que a mensagem publicitária seja respaldada por dados factuais, técnicos e científicos (BREVIGLIERI, 2005).

Além desses princípios, é fundamental ressaltar um dos pilares do CDC, o princípio da boa-fé objetiva, presente nos artigos 4º, inciso III, e 51, inciso IV. Esse princípio orienta as condutas nas relações de consumo, promovendo transparência, ética e honestidade, visando garantir relações harmoniosas e equilibradas.

Ao abordar a publicidade, é imprescindível mencionar o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR), um órgão de controle privado. Inicialmente, foi estabelecido o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CBAP) no final dos anos 70, como uma medida para evitar a aprovação de uma lei de censura pelo Governo Federal. Posteriormente, o CONAR foi criado como uma ONG encarregada de fazer cumprir o código de autorregulamentação. Atualmente, o CONAR se define como “uma organização não-governamental que visa promover a liberdade de expressão publicitária e defender as prerrogativas constitucionais da propaganda comercial” (CONAR, 2022).

Com o propósito de atender denúncias, proteger a liberdade de expressão e salvaguardar os interesses dos consumidores e profissionais de comunicação, o Conselho de Ética do CONAR, como órgão soberano na fiscalização, julga e delibera sobre a conformidade com o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária. Caso uma prática publicitária não esteja em conformidade, o CONAR recomenda aos veículos de comunicação a suspensão da veiculação da peça ou sugere correções à propaganda, podendo ainda advertir o anunciante e a agência (CONAR, 2022).

4 RESPONSABILIDADE CIVIL E PENAL DOS INFLUENCIADORES DIGITAIS NA PUBLICIDADE DE JOGOS DE AZAR

Os influenciadores digitais, por meio de seus perfis nas redes sociais, blogs, vídeos e outras formas de conteúdo online, estabelecem conexões diretas com um público vasto e diversificado. Nesse contexto, surgem questionamentos sobre até que ponto esses agentes digitais devem ser responsabilizados por suas ações, declarações e recomendações, especialmente quando estas têm repercussões negativas.

De acordo com Época Negócios Online (2022) os brasileiros investiram US$ 4,0 bilhões em sites de loteria e apostas em 2014, colocando o Brasil no topo da lista de países que mais gastam com jogos de azar, segundo a revista Economist.

Desde a legalização das apostas esportivas no Brasil, as plataformas de apostas têm visto um aumento tanto em número quanto em popularidade. Atualmente, um em cada quatro brasileiros com smartphone já fez apostas em aplicativos. No entanto, uma pesquisa conduzida pela Mobile Time e Opinion Box, com mais de 2 mil brasileiros, revela que 60% dos apostadores reconhecem ter perdido mais dinheiro do que ganharam, enquanto apenas 23% afirmam ter ganho mais do que perdido. O perfil típico do apostador brasileiro é um homem jovem de baixa renda, com 33% dos homens e 18% das mulheres já tendo feito apostas em aplicativos. A faixa etária dos 16 aos 29 anos representa 36% dos apostadores, enquanto os grupos de 30 a 49 anos e 50 anos ou mais representam 24% e 14%, respectivamente. Em relação às classes sociais, 22% dos usuários de smartphones das classes A e B já fizeram apostas, assim como 21% da classe C, mas esse número aumenta para 30% entre os brasileiros das classes D e E. Esses dados indicam que aqueles com menos recursos financeiros são os que mais experimentam esses aplicativos, tornando-os também os mais vulneráveis a possíveis perdas (Ferreira, 2023).

O aumento significativo no interesse pelas apostas online é impulsionado pelo fato de os influenciadores digitais estarem sendo remunerados para promover esses jogos. Os influenciadores digitais exercem um poder significativo no universo dos jogos de azar, especialmente sobre o público jovem, caracterizado pela sua suscetibilidade ao apelo do enriquecimento rápido e sua busca por soluções imediatas para problemas financeiros ou sociais. É fundamental que esses influenciadores ajam de maneira responsável e ética, evitando glorificar os jogos de azar como meios rápidos para o sucesso financeiro e destacando os riscos associados a essas práticas. Os jovens, influenciados pela ostentação nas redes sociais, podem ser facilmente seduzidos pela ideia de que os jogos de azar são uma solução fácil para seus problemas, mesmo sem perceberem os riscos de desenvolver comportamentos viciantes e problemas financeiros graves. O ciclo de comportamento compulsivo desencadeado pelos jogos de azar pode levar a dificuldades financeiras sérias, especialmente quando influenciado por uma percepção distorcida de controle e probabilidades de sucesso, resultando em uma fuga temporária das dificuldades da vida, mas também em complicações financeiras profundas e persistentes (Metrópole, 2024).

Os influenciadores digitais utilizam diversas estratégias para promover plataformas de jogos de azar, aproveitando seu alcance e impacto nas redes sociais para atrair seguidores. Eles criam conteúdo que captura a emoção dos jogos, compartilham experiências pessoais e demonstram sessões de jogo ao vivo. Além disso, muitos estabelecem parcerias lucrativas com marcas de jogos, promovendo-as através de conteúdo criativo, como postagens nas redes sociais e vídeos. Para aumentar o engajamento, organizam promoções e sorteios, incentivando os seguidores a experimentar as plataformas de jogos de azar. Essas estratégias visam aumentar o interesse e a participação do público, muitas vezes explorando histórias de sucesso e grandes ganhos, embora não representem a experiência típica dos jogadores.

No Brasil, os jogos de azar são proibidos conforme estabelecido no artigo 50, § 3º, alínea “a” da Lei de Contravenções Penais (LCP), o que inclui atividades como apostas sobre corrida de cavalos e competições esportivas. Em casos graves, envolvendo um grande número de vítimas, pode-se configurar como crime contra a economia popular, conforme o artigo 2°, IX, da Lei n° 1.521/51.

No entanto, mesmo sendo ilegais no país, esses jogos continuam disponíveis em diversas mídias online, muitas vezes promovidos por influenciadores digitais. Isso ocorre porque esses jogos têm domínios estrangeiros e não são regulamentados pela legislação brasileira. Assim, embora os influenciadores não possam ser responsabilizados penalmente por promoverem esses jogos, eles podem ser questionados sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor (CDC), especialmente se ocultarem informações sobre a natureza dos jogos, como seu caráter de azar.

O princípio da vulnerabilidade do consumidor, estabelecido pelo CDC, busca proteger a parte mais frágil da relação de consumo, reconhecendo que os consumidores muitas vezes não têm o conhecimento técnico necessário para avaliar os produtos ou serviços oferecidos. Portanto, embora os influenciadores possam não enfrentar consequências penais, eles podem ser responsabilizados sob o CDC se sua publicidade for considerada enganosa ou prejudicial aos consumidores.

4.1. Responsabilidade civil e penal

O marketing digital se traduz na prática de fazer propaganda através do uso da tecnologia, principalmente em plataformas digitais, levando em consideração as mudanças nos padrões de consumo (devido à expansão da era digital e da sociedade de hiperconsumo). Portanto, à medida que a forma de consumir muda, também muda a propaganda e o agente da propaganda, que agora são, em sua maioria, os influenciadores digitais.

Assim, o marketing digital se adapta à forma como os consumidores buscam consumir produtos e serviços. Em relação à comunicação, é importante destacar que: “Comunicar não é apenas produzir e distribuir informação, mas também ser sensível às condições nas quais o receptor a recebe, aceita-a, recusa-a, remodela-a, em função de suas escolhas filosóficas, políticas, culturais” (Gomes, 2023).

Essa afirmação destaca a relação próxima que os influenciadores digitais mantêm com seus seguidores, dando a impressão de serem parte da família ou do círculo de amigos deles. Cada criador de conteúdo tem nichos específicos de público para os quais direciona seu conteúdo, adaptado aos valores, ideias e desejos desses seguidores, gerando uma sensação ainda maior de identificação, admiração ou proximidade com o influenciador. As redes sociais mudaram os parâmetros de disseminação de informações pelas agências tradicionais, alterando os paradigmas da comunicação e incluindo o mercado publicitário na internet por meio dos criadores de conteúdo digital como uma forma de gerar publicidade mais orgânica e alcançar um maior número de pessoas – potenciais consumidores dos produtos ou serviços divulgados nas redes sociais (Carvalho, 2019).

Dado o contexto de consumo inerente às publicidades realizadas pelos influenciadores digitais, que conectam os consumidores às empresas que fornecem os produtos e/ou serviços, surge o questionamento sobre a proteção ao consumidor nos casos de danos aos produtos adquiridos ou à má execução/prestação de serviços contratados, bem como sobre a responsabilização por parte do fornecedor/empresa que oferece o produto ou serviço e do influenciador digital (atuando como agente publicitário) (Tepedino; Terra; Guedes, 2021).

Em primeiro plano, é importante recordar o que a Constituição Federal aduz sobre a relação de consumo e os consumidores em si. Assim, os artigos 5º, inciso XXXII, e 170, inciso V, destacam a defesa do consumidor como uma política nacional voltada para as relações de consumo. Portanto, a tutela dos consumidores é vista como fundamental e instrumental, visando proteger a pessoa humana em situações de vulnerabilidade na relação contratual concreta (Oliveira, 2019)

No âmbito do Código de Defesa do Consumidor (CDC), nos casos de danos ao consumidor devido a um produto defeituoso, por exemplo, o fornecedor do produto ou serviço possui responsabilidade objetiva, conforme estabelecido nos artigos 12 e 14. Por outro lado, existe a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais, conforme o artigo 14, parágrafo 4° (Brasil, 1990).

Considerando os influenciadores digitais como novos agentes de publicidade na era da internet, a responsabilidade civil que recai sobre eles, conforme o CDC, se divide em duas seções: responsabilidade civil pelo fato do produto ou do serviço (arts. 12 a 17) e responsabilidade civil pelo vício do produto ou do serviço (arts. 18 a 25). Isso rompe com a tradicional dicotomia que divide a responsabilidade civil em contratual e extracontratual, afastando-se do Código Civil (Tepedino; Terra; Guedes, 2021).

Embora os influenciadores digitais não sejam mencionados expressamente nas fontes primárias do Direito, a Lei nº 12.695, de 23 de abril de 2014 (Marco Civil da Internet), aborda a responsabilidade civil dos provedores de conexão à internet pelo conteúdo postado, o que inclui o conteúdo veiculado pelos influenciadores digitais (BRASIL, 2014).

O Projeto de Lei n° 104/2019 propõe incluir os influenciadores digitais como microempreendedores individuais, reconhecendo-os como produtores de conteúdo capazes de influenciar o comportamento dos usuários e, portanto, atraindo a atenção de fornecedores de produtos e serviços como veículos de publicidade (Bismarck, 2019). No que diz respeito à responsabilidade civil, Maria Helena Diniz (2023) esclarece que visa restaurar um equilíbrio moral ou patrimonial, punindo aqueles que causam danos a outrem. Tanto a Teoria do Risco quanto a responsabilidade objetiva e solidária dos agentes envolvidos estão presentes no CDC (Tartuce; Neves, 2015).

Assim, os influenciadores digitais se enquadram na categoria de fornecedores por equiparação, sujeitos à responsabilidade objetiva e solidária, garantindo a proteção integral ao consumidor. A relação entre influenciador e consumidor, no contexto dos produtos e serviços anunciados nas redes sociais, requer uma interpretação que os equipare aos fornecedores, garantindo a responsabilização dos influenciadores por eventuais danos causados aos consumidores (Tartuce; Neves, 2015).

4.2 Responsabilidade penal

A responsabilidade civil, como abordado anteriormente, visa compelir alguém a compensar um dano. Maria Helena Diniz, ao discutir sobre esse tema, salienta que qualquer atividade que resulte em prejuízo acarreta uma responsabilidade. Portanto, é evidente que, tanto para aquele que causa o dano quanto para a vítima, há uma obrigação de reparação. Essa restauração do equilíbrio afetado pelo dano é o principal objetivo da responsabilidade civil, ou seja, busca-se retornar ao estado anterior ao ocorrido.

O surgimento do direito penal do consumidor está intrinsecamente ligado ao direito penal econômico, uma vez que certas condutas no mercado visam garantir os direitos e deveres entre fornecedores e consumidores. Portanto, este ramo do direito penal, que sanciona ações realizadas no mercado de consumo, busca promover relações transparentes e honestas. Historicamente, o direito penal desempenhou um papel significativo na proteção dos interesses legítimos do consumidor, além de conter tipos penais que protegem os adquirentes de produtos e serviços, conforme a compreensão atual desse sujeito de direito. Assim, o direito penal do consumidor, além de repressivo, tem uma função preventiva, antecipando-se aos danos potenciais, muitas vezes com base no princípio da precaução (Heidrich, 2023).

Essa abordagem visa prevenir irregularidades no mercado, não se contentando apenas com a punição após o dano ter ocorrido. Isso se reflete nos crimes tipificados pelo Código de Defesa do Consumidor, que visam identificar os sujeitos ativos e passivos das infrações penais. Com o advento das redes sociais, surgiram os chamados crimes virtuais, que englobam uma variedade de condutas ilícitas praticadas em ambientes virtuais ou físicos, afetando a segurança informática e violando direitos autorais, entre outros (Borella, 2023).

Conforme Rossini (2004, p. 110), os crimes virtuais são definidos como condutas típicas e ilícitas, que podem constituir crime ou contravenção, e que são realizadas de forma dolosa ou culposa, de maneira comissiva ou omissiva. Essas ações são praticadas por pessoas físicas ou jurídicas, utilizando-se da informática, tanto em ambientes de rede como em outros contextos, e têm como alvo a segurança informática, afetando direta ou indiretamente a integridade, disponibilidade e confidencialidade dos dados.

Nessa mesma linha de pensamento, Pinheiro (2013, p. 46) discute que os crimes virtuais englobam uma variedade de condutas, como o acesso não autorizado a sistemas de informática, que resulta em ações destrutivas afetando sistemas de comunicação, alterando dados, violando direitos autorais, além de envolver diversos tipos de ofensas, discriminações, demonstrações de ódio e intolerância, exposição de pornografia infantil, terrorismo, entre outros.

No contexto dos crimes contra as relações de consumo, é importante mencionar que o dolo é o elemento central para a responsabilidade penal. O dolo se refere à consciência e intenção de praticar uma conduta descrita como crime. Portanto, os influenciadores digitais podem incorrer em diferentes crimes em relação às suas atividades online, como os crimes contra a honra (Nascimento, 2023).

Para que haja responsabilização penal do influenciador digital, é necessário analisar cuidadosamente o caso concreto para determinar se houve dolo em suas ações. Sendo assim, a responsabilidade civil busca reparar danos já causados, enquanto a responsabilidade penal visa prevenir danos futuros, com a repressão ocorrendo antes da consumação do dano.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da análise realizada sobre a responsabilidade e regulamentação na legislação penal brasileira em relação aos jogos de azar, bem como a publicidade dos influenciadores, é possível concluir que a temática apresenta desafios significativos no contexto jurídico contemporâneo.

A discussão sobre a legalidade dos jogos de azar no Brasil envolve uma série de aspectos, incluindo questões éticas, sociais, econômicas e de segurança pública. A legislação penal brasileira estabelece normas claras sobre a proibição ou regulamentação dessas atividades, visando proteger a sociedade de possíveis danos decorrentes da prática dos jogos de azar.

No que diz respeito à publicidade dos influenciadores digitais, observa-se um cenário em constante evolução, onde esses profissionais exercem uma influência significativa sobre seus seguidores, especialmente no ambiente digital. A divulgação de empresas de jogos de azar por parte desses influenciadores levanta questões importantes sobre responsabilidade, transparência e ética na comunicação.

A apresentação do Projeto de Lei 3915/23, que visa proibir a divulgação, promoção ou apoio de empresas de jogos de azar por influenciadores e artistas, representa uma tentativa de regulamentar essa prática e proteger os consumidores de possíveis danos.

Portanto, é essencial que o debate sobre a responsabilidade e regulamentação dos jogos de azar e da publicidade dos influenciadores seja conduzido de forma ampla e transparente, levando em consideração os interesses da sociedade como um todo. A busca por soluções equilibradas e eficazes requer o envolvimento de diferentes atores sociais e a promoção de um diálogo construtivo entre eles.

REFERÊNCIAS

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[1] Acadêmico do curso de Direito.

[2] Mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos. Especialista em Ciências Criminais e em Direito e Processo Administrativo. Graduado em Direito e em Jornalismo, todos os cursos pela Universidade Federal do Tocantins (UFT). Professor de Processo Penal e Direitos Humanos na Faculdade Serra do Carmo (Fasec/TO). Escritor de obras jurídicas e artigos. Delegado da Polícia Civil do Tocantins.