AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS DE GARANTIA DA LEI DE LOCAÇÕES DE IMÓVEIS – LEI 8.245/1991

AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS DE GARANTIA DA LEI DE LOCAÇÕES DE IMÓVEIS – LEI 8.245/1991

11 de junho de 2025 Off Por Cognitio Juris

CONTRACTUAL WARRANTY CLAUSES OF THE REAL ESTATE LEASING ACT – ACT 8.245/1991

Artigo submetido em 10 de junho de 2025
Artigo aprovado em 11 de junho de 2025
Artigo publicado em 11 de junho de 2025

Cognitio Juris
Volume 15 – Número 58 – 2025
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Yago Barroso Moreira[1]
Jefferson Franco Silva [2]

RESUMO: O presente trabalho possui o propósito de abordar as cláusulas de garantia previstas pela Lei 8.245/1991, para trazer, de forma explicativa, quais são as cláusulas, suas utilizações, desdobramentos e atual momento em contextos fáticos, de forma qualitativa por meio de pesquisas bibliográficas e abordando sua história e contexto para entender a atual legislação.

Palavras-chave: garantias; contratos de locação; imóveis; lei de locação.

ABSTRACT: The purpose of this work is to address the guarantee clauses provided for by Law 8,245/1991, to provide an explanation of the clauses, their uses, developments and current situation in factual contexts, in a qualitative way through bibliographical research and addressing their history and context to understand the current legislation.

KEYWORDS: guarantees; lease agreements; real estate; lease law.

1 INTRODUÇÃO

A locação de imóveis urbanos é um tema bastante discutido no âmbito do judiciário em razão de significativa divergência de interesses e tutelas de direitos, como o direito de moradia estabelecido nos art.6º da Constituição Federal e o direito à propriedade do locador, resultando em um contrato que muitas vezes não possui o equilíbrio exigido pela legislação.

No entanto, existem motivos e contextos para a edição das anteriores e atuais legislações locatícias. Por isso devemos realizar uma pesquisa histórica e qualitativa da legislação e de sua aplicação no contexto fático, em especial as garantias locatícias que visam proteger o direito do locador e permitir o firmamento do contrato entre as duas partes, objeto que será estudado no decorrer deste trabalho.

2 BREVE HISTÓRICO DA LOCAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS NO DIREITO BRASILEIRO

As relações locatícias foram regularizadas por diversas legislações, passando pelo Código Civil de 1916, início do século XX, a primeira lei do inquilinato de 1921 até a atual legislação, a Lei 8.245/1991, também com diversas alterações e adequações feitas por leis posteriores, mas até o momento sem ser revogada por completo.

No período de 1916 a 1921, esta relação fora regida pela Lei 3.071/1916 (Código Civil de 1916), em que prevalecia os princípios do absolutismo da propriedade e da plena liberdade contratual, o que ocasionava situações como, por exemplo, a devolução do imóvel quando findo o prazo ajustado sem nenhuma razão a ser apresentado pelo locador para por término à locação, bem como, ao decorrer os trinta dias em caso de não convenção de prazo para fim da locação, o locador poderia estipular o valor que lhe fosse conveniente como aluguel (BRASIL, 1916).

No entanto, surgia em 1921 a primeira Norma do Inquilinato, o Decreto 4.403/1921, com o intuito de uma intervenção estatal para combater o monopólio, o uso abusivo da propriedade combatendo a realidade de adesão ao contrato de locação para trazer um equilíbrio entre as partes contratuais (BRASIL, 1921).

Assim como este primeiro instrumento legislativo, as demais normas que viriam, em síntese, buscavam sempre proteger e manter o mesmo objetivo, dentre eles, podemos citar: o controle do aluguel, a prorrogação compulsória da locação e a fixação em numerus clausus, das hipóteses de rescisão contratual. Assim até o ano de 1928, tivemos 06 (seis) Leis do Inquilinato subsequentes: (i) Lei nº 4.624/1922, (ii) Lei nº 4.793/1924, (iii) Decreto nº 4.840/1924, (iv) Lei nº 4.884/1924, (v) Lei nº 4.975/1925 e (vi) Lei nº 5.177/1927.

Entretanto, em 1928 o regime comum, ou seja, o Código Civil, voltava a ser aquele que abrangia as locações urbanas, perdurando até o ano de 1942. Este período ficou marcado pelo equilíbrio na lei da oferta e procura, havendo interesse do locador em manter o locatário pelo maior tempo possível, pois o equilíbrio nas relações era comum, colocando o locador em uma posição de que se não mantivesse seu locatário, este facilmente iria a outro que haveria um imóvel disponível para aluguel (PEREIRA LEMOS JUNIOR; SAMPAIO SIQUEIRA, 2023).

Em continuidade, estourava um novo conflito mundial (1939-1945), quebrando a situação de equilíbrio até então existente entre imóveis disponíveis e os preços cobrados, situação do cenário internacional que provocou o poder Estatal a intervir visando manter os locatários em suas moradias e controlar como dito anteriormente o preço do aluguel (JR; BONATTI, 2020).

Esta situação levou a edição até o ano de 1964 de 21 normativas de leis temporárias/transitórias, contando também com o PNH (Programa Nacional de Habitação), visando maior investimento na construção civil destinada a moradia. Ainda, neste contexto, surge a Lei 8.245/1991, vigente Lei do Inquilinato (BATAGINI, 2019).

3 CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS

O contrato de locação é bilateral, oneroso, comutativo, típico, geralmente consensual e de trato sucessivo. Dito isso, o contrato locatício, à luz da Lei do Inquilinato é um contrato categorizado como “dirigido ou regulamento”, tendo em vista as sucessivas intervenções do Estado nesse contrato que supostamente seria regido pela vontade de duas partes, porém, a legislação indica orientações, proibições e cláusulas obrigatórias, ou seja, a autonomia das partes está presente, porém sempre com observância obrigatória ao ordenamento legal (VENOSA, 2021).

Percebemos então, que a legislação possui um caráter eminentemente protetivo para com o locatário, deixando à disposição do julgador a nulidade de cláusulas ou não, tendo em vista que ele interferiu, porém não o suficiente para ditar de forma imperativa, pois, como exposto, a nulidade prevista na legislação não anula o negócio jurídico por completo, apenas a cláusula viciada (VENOSA, 2021).

3.1 NATUREZA JURÍDICA DAS GARANTIAS LOCATÍCIAS

As garantias possuem natureza de obrigação acessória, estas têm por finalidade precípua assegurar ao locador o cumprimento das obrigações pactuadas pelo locatário, atenuando os riscos inerentes à inadimplência e preservando a estabilidade do contrato.

Porém, ao analisar a realidade, confrontando com o direito constitucional à moradia, torna-se também um impeditivo ao acesso como mais uma barreira para a locação urbana, quando ao mesmo tempo, visa garantir o direito do locador, motivo pelo qual o destrinchar da relação locatícia é uma verdadeira disputa de direitos constantemente confrontados, gerando discussões desde as primeiras legislações até a atual Lei do Inquilinato.

A Lei nº 8.245/1991, conhecida como Lei do Inquilinato, ao regular as locações de imóveis urbanos, tratou de delimitar expressamente as modalidades de garantia admitidas, dispondo no art. 37 que o locador poderá exigir, alternativamente, caução, fiança, seguro de fiança locatícia ou cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento (BRASIL, 1991).

Ao adotar rol taxativo, a legislação buscou não apenas conferir segurança jurídica às partes, como também impedir práticas abusivas que oneram excessivamente o locatário, em especial a exigência cumulativa de garantias, vedada pelo parágrafo único do referido dispositivo (ALVES, 2018).

Estas garantias representam uma relevância superior àquela que ela demonstra à primeira vista, elas desempenham papel fundamental dentro da estrutura do contrato, gerando a segurança que o locador busca, mesmo que elas se apresentem como acessórias, atreladas a obrigação principal, cada uma possui particularidades que demandam estudo de forma separada, de garantias reais a garantias pessoais (VENOSA, 2021).

3.2 PRINCÍPIOS DO CONTRATO DE LOCAÇÃO

Existem diversos princípios que dirigem o contrato de locação, alguns deles já citamos anteriormente, como o princípio da autonomia da vontade das partes, porém, é imperioso abordarmos os demais, pois estes nortearão o caminho a ser tomado e trilhado daqueles que regem contratos de locação e interpretam a Lei do Inquilinato.

3.2.1 Princípio da Autonomia da Vontade

Um dos pilares do direito contratual, respaldado tanto pelo Código Civil, como pela Doutrina, garante às partes liberdade, independência e autonomia para estipular as cláusulas de seu contrato, contanto que respeite os limites estabelecidos em Lei (TARTUCE, 2025).

Rememorando que abordamos que o contrato de Locação, ser um contrato “dirigido”, trata-se de influência direta neste princípio, pois, a autonomia das partes é existente, porém, como uma certa exceção por assim dizer, a relação locatícia é uma relação com regulamentação e atuação do Estado de forma regular, pois os interesses em jogo sem extremamente importantes.

A autonomia neste contrato permite às partes estipular critérios como os prazos de pagamento, valor de aluguel reajustes e a escolha de qual garantia locatícia será utilizada no contrato (JR; BONATTI, 2020).

Porém, como já afirmado, é um contrato dirigido que possui limites, por exemplo, o presente trabalha vem tratar que, a Lei do Inquilinato impunha restrição às garantias exigíveis no Contrato de Locação, sendo possíveis de utilização apenas aquelas trazidas no rol taxativo da Lei e a proibição da cumulação de garantias, devendo as partes optarem por apenas uma modalidade de garantia. In verbis:

Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:

I – caução;

II – fiança;

III – seguro de fiança locatícia.

IV – cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

Parágrafo único. É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação (BRASIL, 1991).

O intuito do legislador na estipulação da não cumulação de cláusulas de garantias visa proteger o locatário de abusos, arbitrariedades e exigências desproporcionais, buscando que o exercício da autonomia das partes esteja dentro de parâmetros razoáveis, respeitando as duas partes (TARTUCE, 2025).

3.2.2 Princípio do Consensualismo

Este princípio pode de alguma forma ser semelhante a autonomia da vontade, no entanto, na verdade se trata do acordo de vontades entre as duas partes, ele garante que o contrato deve ser consensual entre as duas partes, podendo levar a sua nulidade, quando ocorrem situações de contratos de locação que na prática funcionam como contratos de adesão, com diversas cláusulas que oneram de forma excessiva o locatário, criando um desequilíbrio contratual. Mais uma vez se tornando exposto o maior desafio do direito locatício, o equilíbrio entre as duas partes (SILVA, 2017).

3.2.3 Princípio da Boa-Fé Objetiva

Como todo contrato, o princípio da boa-fé é elemento essencial, que deve nortear a interpretação das cláusulas e cumprimento deste contrato, possuindo sua base legal no Artigo 422 do Código Civil. In Verbis:

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé (BRASIL, 2002).

Ainda neste sentido, o professor e renomado jurista, Flávio Tartuce leciona acerca do princípio da boa-fé objetiva:

Como ficou claro, o sentido do princípio da boa-fé objetiva pode ser percebido da análise do art. 422 do Código Civil, pelo qual “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e da boa-fé”. Compartilhando do parecer de Judith Martins-Costa, entendo que não restam dúvidas de que a boa-fé objetiva constitui um princípio geral (A boa-fé…, 1999). Além disso, trata-se de uma cláusula geral, a ser preenchida pelo aplicador do Direito caso a caso, de acordo com a ideia de senso comum.

O dispositivo em análise consagra a necessidade de as partes manterem, em todas as fases contratuais, sua conduta de probidade e lealdade. Compreendo, assim como Teresa Negreiros, que tal dispositivo legal traz especializações funcionais da boa-fé: a equidade, a razoabilidade e a cooperação (Teoria…, 2003, p. 133-154). Essas três expressões servem como uma luva para demonstrar os deveres anexos. (TARTUCE, 2025).

Todos os Contratos previstos pelo Código civil possuem este princípio como norteador, dito isto, ele exige que as partes ajam de forma honesta e clara, mantendo também a transparência de seus atos, desde a negociação do objeto do contrato até a extinção da relação jurídica (TARTUCE, 2025).

3.2.4 Princípio da Equidade

Também conhecido como princípio do equilíbrio econômico, é visado combater um dos maiores desafios da relação locatícia, o ônus excessivo para apenas uma das partes. Um dos meios de trabalhar este princípio se traduz na proporcionalidade da garantia a ser empregada no contrato, adequando seus valores de acordo com o aluguel ou o momento do mercado (DINIZ, 2025).

O legislador trabalhou este princípio na Lei do Inquilinato ao estabelecer o limite do valor da caução a 03 meses de aluguel, assim como a vedação ao acúmulo de garantias em um contrato, mais uma vez tentando evitar o excesso de obrigações para um dos lados (DINIZ, 2025).

3.2.5 Princípio da Função Social do Contrato

O princípio da função social advém da Constituição Federal de 1988, impondo que o negócio jurídico da locação deve atender não apenas aos interesses particulares daqueles que o celebram, mas também abarcar o interesse coletivo e à ordem pública, in casu, o direito social a ser atendido é o de direito à moradia, previsto no Art.6º da CF/88. In Verbis:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 1988).

Ou seja, a convenção do contrato de locação não deve apenas respeitar a vontade das partes, mas ela deve possuir critérios que não impossibilitem o acesso à moradia, evitando uso de cláusulas que oneram de forma excessiva o locatário, colocando limites na autonomia privada das partes, pois assim como a legislação, a CF/88 também define um caminho para as partes realizarem o contrato de locação (TARTUCE, 2025).

Neste Sentido, leciona e conceitua o renomado professor e jurista Flávio Tartuce sobre a função social do contrato ao analisar dos Artigos 421 e 2.035 do Código Civil:

Desse modo, os contratos devem ser interpretados de acordo com a concepção do meio social onde estão inseridos, não trazendo onerosidade excessiva às partes contratantes, garantindo que a igualdade entre elas seja respeitada, mantendo a justiça contratual e equilibrando a relação onde houver a preponderância da situação de um dos contratantes sobre a do outro. Sobre a onerosidade excessiva, o tema ganhou especial relevância com a pandemia da Covid-19, tendo sido tratada a revisão contratual por onerosidade excessiva pela Lei 14.010/2020, como se verá a seguir. Valoriza-se, portanto, a equidade, a razoabilidade, o bom senso, afastando-se o enriquecimento sem causa, ato unilateral vedado expressamente pela própria codificação, nos seus arts. 884 a 886. Por esse caminho, a função social dos contratos visa à proteção da parte vulnerável da relação contratual (TARTUCE, 2025). (grifo nosso)

4 GARANTIAS LOCATÍCIAS EM ESPÉCIES

A lei 8.245/91 prevê um rol taxativo de garantias em seu Artigo 37, são elas: caução, fiança, seguro fiança e cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento, cada uma delas com especificidades e vantagens a depender do caso concreto a serem aplicadas. Uma prática comum no contrato de locação e a escolha da garantia pelo próprio locatário, visando obter uma facilidade deste a fechar o negócio jurídico entre as partes (SILVA, 2017).

Importante rememorar que a obrigação da garantia pode ser estipulada pelas partes, em cláusulas previstas no próprio contrato de locação ou em contrato autônomo. Conforme leciona o professor Sílvio de Salvo Venosa, este contrato autônomo não possui tipicidade, o que dificulta sua conceituação, no entanto, podemos identificá-lo sempre que as partes realizarem avença para garantir o cumprimento de outro contrato ou obrigação, não deixando de ter sua natureza de acessório ao contrato principal, podemos exemplificar usando o tradicional contrato de fiança, ligado aos contratos locatícios (VENOSA, 2021).

Dito isto, analisaremos todas as espécies de garantia locatícia e os desdobramentos possíveis dentro de contextos fáticos.

4.1 CAUÇÃO

Ao iniciarmos a análise da caução, faremos uma abordagem de forma macro e posteriormente, de forma micro, verificando suas possibilidades dentro do mundo jurídico. Posto isso, ao levantarmos o conceito geral de caução, sabemos que se trata de qualquer garantia que vise realizar e concretizar um direito.

A caução é trazida no primeiro inciso do Artigo que trata das garantias locatícias, sendo a “garantias locatícia” um gênero e dentre as espécies se encaixaria a caução em imóveis, em dinheiro, em títulos e ações e por último a caução em bens móveis, devendo, no caso de imóveis ser averbada na respectiva matrícula e de móveis no cartório de títulos e documentos (JR; BONATTI, 2020).

Vejamos a lição do Professor Alessandro Schirrmeister Segalla sobre o funcionamento da caução:

A garantia denominada de “caução” terá apenas natureza real, pois, através dela o próprio locatário ou terceiro destacarão do seu patrimônio determinado bem móvel, imóvel, títulos ou ações com a finalidade de proteger o locador de eventual inadimplemento do locatário. “sem que existam as formalidades dos direitos reais de garantias típicos”, com bem expôs Sílvio de Salvo Venosa (SEGALLA, 2010).

Ou seja, o intuito final é o de proporcionar uma maior segurança ao locador, tendo em vista uma maior previsibilidade do que pode ocorrer ao optar por esse tipo de garantia no contrato ou em contrato autônomo (JR; BONATTI, 2020).

4.1.1 Caução em Bens Móveis e Imóveis

O artigo 38 da Lei do Inquilinato abre a possibilidade para além da caução em dinheiro, possa ser realizada caução também de bens móveis e imóveis, porém, ao levarmos a prática, ocorre grande crítica à verdadeira efetividade em torno da caução especificamente por bens móveis (VENOSA, 2021).

Ora, tendo em vista este bem, mesmo que constituído em cartório, não gera imbróglio para que seja transportado de um local para outro, ou seja, não possui verdadeira eficácia para ensejar segurança jurídica ao locador. Explica o professor Luiz Antonio Scavone Júnior:

Na prática da locação de imóveis urbanos a figura da caução de bens móveis é insignificante por se tratar de garantia inócua e sem qualquer utilidade prática em razão da própria natureza dos bens móveis que são “suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social”, nos termos do art. 82 do Código Civil (JR; BONATTI,  2020) (grifo nosso).

Ainda sim, é importante analisarmos os critérios emergentes da legislação para sua eficácia. Vejamos, a obrigação entre as partes é gerada a partir do contrato, porém, a eficácia erga omnes só pode existir a partir da publicidade deste mesmo contrato, seja o de locação com cláusulas prevendo as garantias, seja contrato autônomo de garantia (VENOSA, 2021).

A legislação define que a publicidade é alcançada quando realizado registro público, para bens móveis, no cartório de títulos e documentos, já para os bens imóveis, seria o registro imobiliário. O registro, como explicado anteriormente, é o que de fato gera efeitos para com terceiros, não possuindo, por exemplo, nenhum efeito imobiliário para um bem imóvel que dado como caução sem o devido registro do instrumento na matrícula daquele imóvel (VENOSA, 2021).

Ainda sobre a caução dos bens imóveis, a doutrina possui uma certa dualidade ao tratar do instrumento que de fato garante o imóvel em seu registro, com grandes doutrinadores de um lado se posicionando que aquilo que formaliza a caução deste imóvel é apenas a hipoteca, mesmo não estando prevista na Lei 8.245/91, devendo a hipoteca ser registrada e a caução averbada. Porém, existe corrente contrária liderada por juristas como o saudoso Sílvio de Salvo Venosa, e demais autores. Vejamos posicionamento da doutrina neste sentido contrário:

Na verdade, o coautor destes comentários, Alessandro S. Segalla, entende que a modalidade de garantia mencionada expressamente pelo legislador neste art. 37, I, da LI como “caução” representa o gênero da qual as modalidades caução de imóvel e móvel são espécies, até porque o objetivo da Lei do Inquilinato, ao ter previsto uma modalidade específica de garantia locatícia sob a denominação de caução, foi o de simplificar a estipulação de uma garantia real para permitir a sua efetiva contratação (JR; BONATTI, 2020).

4.1.2 Caução em dinheiro

Como já exposto, tanto a legislação como o contrato de locação de imóveis urbanos, são dirigidos, neste sentido, o legislador estipulou um limite para a garantia da caução em dinheiro, devendo ser o valor de 03 vezes o do aluguel, além de especificamente ser depositado em caderneta de poupança com esse fim específico (TARTUCE, 2025).

O professor Sílvio de Salvo Venosa nos ensina que a caderneta se apresenta como opção segura para a garantia, onde nenhuma das duas partes pode realizar a retirada sem a anuência da outra, não obstante, caso o valor ultrapasse o valor do 03 aluguéis, pode o locatário pedir o saque do excesso, em contramão, em caso de reajuste dos valores do aluguel, pode o locador, assim como o locatário realizar exigências, porém, para complemento do valor depositado para que se torne novamente equivalente ao valor de 03 aluguéis visando manter a eficácia e efetividade da garantia pactuada.

Como previsto na Lei 8.245/91 o responsável pela regulação do funcionamento de tal caderneta de poupança é responsabilidade do poder público. In Verbis:

Art. 38. A caução poderá ser em bens móveis ou imóveis.

§ 2º A caução em dinheiro, que não poderá exceder o equivalente a três meses de aluguel, será depositada em caderneta de poupança, autorizada, pelo Poder Público e por ele regulamentada, revertendo em benefício do locatário todas as vantagens dela decorrentes por ocasião do levantamento da soma respectiva (BRASIL, 1991).

Tal regulamentação é, inclusive, anterior à nossa atual Lei do Inquilinato, sendo regulada pela Resolução 9, de 13/08/1979, do Banco Nacional da Habitação. Dentre os pontos importantes regulamentados, imperativo abordarmos o fato do requisito da abertura da conta ser conjunta em nome do locador e do locatário, além disso, como já citado anteriormente, esta é a resolução que estabeleceu as situações para levantamento, sendo estas: sentença judicial transitada em julgado e anuência por escrito de uma das partes para a outra realizar o levantamento (ABRÃO, 2018).

Além disso, o professor Sílvio de Salvo Venosa ao discorrer sobre tal garantia traz considerações finais importantes das opções de seu levantamento. In Verbis:

Destarte, na cobrança de aluguéis ou qualquer outra verba do locatário, esse depósito pode ser penhorado e servir para satisfação do débito ou de parte dele. Não pode o locador simplesmente lançar mão do depósito para quitar parcelas em atraso do locatário.88 Trata-se de garantia locatícia, e não de pagamento antecipado de aluguéis. Nada mais devendo o inquilino, o depósito, com todas as vantagens da caderneta de poupança, pertence-lhe e não lhe pode ser negado o levantamento. Recusando-se o locador a autorizá-lo expressamente, deve o inquilino recorrer à via judicial. O levantamento do depósito garantidor do débito pendente só pode ocorrer mediante mandado judicial, após o locador promover a execução, penhorando o depósito retido, e não, em princípio, mediante simples alvará judicial (VENOSA, 2021).

4.1.3 Caução em títulos e ações

Ao abordarmos “títulos e ações”, estamos tratando de todo e qualquer valor mobiliário. Prevista no § 3º do Artigo 38 da Lei 8.245/91, se assemelha muito a caução em dinheiro, no entanto, sua maior diferença vem de não possuir limitação de valor, diferentemente da caução em dinheiro, limitada pela lei no valor de 03 vezes o valor do aluguel (VENOSA, 2021).

Dito isso, se enquadra como títulos e ações, por exemplo, títulos de capitalização, ações de companhias, debêntures, títulos de crédito ou quotas de sociedade empresária (JR; BONATTI, 2020).

A caução em títulos, com exceção ao limite imposto por lei de 03 vezes o valor do aluguel, segue as mesmas regras da caução em dinheiro, que será destinada em depósito, ou seja, em caso se extinção do contrato, com todas as obrigações completas, os valores dos títulos retornam ao locatário. Leciona o Professor Sílvio Salvo Venosa:

Desse modo, todas as vantagens que advirem desses valores mobiliários pertencerão ao locatário, podendo este recebê-los, se solvidas todas as suas obrigações decorrentes da locação. Ficando o locador como depositário desses bens, não poderá, por sua própria conta, assim como não o fará com o depósito em poupança, lançar mão dos valores respectivos para se ressarcir de eventuais aluguéis, encargos ou responsabilidades do inquilino em atraso. Deve promover a respectiva ação para responsabilização do locatário, a fim de, com o devido processo legal, mediante autorização judicial, se valer desses títulos, quer penhorando-os, quer deles se utilizando, se assim for decidido. O que se disse acerca do dinheiro em garantia é referido aqui. Esses bens são garantia da locação, e não pagamento antecipado (VENOSA. 2021).

Vejamos, esta modalidade apresenta a vantagem de estabelecimento de qualquer valor para caução, sendo um grande atrativo. Ainda assim, esta modalidade apresenta riscos, tendo em vista a instabilidade do mercado empresarial, possibilidade de liquidações judiciais, em que abrem espaço para situações como sucessão empresarial de sócios e acionistas. Por este motivo, esta espécie de caução não é uma das mais recomendadas, pois seus riscos sobrepujam suas vantagens (JR; BONATTI, 2020).

Em conjunto com estas características, esta espécie entra na mesma modalidade de “bens móveis”, onde usa eficácia apenas existe, em caso de bens móveis, na entrega da posse e no caso, os títulos forem transmitidos de forma devida para o credor, pois caso não aconteça, fica o credor em pleno risco de sua garantia ser transmitida para terceiros (JR; BONATTI, 2020).

4.2 FIANÇA

A fiança se trata de contrato autônomo, com conceito já trabalhado neste artigo, além de ser uma das garantias mais comumente conhecidas e utilizadas dentro do mundo jurídico. Se trata de garantia pessoal, onde terceiro assume responsabilidade pela dívida, colocando em jogando a si e seu patrimônio, se tratando assim de contrato unilateral e usualmente gratuito, popularmente ocorre por favores por uma amizade. Ou seja, o fiador não é codevedor dos valores, mas ele garante o adimplemento de débito de terceiro, ele é o responsável pelo pagamento em caso de inadimplência, a depender do contrato, de forma solidária ou subsidiária (DINIZ, 2025).

Além do já exposto como forma de conceito, leciona o Professor e jurista Sílvio de Salvo Venosa ao tratar da fiança:

Trata-se de forma peculiar de contrato, pelo qual um terceiro garante o contrato. Garantia pessoal que é, assegura o cumprimento das obrigações do locatário, o verdadeiro devedor, geralmente por amizade, embora a fiança remunerada esteja presente com certa frequência. É caso típico em que se dissociam os dois elementos clássicos da obrigação: o débito e a responsabilidade. No contrato de fiança, somente existe a responsabilidade, porque o débito não pertence ao fiador, mas sim ao afiançado. O fiador responde desde eventual deficiência do locatário no cumprimento do contrato principal até sua total inadimplência (VENOSA, 2021).

Não obstante, o professor Flávio Tartuce conceitua o contrato de fiança em uma de suas várias lições:

A fiança, também denominada caução fidejussória, é o contrato pelo qual alguém, o fiador, garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não cumpra (arts. 818 a 838 do CC). O contrato é celebrado entre o fiador e o credor, assumindo o primeiro uma responsabilidade sem existir um débito propriamente dito (“Haftung ohne Schuld” ou, ainda, “obligatio sem debitum”).

No Direito Privado brasileiro existem duas formas de garantia: a) garantia real, em que uma determinada coisa garante a dívida, como ocorre no penhor, na hipoteca, na anticrese e na alienação fiduciária em garantia; e b) garantia pessoal ou fidejussória, em que uma pessoa garante a dívida, como ocorre na fiança e no aval (TARTUCE, 2025).

Conquanto, em sua maioria, ocorre como um contrato gratuito, não podemos esquecer do contrato de fiança oneroso, sendo um serviço prestado usualmente por instituições bancárias e seguradoras, sendo sua remuneração usualmente uma porcentagem do valor garantido, inclusive, especificamente se tratando de instituições bancárias, se o contratante, recebedor final deste serviço, aplica-se o CDC, portanto, a fiança bancária se encontra em uma situação atípica (TARTUCE, 2025).

Continuando a linha da conceituação e características do contrato de fiança, se trata de contrato acessório, in casu, ao contrato de locação, sendo consensual, exigido por força de lei, que sua forma seja escrita. Importante salientar pontos antes controversos na jurisprudência e doutrina, os quais estão pacificados, dentre eles, a cláusula de prorrogação automática da fiança, incidindo no caso de silêncio das partes em contrato locatício, onde este se torna de prazo indeterminado. Entendimento alvo de muitas críticas tendo em vista o bojo do Artigo 819 do Código Civil: “Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva.” (JR; BONATTI, 2020).

Ora, ocorreria flagrante interpretação extensiva da norma, porém, a jurisprudência apresentou uma solução, em mais uma tentativa de equilíbrio da relação locatícia, admitindo-se a exoneração unilateral do fiador, situação inserida na Lei do Inquilinato através da Lei 12.112/09, ainda de acordo com o Professor Flávio Tartuce:

Pois bem, com a emergência da Lei 12.112/2009 ficou expressamente estabelecido pela norma que, prorrogada a locação, prorroga-se automaticamente a garantia, caso da fiança.

Todavia, chegou-se a um meio-termo, pois, com a prorrogação, passa a ser admitida a exoneração unilateral por parte do fiador, mediante simples notificação dirigida ao credor (locador). Após a notificação a responsabilidade do fiador persiste por mais cento e vinte dias (art. 40, inc. X, da Lei de Locação, também introduzido pela Lei 12.112/2009). A norma prevalece em relação ao art. 835 do CC/2002, por ser mais especial. Relembre-se que o último dispositivo de igual modo dispõe de um direito a exoneração para o fiador, na fiança sem prazo determinado. A diferença é que nesta norma geral há previsão de sua responsabilidade por sessenta dias após a notificação do credor. Em suma, a divergência anterior parece ter sido solucionada pela lei, de modo razoável, na minha opinião doutrinária (TARTUCE. 2025).

Um último ponto de destaque que não pode ser deixado de lado ao tratarmos do contrato de fiança, é a discussão sobre impenhorabilidade do bem de família do fiador. De um lado era alegado a inconstitucionalidade por ofender o Artigo 6º da CF/88, sendo a questão levada ao STF, com decisão monocrática declarando a impenhorabilidade do bem de família do fiador. No entanto, ao chegar ao pleno do tribunal, fora afastada a impenhorabilidade reconhecendo a constitucionalidade do Art. 3 º, VII da Lei 8009/90 frente ao Artigo 6º da CF/88, sendo posteriormente ratificada pelo STJ em rito de recursos repetitivos, valendo neste momento colacionar a tese proferida em julgamento pela Segunda Seção:

É legítima a penhora de apontado bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, ante o que dispõe o art. 3º, VII, da Lei 8.009/1990. A Lei 8.009/1990 institui a proteção legal do bem de família como instrumento de tutela do direito fundamental à moradia da entidade familiar e, portanto, indispensável à composição de um mínimo existencial para uma vida digna. Nos termos do art. 1º da Lei 8.009/1990, o bem imóvel destinado à moradia da entidade familiar é impenhorável e não responderá pela dívida contraída pelos cônjuges, pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas no art. 3º da aludida norma. Nessa linha, o art. 3º excetua, em seu inciso VII, a obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação, isto é, autoriza a constrição de imóvel – considerado bem de família – de propriedade do fiador de contrato locatício. Convém ressaltar que o STF assentou a constitucionalidade do art. 3º, VII, da Lei 8.009/1990 em face do art. 6º da CF, que, a partir da edição da Emenda Constitucional 26/2000, incluiu o direito à moradia no rol dos direitos sociais (RE 407.688-AC, Tribunal Pleno, DJ 6/10/2006 e RE 612.360-RG, Tribunal Pleno, DJe 3/9/2010). Precedentes citados: AgRg no REsp 1.347.068-SP, Terceira Turma, DJe 15/9/2014; AgRg no AREsp 151.216-SP, Terceira Turma, DJe 2/8/2012; AgRg no AREsp 31.070-SP, Quarta Turma, DJe 25/10/2011; e AgRg no Ag 1.181.586-PR, Quarta Turma, DJe 12/4/2011 (BRASIL, 2014).

Sendo assim, verificamos que houve fim e se pacificou a penhorabilidade do bem de família do fiador de contrato de locação, com base na exceção levantada pela Lei 8.009/90 (TARTUCE, 2025).

4.3 SEGURO DE FIANÇA LOCATÍCIA

A lei 8.245/91 não detalhou ou regularizou o seguro de fiança, apenas possibilitou sua existência, sendo uma garantia pessoal, disciplinada dentre os contratos de seguros, previstos nos Artigos 757 a 777 do Código Civil.

O seguro locatício foi regulamentado pela Resolução CNSP 202 de 22 de dezembro de 2008 e pela Circular SUSEP nº 587 de 10 de junho de 2019, possuindo um objetivo claro, garantir ao segurado o pagamento dos danos que ele possa sofrer por inadimplemento do locatário. O contrato de seguro fiança locatícia é um contrato a parte firmado entre a seguradora e o locador (segurado), dentre os pontos importantes da regulamentação, podemos citar o mínimo a ser previsto nas apólices quando da contratação, no caso, a cobertura do atraso de aluguéis, ou seja, quando o locatário está em mora com suas obrigações, ficando facultada a contratação de coberturas a maior (VENOSA, 2021).

Ao adentrarmos a realidade prática, é de conhecimento comum que a figura do fiador, terceiro, pessoa física, caiu drasticamente em desuso, quando comparado a sua utilização no período de 10 a 15 anos. Com isto em mente, a realidade imobiliária das dificuldades de realizar um contrato de locação reside em grande parte na escolha da garantia para o contrato de locação.

No caso da caução, o locatário muitas vezes não possui condições financeiras de dispor do valor referente a 03 vezes o valor de um aluguel de uma só vez, ou de bens que possam garantir seu contrato, gerando entraves no prosseguimento do contrato. Já no caso da fiança, como discorrido acima, não é encontrado com tanta facilidade um terceiro a aceitar tal compromisso.

Dito isto, o seguro fiança surge como uma alternativa aos imbróglios do fechamento do contrato de locação, isto porque, este não oferece apenas garantia acerca dos aluguéis em atraso, como também, caso seja aderido na apólice, abarcará IPTU, condomínio, multas e até danos ao imóvel (DINIZ, 2025).

Devemos lembrar que o contrato de seguro fiança é entre o locador e a seguradora. O locatário é o “garantido” da apólice, pois, como segurado, este é o que receberá da seguradora em caso de inadimplência. Sua utilização se diferencia, pois não ocorre a execução de uma garantia, e sim o pagamento pela seguradora ao ocorrer o inadimplemento, mediante o aviso do locador ao ocorrer a locatário incorrer em mora, após o aviso, a seguradora abre o processo de apuração dos fatos e posteriormente, se aprovada, o pagamento diretamente ao locador (TARTUCE, 2025).

A professora Maria Helena Diniz, ao abordar os direitos do locador, discorre sobre o seguro fiança:

seguro de fiança locatícia (Circulares SUSEP n. 587/2019 e 594/2019), isto é, o pagamento de uma taxa, correspondente a um prêmio mensal ou anual que se ajustar, tendo por fim garantir o pagamento de certa soma ao locador (segurado). Garante-se, mediante o prêmio, o pagamento de indenização dos prejuízos sofridos com o inadimplemento do locatário (Res. n. 202/2008 da SUSEP) (DINIZ, 2025).

Em suma, o seguro fiança se fora previsto pelo legislador como uma alternativa as espécies de garantias já tradicionais e que correm risco de cair em desuso, sendo esta espécie a de uso mais crescente no mercado, sendo uma forma mais estável para locador, porém, devido a carga para com o locatário, ainda gera discussões na doutrina.

4.4 CESSÃO FIDUCIÁRIA DE QUOTAS DE INVESTIMENTO

Esta espécie se trata de cessão da titularidade de crédito, por parte do locatário em quotas de investimento, emitidas por instituição financeira, para o locador até o fim do contrato ou liquidação da dívida. Ou seja, a posse destas quotas, indireta ou direta, se mantém com o locador que pode executá-las caso o locatário se encontre em inadimplemento, pois quando se encontra em mora, a titularidade se torna do credor-fiduciário (TARTUCE, 2025).

Acerca de suas características é imperioso destacar o caráter resolúvel a qual se presta, é uma cessão de direitos em garantia, ou seja, está ligada ao contrato principal, in casu, o contrato de locação, que por consequência e por força de lei deve manter formalidade escrita e publicidade para perpetuar efeito para com terceiros. Ademais, ao discutirmos a questão da publicidade, visando “amarrar” suas obrigações, é de praxe, adicionar no contrato de locação, cláusula prevendo a garantia em si, trazendo seus efeitos para as partes, no lugar de realizar apenas o registro, visando uma maior segurança publicidade e evitar a transmissão a terceiros de boa-fé, ato que prejudicaria o locador (TARTUCE, 2025).

Visando uma maior didática e detalhista visão do tema, trazemos aqui o entendimento da professora Maria Helena Diniz:

d) cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento (Lei n. 8.245/91, art. 37, IV, acrescido pela Lei n. 11.196/2005), pela qual o locatário (devedor) cede, até que se dê a liquidação total da dívida ex locato, ao locador (credor), os seus direitos creditórios, representados em quotas (títulos de investimento) emitidas por entidade financeira, originárias de operações nos segmentos financeiro, comercial, industrial, arrendamento mercantil, prestação de serviços, sistema de distribuição de valores mobiliários destinados à aplicação em empreendimentos imobiliários (construção de imóveis, aquisição de imóveis prontos ou investimentos em projetos, visando viabilizar o acesso à habitação e serviços, inclusive em áreas rurais para posterior alienação, locação ou arrendamento). Tais quotas constituem objeto do fundo, que não poderá ser explorado comercialmente pelo mesmo, salvo através de locação ou arrendamento ou em carteira diversificada de títulos e valores mobiliários. Essa cessão fiduciária é admitida pela Lei n. 4.728/65, art. 66-B, §§ 3º a 6º (incluídos pela Lei n. 10.931/2004) e, salvo disposição em contrário, a posse direta ou indireta das quotas é atribuída ao credor (locador), que, em caso de inadimplemento ou mora da obrigação locatícia garantida, poderá vender a terceiro o bem objeto da propriedade fiduciária independentemente de leilão, hasta pública ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no pagamento do seu crédito e das despesas decorrentes da realização da garantia, entregando ao devedor (locatário) o saldo, se houver, acompanhado do demonstrativo da operação realizada (DINIZ, 2025).

No entanto, trata-se de espécie com pouca utilização no mercado de locações em sua maioria, tendo em vista o fato de que o locatário deverá manter o valor acordado por toda a duração do contrato, fato esse de difícil controle, pois, devido à mobilidade do mercado, podemos chegar em situações de oscilações positivas, caso haja saldo positivo esse se converte ao locatário, ou negativa, trazendo ineficácia e insegurança ao locador (JR; BONATTI, 2020).

5 CONCLUSÃO

Com base no exposto de todo este trabalho e de todo o estudo realizado para sua confecção, durante a análise da relação locatícia percebemos uma dualidade na relação, com defensores de dois lados, alguns mais propensos aos direitos do locador e outros, mais propensos aos direitos do locatário. Discordâncias que geraram diversas teses jurídicas e posicionamentos das cortes superiores, visando trazer segurança aos jurisdicionados.

No entanto, como já exposto anteriormente, de fato o contrato locatício e a legislação locatícia, são dirigidos, pendendo para o lado mais necessário de acordo com o entendimento dos legisladores. Porém, com o decorrer do tempo, foram alterados diversos entendimentos e buscando um certo equilíbrio na relação. Portando a relação locatícia se manterá numa eterna busca pelo equilíbrio contratual e nesta busca, poderá chegar o mais próximo possível de um equilíbrio que provavelmente não será alcançado.

Sobre as garantias locatícias em si, estes são os instrumentos que o legislador trouxe para trazer uma maior garantia aos direitos do locador, lado este amplamente crítico das leis locatícias por se sentir lesado. Porém, como exposto, o legislador não pode prever como irá se desdobrar a realidade tanto do mercado locatício, como do próprio país ou cenários internacionais, os quais já influenciaram na confecção de leis locatícias, portanto, na medida do tempo em que entrou em vigência, ela se propôs de forma digna a tentar apresentar instrumentos que trariam maior segurança ao locador.

Dito isto, nada impede, ou, melhor ainda, é dever do legislador, analisar a necessidade de acordo com a realidade atual e trazer inovações legislativas para nossa realidade. Mais compatíveis com as capacidades de todas as camadas, seja com garantias que são mais fáceis de realizar por parte do locatário, seja por alguma mais complicada que traga uma segurança maior em consequência. Ainda assim, haverá o papel do judiciário para realizar sua interpretação de acordo com a realidade fática e com a intenção do legislador, para definir qual será a solução, sempre dentro dos caminhos dispostos pela nossa Constituição Federal de 1988.

REFERÊNCIAS

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[1]  Graduando em Direito pela Faculdade Serra do Carmo – FASEC. E-mail: yagobarroso32@gmail.com

[2]Professor na Faculdade Serra do Carmo – Fasec, da disciplina de Direito Tributário, Direito Administrativo e Prática Real e Simulada V, no curso de Bacharelado em Direito. Especialista em Direito Processual Civil, graduado em Direito pela Universidade Federal do Tocantins UFT/Palmas/TO. Servidor Público Federal da Seção Judiciária do Estado do Tocantins – Justiça Federal da 1ª Região. E-mail: jefferson.franco.silva@gmail.com.