A COMPREENSÃO DA VALIDADE DA NORMA NO SISTEMA JURÍDICO

A COMPREENSÃO DA VALIDADE DA NORMA NO SISTEMA JURÍDICO

UNDERSTANDING THE VALIDITY OF THE NORM IN THE LEGAL SYSTEM

Artigo submetido em 18 de abril de 2024
Artigo aprovado em 05 de maio de 2024
Artigo publicado em 30 de junho de 2024

Cognitio Juris
Volume 14 – Número 55 – Junho de 2024
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Daniele Lambert da Cunha[1]
Gisele de Souza[2]

Resumo: O presente artigo tem como finalidade abordar a validade da norma jurídica e seus efeitos jurídicos, sob a perspectiva neoconstitucional. Para tanto, esclarece o que é norma jurídica, discorrendo sobre a interpretação do texto normativo a partir do sistema jurídico no qual está inserida, pressupondo sua unidade, coerência e completude. Em razão de tais pressupostos, verifica-se que o ordenamento jurídico não abarca antinomias, e que estas são apenas aparentes, na medida em que possui mecanismos de solucioná-las. Nesse contexto, considerando que o sistema jurídico não admite norma contrária ao ordenamento, será abordado a característica (plano) da validade, diferenciando-a da existência, e discorrendo sobre as correntes doutrinarias existentes: uma que entende tratar-se do mesmo plano, enquanto outra distinguem-nas, considerando os efeitos jurídicos na adoção de cada corrente, e apontando a mais coesa. Da análise de tal característica, verifica-se o importante papel dos tribunais superiores – Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribuna de Justiça (STJ) – na desconstituição da norma contrária ao ordenamento.
Palavras-chave: norma, ordenamento jurídico, antinomias, coerência, completude, unidade, validade.

Abstract: The purpose of this article is to address the validity of the legal rule and its legal effects, from a neo-constitutional perspective. To this end, it clarifies what a legal norm is, discussing its interpretation from the legal system in which it is inserted, presupposing its unity, coherence and completeness. Because of these assumptions, it is verified that the legal system does not encompass antinomies, and these are only apparent, to the extent that the legal system itself has mechanisms to solve them. In this context, considering that the legal system does not admit a norm contrary to the order, the characteristic (plan) of validity will be addressed, differentiating it from existence, and discussing the existing doctrinal currents: one that understands that it is the same plan, while another distinguishes them, considering the legal effects in the adoption of each current, and pointing out the most cohesive. From the analysis of this characteristic, it is verified the important role of the superior courts (Supremo Tribunal Federal – STF) and Superior Tribunal de Justiça – STJ) in the deconstitution of the norm contrary to the order.
Keywords: norm, legal order, antinomies, coherence, completeness, unity, validity.

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo aborda o conceito de norma jurídica, bem como a compreensão do ordenamento jurídico, pressupondo sua unidade, coerência e completude, e a partir daí, discorre sobre a validade da norma.

Considerando que o ordenamento jurídico é coerente, completo, e unitário, não cabe normas antinômicas, razão pela qual o próprio ordenamento jurídico contém mecanismos de resolver antinomias.

Sobre o plano da validade da norma, observa-se a existência de textos normativos “transvestidos de normas”, que, por serem contrárias ao ordenamento, são inválidas. E a referida invalidade necessita ser declarada para deixar de produzir efeitos jurídicos.

Quando a norma é contrária à lei federal, o Superior Tribunal de Justiça desempenha o papel de interpretá-la, analisar sua legalidade e dar a decisão final acerca da sua invalidade.

E quando a norma é contrária à Constituição Federal, é o Supremo Tribunal Federal que desempenha o importante papel de interpretá-la, analisar sua constitucionalidade, e dar a decisão final sobre a sua invalidade.

Portanto, é de suma importância a compreensão da norma em consonância com o ordenamento jurídico; caso contrário, o Tribunal, em especial o STF nos casos de inconstitucionalidade, no exercício do papel interpretativo normativo em última instância, declarará a invalidade da norma.

O estudo evidencia duas correntes doutrinarias que discorrem sobre o plano da validade da norma: uma delas distingue os planos da validade e da existência, enquanto a outra não. E da adoção de cada posicionamento decorrem consequências distintas, ou seja, efeitos jurídicos distintos.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. O direito e a norma jurídica

Diversos autores buscaram definir o direito, atrelando-o à norma jurídica, e mediante sua definição, analisaram suas características intrínsecas no ordenamento jurídico, a fim de garantir a unidade do ordenamento, a coerência das normas e completude do direito.

Para Kelsen, o direito decorre da norma hipotética fundamental (pressuposta), e trata-se de um conjunto de normas (de dever ser) atreladas à coação. Pondera que o direito é uma espécie de moldura com normas aplicáveis, em que cabe diversas interpretações corretas, desde que decorra de uma autoridade competente, que lhe atribui validade.

Para Hart, positivista como Kelsen, e menos radical, o direito está atrelado à linguagem, o que torna igualmente possível diversas interpretações corretas. Para ele, direito é um conjunto de regras, classificadas em permissivas e proibitivas, e ligadas a uma regra identificadora, de reconhecimento (para incertezas), de alteração (quando é estática), e de julgamento (para resolver conflitos ligados à ineficácia).

Já Goffredo Telles Junior considera o direito um conjunto de normas mandamentais e autorizantes. Isso porque a norma impera no ordenamento, e sempre autoriza uma reação, sendo a característica “autorizante” da norma, que a distingue, que a torna jurídica, com a seguinte estrutura hipotética “se “A” é, “B” deve ser”.

Em razão das características autorizante e mandamental, inerentes às normas jurídicas, podem ser consideradas:  i) as Leis Definidoras; ii) as Leis Supletivas, iii) e as Normas Penais. Por outro lado, Preceitos não são normas jurídicas, apesar de serem proclamações de princípios, expressões ideológicas, declarações programáticas observáveis pelo Poder Público, apesar de sua aparência jurídica que lhe confere solenidade.

Neste contexto, o professor Goffredo Telles salienta ainda que existem “normas” editadas pelo Poder Público, cuja formalidade para tal foi devidamente observada, todavia, por serem contrárias ao ordenamento jurídico, trata-se de normas inválidas.

Considerando que o ordenamento jurídico tem como características a unidade, a completude e a coerência, apesar da existência de normas inválidas, estas precisam ter sua invalidade declarada, com a consequente expulsão do ordenamento jurídico, considerando que a invalidade da norma lhe retira o status de norma jurídica.

Neste contexto, o STF, como último intérprete normativo sobre a constitucionalidade de lei, desempenha papel fundamental para a garantia e a perpetuação do direito.

2.2 A interpretação da norma no ordenamento jurídico: unidade, coerência e concretude

 2.2.1. Sistema Jurídico – Regras e Princípios

O ordenamento jurídico é composto por regras e princípios, utilizando-se aqui o conceito de princípio como elemento aglutinador, que confere racionalidade e coerência ao todo.

A boa compreensão de sistema, defendida por Bertalanfly[3]  se assemelha à compreensão de sistema jurídico. Para o autor, sistema compreende partes de um todo, em que cada parte contém em si toda a descrição “genética”, e que há uma “ordem hierárquica”, em que em cada um de seus níveis individuais, aplicam-se igualmente os aspectos de totalidade e somatividade, mecanização progressiva, centralização, e finalidade, compreendendo “sistemas”, como “todo” ou “unidade”.

A estrutura exposta por Bertalanffy se assemelha à compreensão do sistema constitucional brasileiro, conforme dispõem Geraldo Ataliba[4] e Celso Antônio bandeira de Mello[5]. Este último jurista discorre sobre princípio[6] como disposição expressa ou implícita, que conforme o sentido nas normas em um dado sistema jurídico.

Dentro do sistema jurídico brasileiro há diversos sistemas parciais que abrangem objetos distintos, mas que contêm harmonia entre si, em razão da Constituição Federal e dos princípios dela decorrentes.

A Noção de Ordenamento Jurídico como um sistema formado por regras e princípios aglutinadores é de suma importância, pois a partir daí é que se verifica as características de unidade, coerência e concretude do sistema jurídico.

Ele é completo porque tudo o que é juridicamente relevante, o direito contempla, sendo que a previsão de analogia em determinados casos, por si só, não retira a completude do ordenamento, mas apenas e tão somente traduz mecanismo criado pelo próprio ordenamento para se manter completo.

Também possui unidade porque possui uma única fonte, que no ordenamento jurídico brasileiro é a Constituição Federal e seus princípios explícitos e implícitos[7].

E por fim, o ordenamento jurídico é coerente, não contemplando normas antinômicas, mas sim harmônicas entre si. Sendo coerente, possui mecanismos para solucionar as antinomias, ou seja, os textos normativos conflitantes, expostos a seguir.

2.3         Das antinomias dos textos normativos

Em razão da coerência do ordenamento jurídico, não é possível a existência de normas antinômicas, caso em que, se houver, serão objeto do intérprete, que solucionará a problemática decorrente.

Bobbio dispõe no capítulo 3 do Livre Teoria do Ordenamento Jurídico[8] sobre “a coerência do ordenamento jurídico” as supostas antonímias.

Antinomia é a situação na qual encontram-se no mesmo ordenamento jurídico dois textos normativos de onde se extrairiam normas conflitantes / incompatíveis, que contém o mesmo âmbito de validade (temporal, espacial, pessoal e material).

Ou seja, no ordenamento jurídico figuram-se codificações normativas, ou modais deônticos (é permitido fazer, é proibido fazer, é obrigado a fazer), e através delas, podem ocorrer situações de contrariedade, contraditoriedade, subalternidade e subcontrariedade.

A partir dos modais deônticos é possível se extrair as seguintes situações: i) ambas as normas não poderão ser verdadeiras, mas poderão ser ambas falsas (contrarias); ii) ambas não poderão ser nem verdadeiras, nem falsas (contraditorias); iii) relação de implicação na qual uma se deduza de outra, ou seja, do proibido fazer se deduz a norma que permite não fazer, da mesma forma que de uma norma obrigue fazer se deduza uma norma que permita fazer (subalternas), e iv) ambas podem ser verdadeiras, mas não poderão ser falsas (subcontrários).

 Esclarecido os modais doentios e lógicos, expõe-se sobre as antinomias: a doutrina prevê três tipos: i) a total-total, na qual há duas normas incompatíveis, com o mesmo âmbito de validade; ii) Parcial-Parcial, quando há duas normas, ambas com apenas partes conflitantes), e iii)Total-Parcial, quando há uma norma contraria à parte de outra norma.

Citando Karl Engish, Bobbio ainda dispõe sobre a existência de antinomias impróprias, ligadas à linguagem. Seriam elas:

  • Antinomia de princípios, quando há valores contrapostos, princípios antinômicos;
  • Antinomia de valoração, quando uma norma pune um delito menor com uma pena mais grave, enquanto outra pune um delito maior, com uma pena mais branda. Aqui, todavia, não se trata de antonímia, mas sim injustiça, que tem, em comum, a necessidade de correção, mas enquanto antinomia gera incerteza, injustiça produz desigualdade.
  • Antinomia Teleológica (lacunas), que é o conflito entre uma norma que prescreve um meio para atingir um fim, sem que, com a sua incidência, garanta o fim almejado, em razão de uma lacuna normativa.

Em razão da existência de antinomia solúveis (aparentes), seriam necessárias regras para sua solução. Em contrapartida, haveria antinomias insolúveis (reais), tanto em casos em que não se aplicaria nenhuma regra, quanto em casos em que poderia ser aplicado mais de uma regra.

Dentre as regras de Soluções, há:

  • O critério cronológico (no qual prevalece a norma posterior, até porque regra contrária obstaria o progresso jurídico, e a adaptação gradual do direito à evolução da sociedade);
  • O Critério hierárquico (no qual prevalece a norma superior);
  • O Critério de especialidade (no qual prevalece a norma especial em detrimento da norma geral)

Todavia, há casos em que a utilização de tais regras seria insuficiente, quando duas normas são:

  • Contemporâneas;
  • Do mesmo nível;
  • Ambas gerais.

Ainda assim, haveria três possibilidades de solução:

  • Eliminar 1 norma (interpretação ab-rogante);
  • Eliminar as 2 normas (de contrariedade);
  • Conservar as 2 normas, porque a antinomia é inexistente, e a incompatibilidade é só aparente, decorrente de má interpretação

De toda forma, o que se denota é que o ordenamento jurídico possui meios de manter sua coerência, a partir da interpretação do texto normativo, numa perspectiva neoconstitucional, mediante ponderação no caso concreto. Neste sentindo, no caso de se constatar antinomia, esta é sempre aparente, visto que há meios de solucioná-la, cabendo, ao final, ao Poder judiciário interpretar o Direito para apontar a norma aplicável ao caso sub judice.

2.4         Interpretar: construir x descobrir

Além das características de unidade, coerência e completude do ordenamento jurídico, a doutrina dispõe de duas formas de compreender o signo “interpretar”, na interpretação do direito.

Nobberto Bobbio[9], Francesco Ferrara, e Francesco Carnelutti[10], entendem o conceito de interpretação como construção, senão vejamos:

No caso de haver antinomias (incoerências) e lacunas (incompletude), a interpretação do texto normativo resultaria na construção de novas normas jurídicas.

Acerca da coerência, sem fazer distinção entre texto normativo e norma, Bobbio aborda teorias para excluir a incompatibilidade entre normas (antinomias), expondo que os critérios de solução (cronológico, especial e hierárquica) seriem insuficientes, conflitantes, e incoerentes, o que traria incerteza e várias possibilidades para uma mesma situação, que pode gerar situações injustas e tratamento desigual a pessoas em situações semelhantes.

Da mesma forma, acerca da completude, Bobbio dispõe sobre a integração do ordenamento a partir do preenchimento de lacunas existentes e problemáticas no ordenamento, dispondo de diversas teorias, utilizando-se do conceito de integração com o sentido de preencher lacunas. Bobbio utiliza o mesmo conceito de Black acerca da construção para suprir lacunas e resolver antinomias, equivalendo a integração, quanto ao preenchimento de lacunas, como a integração de nova norma ao conjunto normativo vigente.

Todavia, se o ordenamento jurídico tem como características a unidade, coerência e completude, o conceito de “interpretação” do texto normativo, utilizado como “construção” do ordenamento seria contrário as próprias características do ordenamento para sê-lo.

Divergindo de tais doutrinadores, o professo Ricardo Marcondes[11], concordando com o entendimento de Dworkin, dá melhor luz ao conceito de interpretação, senão vejamos:

Segundo o Professor Ricardo Marcondes, a atividade do intérprete, ao realizar analogia a fim de suprir lacunas, é atividade cognitiva, tratando-se de interpretação. Tanto o uso de analogia quanto a solução de aparentes antinomias seriam métodos de interpretação do Direito.  A fonte da analogia é o próprio ordenamento jurídico[12].

 Nesse contexto, o preenchimento de lacunas de textos normativos decorre da interpretação sistemática do próprio ordenamento, não havendo a construção de novas normas jurídicas, mas sim a descoberta das normas, extraídas da interpretação dos textos normativos.

Ao dispor sobre a coerência, o professor Ricardo Marcondes sustenta ainda que i) o direito e as normas jurídicas advêm de regras de hermenêuticas positivadas e não positivas, que integram o direito positivo, e que ii) todos somos intérpretes da Constituição, tendo os juízes papel primordial na interpretação do Direito, e cujas normas jurisdicionais têm o atributo da coisa julgada. A partir de tais pressupostos, considera que a interpretação do texto normativo deve ser efetuada em observância ao contexto jurídico em que ele está inserido. Ou seja, a interpretação seria a “busca pela melhor luz ao objeto interpretado”[13], e nesse contexto, o intérprete, observando pressupostos tais como de justiça, coerência e precisão, empreende analogias e resolve antinômicas, não construindo o Direito, mas “revelando-o, extraindo-o dos textos editados pelo agentes normativos competentes”[14].

Ou seja, o uso de analogias e a solução de antinomias decorrem da própria interpretação do ordenamento jurídico, sendo parte implícita e descoberta pelo intérprete do Direito, que o faz considerando as características do ordenamento jurídico de unidade, coerência e completude, pressupondo o direito como justo, coerente, e preciso.

Dessa forma, no caso de antinomias ou lacunas aparentes, em vez de o intérprete construir novas normas, ele apenas às descobre, a partir da interpretação sistemática do ordenamento jurídico, sendo que no caso de antinomias, ou a interpretação sistemática já soluciona a antinomia aparente, ou a judicialização da situação conflitante irá apontar, através da ponderação, a solução legal adequada.

2.5 Características da norma : planos da existência e validade

Dentre as características da norma jurídica estão: sua existência, e sua validade.

Tal distinção foi bem detalhada por Pontes de Miranda, que, a partir do fato, considerou a existência de elementos nucleares para a existência, elementos nucleares para a validade, e elementos integrativos para a produção de efeitos, e reconheceu que tal sistematização aplica-se as normas.

E há duas grandes correntes doutrinarias, com posicionamento distintos sobre tais características, porque parte da Doutrina entende que trata-se de uma única característica, enquanto parte entende que são características distintas, sendo que tal distinção facilita a compreensão do direito.

  Ambas serão agora abordadas:

2.5.1. Da Existência da norma

O Professor Marcelo Neves considera o ordenamento jurídico uma espécie de sistema normativo dinâmico, no qual tolera-se a irregular incorporação de normas jurídicas, até que ocorra a produção de ato jurídico ou norma jurídica destinada a expulsa-las, ou seja, até que o órgão competente as desconstituam[15], o que torna necessária a  distinção entre  os planos da existência e validade.

O renomado autor dispõe ainda que “a existência de um ato ou norma jurídica, segundo Pontes de Miranda, constitui-se por sua entrada no mundo jurídico, podendo isto ocorrer regular ou irregularmente. Quando o ato jurídico ou a norma jurídica entra defeituosamente no “mundo jurídico”, há “existência” sem validade. Portanto, distinguem-se os planos da “existência” e da validade”[16].

 O plano da existência do ato jurídico está ligado ao suporte fático complexo que constitui a regra.  Em vez de “existência”, prefere utilizar o signo “pertinência”, tendo em vista que uma norma pertence ao ordenamento jurídico ou i)  quando decorre de um  ato formal de um  órgão competente pelo do sistema, ou seja, órgão previsto direta ou indiretamente no núcleo normativo originário e ainda não foi desconstituída por invalidade ou revogada;  ou ii) quando resulta de fato costumeiro a que o núcleo normativo originário, direta ou indiretamente, com efeito normativo.

Para Celso Antônio bandeira de Mello, que também distingue os planos da existência e validade, os atos inexistentes caracterizam-se como i) imprescritíveis; ii) insuscetíveis de convalidação ou conversão, iii) não passíveis de ressalva dos efeitos pretéritos.

O Professor Ricardo Marcondes complementa: a declaração de inexistência além de imprescritível, não é passível de decadência; além de insuscetíveis de convalidação ou conversão, também não são suscetíveis de redução e de invalidação; os efeitos produzidos por eles o foram no mundo fenomênico, não no jurídico, e assim, não são passíveis de ressalva; não há que se falar em estabilização ou em invalidação irretroativa ou parcialmente retroativa[17].

Ricardo Marcondes Martins segue a doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello[18], segundo o qual “existência é a qualidade de pertencer ao ordenamento; não se confunde com validade, qualidade de não ser dotada de vício que exija correção”[19].

Para existir, a norma deve possuir elementos (conteúdo e forma) e pressupostos de existência (objeto[20], habilitação do agente para editar atos administrativos; o mínimo de eficácia ou de recognoscibilidade social e a não concretização de injustiça intolerável).

Eficácia e validade são atributos da norma existente.

Sobre os efeitos jurídicos da inexistência do ato, o professor Ricardo entende que há efeitos jurídicos da inexistência, e não do ato em si; além de não haver possibilidade de desconstituição dos efeitos.

São efeitos da inexistência do ato: i) o direito de obter a declaração de inexistência (o ato inexistente não é passível de correção – invalidade, redução, conversão ou convalidação); ii) de resistir ativamente à execução do ato inexistente[21]; iii) o dever de indenizar os danos causados; e iv) o dever de responsabilizar o editor.

Ainda segundo o professor Ricardo Marcondes, o ato inexistente não pode ser estabilizado, não havendo limite temporal.

À inexistência da norma impõe-se tão somente a declaração de inexistência. Caracteriza-se os atos inexistentes como i) imprescritíveis, ii) não passíveis de decadência; iii) insuscetíveis de convalidação ou conversação, iv) não passíveis de redução ou invalidação; v) não passíveis de ressalva dos efeitos pretéritos, vi) sem produção no mundo jurídico (apenas no mundo fenomênico), e, portanto, não passíveis de ressalva, não havendo que se falar em estabilização ou em invalidação irretroativa ou parcelamento retroativa.

A existência da norma está ligado a pertinência ao sistema no qual se propõe a encartar, produzindo efeitos com fundamento na Constituição do país, por ser ela quem dá identidade ao sistema, que unifica.[22]  A norma existe a partir do momento em que é editada, a priori, nos termos da Constituição Federal. Todavia, mesmo quando obedece aos critérios formais de criação, ela pode ser contrária ao ordenamento jurídico. Se não contrária ao ordenamento, trata-se de uma norma existente e válida. Se contrária, apesar de existente, e produzindo seus efeitos até que se declare a invalidade, ela é existente e inválida[23].

2.5.2. Da validade da norma

  Validade da norma é pressuposto da existência, mas não se confunde com esta. A norma existente pode ser válida ou inválida (ou seja, contrária ao ordenamento jurídico). E se inválida, caberá ao Judiciário a Declaração de sua invalidade. Nota-se que neste caso, a norma é, desde o seu nascedouro, inválida, e, portanto, a declaração de invalidade, prima facie, tem efeitos ex tunc, ou seja, retroativos.

Caso entenda-se que existência e validade estejam no mesmo plano, sua invalidade se traduziria na sua desconstituição, prima facie, com efeitos ex nunc, ou seja, que não retroagem.

O entendimento segundo o qual “o fato de que uma norma seja válida significa que existe[24], iniciou-se com Kelsen, e deste racional, extrai-se que a norma só é inválida quando “decretada” pelo órgão competente.

Kelsen não diferencia o plano da existência da validade, e a partir de tal equívoco, considera norma válida quando i) criada em consonância com a norma fundamental (aspecto formal) ; e ii) existente no ordenamento jurídico.

 A partir de tais concepções, considera inválida a lei que foi anulada por autoridade competente, o próprio órgão legislativo ou “tribunal supremo” (que no ordenamento brasileiro, seria o STF, no caso de inconstitucionalidade, e o  STJ, no caso de ilegalidade).

As leis “inconstitucionais” seriam leis editadas em observância a formalidade exigida na Constituição, por autoridade competente, que, todavia, seriam anuláveis por um processo especial.

A invalidade da norma seria desconstitutiva[25], tendo em vista que só se tornou nula a partir do ato formal que decretou sua nulidade (anulabilidade).

A título de exemplificação deste racional, no caso do STF julgar inconstitucional uma norma, ela só seria considerada inválida a partir da decisão judicial, e em razão da decretação da sua invalidade por tribunal competente.

Entretanto, há outra corrente doutrinária, que diferencia os planos da existência da validade, seguida pelo Professor Ricardo Marcondes[26], cujos efeitos desta distinção são enormes. Para ele, a invalidade da norma está ligada à sua contrariedade ao ordenamento jurídico, ainda que tenha sido formalmente editada por autoridade competente. Neste contexto, quando o órgão competente reconhece a invalidade, declara a invalidade da norma, que assim o é desde o seu nascedouro[27].

A título de exemplificação seguindo tal distinção, no caso do STF julgar inconstitucional uma norma, trata-se de norma inválida desde o seu nascedouro, cuja decisão judicial tratou apenas de declarar sua invalidade.

Tal entendimento também é esboçado por Marcelo Neves, ao elucidar que o ordenamento jurídico de sistema dinâmico “tolera a incorporação irregular de normas jurídicas, que permanecerão no sistema enquanto não houver produção de ato jurídico ou norma jurídica destinada a expulsa-las, isto é, até que se manifeste o órgão competente desconstituindo-as[28], razão pela qual a distinção dos planos da existência e da validade é imperioso.

Esclarece que o citado autor prefere substituir o signo “existência” por “pertinência”, significando que determinada norma integra determinado ordenamento jurídico.

Também compartilha deste racional o ilustre Professor Celso Antônio Bandeira de Mello, que assim dispõe:

 É certo que enquanto for expedida do sistema pelos meios previstos como idôneos para tanto, a norma nele permanecerá e produzirá seus efeitos, o que, todavia, não significa que possua atributos de validade. Pode ter nascida em descompasso com norma superior, contradinzo formal ou materialmente preceitos que teria de respeitar. Estará vigorante, será eficaz – se não pender de algum termo inicial – mas nem por isto ter-se-á de concluir que é valida.

Em suma: a existência de uma norma, sua pertinência a um sistema jurídico, nada predica quanto à sua validade ou invalidade.[29].

 Ou seja, norma jurídica contrária ao ordenamento jurídico existe e é inválida, cuja invalidade, um dia, será analisada, declarada, e expulsa do ordenamento jurídico, razão pela qual não é possível entender os conceitos de existência e validade como um só.

Norma contrária ao ordenamento jurídico é inválida. Se contrária a lei, é inválida por ser é ilegal. Se contrária aos preceitos Constitucionais, é inválida por ser inconstitucional.

A invalidade da norma tem como efeito a imposição da Administração de corrigi-lo. Além disso, atribui ao administrado o direito de resistência passiva[30] (é efeito do vício do ato administrativo inválido) podendo ainda gerar outros efeitos, como a imposição à Administração o dever de reparar o dano causado à terceiros, bem como de responsabilizar o agente público que o editou[31].

A Invalidade gera a anulação da norma. Todavia, há corrente doutrinaria que o considera nulo, e há corrente que o considera anulável[32]. Há equívoco ao considerar a norma nula (em razão da invalidade) como inexistente (teoria civilista), tendo em vista que a sua retirada do sistema decorre da declaração de invalidade, ou seja, edição de outro ato jurídico, que pode ter efeitos retroativos ou não.

Portanto, a declaração de invalidade da norma gera a sua nulidade, todavia, em razão da consequência dos efeito da lei invalida existente no sistema jurídico, no ato de declaração de invalidade, ou seja, quando da edição do ato corretor, é necessário ponderar sobre os efeitos da nulidade face a “análise do conjunto de circunstâncias fatias e jurídicas. São relevantes, entre outros fatores, o tempo decorrido e os efeitos gerados pelo ato, ou melhor, o número de relações jurídicas por ele instituídas[33], e é tal ponderação que gera a modulação dos efeitos na declaração de invalidade da norma jurídica (ex tunc, ex nunc, e não ad initio e até mesmo pro futuro).

Portanto, diversos são os fundamentos que nos levam a crer que a validade e a existência estão em planos distintos, e a compreensão da norma, considerando tal distinção, trás diversos efeitos, exercendo, os tribunais superiores, papel indispensável na declaração de invalidade da norma.

2.5.2.1 O papel do Supremo Tribunal Federal na verificação da validade da norma

Quando houver litígio acerca da norma no caso concreto, cabe ao Poder Judiciário desempenhar a função interpretativa da norma.

Conforme posicionamento de Oswaldo Aranha de Mello, citado pelo Professor Ricardo Marcondes, “o magistrado é o oráculo do Direito, é o agente encarregado de dizer qual é interpretação correta do sistema normativo vigente[34].

Neste sentido, cabe ao Poder judiciário descobrir a real vontade do ordenamento jurídico no caso concreto, e cabe ao Supremo Tribunal Federal – STF, em última instância, descobrir a norma aplicável ao caso concreto, declarando, se necessário, a invalidade de norma contrária aos valores constitucionais, pois enquanto o Superior Tribunal de Justiça  – STJ detém a competência de proferir a decisão final da interpretação de lei federal, cabe ao STF a mais importante tarefa jurisdicional, de proferir em última instancia, a interpretação constitucional, tanto em controle difuso quanto concentrado.

Nelson Nery Junior discorre sabiamente sobre o papel do STF diante de norma inconstitucional, ao dispor sobre leis originariamente inconstitucionais, in verbis:

Caso a lei infraconstitucional esteja em desacordo com o texto constitucional, não deve, por obvio, ser aplicada. Comprovada a divergência : a) se a norma legal tiver sido editada antes da Constituição Federal, terá ocorrido o fenômeno da não recepção, pela nova ordem constitucional, da lei com ela incompatível e que não poderá ser aplicada; b) se a norma legal tiver sido editada depois do advento da Constituição Federal, será inconstitucional e não poderá ser aplicada para solução do caso concreto: estará sujeita à declaração in concreto (controle difuso) ou in abstracto (controle concentrado) dessa referida inconstitucionalidade. [35]

A Constituição Federal é a ordem jurídica fundamental da coletividade, que determina os princípios diretivos que dão base a unidade política, que regulamenta a forma de pacificação de conflitos internos, realizando três tarefas fundamentais, de integração, organização, e de direção jurídica[36], o que evidencia o papel fundamental do STF na sua proteção, mediante a declaração de normas inválidas.

Portanto, a declaração de invalidade da norma gera a sua nulidade, todavia, em razão da consequência dos efeitos da lei invalida existente no sistema jurídico até o ato de declaração de invalidade, ou seja, quando da edição do ato corretor, no caso em análise, pelo STF, é necessário ponderar sobre os efeitos da nulidade em razão do tempo decorrido entre a edição da norma inválida e a declaração dos seus efeitos, bem como os efeitos gerados por esse ato.  “São relevantes, entre outros fatores, o tempo decorrido e os efeitos gerados pelo ato, ou melhor, o número de relações jurídicas por ele instituídas[37].

Tal ponderação gera a modulação dos efeitos na declaração de invalidade da norma jurídica (ex tunc, ex nunc, e não ad initio e até mesmo pro futuro).

Na esfera tributária, na medida em que tais normas invalidas produzem efeitos, impõem obrigações e pagamentos indevidos de tributos, quando o STF as declara inconstitucionais, tais declarações, por vezes, precisam ter efeitos modulados em razão da influência de tais decisões na arrecadação do erário e restituição de indébito pelo Poder Público.

Ressalta-se que, por vezes, o mesmo racional que já invalidou uma norma, se aplicaria para outra, igualmente inválida. Todavia, nota-se a replicação de decisões estereotipadas, em dissonância com o racional já exposto pelo STF em processo julgado pelo rito da repercussão geral[38], ensejando um novo pronunciamento expresso do STF.

A título de exemplificação, o STF, que já havia reconhecido a inconstitucionalidade de correção monetária de débitos tributários que superem os limites estabelecidos pela União Federal no julgamento da ADI nº 442[39], e reiterado o seu entendimento pelo Plenário, no julgamento do RE nº 183.907/SP, julgou, pela sistemática da repercussão geral, o ARE 1.216.078/SP[40], fixando o Tema nº 1.062 segundo o qual: “Os estados-membros e o Distrito Federal podem legislar sobre índices de correção monetária e taxas de juros de mora incidentes sobre seus créditos fiscais, limitando-se, porém, aos percentuais estabelecidos pela União para os mesmos fins”.

Em que pese o mesmo racional, segundo o qual os estados não podem fixar a correção monetária acima dos índices estabelecidos pela União se aplique aos municípios, viu-se a necessidade do STF se pronunciar expressamente sobre isso, que ocorrerá no RE 1.346.152, que teve repercussão geral reconhecida (Tema 1.217).

Nesse ponto, o pronunciamento do STF irá declarar a invalidade de norma municipal em descompasso com a Constituição Federal, esperando-se que em razão do racional já utilizado no Tema 1.062, seja declarada a inconstitucionalidade de legislação municipal que utilize índices de correção monetária superiores em desacordo com as disposições constitucionais.

O exemplo acima demonstra a necessidade da atuação do STF, que vem desempenhando sua função jurisdicional e corrigindo os atos jurídicos inválidos,  contrariando os dizeres  de Alf Ross, que dispõe que “Em primeiro lugar, a prioridade da Constituição depende dos tribunais terem competência para revisar a constitucionalidade material das leis. E mesmo quando os tribunais tenham tal competência, com frequência se recusarão, de fato, a registrar o conflito e a declarar a invalidade[41].

Ainda que de forma cautelosa, o STF desempenha sua função de “oráculo do direito”, e afasta do ordenamento jurídico, através da declaração de inconstitucional, a norma existente e inválida.

3. CONCLUSÃO

A partir da compreensão do que é norma, sistema normativo, e suas características de unidade, coerência e concretude, entende-se que o ordenamento jurídico não abarca antinomias.

Norma conflitante com o ordenamento jurídico, quer seja com outra norma (ilegal), ou com a Constituição Federal (inconstitucional), quando existente, deve ter sua invalidade declarada, desconstituindo-a.

A doutrina possui dois entendimentos sobre a validade da norma: uma a distingue da existência, e outra não; e os efeitos de tais compreensões divergentes são abissais.

Da compreensão da norma válida como existente, o efeito da declaração de invalidade pelo Poder Judiciário se traduz na pura desconstituição da norma, que tornar-se-á inválida, contrária ao sistema, somente a partir de tal decisão.

Por outro lado, se validade não se confunde com existência, apesar de a pressupor, o efeito da declaração de invalidade pelo Poder Judiciário é a declaração de sua invalidade, que assim o é desde o seu nascedouro. Em decorrência de tal declaração, ocorrerá também sua desconstituição. Todavia, tal compreensão leva em conta as características de coerência, completude e unidade do ordenamento jurídico.

Em ambos os casos, o Supremo Tribunal Federal desempenha primordial papel como intérprete da norma em última instancia, na aferição de constitucionalidade, que equivale a verificação da validade da norma à luz dos preceitos constitucionais.

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[1] Mestranda em Direito Constitucional e Processual Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.

[2] Mestranda e Pós-graduada em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.

[3] BERTALANFFY, Ludwig von. Teoria geral dos sistemas. Tradução de Francisco M. Guimarães. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

[4] ATALIBA, Geraldo Sistema constitucional tributário brasileiro São Paulo Revista dos Tribunais, 1968.

[5] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Criação de secretarias municipais: inconstitucionalidades do art. 43 da Lei Orgânica dos Municípios do Estado de São Paulo. Revista de direito administrativo e infraestrutura – RDAI, São Paulo, n. 11, ano 3, 2019 .

[6] Aqui ainda utilizando-se o conceito de princípio da 2ª fase.

[7] Aqui a compreensão de princípios abarca tanto a 2ª fase, como elemento aglutinador, como valor positivado, da 3ª geração.

[8] BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Tradução de Ari Marcelo Solon. 2 ed. Bauru: Edipro, 2019.

[9] BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Tradução de Ari Marcelo Solon. 2 ed. Bauru: Edipro, 2019.

[10] RDAI 03 – Teoria geral da interpretação jurídica – considerações críticas à obra de Black – Ricardo Marcondes Martins

[11] RDAI 03 – Teoria geral da interpretação jurídica – considerações críticas à obra de Black – Ricardo Marcondes Martins

[12] Elucida ainda que no caso de haver lacuna, é porque trata-se de regra jurídica irrelevante, sem consequência normativa, e não integrante do direito positivo.

[13] RDAI 03 – Teoria geral da interpretação jurídica – considerações críticas à obra de Black – Ricardo Marcondes Martins

[14] RDAI 03 – Teoria geral da interpretação jurídica – considerações críticas à obra de Black – Ricardo Marcondes Martins. Neste sentido, a interpretação do texto normativo, seria similar a interpretação de uma obra literária, conforme aduz DWORKIN, Ronald. O direito como interpretação. Uma questão de princípio. Pág. 222 “a interpretação de uma obra literária tenta mostrar que maneira de ler ( ou de falar, dirigir ou representar) o texto revela-o como a melhor obra de arte.”

[15] NEVES, Marcelo. Teoria da inconstitucionalidade das leis. São Paulo: Saraiva, 1998.

[16]NEVES, Marcelo. Teoria da inconstitucionalidade das leis. São Paulo: Saraiva, 1998, pag 41.

[17] MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In BACELLAR FILHO_ MARTINS Tratado de direito administrativo – v. 5

[18] Nesta exposição pertinência ao sistema é sinônimo de existência. Segue-se a doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello que, com a habitual perfeição, tratou do assunto em artigo de obrigatória leitura: “o tema da existência de um ato, de uma norma, diz com sua referibilidade a um sistema normativo, concerne a sua ‘pertinência’ ao sistema no qual se encarta ou se propõe a encartar-se. Uma lei pertence ao Direito Positivo brasileiro (ou inglês, ou francês ou espanhol), porque ‘promana’ daquele sistema jurídico. Ou seja: é lei brasileira (e não inglesa, francesa ou espanhola) porque se ‘radica’ no sistema jurídico positivo brasileiro. Este ‘promanar’, este ‘radicar-se’, significa que a lei foi produzida com fundamento naquele sistema, o que equivale a dizer, com fundamento (bom ou mau, procedentemente sustentável ou não) na Constituição do país, por ser ela que unifica e dá identidade ao sistema”. (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Leis originariamente inconstitucionais compatíveis com emenda constitucional superveniente. Revista Trimestral de Direito Público. n. 23. p. 12-23. São Paulo, 1998).

[19] MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In BACELLAR FILHO_ MARTINS Tratado de direito administrativo – v. 5,pág. 164.

[20] “ a impossibilidade material do objeto, assim, prejudica o aspecto deôntico do conteúdo do ato, torna-o inexistente; a impossibilidade jurídica do objeto mantém íntegro o aspecto deôntico do conteúdo e, por isso, só causa a invalidade”. MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In BACELLAR FILHO_ MARTINS Tratado de direito administrativo – v. 5, pág 235

[21] O direito de resistência ativa é reconhecido tanto por celso Antônio quanto pelo professor Ricardo Marcondes. Além disso, o direito de resistência ativa é efeito do fato jurídico da coação estatal não fundada num ato jurídico (ato jurídico inexistente)

[22]uma lei pertence ao direito positivo brasileiro(…) porque “promana” daquele sistema jurídico. Ou seja: é lei brasileira (…) porque se “radica” no sistema jurídico positivo brasileiro. Este “promanar”, está “radicar-se”, significa que a lei foi produzida com fundamento naquele sistema, o que equivale a dizer, com fundamento  (…) na Constituição do Pais, por ser ela que unifica e dá identidade ao sistema. Ela é que serve de escoro, fonte de pertinência da norma ao sistema em questão. É sua referibilidade original àquele sistema o  que faz uma lei (e assim também qualquer outro ato), ser ou não uma lei brasileira (…)”” BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Leis originariamente inconstitucionais , pág. 7.

[23]enquanto não for expelida do sistema pelos meios previstos como idôneos para tanto, a norma nele permanecerá e produzirá seus efeitos, o que, todavia, não significa que possua atributos de validade”. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Leis originariamente inconstitucionais , Pág 7.

[24] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução João Baptista Machado. 8. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

[25]A lei foi válida até a sua anulação. Ela não era nula desde o início. Não é, portanto, correto o que se afirma quando a decisão anulatória da lei é designada como “declaração de nulidade”, quando o órgão que anula a lei declara na sua decisão essa lei como “ nula desde o início (ex tunc). A sua decisão não tem caráter simplesmente declarativo, mas constitutivo”. KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução João Baptista Machado. 8. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009. pág 307.

[26]Existência é a qualidade de pertencer ao ordenamento; não se confunde com validade, qualidade de não ser dotada de vício que exija correção” MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; MARTINS, Ricardo Marcondes. Tratado de direito administrativo – v. 5: Ato administrativo e procedimento administrativo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022., pág. 164.

Deve-se diferenciar a existência da validade. A norma inserida no ordenamento pode ser válida ou invalida. Norma posta no ordenamento, existente no mundo jurídico, pertencente ao sistema jurídico, não se confunde com norma não dotada de vício. Existência é a qualidade de pertencer ao ordenamento; não se confunde com validade, qualidade de não ser dotada de vício que exija correção.  Uma vez inserida uma norma no sistema, ela é presumida válida até que sua invalidade seja reconhecida pelo órgão competente. (…) Deveras, a norma inválida é passível de incidência e de geração de efeitos jurídicos e é presumida válida pelo sistema enquanto sua invalidade não for reconhecida pelo órgão competente. A norma inexistente, por não ser norma, não pode ser válida nem eficaz; validade e eficácia são atributos da norma existente.” MARTINS, Ricardo Marcondes. Tratado de direito administrativo – v. 5: Ato administrativo e procedimento administrativo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022., pág 165.

[27]O órgão, ao reconhecer a inconstitucionalidade, desconstitui não é a validade, pois a norma desconforme com a Constituição Federal é, desde a sua edição, invalida. Ele pode desconstituir: (a) a presunção de validade; (b) os efeitos gerados pela norma; (c) a existência da norma.” MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; MARTINS, Ricardo Marcondes. Tratado de direito administrativo – v. 5: Ato administrativo e procedimento administrativo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022, pág.  166.

[28] E ainda prossegue: “considerando que o ordenamento jurídico é um sistema dinâmico de normas, não se construindo e desenvolvendo, portanto, a partir de operações lógico-dedutivas, mas sim de processos técnico-políticos de produção e aplicação normativas –  infere-se e verifica-se que as normas invalidas permanecem no sistema enquanto não há aplicação das “regras de rechaço” especificas, impõe-se sustentar que há uma hierarquia relativa e instável entre as normas jurídicas do Estado.

 A explicação semiótica desta situação – pertinência ao ordenamento de normas invalidas – encontra-se nas características semânticas e pragmáticas do discurso jurídico. A plurivocidade significativa da linguagem jurídica (problema semântico), utilizada pelos diversos órgãos que exercem o poder e também pelos destinatários do poder (problema pragmático), implica a existência prática de que a norma permaneça no sistema enquanto não seja desconstituída por órgão competente, caracterizando-se a presunção juris tantum de validade das normas emanadas de órgãos do sistema (pertinentes ao ordenamento) pois a hipótese contraria (presunção de invalidade) conduziria ao não fundamento do sistema, por haver interpretações as mais divergentes entre os utentes das normas.” NEVES, Marcelo. Teoria da inconstitucionalidade das leis. São Paulo: Saraiva, 1998, pág 46.

[29] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Leis originariamente inconstitucionais

[30]o exercício do direito de resistência passiva não exige a impugnação do ato perante o Poder Público. Se o administrado não pagou tributo inconstitucional, ainda que não o tenha impugnado, com o reconhecimento da inconstitucionalidade, o Estado não poderá imputar-lhe multa pela falta de pagamento. A resistência passiva não exige a impugnação do ato”. Ricardo Marcondes. Tratado de direito administrativo 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022, pág 155.

[31]  “O ato inválido existe no mundo jurídico, e por isso, possui eficácia deôntica, quer dizer, a comunidade está vinculada a ele” MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; MARTINS, Ricardo Marcondes. Tratado de direito administrativo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022, pag 167

[32] Há quatro critérios acerca da dicotomia nulo-anulável: prazo para invalidação; efeitos da invalidação (ex nunc x ex tunc); legitimidade para impugnação e a possibilidade ou não de exame de ofício da invalidade; e a possibilidade de convalidação, todavia, tais classificações  são insatisfatórias para determinar os efeitos, devendo ser realizado juízo de ponderação.

[33] MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; MARTINS, Ricardo Marcondes. Tratado de direito administrativo – v. 5: Ato administrativo e procedimento administrativo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022, pág. 160.

[34] MARTINS, Ricardo Marcondes. Teoria jurídica da liberdade. São Paulo Contracorrente, 2015.

[35] NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo na Constituição Federal : processo civil, penal e administrativo. 12ª edição, são Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

[36] NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo na Constituição Federal : processo civil, penal e administrativo. 12ª edição, são Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

[37] MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In BACELLAR FILHO_ MARTINS Tratado de direito administrativo – v. 5, p. 160.

[38] Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: (…) III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.(negritamos).

[39] “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 113 DA LEI N. 6.374, DE 1º DE MARÇO DE 1.989, DO ESTADO DE SÃO PAULO. CRIAÇÃO DA UNIDADE FISCAL DO ESTADO DE SÃO PAULO – UFESP. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA PELO ÍNDICE DE PREÇO AO CONSUMIDOR – IPC. UNIDADE FISCAL DO ESTADO DE SÃO PAULO COMO FATOR DE ATUALIZAÇÃO DOS CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS. ARTIGO 24, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL. INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO.

1. Esta Corte, em oportunidades anteriores, firmou o entendimento de que, embora os Estados-membros sejam incompetentes para fixar índices de correção monetária superiores aos fixados pela União para o mesmo fim, podem defini-los em patamares inferiores — incentivo fiscal. Precedentes.

2. A competência dos Estados-membros para fixar índices de correção monetária de créditos fiscais é tema que também foi examinado por este Tribunal. A União e Estados-membros detêm competência legislativa concorrente para dispor sobre matéria financeira, nos termos do disposto no artigo 24, inciso I, da CB/88.

3. A legislação paulista é compatível com a Constituição de 1988, desde que o fator de correção adotado pelo Estado-membro seja igual ou inferior ao utilizado pela União.

4. Pedido julgado parcialmente procedente para conferir interpretação conforme ao artigo 113 da Lei n. 6.374/89 do Estado de São Paulo, de modo que o valor da UFESP não exceda o valor do índice de correção dos tributos federais.

(ADI 442, Relator Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 14/04/2010)”

[40] REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.216.078 SÃO PAULO. Recurso extraordinário com agravo. Direito Financeiro. Legislação de entes estaduais e distrital. Índices de correção monetária e taxas de juros de mora. Créditos tributários. Percentual superior àquele incidente nos tributos federais. Incompatibilidade. Existência de repercussão geral. Reafirmação da jurisprudência da Corte sobre o tema.

 1. Tem repercussão geral a matéria constitucional relativa à possibilidade de os estados-membros e o Distrito Federal fixarem índices de correção monetária e taxas de juros incidentes sobre seus créditos tributários.

 2. Ratifica-se a pacífica jurisprudência do Tribunal sobre o tema, no sentido de que o exercício dessa competência, ainda que legítimo, deve se limitar aos percentuais estabelecidos pela União para os mesmos fins. Em conseqüência disso, nega-se provimento ao recurso extraordinário.

3. Fixada a seguinte tese: os estados-membros e o Distrito Federal podem legislar sobre índices de correção monetária e taxas de juros de mora incidentes sobre seus créditos fiscais, limitando-se, porém, aos percentuais estabelecidos pela União para os mesmos fins.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. No mérito, por maioria, reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria, vencido o Ministro Marco Aurélio. Não participou deste julgamento, por motivo de licença médica, o Ministro Celso de Mello. Relator Ministro DIAS TOFFOLI

[41] ROSS, Alf. Direito e justiça. Tradução de Edson Bini. Bauru: Edipro, 2000.