O DIREITO FUNDAMENTAL À COISA JULGADA E A INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO
1 de junho de 2021THE FUNDAMENTAL RIGHT TO THE RES JUDICATA AND THE INEXIGIBILITY OF THE EXECUTIVE
Cognitio Juris Ano XI – Número 35 – Junho de 2021 ISSN 2236-3009 |
Autor: Marcos Paulo Passoni[1] |
Resumo: O presente ensaio trata das hipóteses do art. 515, §1º e 12, 14 e 15 do Código de Processo Civil.
Palavras-chave: Coisa Julgada – Decisão do STF em controle de constitucionalidade – Ação rescisória
Abstract: The present study deals with the hypotheses of article 515, §1º and 12, 14 and 15 of the Code of Civil Procedure.
Key-Words: Res Judicata –
Supreme Court decision on constitutionality control – Rescissory Action.
I. Objetivo
O objetivo deste ensaio é explorar a relação entre dois institutos muito caros ao Direito Constitucional e ao Direito Processual Civil, à vista do art. 525, §12 do CPC: a decisão declaratória de inconstitucionalidade — de lei ou ato normativo federal ou estadual contestado em face da Constituição Federal — proferida pelo STF em controle concentrado e a coisa julgada material, seja em face da coisa julgada (como irretorquível direito constitucional fundamental) que já se formou em passado longínquo, seja em face da coisa julgada que se formou em passado recente, seja em face da coisa julgada que irá se formar (portanto, no futuro).
Esse ensaio, portanto, examinará alguns dos impactos da decisão declaratória de inconstitucionalidade às coisas julgadas, considerando o dinamismo do sistema jurídico[2] formado pelas normas concretas individuais e pelas normas jurídicas criadas pelo STF.
II. Norma jurídica concreta: a coisa julgada material como direito fundamental
O Direito estrutura-se mediante princípios e regras, os quais são dotados de normatividade na perspectiva de um poder de aptidão para impor conduta, comumente aplicado sob sanção, na hipótese de descumprimento daquela imposição.
A norma jurídica concreta-individualizada, como é sabido, resultante da aplicação do direito in concreto, é fruto do estabelecimento de sentido e alcance empreendido pela interpretação da lei. Norma jurídica é fim e não meio. É o texto de lei somado ao recorte fático social – ambos elevados à potência interpretativa e esta iluminada diretamente pelo postulado da hermenêutica e indiretamente pela filosofia do direito –, que produzem à norma jurídica concreta. Só há norma após a interpretação, não o contrário.
A norma jurídica concreta-individualizada, produzida pela sentença na solução final da lide, é o objeto da autoridade da coisa julgada material. Como sabido, é o dispositivo da sentença que fica revestido por tal autoridade e é a coisa julgada material que, ao formar-se sobre o dispositivo da sentença, reveste a norma jurídica concreta, protegendo-a e imutabilizando-a.
A coisa julgada, pela força do inciso XXXVI, artigo 5º da Constituição Federal, —- cuja matriz constitucional lhe atribuir substância de Direito Fundamental in abstrato —, e no exato instante em que a decisão de mérito transita em julgado, é içada ao status de direito fundamental in concreto.
III. Considerações introdutórias sobre a coisa julgada
Como cláusula pétrea, a coisa julgada nasce para o sistema jurídico in abstrato na Constituição Federal. Nessa linha prescreve o artigo 5º, XXXVI da Lei Federal Maior: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. A lição é elementar, mas não deve ser deslembrada, sobretudo à luz da análise de instituto tão caro ao Direito Processual Civil como é o da coisa julgada[3].
A República Federativa do Brasil foi erigida sobre o Estado Democrático de Direito (CF 1º caput), de modo que este Estado seja democrático e regulado por princípios protetores do bem-estar dos cidadãos da República. Não há de se cogitar em coisa julgada material para os atos do Poder Legislativo ou do Poder Executivo, mas sim para os atos do Poder Judiciário. O Estado Democrático de Direito é imanente àquele instituto: a coisa julgada material, a qual constitui elemento de existência do Estado Democrático de Direito, é uma notável garantia fundamental (CF 5º XXXVI) e bem protegida pelo arcabouço da cláusula pétrea, a qual não pode ser modificada ou eliminada nem por emenda constitucional (CF 60 §4º I e IV).
Afinal, o que é a auctoritas rei iudicatae? A Constituição Federal não a conceituou e, tal tarefa, ficou a cargo da legislação infraconstitucional, de modo que o art. 6º da LINDIB – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro ensina: “ A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.”, assim como dispõe o art. 502 do CPC: “Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.”. A coisa julgada material afigura-se como a qualidade que torna imutável e indiscutível o comando que emerge da parte dispositiva da sentença de mérito (i.e. a norma jurídica concreta) não mais sujeita a recurso nem à remessa necessária (art. 502 do CPC 2015 e art. 6º da LINDB).[4] A coisa julgada, vale relembrar, não é efeito da decisão. Barbosa Moreira bem destacou: “se alguma coisa escapa ao selo da imutabilidade, são justamente os efeitos da sentença.” [5].
É de relevo rememorar, lege lata, que nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobrevier modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença; ou nos demais casos prescritos em lei, ex vi do art. 505 do CPC. E mais. Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido, conforme art. 508 do CPC.
O jurista Nelson Nery elucida que “Entre o justo absoluto, utópico, e o justo possível, realizável, o sistema constitucional brasileiro, a exemplo do que ocorre na maioria dos sistemas democráticos ocidentais, optou pelo segundo (justo possível), que é consubstanciado na segurança jurídica da coisa julgada material. Descumprir-se a coisa julgada é negar o próprio Estado Democrático de Direito, fundamento da República brasileira.”[6].
Juntando as pontas, a norma jurídica concreta-individualizada produzida na decisão de mérito transitada é revestida pela autoridade da coisa julgada, cuja protestação, por conta de eventuais embates externos — seja pela declaração de inconstitucionalidade de lei que lhe dá base, seja pela declaração de inconstitucionalidade ser anterior ou posteriores àquela decisão — , a coisa julgada merece análise peculiar.
A coisa julgada material merece respeito singular.
IV. Potenciais impactos à coisa julgada a partir da decisão declaratória de inconstitucionalidade proferida pelo STF
O cerne da reflexão posta neste artigo é examinar os eventuais impactos provocados à coisa julgada sob o ponto de vista do ordenamento jurídico e da própria declaração de inconstitucionalidade proclamada pelo STF, no controle concentrado, à vista dos §§ 12, 14 e 15 do artigo 525 do Código de Processo Civil[7].
Este estudo detectou algumas hipóteses as quais merecem análise pontualizada e considerou para tanto apenas as relações jurídicas instantâneas (e não as de trato continuado ou sucessivas)[8]:
Da inconstitucionalidade retrospectiva:
a) a coisa julgada formada antes da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF – coisa julgada formada há mais de 2 (dois) anos antes dessa decisão do STF;
b) a coisa julgada formada antes da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF – coisa julgada formada há menos de 2 (dois) anos antes dessa decisão do STF;
Da inconstitucionalidade prospectiva:
c) a coisa julgada material soberana formada após o trânsito em julgado da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF;
d) a coisa julgada material formada após o trânsito em julgado da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF, porém, antes de se tornar soberana;
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Nasce neste contexto questões de relevo abaixo examinadas.
Da inconstitucionalidade retrospectiva
a coisa julgada formada há mais de 2 (dois) anos da decisão declaratória de inconstitucionalidade
Nesta hipótese examinada existe uma decisão do STF proferida pela declaração de inconstitucionalidade da lei e, há mais de dois anos, uma coisa julgada formada lá no passado. Este tópico cuida da inconstitucionalidade retrospectiva e da coisa julgada soberana.
Vejamos.
Do ponto de vista da decisão proferida pelo STF para o passado, o que acontecerá com todas as ações judiciais findas e já seladas pelo trânsito em julgado e cujas decisões de mérito foram proferidas há mais de 2 (dois) anos e fundadas na lei ou no ato normativo declarados inconstitucionais pelo STF (art. 525, §12 do CPC)? A repercussão dessa declaração de inconstitucionalidade para o passado atinge e desfaz automaticamente a coisa julgada soberana?
A resposta é não: nada deve acontecer com a coisa julgada soberana.
Com base na breve exposição acima sobre os fundamentos constitucionais da coisa julgada, defendemos que contra a coisa julgada material formada há mais de 2 (dois) anos, antes, portanto, da decisão declaratória de inconstitucionalidade do STF, não há qualquer repercussão ou impacto dessa decisão àquela res judicata. Essa coisa julgada soberana nada sofre. A coisa julgada material constituída e petrificada há mais de 2 (dois) anos, em realidade não é apenas ‘bem ou coisa julgada’, mas um ‘bem ou coisa soberanamente julgada’ e, portanto, ostenta qualidade de inalterabilidade, imutabilidade e indiscutibilidade na perspectiva de um direito fundamental.
De plano é importante discutir o alcance da norma do art. 525, §15 do CPC.
Essa norma não pode ser interpretada de modo desconectado das normas da esfera constitucional. Diz a norma em comento: “§ 15. Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.”. Isso poderia vir a levar o intérprete a concluir — erroneamente — que toda e qualquer decisão exequenda anterior à decisão proferida pelo STF, independentemente de lapso de tempo passado, estaria sujeita automaticamente à ação rescisória, no prazo de dois anos ‘a contar da decisão do STF’.
Por primeiro é importante frisar que as ações constitucionais normalmente não têm prazo para o seu ajuizamento, de sorte que esta interpretação elástica poderia levar ao caos e fazer com que as decisões do STF proferidas, no futuro, daqui a cinco, dez ou vinte anos, venham a atingir e alcançar decisões proferidas há cinco, dez ou vinte anos, o que parece ser juridicamente ilógico e constitucionalmente inconcebível (art. 5º, XXXVI, da CF/88).
Ademais, a par de merecida interpretação restritiva, a ação rescisória é uma exceção à regra considerando a respeitabilidade ao direito constitucional de intangibilidade da coisa julgada soberana.
Essa coisa julgada constitui-se e passa a existir, como é sabido, dois anos após a formação da coisa julgada material, ex vi do artigo 975 do CPC/2015. Perduram-se dois anos entre a formação da coisa julgada material e a formação da coisa julgada material soberana. Logo, esta categoria jurídica deve ser respeitada, isso sob a óptica do próprio texto Constitucional (art. 5º, XXXVI) e de modo a diferenciá-la da coisa julgada não-soberana.
A coisa julgada em si é elemento de existência do Estado Democrático de Direito, afigura-se como cláusula pétrea e garantia fundamental. É direito substancial de todos. Por razões lógicas, com maior força, a coisa — soberanamente — julgada há de ser protegida e respeitada pelas partes, mas, sobretudo, pelo Poder Judiciário e demais poderes estatais. Portanto, a coisa soberanamente formada há de ser agasalhada in totum, mesmo contra eventual decisão com efeito vinculante proferida pelo STF em controle concentrado de inconstitucionalidade.
Ao nosso sentir, a coisa soberanamente julgada integra-se, em caráter definitivo, ao sistema jurídico como norma jurídica concreta. A norma jurídica concreta poderá estar em consonância ou não com o sistema jurídico; estando em consonância, o objetivo jurisdicional último de prestação de tutela jurisdicional terá sido alcançado; não estando, o sistema haverá de suportar este mal, para evitar-se um mal maior de insegurança jurídica, com influência generalizante aos jurisdicionados e esgarçamento do âmbito social. É um mal menor do que aquele que visa a desrespeitar a autoridade da coisa julgada material, em afronta ao artigo 5º, XXXVI, da CF/88. “Para a jurisdição, o direito substantivo converte-se sempre numa incógnita e a autonomia de cada decisão torna possível que essa incógnita seja resolvida de maneiras diferentes.”[9]
Haverá flagrante ilicitude em pretender alterar-rescindir-flexibilizar esta coisa julgada material soberana por força de decisão declaratória de inconstitucionalidade fundada no art. 525, §12 do CPC. Como sabido, a qualidade da coisa julgada soberana é de inalterabilidade, imutabilidade e indiscutibilidade. Será procedimentalmente incabível o ajuizamento de ação rescisória nestas condições por falta de interesse de agir.
Neste sentido de preservação da coisa soberanamente julgada proferida em momento anterior a posterior decisão declaratória de inconstitucionalidade emitida pela Corte Suprema, em controle concentrado, se pronunciou o STF: “A sentença de mérito transitada em julgado só pode ser desconstituída mediante ajuizamento de específica ação autônoma de impugnação (ação rescisória) que haja sido proposta na fluência do prazo decadencial previsto em lei, pois, com o exaurimento de referido lapso temporal, estar-se-á diante da coisa soberanamente julgada, insuscetível de ulterior modificação, ainda que o ato sentencial encontre fundamento em legislação que, em momento posterior, tenha sido declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, quer em sede de controle abstrato, quer no âmbito de fiscalização incidental de constitucionalidade. A superveniência de decisão do Supremo Tribunal Federal, declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada de eficácia “ex tunc” – como sucede, ordinariamente, com os julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ 87/758 –RTJ 164/506 – RTJ 201/765) –, não se revela apta, só por si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos pronunciamentos que emanam, ‘in abstractro’, da Suprema Corte.” (in STF, AgRg no RE 592.912/RS, Min. Celso de Mello, j´. 03.04.2012).
Nesta concepção, não é conforme o perfil da Constituição Federal o artigo 525, §15 do CPC por violar a coisa julgada soberana.
Por vez, o artigo 525, §15 do CPC pode ser considerado constitucional[10] a se adotar outro sentido ao seu texto: o §15 será aplicado para o desfazimento de decisão pretéritas chancelada pela autoridade da coisa julgada “não-soberana”. Desde que não tenha a decisão rescindenda recebido a chancela da coisa julgada soberana, caberá a ação rescisória para tentar desfazer as decisões anteriores manchadas pela base legal declarada inconstitucional (em razão disso, vide-se infra a discussão sobre o prazo de até 4 anos para o ajuizamento da ação rescisória).
A coisa julgada soberana (formada no passado) não deve ser atingida pela decisão declaratória de inconstitucionalidade proferida pelo STF.
b) a coisa julgada material formada há menos de 2 (dois) anos da decisão declaratória de inconstitucionalidade
Do ponto de vista da decisão declaratória de inconstitucionalidade do STF, em controle concentrado, olhando ainda para traz, retrospectivamente, para as coisas julgadas formadas há menos de 2 anos desta decisão do STF (portanto, coisa julgada “não-soberana”), pelo exposto até aqui, podemos afirmar que estas decisões não são automaticamente desfeitas e haverá de ser aforada a ação rescisória[11] para a eventual rescisão destas decisões de mérito baseadas em lei declarada inconstitucional.
A decisão de inconstitucionalidade proferida no controle concentrado, embora tenha eficácia erga omnes, não tem eficácia retroativa para desfazer automaticamente as coisas julgadas pretéritas. “Sempre se considerou que o respeito às situações protegidas pela autoridade da res iudicata figurava como limite à retroatividade do julgado, a menos que haja a possibilidade legítima de desconstitui-la por via de ação rescisória.”[12]
Pela dicção do §15 do art. 525 do CPC, se a decisão do STF for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda (demandas pretéritas = coisas julgadas não-soberanas formadas no passado), caberá ação rescisória. A lei resolveu esta polêmica de forma objetiva: há necessidade de ação rescisória para desfazer decisão estofada em lei ou ato normativo declarado inconstitucional face à Constituição Federal, o que exclui a defesa por mera impugnação (art. 525, §12 do CPC) ou suposto desfazimento automático da coisa julgada pretérita.
O motivo central dessa discussão é aparentemente o ambiente de constitucionalidade da lei aplicada ao caso. A decisão aplicada lei, por estar no sistema jurídico, presumivelmente constitucional. O sistema do direito positivo emanava ao Estado-juiz e às partes que ‘aquela’ lei face à Constituição Federal era constitucional. Logo, deveria ser (como foi) respeitada pelos jurisdicionados e aplicada pelo Estado-Juiz. Neste ambiente, não havia pronunciamento do STF em controle concentrado, em sentido contrário, pela inconstitucionalidade da lei ou ato normativo. Assim, se a decisão vem a ser acobertada pela autoridade da coisa julgada nesse ambiente de constitucionalidade da lei que deu base essencial à decisão, este bem julgado só e só pode ser desfeito à luz da segurança jurídica, nos estritos rigores exigidos pelo aforamento da ação rescisória e não por meio de impugnação (art. 525, §12 do CPC).
O Pleno do STF já examinou essa situação posta em discussão e posicionou-se pela exigência da ação rescisória. O STF assentou entendimento no sentido de que os artigos do CPC de 1973 e de 2015 em foco são constitucionais, pois se a decisão do STF for anterior ao trânsito em julgado da decisão objeto de exame, aí sim cabe a Impugnação, o que será melhor examinado nos próximos tópicos deste artigo (in ADI 2418 / DF, 04/05/2016, Min. MIN. TEORI ZAVASCKI).
No julgamento acima, restou destacado pelo “SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Tratando-se de decisão [do STF] anterior ao ato exequendo, incidirão, tal seja a hipótese, os meios concernentes à impugnação ou aos embargos à execução. Cuidando-se, no entanto, de sentença que venha a conflitar com posterior decisão desta Corte, caberá ação rescisória, cujo “dies a quo” deverá observar a regra fundada no § 8º do art. 535 do novo CPC. Essa dualidade de restrições processuais pode, eventualmente, gerar descompasso, considerado o interregno entre elas existente.”.
Na sequência, esclareceu o Relator Ministro “O SENHOR MINISTRO TEORI ZAVASCKI (RELATOR) – Na verdade, são dois instrumentos diferentes. Se a decisão do Supremo for anterior à sentença exequenda, nós não vamos raciocinar com o mecanismo da ação rescisória, nós vamos raciocinar com o mecanismo da impugnação ou dos embargos da execução, cujo prazo é o próprio do processo civil. Quer dizer, no momento da execução, ao ser executada a sentença, ele invoca.”. Confira-se ainda neste sentido e em julgado mais recente: STF, Pleno, RE nº 730.462, relator Ministro Teori Zavascki, j. em 28.05.2015.
A doutrina de Luiz Guilherme Marinoni esclarece que as “decisões que transitaram em julgado, tratando da questão constitucional posteriormente interpretada de outra maneira pelo Supremo Tribunal Federal, expressam um juízo legítimo sobre a constitucionalidade. Este juízo nada mais é do que resultado do dever-poder judicial de realizar o controle da constitucionalidade. Ademais, o fato de a decisão transitar em julgado, antes de a questão chegar à análise do Supremo Tribunal Federal, é mera consequência do sistema de controle da constitucionalidade brasileiro”[13]
O efeito retroativo ex tunc produzido pelo efeito vinculante e erga omnes da decisão do STF encontrará no passado um claro limite, como anteparo intransponível, na coisa julgada material. O efeito ex tunc não é capaz de desfazer a coisa julgada, seja ela soberana ou não-soberana.
“Permitir que o magistrado, no caso futuro, profira decisão sobre o que fez e o que não fez coisa julgada, a pretexto de que estaria aplicando o princípio da proporcionalidade, não é profligar tese de vanguarda, como à primeira vista poderia parecer, mas, ao contrário, é admitir a incidência do totalitarismo nazista no processo civil brasileiro. Como já dissemos, nem os nazistas ousaram desconsiderar a coisa julgada: criaram uma nova e absurda hipótese – totalitária, é verdade – de impugnação da sentença pela ação rescisória, mas sujeita ao prazo decadencial normal para o exercício da pretensão rescisória.”.[14] “Não é verdade a afirmação de que não existe controle da constitucionalidade de atos judiciais. Existe, mas deve ser exercido dentro do devido processo legal. Criar impugnabilidade perpétua de sentença ou acórdão apontados de inconstitucionais, como se isso fosse uma espécie de querela nullitatis insanabilis, afigura vetusta e banida dos ordenamentos jurídicos dos povos cultos, é arbítrio e ofensivo ao Estado Democrático de Direito (CF 1º caput) e à garantia constitucional do devido processo legal (CF 5º caput e LIV).”[15]
Caso sejam utilizados impugnação ou petição simples para subtrair a eficácia da coisa julgada em hipótese incompatível com aquela autorizada pela lei (i.e., em que a decisão do STF é ulterior à decisão exequenda transitada em julgado), estes meios hão de ser considerados incabíveis no caso em testilha. É evidente que os rigores de cabimento de uma ação rescisória não podem ser contornados pela oposição de mecanismo tecnicamente menos rigoroso como o da impugnação ou petição simples, nessas hipóteses. São caminhos processuais distintos, não intercambiáveis e com requisitos legais díspares, de modo que não devem ser embaralhados ou desrespeitados, logo, a petição simples ou a impugnação, apresentados nessa situação, são incabíveis para a hipótese em foco.
Caberá ação rescisória com base no art. 525, §§12 e 15 do CPC se o STF não fez modulação dos efeitos de sua decisão declaratória de inconstitucionalidade, fator que poderá atingir o interesse no ajuizamento dela. Inexistindo o impedimento da modulação e afastada a alegada inconstitucionalidade da lei processual para as coisas julgadas pretéritas, caberá ação rescisória com base no inciso V do art. 966 do CPC.
Por fim, é importante registrar que a lei ou ato normativo declarado inconstitucional pelo STF deve ter sido ou essencial[16] ou exclusivo[17] para o acolhimento do pedido da decisão pretérita. “Se o desrespeito ao pronunciamento vinculante não impuser a alteração da sentença, mas admitir apenas a modificação da sua fundamentação, não há como acolher a impugnação.”[18] Mudando o que deve ser mudado, é a aplicação dos enunciados de súmula 126/STJ e 283/STF ao caso sob análise.[19]
b.1) Quatro anos para o ajuizamento de ação rescisória
Questão que se coloca aqui é: o prazo de 2 anos “em curso” para o ajuizamento de ação rescisória contra decisões/processos anteriores e pretéritos à ulterior declaração de inconstitucionalidade “somar-se-ia” ao prazo de ( mais ) 2 anos para a propositura de ação rescisória, compatibilizando, assim, o teor do caput do art. 975 do CPC[20]e o teor da segunda parte do § 15 do art. 525?[21] A transformar o prazo para o ajuizamento da ação rescisória nesta situação de excepcionalidade de até 4 anos?
O jurista Dr. Nelson Nery elucidou o ponto: “Ação rescisória. Segurança jurídica. Contudo, determina o texto comentado que o dies a quo desse prazo seja o do trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF. Haveria, portanto, dois prazos de rescisória? O prazo 1 – dois anos a contar do trânsito em julgado da própria sentença exequenda – e o prazo 2 – dois anos a contar do trânsito em julgado do acórdão do STF que reconheceu a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em que se funda a sentença exequenda? A pretensão rescisória extinta pela decadência não pode renascer pela decisão futura do STF. Saliente-se que a ADIn, por exemplo, não tem prazo de exercício previsto em lei, de sorte que se trata de pretensão perpétua, que pode ser ajuizada em dois, cinco, dez, vinte anos depois da entrada em vigor da lei apontada inconstitucional. Por óbvio, a rescisória – instituto que se caracteriza como exceção à regra constitucional de intangibilidade da coisa julgada material (CF 5º, XXXVI), que, como exceção, deve ser interpretada restritivamente – não pode receber esse mesmo tratamento e nem as partes devem submeter-se à essa absoluta insegurança jurídica. Daí porque, extinta a pretensão rescisória pela decadência, não pode renascer. Entendimento diverso ofenderia o princípio constitucional da segurança jurídica e a garantia fundamental da intangibilidade da coisa julgada (CF 5º, XXXVI). Para que possa dar-se como constitucional, o dies a quo fixado no texto normativo sob comentário deve ser interpretado conforme a Constituição. Assim, somente pode ser iniciado o prazo da rescisória a partir do trânsito em julgado da decisão do STF, se ainda não tiver sido extinta a pretensão rescisória cujo prazo tenha-se iniciado do trânsito em julgado da decisão exequenda. Em outras palavras, o que o texto comentado autoriza é uma espécie de alargamento do prazo da rescisória que está em curso.”[22].
Sobre o prazo para aforar a ação rescisória ser razoável ou exagerado, afirma Marinoni que “o prazo da rescisória deve estar no meio-termo, preservando o equilíbrio entre as tensões opostas.”[23]
Nessa situação, é possível admitir o alargamento deste prazo bienal ‘necessariamente em curso’ por mais 2 anos, com isso compatibilizando a intepretação constitucional da norma (§ 15 do art. 525 do CPC).
Da inconstitucionalidade pro futuro
c) a coisa julgada material formada após o trânsito em julgado da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF
Observando o caso do ponto de vista da decisão declaratória de inconstitucionalidade proferida pelo STF e olhando, agora, a partir dela para situação futura e, especificamente, para a coisa julgada que vier a se formar — após — esta decisão do STF, algumas questões hão de ser examinadas.
c.1) decisão exequenda sem o selo da coisa julgada
A primeira situação a considerar na espécie é a seguinte. Há decisões exequendas que nasceram fundadas em lei ou ato normativo os quais já foram declarados inconstitucionais anteriormente pelo STF, mas ainda não receberam a chancela de coisa julgada material; não transitaram em julgado. Estas decisões exequendas estão a carregar decisão originariamente inconstitucional porquanto em contraste e afronta à decisão declaratória de inconstitucionalidade anterior do STF. Quando da prolação da decisão exequenda já havia um ambiente de inconstitucionalidade da lei base da decisão exequenda.
A rigor, é irrelevante a decisão exequenda ter sido proferida antes ou depois da decisão declaratória de inconstitucionalidade proferida pelo STF. O que efetivamente importa nesse exame é a inexistência de trânsito em julgado da decisão exequenda e a formação de posicionamento do STF contrário à base legal da decisão exequenda.
Assim, caberá aos executados arguirem por petição simples ou por impugnação a inexequibilidade do título executivo com fulcro no artigo 525, §1º, III, §12 e 14 do CPC.
c.2) decisão exequenda transitada em julgado com o selo da coisa julgada soberana
Segunda hipótese. Há casos em que a decisão é originalmente inconstitucional e ela já foi acobertada pela autoridade de coisa julgada soberana. A decisão exequenda foi proferida em ambiente jurídico em que já havia, por força de posição anterior do STF, a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo face à Constituição Federal.
O sistema jurídico sob a chancela do STF já dizia que a lei ou ato ‘x’ são inconstitucionais, mas ulteriormente uma ação judicial tramita, transita em julgado pelo mérito, permanece inatacável por mais de dois anos, ‘ao fundamento essencial de que a lei ou ato ‘x’ são constitucionais’, sem que o Estado-Juiz ou as partes arguissem tal aberração jurídica.
Um aparente paradoxo, mas jurídico. O ordenamento jurídico já havia por decisão do STF repelido a lei ou ato normativo face à Constituição Federal por inconstitucionalidade, mas a norma individual-concreta foi produzida no caso sob vício e este vício perdurou por mais de 2 anos, de modo que a decisão — no caso concreto — foi acobertada pela autoridade da coisa julgada ‘soberana’, incrustando-se efetivamente ao sistema jurídico (como coisa julgada soberana).
Neste caso, o processo relativo à decisão exequenda tramitou por anos em ambiente de direito material-processual diverso, sem que ninguém houvesse alegado a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo que pesava sobre eles.
Depois do trânsito em julgado, por dois anos, também nada foi alegado: dormientibus non succurrit jus. Descabe, portanto, a ação rescisória. Sobre este ponto, leciona o Professor Nelson Nery: “Passado o prazo da ação rescisória, a coisa julgada inatacada, que se formou depois da declaração de inconstitucionalidade pelo STF, não mais poderá ser contestada ou impugnada e o devedor terá de, inexoravelmente, submeter-se ao comando desse título executivo judicial transitado soberanamente em julgado. V. coments. CPC 502. V. CPC 1056.”[24].
A coisa julgada soberana prospectiva, por ser juridicamente mais relevante que a coisa julgada não-soberana, merece este respeito singular.
d) a coisa julgada material formada após o trânsito em julgado da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF, porém, antes de se tornar soberana;
d.1) decisão exequenda transitada em julgado sem o selo da coisa julgada soberana
A terceira situação é com relação às decisões exequendas fundadas em lei ou atos normativos considerados constitucionais pelo juiz da causa (normalmente de forma tácita) e que foram chanceladas pela coisa julgada material, porém, sem o transcurso do prazo de dois anos. A decisão exequenda transitada em julgado pelo mérito é originalmente contrária à ordem jurídica constitucional explicitada pelo STF em anterior controle de constitucionalidade concentrado.
Nessa situação, a obrigação contida no título executivo é considerada ab ovo inexigível e, assim, o executado poderá arguir essa inexigibilidade por meio de impugnação (art. 525, §§12 e 14 do CPC). O fim desta defesa é apenas subtrair a eficácia e exigibilidade do título executivo, obstando o prosseguimento do cumprimento de sentença[25]. Não almeja o desfazimento da coisa julgada. Logo, não é possível, e.g., a repetição de valores pagos ou mesmo a desconstituição da condenação em custas, despesas e honorários advocatícios.
Só a ação rescisória é capaz de desfazer e rescindir a decisão transitada em julgado. Neste caso, considerando não ter havido a formação de coisa julgada soberana e caso o lesado pela decisão exequenda queira ir mais além e a fundo, com a pretensão de desfazimento da coisa julgada material que reveste a decisão exequenda, caberá a ação rescisória a qual será proposta com fulcro no art. 966, inciso V do CPC. Aqui, considerando a decisão anterior de inconstitucionalidade do STF, é perfeitamente possível falar em violação da norma jurídica para o cabimento da ação rescisória.[26]
Existe aqui neste item a discussão de dois planos distintos. Um plano sobre a existência da coisa julgada e só e só a ação rescisória poderá desfazer a autoridade da coisa julgada não-soberana que reveste o comando da decisão exequenda. E outro plano sobre a eficácia da decisão exequenda que, para subtrair (apenas) a eficácia desta decisão, caberá a impugnação ou petição simples (objeção de pré-executividade).
V. Conclusão
Em conclusão, como visto, existem algumas perspectivas a serem atribuídas à coisa julgada (com fulcro em subjacente relação jurídica instantânea) examinada a partir do ponto de vista da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF em controle concentrado de constitucionalidade, sem olvida jamais da qualidade de direito fundamental (abstrato e concreto) qualificador da res judicata.
Havendo a coisa soberanamente julgada, seja em perspectiva retrospectiva ou pro futuro a partir da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF não existirá a hipótese de rescindibilidade dessa coisa julgada soberana, com base no artigo legal em referência, sobretudo porque o escoamento do prazo bienal tem o condão de imutabilizar soberanamente o julgado (podendo transformar pedra em diamante ou o contrário) e qualificando, vez mais, a coisa julgada como direito fundamental irretorquível e intocável.
Havendo a coisa julgada não-soberana em olhar retrospectivo a partir da decisão declaratória de inconstitucionalidade pelo STF, não há que se falar em aplicação dos § 12 do art. 525 do CPC, então, será descabida a apresentação de impugnação com fulcro nesta norma, devendo essa defesa, se apresentada, ser inadmitida por falta de interesse processual. A coisa julgada pretérita não deve ser desfeita de modo tão fluido. O direito fundamental à res judicata e seus predicados hão de ser extensivamente protegidos. É o caso, nesta situação, de ajuizamento de ação rescisória (art. 515, §15 do CPC).
Somente havendo coisa julgada não-soberana em perspectiva pro futuro em relação à decisão declaratória de inconstitucionalidade anterior do STF, é que caberá ação rescisória para — efetivamente – visar desfazer a coisa julgada não-soberana e/ou caberá a apresentação de impugnação ou petição simples (objeção de pré-executividade) para (apenas) subtrair a eficácia da decisão exequenda, a garantir a conformidade constitucional dos dispositivos em análise, cumprindo ressaltar que estas alternativas estão em planos jurídicos distintos do sistema: o desfazer a coisa julgada (plano da existência) e o de subtrair a eficácia da decisão judicial (plano da eficácia).
É preciso examinar através da decisão declaratória de inconstitucionalidade proferida pelo STF para as demandas e as suas coisas julgadas espalhadas no passado, no presente e no futuro do ordenamento jurídico, eis que existem implicações distintas para cada caso concreto.
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[1] Doutorando em Direito pela PUC-SP. Mestre em Direito Difusos e Coletivos pela Unimes-Santos. Bacharel em Direito pela PUC-SP. Professor de Direito Processual Civil da Escola Superior de Advocacia de São Paulo. Advogado. marcos@suchodolski.com
[2] Alchourrón, Carlos Eduardo; Bulygin, Eugênio. Sobre el concepto de ordem jurídico, in Análisis lógico y derecho, n. 24, Madri: Centro de Estúdios Constitucionales, 1991, p. 393.
[3] Conforme lição do jurista Nelson Nery, o intérprete “deve buscar a aplicação do direito ao caso concreto, sempre tendo como pressuposto o exame da Constituição Federal. Depois, sim, deve ser consultada a legislação infraconstitucional a respeito do tema. Caso a lei infraconstitucional esteja em desacordo com o texto constitucional, não deve, por óbvio, ser aplicada.” in Princípios e Processo na Constituição Federal, p. 53.
[4] “No Anteprojeto elaborado por Alfredo Buzaid (art. 507) e no Projeto submetido ao Congresso Nacional (art. 471), definia-se a coisa julgada material como “a eficácia, que torna imutável e indiscutível o efeito da sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”. Por força de emenda apresentada no Senado Federal, passou a redação a ser a que hoje se vê no art. 467 do Código [1973], onde os atributos ‘imutável’ e ‘indiscutível’ se ligam à própria sentença, e não ao seu efeito.” José Carlos Barbosa Moreira, Temas de Direito Processual – 3ª série, São Paulo, 1984, 108, item 6. O art. 502 do Código de Processo Civil de 2015 manteve esta mesma linha de raciocínio, de ligar a imutabilidade/indiscutibilidade à sentença, aperfeiçoando o texto com a substituição de ‘sentença’ por ‘decisão’.
[5] “Ainda e sempre a coisa julgada”, in Direito Processual Civil – ensaios e pareceres 1971, Ed. Borsoi, RJ, p. 139.
[6] Nelson Nery Júnior, in A polêmica sobre a relativização da coisa julgada (Desconsideração) da coisa julgada e o Estado Democrático de Direito, p. 254, in Relativização da Coisa Julgada, Enfoque crítico, 2ª ed., Coord. Fredie Didier, Jus Podivum, 2006.
[7]§ 12. Para efeito do disposto no inciso III do § 1º deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.
§ 14. A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 12 deve ser anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda.
§ 15. Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.
[8] O controle de constitucionalidade difuso pode ter o ‘termo final’ de sua aplicação vinculante distinto do controle concentrado, isso a depender a corrente doutrinária adotada (a depender da expedição ou não da resolução do Senado Federal, art. 52, X da CF), razão pela qual este artigo não ingressará nesta seara. Nada obstante, fazendo estes ajustes, as ideias centrais aqui lançadas possam ser lá aplicadas.
[9] Miguel Galvão Teles, Inconstitucionalidade pretérita, p. 329.
[10] Há autores que defendem a inconstitucionalidade do §15 do art. 515 do CPC, notem bem, para o uso da ação rescisória voltada ao ataque de coisa julgada formada no passado. Luiz Guilherme Marinoni, A intangibilidade da coisa julgada diante da decisão de inconstitucionalidade, 4ª ed., RT, 2016, p. 107-108. Este mesmo autor defende o cabimento da ação rescisória para atacar a coisa julgada pro futuro, formada após e contrariamente à decisão do STF, ao argumento de que aqui há sim ‘violação de norma jurídica’, ibidem, p. 113. É, em suma, constitucional a norma processual ao prever o cabimento de ação rescisória para atacar coisa julgada pro futuro, mas é posta em dúvida a constitucionalidade desta norma para o cabimento de ação rescisória para atacar coisa julgada pretérita à declaração de inconstitucionalidade proferida pelo STF, eis que nesta situação não haveria norma jurídica violada pela decisão anterior para, com isso, abrir espaço às hipóteses rescisórias.
[11] Sobre a eventual inconstitucionalidade deste artigo aplicado às coisas julgadas passadas, vide-se nota de rodapé anterior.
[12] Luis Roberto Barroso, O controle de constitucionalidade no direito brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2006, p. 193.
[13] Luiz Guilherme Marinoni, A intangibilidade da coisa julgada diante da decisão de inconstitucionalidade, 4ª ed., RT, 2016, p. 92.
[14] Nelson Nery Júnior in A Polêmica sobre a relativização (desconsideração) da coisa julgada e o Estado Democrático de Direito, in Relativização da Coisa Julgada, Jus Podivm, 2ª ed., 2006, p. 263.
[15] Nelson Nery Júnior in A Polêmica sobre a relativização (desconsideração) da coisa julgada e o Estado Democrático de Direito, in Relativização da Coisa Julgada, Jus Podivm, 2ª ed., 2006, p. 264.
[16] Fredie Didier Jr.. in Curso de Processo Civil, vol. 5, Ed. JusPodivm, 9ª ed., p. 555.
[17] “Evidentemente, a procedência dos embargos ou da impugnação, na hipótese versada, pressupõe a motivação do título executivo, ‘exclusivamente’, no preceito inconstitucional. Se, ao invés, a condenação se ampara em múltiplos fundamentos, porque o vencedor alegou várias causas de pedir no processo que a originou, o título resistirá à inconstitucionalidade originária ou superveniente de apenas um dos seus fundamentos.” (Araken de Assis, Eficácia da Coisa Julgada Inconstitucional, p. 51).
[18] MARINONI. Luiz Guilherme. Coisa julgada inconstitucional, São Paulo, RT, 2008, p. 133.
[19]Enunciado de súmula 126 do STJ: ‘É inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles sufi ciente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário.’ e o enunciado de súmula 283 do STF ‘É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.’.
[20] Art. 975. “O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.”
[21] Que diz: “ cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.”.
[22] NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil comentado/ Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery. 17ª ed., São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 1.487.
[23] Marinoni, Luiz Guilherme. A intangibilidade da coisa julgada diante da decisão de inconstitucionalidade, RT, 4ªed., 2016, p. 165.
[24] Nelson Nery Jr. e Rosa Nery in Código de Processo Civil Comentado, 17ª ed., RT, São Paulo, p. 1.486.
[25] DIDIER Jr., Fredie. Curso de Direito Processual Civil, vol. 5, Ed Juspodivm, 9ª ed., p. 556.
[26] Neste sentido, é a lição de Marinoni, Luiz Guilherme, A intangibilidade da coisa julgada diante da decisão de inconstitucionalidade, 4ª ed., RT, 2016, p. 113.