DIGNIDADE HUMANA E PRIVAÇÃO DA LIBERDADE: UMA LEITURA A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E DA CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS
30 de junho de 2024HUMAN DIGNITY AND DEPRIVATION OF LIBERTY: AN ANALYSIS BASED ON THE BRAZILIAN FEDERAL CONSTITUTION OF 1988 AND THE AMERICAN CONVENTION ON HUMAN RIGHTS
Artigo submetido em 12 de junho de 2024
Artigo aprovado em 24 de junho de 2024
Artigo publicado em 30 de junho de 2024
Cognitio Juris Volume 14 – Número 55 – Junho de 2024 ISSN 2236-3009 |
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Autor(es): Felipe de Castro Busnello[1] |
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RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo abordar o tratamento humano às pessoas privadas de liberdade, especialmente sob o ponto de vista do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. A matéria também é analisada sob a perspectiva do direito brasileiro, a partir das regras e princípios estabelecidos na Constituição Federal de 1988, assim como na decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu o “estado de coisas inconstitucional” em relação ao sistema carcerário brasileiro.
Palavras-chave: Dignidade Humana. Privação de liberdade. Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
ABSTRACT: This work aims to address the humane treatment for people deprived of their liberty, especially from the point of view of the Inter-American Human Rights System. The issue is also analyzed from the perspective of Brazilian law, based on the norms and principles established in the 1988 Federal Constitution, as well as in the decision of the Constitutional Court that recognized the “unconstitutional state of affairs” in relation to the Brazilian prison system.
Keywords: Human dignity. Deprivation of liberty. Inter-American Human Rights System.
Introdução
O conceito de dignidade humana desempenha um papel central no discurso dos direitos humanos, especialmente sob o ponto de vista do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. No Brasil, foi a partir da Constituição Federal de 1988, que os direitos humanos ganharam um destaque extraordinário, pois o tema passou a ser tratado de forma mais abrangente e pormenorizada. Em um Estado Democrático de Direito Humanista, onde todos estão submetidos à Constituição e às leis, os direitos humanos fundamentais devem ser efetivos, orientando a interpretação e a aplicação de todo o sistema legal.
Nesse contexto, abordamos nesse artigo a aplicação da dignidade humana, em termos concretos, às pessoas privadas de liberdade. A constitucionalização do Direito favoreceu a inclusão dos direitos humanos explicitamente nas leis. A título de exemplo, a execução penal deve proporcionar condições para a harmônica integração social da pessoa privada de liberdade. Da mesma forma, a Defensoria Pública, instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, é responsável pela promoção dos direitos humanos e deve velar pela regular execução da pena e da medida de segurança.
No entanto, na prática, o sistema prisional brasileiro é suscetível a violações massivas de direitos fundamentais e isso já foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, quando entendeu que estava configurado no sistema carcerário brasileiro um “estado de coisas inconstitucional”, pois presente transgressão grave e sistemática a direitos humanos que enseja a imprescindibilidade da atuação do Tribunal Constitucional, no sentido de impor aos Poderes Públicos a adoção de ações urgentes e necessárias ao afastamento dessas violações, bem como supervisionar a efetiva implantação de tais medidas.
A finalidade do estudo é demonstrar que, mais do que um princípio do processo penal, a dignidade humana é um objetivo a ser concretizado, seja na prestação de justiça em casos concretos, seja nos mecanismos internacionais de proteção e garantia dos direitos humanos, seja na configuração dos órgãos do Estado. Enfim, o fenômeno da irradiação da dignidade humana deve orientar toda a atividade estatal, fazendo com que o Estado Democrático de Direito seja uma realidade também em relação às pessoas privadas de liberdade.
1. Dignidade humana e o princípio “pro homine”
Do princípio da dignidade humana é derivada a essência dos direitos humanos, para a proteção da liberdade, da igualdade e para a promoção da justiça. No seu âmbito está abrangida a defesa do mínimo existencial, e há, ainda, um elemento instrumental, que é o acesso à justiça, necessário para a exigibilidade e efetivação dos outros direitos.
Por isso, pode-se dizer que, além de importante atributo do nosso Estado Democrático de Direito, a dignidade da pessoa humana é um metaprincípio, que está acima dos demais princípios constitucionais, de forma que todas as normas jurídicas devem ser interpretadas a partir da dignidade humana, buscando a sua concretização. Trata-se do fenômeno da irradiação da dignidade da pessoa humana.
Sobre a dignidade humana, nos ensina o eminente Professor Marco Antonio Marques da Silva, em seu artigo ‘Cidadania e Democracia: Instrumentos para a efetivação da dignidade humana’[2], que:
A dignidade decorre da própria natureza humana[3], o ser humano deve ser sempre tratado de modo diferenciado em face da sua natureza racional. É no relacionamento entre as pessoas e no mundo exterior, e entre o Estado e a pessoa, que se exteriorizam os limites da interferência no âmbito desta dignidade. O seu respeito, é importante que se ressalte, não é uma concessão ao Estado, mas nasce da própria soberania popular, ligando-se à própria noção de Estado Democrático de Direito.
Esse conceito pode parecer vago em razão de ser dinâmico e variar ao longo do tempo e conforme o contexto local, portanto existe intensa produção doutrinária e jurisprudencial sobre seu alcance. O certo é que, no Brasil e no mundo, busca-se alcançar sua densidade e conteúdo em concreto, não em abstrato, tarefa crucial quando se considera que a dignidade deve ser permanentemente concretizada e utilizada para a solução de conflitos.
Como se sabe, princípios são normas que apontam para estados ideais a serem buscados, e, por terem conteúdo aberto, permitem a atuação construtiva e integrativa do intérprete, capacitando-o a construir a solução mais adequada para o caso concreto, realizando o ideal de justiça. De acordo com Luís Roberto Barroso[4]:
O reconhecimento da distinção qualitativa entre essas duas categorias e a atribuição de normatividade aos princípios são elementos essenciais do pensamento jurídico contemporâneo. Os princípios – notadamente os princípios constitucionais – são a porta pela qual os valores passam do plano ético para o mundo jurídico. Em sua trajetória ascendente, os princípios deixaram de ser fonte secundária e subsidiária do Direito para serem alçados ao centro do sistema jurídico. De lá, irradiam-se por todo o ordenamento, influenciando a interpretação e aplicação das normas jurídicas em geral e permitindo a leitura moral do Direito.
Por sua vez, conforme Marco Antonio Marques da Silva, em seu artigo ‘Igualdade na Persecução Criminal: Investigação e produção de provas nos limites constitucionais’[5]:
Na justiça penal, os princípios constitucionais avultam em importância, porque têm como objetivo a proteção do direito de liberdade do indivíduo. […] Num Estado Democrático de Direito, o sistema do direito penal deve ter como limite os direitos humanos acolhidos pela Constituição Federal, nos tratados e convenções internacionais. Este o caráter conciliador do direito penal, uma vez que a pena não desestimula o crime. O respeito incondicional aos direitos fundamentais, no âmbito do direito penal, e às garantias individuais, no do processo penal indicam a verdadeira vocação de uma democracia. Assim, a eficiência do Estado, com relação à criminalidade moderna, embora possa se diferenciar, quanto aos meios, mas não pode ignorar estas garantias. O cumprimento dos princípios constitucionais que norteiam a persecução criminal e o processo penal será o verdadeiro primado das garantias individuais, efetivando os direitos fundamentais inscritos na nossa Carta Magna.
A respeito do assunto, em matéria de direitos humanos, o princípio “pro homine” deve prevalecer. Nesse sentido, universalmente, em toda situação jurídica, havendo mais de uma norma ou interpretação possível, sempre deve preponderar aquela que favorece em concreto a dignidade humana. Assim, a melhor interpretação de qualquer caso, legislação ou tratado internacional é aquela mais favorável ao ser humano. Essa pode parecer uma tarefa óbvia em alguns casos, mas nem sempre será tão fácil a sua implementação quando se está diante de determinados casos concretos.
A seguir serão apresentados alguns aspectos que podem auxiliar nessa atividade. Serão abordados: i) aspectos relevantes sobre as origens do princípio e sua historicidade, com destaque para a constitucionalização e o status das normas internacionais de Direitos Humanos no Brasil; ii) a importância do sistema Interamericano de Diretos Humanos e dos instrumentos para garantir sua aplicação; iii) a execução penal sob o enfoque dos direitos e garantias fundamentais; e iv) a concretização da dignidade humana no contexto do tratamento dispensado às pessoas privadas de liberdade, ressaltando a jurisdicionalização da execução penal, o papel da Defensoria Pública nesse contexto e o “estado de coisas inconstitucional”.
2. Proteção internacional dos direitos humanos
Após a Segunda Guerra Mundial, verificada a falta de preocupação com o ser humano, houve a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945, e o princípio da dignidade da pessoa humana passou a figurar em documentos internacionais, como, por exemplo, na Declaração dos Direitos Humanos, de 1948. Formou-se, então, uma ordem supranacional de proteção aos direitos humanos, inicialmente com um sistema global (ideia de universalização), e posteriormente com a criação de sistemas regionais para complementá-lo e fortalecê-lo.
Com o término da Segunda Guerra as Constituições dos Estados também passaram a prever a dignidade da pessoa humana em âmbito interno. No caso do ordenamento jurídico brasileiro, ela é prevista no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988, entre os princípios fundamentais, como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito (“A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III a dignidade da pessoa humana”), constituindo um verdadeiro “valor supremo”.
2.1. A constitucionalização do direito
De acordo com Luís Roberto Barroso, em sua obra ‘Curso de Direito Constitucional contemporâneo – os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo’[6], o término da Segunda Guerra Mundial é um marco para o desenvolvimento do Estado Constitucional de Direito, em que a Constituição figura como centro do sistema jurídico, e irradia sua força normativa, tendo por característica central a subordinação da legalidade a uma Constituição, ou seja, a validade das leis também está condicionada à efetiva compatibilidade de seu conteúdo com as normas constitucionais.
O fenômeno da constitucionalização do Direito consiste na impregnação de todo o sistema jurídico por normas constitucionais, que são dotadas de normatividade, isto é, são diretamente aplicáveis aos casos concretos por Juízes, operadores do Direito, autoridades administrativas, particulares, etc., dispensando regulamentação. A constitucionalização está diretamente relacionada às garantias previstas no artigo 5º da Constituição Federal, e tem como consequências, entre outras, a modernização, simplificação e unificação da ordem jurídica, que deve ser toda interpretada segundo a Constituição, com a neutralização natural e progressiva daquilo que não é considerado constitucional, bem como o desenvolvimento de uma jurisprudência constitucional, sobre direitos e liberdades fundamentais.
Ainda segundo Luís Roberto Barroso, o marco filosófico do novo direito constitucional é o pós-positivismo. Após o término da Segunda Guerra, houve o declínio do positivismo jurídico, pois ele não evitou as violações à dignidade humana pelos regimes totalitários (o fascismo na Itália e o nazismo na Alemanha perpetraram atrocidades sob a proteção da legalidade). Então a ética e os valores morais começaram a ressurgir no Direito para que tais violações não se repetissem, assumindo os direitos humanos papel fundamental nos regimes constitucionais e consolidando uma nova estrutura que torna o indivíduo principal objeto de proteção.
Para Luís Roberto Barroso, o marco histórico do novo direito constitucional no Brasil foi a Constituição de 1988 e o processo de redemocratização que ela ajudou a protagonizar. A aproximação das ideias de constitucionalismo e de democracia deu origem a uma nova forma de organização política: o Estado Democrático de Direito. A CF/88 foi capaz de promover, de maneira bem-sucedida, a transição de um regime autoritário, intolerante e, por vezes, violento para um Estado Democrático de Direito.
Contudo, apesar de sua evidente importância, a constitucionalização do direito não é suficiente para a tutela do cidadão frente o poder estatal. Conforme se verá, mesmo em matéria de direitos e garantias fundamentais, as Constituições dos Estados e interpretações realizadas em âmbito interno devem ser submetidas a tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos dos quais os países sejam signatários (ideia de controle de convencionalidade, realizado por Cortes internacionais).
2.2. Breve abordagem sobre o status das normas internacionais sobre direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro
Existem diversos posicionamentos a respeito do status das normas internacionais sobre direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro, em especial diante do conteúdo do artigo 5º, §§ 2º e 3º, da Constituição Federal.
Artigo 5º, § 2º: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
Artigo 5º, § 3º: Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
O melhor entendimento e que mais privilegia os direitos humanos é no sentido de que os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos de que o Brasil é signatário, como, por exemplo, a Declaração Americana sobre os Direitos Humanos, independentemente do rito pelo qual tenham sido aprovados, integram nosso ordenamento jurídico com status constitucional, ou mesmo supraconstitucional[7], com fundamento nos artigos 1º, inciso III, 4º, inciso II, e 5º, § 2º, da Constituição Federal.
Artigo 1º: A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana.
Artigo 4º: A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: II – prevalência dos direitos humanos.
Pelas mesmas razões, entende-se que tais normas são autoaplicáveis, ou seja, entram de forma plena em nosso ordenamento jurídico automaticamente, e têm aplicação imediata, sem a necessidade de internalização (pacta sunt servanda).
3. O Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH) e a convencionalidade
Como já dito, no período pós-segunda guerra, além das legislações internas, também houve a expansão dos direitos e garantias fundamentais no âmbito do direito internacional, que ganhou um arcabouço jurídico pautado na universalização e internacionalização dos direitos humanos. Como resultado, além da proteção interna, as normas fundamentais foram asseguradas internacionalmente, permitindo a responsabilização dos Estados perante a comunidade internacional em casos de violação aos direitos humanos.
O Sistema Interamericano de Direitos Humanos surgiu com a fundação da Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1948. Seu principal documento é a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH), também conhecida como Pacto de São José da Costa Rica. As principais instituições criadas pela Carta da OEA para a promoção e proteção dos direitos humanos são: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericanas de Direitos Humanos. Como será especificado em seguida, a principal atribuição da Comissão é de receber e supervisionar as petições que denunciam abusos contra os direitos humanos, que são apresentadas contra os Estados-Membro da OEA. A Corte é um dos três tribunais regionais de proteção dos direitos humanos; como uma instituição judicial autônoma, seu objetivo é de aplicar e interpretar a Convenção Interamericana[8].
Quando se fala em convencionalidade, nosso principal parâmetro é a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que é bastante abrangente em matéria de proteção aos direitos humanos, pois traz um rol extenso de direitos e liberdades individuais, e estabelece, em seu artigo 2, que os países signatários têm a obrigação de adequar suas legislações para assegurar os direitos ali previstos:
Dever de adotar disposições de direito interno: Se o exercício dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1 ainda não estiver garantido por disposições legislativas ou de outra natureza, os Estados Partes comprometem-se a adotar, de acordo com as suas normas constitucionais e com as disposições desta Convenção, as medidas legislativas ou de outra natureza que forem necessárias para tornar efetivos tais direitos e liberdades.
Os direitos e garantias previstos na CADH, assim como em outros documentos internacionais sobre o tema, são gerais e complementares à proteção oferecida no âmbito interno dos Estados membros. No mais, pautam-se na limitação da interferência estatal, como forma de coibir arbitrariedades e excessos. Isso porque o Estado se constitui a partir da vontade popular e detém o monopólio do poder punitivo; assim, quando se trata de matéria penal ou processual penal, que envolve liberdades e garantias fundamentais, a legitimidade da intervenção deve observar as limitações ao poder punitivo.
Por outro lado, também existe o dever estatal de apurar crimes, processar os supostos autores e puni-los de acordo com o devido processo legal. Nesse sentido, diversos documentos internacionais impõem aos Estados-partes o dever de proteção a grupos vulneráveis, inclusive através da responsabilização penal dos autores de violações, como, por exemplo, a direitos de crianças e mulheres. No caso do Brasil, a título de exemplo, a Lei nº 11.340, de 2006, conhecida como Lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, é fruto da responsabilização do Estado brasileiro perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos em razão de omissão, negligência e tolerância em relação a crimes cometidos contra os direitos humanos das mulheres.
Cláudio José Langroiva Pereira et alii analisam com profundidade a matéria no artigo ‘O direito do acusado ao recurso contra decisão condenatória e os paradigmas da Corte Interamericana de Direitos Humanos’[9]; vejamos:
A Constituição da República de 1988 e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, promulgada no Brasil pelo Decreto nº 678/92, estabelecem direitos e garantias que orientam todo o sistema penal e processual penal. Para falarmos de um processo penal constitucional, convencional e humanitário[10], é preciso ir além da mera questão envolvendo a hierarquia entre normas de direito interno e direito internacional. Faz-se necessário averiguar o conteúdo e a extensão dos direitos e garantias processuais, partindo-se do pressuposto de que são verdadeiros direitos humanos, destinados a impor limites ao poder punitivo estatal[11].
Dois dispositivos da CADH interessam diretamente à área penal, a saber: o artigo 7 (direito à liberdade pessoal), que prevê os direitos e garantias da pessoa presa, e o artigo 8, que estabelece as garantias judiciais ou processuais. Ao Poder Judiciário compete repelir qualquer decisão ou lei que seja incompatível com tais premissas fundamentais. A Convenção estabelece que a Comissão e a Corte IDH são órgãos competentes para reconhecer os assuntos relacionados com o cumprimento de compromissos contraídos pelos Estados Partes da Convenção e regular seu funcionamento[12].
Nesse contexto, a Comissão IDH, na qualidade de órgão intermediário, recebe denúncias sobre violações praticadas pelos Estados membros, apura os fatos, de acordo com o devido processo, e emite recomendações para que sejam feitas as devidas adequações em relação ao que foi identificado como desviante, sob pena de sanções e possibilidade de remessa do caso para apreciação da Corte Interamericana. De acordo com o artigo 1 do Regulamento[13], a Comissão IDH é um órgão autônomo da OEA, que tem a função principal de promover a observância e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização nessa matéria. O acesso à Comissão pode ser feito pelo próprio indivíduo, grupo de indivíduos ou organização não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados Membros da OEA. Trata-se de um órgão político do sistema interamericano.
Já a Corte IDH é o canal de materialização da convencionalidade. Trata-se do órgão máximo do Sistema IDH, que julga os casos levados à sua apreciação, através do devido processo, com a eventual responsabilização dos Estados pelas violações às normas internacionais. Dessa maneira, a Corte consolida a interpretação sobre as normas para que os Estados as apliquem da melhor forma, sob pena de sanções em caso de descumprimento. A Corte pode ser acessada pela Comissão IDH ou pelos Estados (que, em geral, são os próprios autores das violações), mas não diretamente pelo cidadão, o que é apontado como uma falha do SIDH.
O Estado brasileiro reconheceu a jurisdição da Corte IDH através do Decreto nº 4.463, de 08 de novembro de 2002:
Promulga a Declaração de Reconhecimento da Competência Obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos, sob reserva de reciprocidade, em consonância com o art. 62 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José), de 22 de novembro de 1969.
A jurisprudência da Corte IDH é referência mundial em direitos e garantias fundamentais, utilizada como parâmetro, inclusive, em diversas decisões do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
No contexto nacional, em janeiro de 2022, o Conselho Nacional de Justiça brasileiro (CNJ) reconheceu que a Corte IDH integra nosso sistema, ao editar a Recomendação nº 123, que “recomenda aos órgãos do Poder Judiciário brasileiro a observância dos tratados e convenções internacionais de direitos humanos e o uso da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos”.
Como bem apontam Claudio José Langroiva Pereira et alii[14]:
Nesta tarefa, os julgados da Corte Interamericana de Direitos Humanos constituem valorosa fonte, valendo destacar que não apenas a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, mas também a interpretação de seus dispositivos realizada pela jurisprudência da Corte integra o bloco de constitucionalidade[15].
[…]
Enquanto não se promover uma reforma legislativa ampla, que compatibilize o Código de Processo Penal com a Constituição da República e os tratados internacionais, indispensável se faz que os tribunais pátrios se valham da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, para promover a ampliação e a consolidação das garantias processuais penais.
Ainda sobre o assunto, é importante destacar que a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, instituição essencial à função jurisdicional do Estado a quem incumbe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, de acordo com o artigo 134 da Constituição Federal de 1988, já reconhece expressamente a relevância da CADH há bastante tempo, pois orienta os Defensores a utilizar esse instrumento internacional, atribuindo-lhe efetividade, em concreto. Desde o ano de 2008, vigora a Tese Institucional nº 02, com o seguinte conteúdo:
O Defensor Público toda vez que apresentar impugnação de qualquer decisão judicial, deverá utilizar, sempre que possível, como fundamento, algum dispositivo de tratado de direitos humanos (ratificado e assinado pelo Brasil), objetivando a efetiva aplicação destes diplomas no Brasil e também para que eventualmente possa apresentar o caso perante o sistema regional de proteção de direitos humanos.
3.1. As medidas de urgência no Sistema Interamericano de Direitos Humanos
Conforme Manoela Fleck de Paula Pessoa e Nestor Eduardo Araruna Santiago, em seu artigo ‘O sistema interamericano de direitos humanos e as medidas de urgência no sistema prisional brasileiro: a perspectiva garantista na proteção dos direitos humanos’[16], a CADH prevê instrumentos para assegurar a aplicação de suas disposições no âmbito interno dos Estados membros, como, por exemplo, as medidas de urgência, que se dividem em medidas cautelares e medidas provisórias. As medidas de urgência podem ser acionadas em casos de extrema gravidade e urgência, como importante ferramenta para prevenir danos iminentes e irreparáveis às vítimas de violações aos direitos humanos, e, desse modo, garantir os valores máximos relacionados à dignidade humana. Nesse sentido, prevê o artigo 63, item 2, da CADH:
“Em casos de extrema gravidade e urgência, e quando se fizer necessário evitar danos irreparáveis às pessoas, a Corte, nos assuntos de que estiver conhecendo, poderá tomar as medidas provisórias que considerar pertinentes. Se se tratar de assuntos que ainda não estiverem submetidos ao seu conhecimento, poderá atuar a pedido da Comissão”.
A Comissão IDH tem competência de outorga das medidas cautelares, e, conforme o artigo 25, item 1, do Regulamento da Comissão IDH, tem como função principal promover a observância e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização em tal assunto; e a Corte IDH tem competência de editar as medidas provisórias.
Devido à superlotação e condições precárias do sistema carcerário brasileiro, com violações generalizadas e sistemáticas a direitos humanos previstos tanto no âmbito interno como no direito internacional, ameaçando a vida e a integridade física dos presos, já foram concedidas diversas tutelas de urgência no âmbito do SIDH relacionadas ao nosso sistema prisional[17], visando garantir a implementação e cumprimento pelo Estado brasileiro dos direitos humanos prescritos. Podem ser citados, a título de exemplo, os casos do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no estado do Maranhão, e do Complexo Penitenciário de Curado, no Pernambuco, em que houve a imposição de medidas provisórias pela Corte Interamericana ao Brasil[18], visando proteger eficazmente a vida e a integridade física de todas as pessoas privadas de liberdade nas unidades desses estabelecimentos, e também de agentes penitenciários, funcionários e visitantes. Em ambos os casos a Corte Interamericana destacou o problema da superlotação carcerária, entre diversos outros, exigindo do Estado, por exemplo, a realização de “mutirões judiciais” e audiências de custódia.
4. Introdução à execução penal sob o enfoque dos direitos e garantias fundamentais
O direito penal e o direito processual penal são formas de limitação do exercício do poder punitivo pelo Estado. O ordenamento jurídico brasileiro, em especial o processo penal e seus institutos, precisaram ser revisitados após o período da ditadura, e têm sido debatidos na atualidade sob o enfoque da Constituição Federal de 1988 e do Estado Democrático de Direito (artigo 1º, caput, da CF/88).
Nesse ponto, é importante mencionar que a Comissão Interamericana exerceu um papel importante entre 1970-1980, pressionando governos repressivos. Seus relatórios sobre o Chile durante o período militar, por exemplo, tiveram um significado particular para os defensores dos direitos humanos internos e internacionais. No início da década de 1990, a Comissão IDH começou a acompanhar de perto os países com instituições democráticas frágeis que ainda sofriam violência política. A título de exemplo, a Comissão publicou quatro relatórios sobre a situação dos direitos humanos no Haiti entre 1990 e 1995 e três relatórios sobre a Guatemala entre 1993 e 2001. Em 1998, a Comissão visitou o Peru e preparou um relatório abrangente sobre a sua situação em matéria de direitos humanos. O relatório foi divulgado em Junho de 2000 e foi crucial para acabar com o regime de Fujimori[19].
No contexto brasileiro, houve a segunda redemocratização em 1985, que teve como objetivo reestabelecer a democracia. A Assembleia Nacional Constituinte aprovou a nova Constituição, que substituiu a anterior de 1967 e foi promulgada em 05 de outubro de 1988. O novo humanismo, base da nova concepção do próprio Direito e do constitucionalismo, afirma a supremacia da pessoa humana na escala de valores. Isso engloba todas as pessoas humanas, sem discriminação ou privilégio. A afirmação da pessoa como valor supremo deve ter um sentido prático e se confirmar no plano da realidade. A Constituição não apenas impõe limites aos poderes do Estado, mas também determina deveres de atuação.
O Brasil é um Estado Democrático de Direito Humanista, isso significa, em resumo: que todos estão submetidos à Constituição e às leis; que a lei deve expressar a vontade do povo; e que os direitos humanos fundamentais devem ser efetivos, inclusive orientando a interpretação e a aplicação de todo o sistema legal.
A Constituição Federal estabelece direitos e garantias fundamentais e o constitucionalismo moderno representa uma técnica específica de limitação do poder. É importante destacar que o sistema brasileiro é baseado na supremacia da Constituição sobre as demais normas do sistema jurídico, e é reconhecida a aplicabilidade direta das normas consagradoras de direitos, liberdades e garantias, que, inclusive, têm reforço de proteção pelo ordenamento, conforme artigo 60, § 4º, inciso IV, da CF/88, que estabelece cláusulas pétreas: “não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: os direitos e garantias individuais”. No mais, nos termos do artigo 5º, § 1º, da CF/88: “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”; isso significa que tais preceitos ou regras jurídicas têm força normativa autônoma, ou seja, independem de lei que os concretize, e reforçada, isto é, não podem ser subvertidos pelo legislador.
Na Constituição Federal de 1988, nenhum outro ramo do direito ocupa tanto espaço quanto o direito penal e o processo penal. Ela prevê um conjunto de princípios, de modo que se pode falar em uma “Constituição penal” dentro da própria Constituição. O direito processual penal é necessário para a estruturação e imposição de penas, ou seja, para a aplicação do direito penal. De acordo com o eminente Professor Marco Antonio Marques da Silva[20]:
Os princípios constitucionais do direito penal cumprem uma função fundamentadora da intervenção do Estado Democrático de Direito na privacidade e intimidade das pessoas, através do poder de punir, estabelecendo os limites deste. No processo penal, os princípios constitucionais proporcionam as regras segundo as quais o fato deve ser produzido e considerado válido para poder determinar consequências jurídicas.
A ciência penal como um todo é a utilma ratio, isto é, o último recurso, porque tem consequências mais severas do que todas as demais áreas do direito. Em outras palavras, o direito penal e o processo penal não podem ser vistos como sistema autônomo, e só são acionados como instância final na motivação ao comportamento em sociedade, com limites jurídicos e fins de estabilização e garantia de normas sociais, quando nenhuma outra área do direito for suficientemente forte para obrigar ao cumprimento da lei.
Por isso, é importante compreender todo o sistema de garantias, assim como refletir sobre a ideia de que a pena privativa de liberdade não é a resposta mágica para resolver todos os problemas de criminalidade; ela é apenas uma das respostas, que não deve representar uma vingança institucionalizada, sem qualquer conexão com a ideia de reparação.
Segundo a exposição de motivos da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984):
Na Constituição existem normas processuais penais, como as proibições de detenção arbitrária, da pena de morte, da prisão perpétua e da prisão por dívida. A Constituição consagra ainda regras características da execução ao estabelecer a personalidade e a individualização da pena como garantias do homem perante o Estado. Também no Código Penal existem regras de execução, destacando-se, dentre elas, as pertinentes aos estágios de cumprimento da pena e respectivos regimes prisionais.
Para o Professor Gustavo Octaviano Diniz Junqueira[21]:
A Constituição, como estatuto de elaboração do próprio Estado, é o primeiro ponto a observar os limites de atuação estatal, as garantias do indivíduo e o modo pelo qual tais interesses podem ser manejados.
Da mesma forma, segundo os ensinamentos do eminente Professor Claudio José Langroiva Pereira[22]:
A Constituição surge como fundamentadora desta proteção limitada, por meio de princípios político criminais de aplicação penal que, em última instância, devem apresentar elementos suficientes para uma valoração de gravidade do delito e de merecimento da pena.
Nesse sentido, o Estado deve garantir às pessoas privadas de liberdade um tratamento digno, bem como a possibilidade de restabelecimento do convívio em sociedade.
É importante mencionar a existência de princípios e regras internacionais específicos sobre o tratamento de reclusos e a gestão de estabelecimentos prisionais, como as Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos (Regras de Mandela)[23]. O Brasil é signatário de diversos documentos internacionais sobre o assunto, mas, infelizmente, existem muitas falhas na implementação, pois esses princípios estão longe de serem respeitados de maneira adequada.
É de fundamental importância que o princípio da dignidade da pessoa humana seja observado também no âmbito da execução penal, através do respeito a direitos e garantias constitucionais fundamentais implícitos e explícitos, relacionados às liberdades atingidas pelas sanções criminais, como a humanização, a individualização e a proporcionalidade das penas.
5. Tratamento humano a pessoas privadas de liberdade
A pena privativa de liberdade incide diretamente sobre direitos fundamentais, e tem finalidades preventiva e socializadora, que devem ser compatíveis com a dignidade da pessoa humana. Os direitos individuais merecem consideração destacada, em função de sua garantia constitucional e convencional. Nesse sentido, estabelece o artigo 1º da Lei de Execução Penal – LEP que “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”.
Embora o custodiado esteja afastado da sociedade, o que por si constitui uma restrição ao direito fundamental de ir e vir, a execução da pena só será legítima se proporcionar a integração no meio social. É inconstitucional que a pena seja cumprida em condições insalubres ou incompatíveis com a socialização. A possibilidade de progressão de regimes prevista pela LEP constitui importante mecanismo de integração social do custodiado.
A respeito do assunto, Ingo Wolfgang Sarlet[24] defende que, apesar de eventual divergência, há cada vez mais consenso na doutrina e na jurisprudência sobre a plena justiciabilidade da dimensão negativa (defensiva) dos direitos sociais em geral e da possibilidade de se exigir em Juízo pelo menos a satisfação daquelas prestações vinculadas ao mínimo existencial, de forma que também nesta esfera a dignidade da pessoa humana assume a condição de metacritério para as soluções tomadas no caso concreto. Isso porque a Constituição, que tem normas dotadas de superioridade hierárquica, protege prioritariamente os direitos fundamentais e determina a adoção de políticas públicas para concretizá-los, cabendo ao Poder Judiciário, no desempenho de sua função de aplicar o direito, afirmar a supremacia da Constituição, expressão maior da vontade popular, além da preservação das condições essenciais de fundamento do Estado Democrático de Direito.
Para o autor, outro conjunto de direitos e garantias fundamentais que guarda relação intrínseca com a dignidade humana é composto pelos direitos e garantias processuais. No âmbito do processo, em especial do processo penal, onde pode haver comprometimento da liberdade, o indivíduo não pode ser tratado pelo poder público como mero objeto da decisão judicial, mas como sujeito, sendo-lhe assegurada a possibilidade de se manifestar e exercer influência na esfera do processo decisório.
Nesse sentido, a Corte IDH entende que o conceito de devido processo legal está diretamente relacionado ao de justiça, e não de procedimento. O processo não tem um fim em si mesmo, ele existe para prestar justiça, portanto, devem ser observados o contraditório pleno e a ampla defesa, bem como a interpretação mais favorável ao cidadão. Alguns exemplos são: i) a necessidade de formalização da acusação e individualização das condutas; ii) a tradução oficial da acusação ou de prova produzida pela parte contrária em língua estrangeira para fazê-la compreensível; e iii) a nomeação de intérprete qualificado sempre que necessário. No mais, em regra o processo deve ser público, desde que isso não venha a ferir direitos e garantias individuais, e com ampla possibilidade de acesso aos envolvidos. Para ser íntegro, o processo também deve ser julgado por juiz natural, imparcial, que fundamente adequadamente sua decisão, proibindo-se tribunais de exceção.
5.1. A jurisdicionalização da execução
Nos termos da exposição de motivos da Lei nº 7.210/84[25]:
Vencida a crença histórica de que o direito regulador da execução é de índole predominantemente administrativa, deve-se reconhecer, em nome de sua própria autonomia, a impossibilidade de sua inteira submissão aos domínios do Direito Penal e do Direito Processual Penal. […] O Projeto reconhece o caráter material de muitas de suas normas. Não sendo, porém, regulamento penitenciário ou estatuto do presidiário, avoca todo o complexo de princípios e regras que delimitam e jurisdicionalizam a execução das medidas de reação criminal. […] À autonomia do Direito de Execução Penal corresponde o exercício de uma jurisdição especializada, razão pela qual, no artigo 2º, se estabelece que a “jurisdição penal dos juízes ou tribunais da justiça ordinária, em todo o território nacional, será exercida, no processo de execução, na conformidade desta lei e do Código de Processo Penal”.
Prossegue a exposição de motivos:
As atribuições pertinentes a cada um de tais órgãos foram estabelecidas de forma a evitar conflitos, realçando-se, ao contrário, a possibilidade da atuação conjunta, destinada a superar os inconvenientes graves, resultantes do antigo e generalizado conceito de que a execução das penas e medidas de segurança é assunto de natureza eminentemente administrativa. Diante das dúvidas sobre a natureza jurídica da execução e do consequente hiato de legalidade nesse terreno, o controle jurisdicional, que deveria ser frequente, tem-se manifestado timidamente para não ferir a suposta “autonomia” administrativa do processo executivo. […] A orientação estabelecida pelo Projeto, ao demarcar as áreas de competência dos órgãos da execução, vem consagrar antigos esforços no sentido de jurisdicionalizar, no que for possível, o Direito de Execução Penal. […] Esse juízo especializado já existe, entre nós, em algumas Unidades da Federação. Com a transformação do Projeto em lei, estamos certos de que virá a ser criado, tão celeremente quanto possível, nos demais Estados e Territórios.
Além disso, de acordo com os artigos 193 e seguintes, o Juízo da Execução é o foro natural para o conhecimento de todos os atos praticados por qualquer autoridade, na execução das penas e das medidas de segurança. O procedimento correspondente às situações previstas na LEP será judicial, desenvolvendo-se perante o Juízo da execução.
Como dito anteriormente, o Estado é detentor exclusivo do ius puniendi, mas não pode exercer seu poder repressivo de forma arbitrária, somente sendo autorizado a punir quando assim for determinado pelo órgão jurisdicional competente; em outras palavras, não pode o Estado-Administração executar diretamente sua pretensão punitiva, devendo se submeter à prestação jurisdicional e controle do Estado-Juiz.
5.2. A atuação da Defensoria Pública no âmbito da execução penal
Estabelece o artigo 134 da CF/88:
A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicialmente, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 80, de 2014).
Como consequência da jurisdicionalização da execução, a Lei nº 12.313/2010 alterou a Lei nº 7.210/1984 para prever a assistência jurídica ao preso dentro do presídio e atribuir competências à Defensoria Pública. Foi incluído na LEP o artigo 81-A: “A Defensoria Pública velará pela regular execução da pena e da medida de segurança, oficiando, no processo executivo e nos incidentes da execução, para a defesa dos necessitados em todos os graus e instâncias, de forma individual e coletiva”.
Também acerca do tema, estabelece a Súmula nº 533 do STJ:
Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado.
Tais previsões decorrem do princípio constitucional da ampla defesa, disposto no artigo 5º, inciso LV, da CF/88: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Significa que o Estado deve proporcionar a mais ampla defesa ao acusado, sendo que ao réu que não possua condições financeiras, será sempre e obrigatoriamente nomeado defensor, conforme artigo 5º, inciso LXXIV, da CF/88: “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.
É importante esclarecer que, além da atuação ordinária de Defensores nos processos de execução, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo possui um Núcleo Especializado de Situação Carcerária (NESC), órgão interno, de caráter permanente, que tem como missão primordial prestar suporte e auxílio, tanto administrativa quanto judicialmente, a Defensores Públicos sobre direitos específicos ou gerais de pessoas presas ou internadas, fazendo inspeções nos estabelecimentos prisionais e trabalhando em temas como a política ‘Mães em Cárcere’[26].
Infelizmente, na prática, a Defensoria Pública ainda encontra muita resistência no cumprimento de direitos básicos da população carcerária, como, por exemplo, demora excessiva na análise e frequente indeferimento de pedidos de progressão de regime prisional ou de livramento condicional apesar do preenchimento dos requisitos legais. Tais violações, somadas à banalização das prisões processuais e ao contínuo recrudescimento das penas e dos requisitos para a obtenção de benefícios na execução penal, contribuem para a superpopulação carcerária e para o sucateamento do sistema já ineficiente. Como se não bastasse, apesar do esforço diário dos Defensores Públicos para assegurar os direitos dos seus assistidos, o número absolutamente insuficiente de Defensores só agrava o problema e distancia ainda mais a população mais carente de seus direitos processuais.
Esse panorama revela a importância de, entre as funções institucionais da Defensoria Pública, estar a de ‘representar aos sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, postulando perante seus órgãos’ (art. 4º, VI, da Lei Complementar nº 80/94), pois, como visto, o grande violador de direitos da população carcerária é o próprio Estado brasileiro.
5.3. O sistema prisional brasileiro e o “estado de coisas inconstitucional” (ADPF 347/DF)
No ano de 2015, ao apreciar os pedidos formulados em caráter cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347/DF, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade – PSOL[27], o Supremo Tribunal Federal entendeu que estava configurado no sistema prisional brasileiro o que a Corte Constitucional da Colômbia denominou de “estado de coisas inconstitucional”, que consiste em uma técnica que permite ao Tribunal Constitucional, em casos excepcionais, quando presente transgressão grave e sistemática a direitos humanos e, constatada a imprescindibilidade da sua atuação, impor aos Poderes Públicos (órgãos legislativos, administrativos e judiciários, da União, dos Estados e do DF) a adoção de ações urgentes e necessárias ao afastamento das violações massivas de direitos fundamentais, assim como supervisionar a efetiva implantação.
Os três principais pressupostos para a aplicação dessa técnica são: i) situação de violação generalizada de direitos fundamentais; ii) inércia ou incapacidade reiterada e persistente das autoridades públicas em modificar a situação; e iii) a superação das transgressões exigir a atuação de uma pluralidade de autoridades. Dessa forma, entendeu-se que o sistema carcerário brasileiro se enquadra na denominação de “estado de coisas inconstitucional”, em razão da violação generalizada dos direitos fundamentais dos presos pelo Poder Público, alcançando a transgressão à dignidade da pessoa humana e ao próprio mínimo existencial.
As violações estão relacionadas, por exemplo, às condições desumanas de custódia, à precariedade das instalações, à superlotação carcerária, à inexistência de separação adequada entre os presos, a falhas estruturais em políticas públicas. Essas condições não favorecem a ressocialização, mas, pelo contrário, acabam contribuindo para o aumento da criminalidade e da violência. De acordo com o STF[28]:
Presente quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais, decorrente de falhas estruturais e falência de políticas públicas e cuja modificação depende de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária, deve o sistema penitenciário nacional ser caracterizado como “estado de coisas inconstitucional”.
A decisão do Tribunal, no exercício de seu papel contramajoritário, foi no sentido de reconhecer a banalização da prisão provisória, ideia baseada na “cultura do encarceramento”, e deferir parte dos pedidos formulados em âmbito cautelar, definindo que: a) “Estão obrigados juízes e tribunais, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos[29] e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos[30], a realizarem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados do momento da prisão”; b) “Determinar à União que libere o saldo acumulado do Fundo Penitenciário Nacional para utilização com a finalidade para a qual foi criado, abstendo-se de realizar novos contingenciamentos”; e c) “Determinar à União e aos Estados, e especificamente ao Estado de São Paulo, que encaminhem ao Supremo Tribunal Federal informações sobre a situação prisional”.
Somente no dia 04 de outubro de 2023 o pleno do STF concluiu o julgamento da ADPF nº 347/DF, sobre o “estado de coisas inconstitucional”, e, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado, para: 1) reconhecer o estado de coisas inconstitucional do sistema carcerário brasileiro; 2) determinar que juízes e tribunais: a) realizem audiências de custódia, preferencialmente de forma presencial, de modo a viabilizar o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária em até 24 horas contadas do momento da prisão; b) fundamentem a não aplicação de medidas cautelares e penas alternativas à prisão, sempre que possíveis, tendo em conta o quadro dramático do sistema carcerário; 3) ordenar a liberação e o não contingenciamento dos recursos do FUNPEN; 4) determinar a elaboração de plano nacional e de planos estaduais e distrital para a superação do estado de coisas inconstitucional, com indicadores que permitam acompanhar sua implementação; 5) estabelecer que o prazo para apresentação do plano nacional será de até 6 (seis) meses, a contar a publicação da decisão, e de até 3 anos, contados da homologação, para a sua implementação, conforme cronograma de execução a ser indicado no próprio plano; 6) estabelecer que o prazo para apresentação dos planos estaduais e distrital será de 6 (seis) meses, a contar a publicação da decisão de homologação do plano nacional pelo STF, e implementado em até 3 anos, conforme cronograma de execução a ser indicado no próprio plano local; 7) prever que a elaboração do plano nacional deverá ser efetuada, conjuntamente, pelo DMF/CNJ e pela União, em diálogo com instituições e órgãos competentes e entidades da sociedade civil, nos termos explicitados e observada a importância de não alongar excessivamente o feito; 8) explicitar que a elaboração dos planos estaduais e distrital se data pelas respectivas unidades da federação, em espeito à sua autonomia, observado, todavia, o diálogo com o DMF, a União, instituições e órgãos competentes e entidades da sociedade civil, nos moldes e em simetria ao diálogo estabelecido no plano nacional; 9) prever que em caso de impasse ou divergência na elaboração dos planos, a matéria será submetida ao STF para decisão complementar; 10) estabelecer que todos os planos deverão ser levados à homologação do Supremo Tribunal Federal, de forma a que se possa assegurar o respeito à sua decisão de mérito; 11) determinar que o monitoramento da execução dos planos seja efetuado pelo DMF/CNJ, com a supervisão necessária do STF, cabendo ao órgão provocar o Tribunal, em caso de descumprimento ou de obstáculos institucionais insuperáveis que demandem decisões específicas de sua parte; 12) estipular que os planos devem prever, entre outras, as medidas examinadas no voto, observadas as diretrizes gerais dele constantes, sendo exequíveis aquelas que vierem a ser objeto de homologação final pelo STF em segunda etapa.
Ao final, o STF firmou a seguinte tese de julgamento:
1. Há um estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário brasileiro, responsável pela violação massiva de direitos fundamentais dos presos. Tal estado de coisas demanda a atuação cooperativa das diversas autoridades, instituições e comunidade para a construção de uma solução satisfatória. 2. Diante disso, União, Estado e Distrito Federal, em conjunto com o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Conselho Nacional de Justiça (DMF/CNJ), deverão elaborar planos a serem submetidos à homologação do Supremo Tribunal Federal, nos prazos e observadas as diretrizes e finalidades expostas no presente voto, especialmente voltados para o controle da superlotação carcerária, da má qualidade das vagas existentes e da entrada e saída dos presos. 3. O CNJ realizará estudo e regulará a criação de número de varas de execução penal proporcional ao número de varas criminais e ao quantitativo de presos.
Tais determinações são decorrentes de inúmeros questionamentos perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, sobre condutas reiteradas do Estado brasileiro envolvendo violações a garantias previstas na CADH, em especial em seus artigos 7 e 8.
5.3.1. Audiências de custódia
Quanto às audiências de custódia, há previsões tanto no Pacto dos Direitos Civis e Políticos como na CADH no sentido da necessidade de apresentação imediata da pessoa privada de liberdade à autoridade competente para analisar a legalidade e necessidade da prisão. Seus principais objetivos são o não encarceramento em casos em que ele é desnecessário, pois a liberdade é a regra em nosso sistema e a sua privação é a exceção, devendo ser privilegiadas as medidas alternativas à prisão, além de apurar eventuais violações a direitos fundamentais dos custodiados, como, por exemplo, a prática de tortura por agentes estatais.
Houve grande esforço pelo Conselho Nacional de Justiça, dentro de suas funções, para a efetiva implementação das audiências de custódia, inicialmente através de projeto piloto, mesmo antes da existência de previsão legal específica a respeito. Atualmente o procedimento das audiências de custódia é disciplinado pelo artigo 310 do CPP, que prevê, em seu § 4º, o prazo de até 24 (vinte e quatro) horas após a prisão para a sua realização. O entendimento atual do STF é no sentido de que as audiências de custódia devem ser realizadas em todas as modalidades de prisão, e não apenas nos casos de flagrante.
Infelizmente, na prática, verifica-se que parcela do Poder Judiciário ainda não está convencida sobre a importância da correta utilização das audiências de custódia, para análise acerca da legalidade e necessidade das prisões, tornando tais atos meramente burocráticos. Além disso, como forma de preservar a imparcialidade, o ideal seria que o Magistrado responsável pela audiência de custódia não estivesse de maneira alguma comprometido com o posterior julgamento do mérito da causa, o que ainda não é uma realidade em nosso sistema.
Conclusão
Em apertada síntese, é possível concluir que a execução penal é regida especificamente pela LEP (Lei nº 7.210/84), que prevê sua natureza jurisdicional, mas deve estrita observância à Constituição Federal de 1988, e, especialmente, aos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos.
Nesse sentido, após decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos responsabilizando o Brasil pelas péssimas condições do sistema prisional, o Supremo Tribunal Federal entendeu configurado o “estado de coisas inconstitucional”, sendo necessárias alterações drásticas em sua infraestrutura, e fez diversas determinações, entre elas a de realização de audiências de custódia.
A Defensoria Pública atua no âmbito da execução penal como forma de garantir o efetivo acesso à Justiça aos mais necessitados, e, assim, implementar materialmente as disposições constitucionais e normas internacionais de Direitos Humanos, concretizando o princípio da dignidade humana aplicado no contexto das pessoas privadas de liberdade.
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[1] Defensor Público do Estado de São Paulo desde o ano de 2014. Graduado em Direito pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas, FMU, Brasil (2011). Com especialização em Curso de Pós-Graduação Lato Sensu pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus, FDDJ, Brasil (2013). Mestrando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
[2] MIRANDA, Jorge; SILVA, Marco Antonio Marques da (Coord). Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana. Editora Quartier Latin do Brasil. São Paulo, 2008, p. 227.
[3] Camargo, Antonio Luís Chaves. Culpabilidade e Reprovabilidade Penal. São Paulo: Sugestões Literárias, 1994, p. 12 e 31.
[4] BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo – os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 2ª edição. Editora Saraiva, 2010, p. 204.
[5] SILVA, Marco Antonio Marques da (Coord.). Processo Penal e Garantias Constitucionais. Editora Quartier Latin do Brasil. São Paulo, 2006, p. 491.
[6] BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo – os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 2ª edição. Editora Saraiva, 2010.
[7] Embora não seja esse o entendimento adotado pelo STF sobre a matéria, já que, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 466.343-1/SP em 03 de dezembro de 2008, a Corte estabeleceu a seguinte distinção: i) os tratados e convenções internacionais que versam sobre direitos humanos, aprovados em cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por 3/5 dos votos dos respectivos membros, são equivalentes às emendas constitucionais (art. 5º, § 3º, da CF/88); ii) os que versam sobre direitos humanos, mas foram aprovados pelo procedimento ordinário, possuem status supralegal, encontrando-se entre as leis e a Constituição; e iii) os que não tratam sobre direitos humanos ingressam no ordenamento jurídico brasileiro com força de lei ordinária.
[8] Fonte: www.corteidh.or.cr. Acesso em 12 de junho de 2024.
[9] CONCI, Luiz Guilherme Arcaro; PEREIRA, Claudio José Langroiva; RIQUERT, Fabián Luis (Coord.). Impacto da Jurisprudência Interamericana nas Garantias Processuais. Um Diálogo Argentina-Brasil. Editora Quartier Latin. São Paulo, 2022, p. 296.
[10] GIACOMOLLI, Nereu José. O devido processo penal: abordagem conforme a Constituição Federal e o Pacto de São José da Costa Rica. 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2015, p. 12.
[11] GIACOMOLLI, Nereu José. O devido processo penal: abordagem conforme a Constituição Federal e o Pacto de São José da Costa Rica. 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2015, p. 89.
[12] Fonte: https://www.corteidh.or.cr/que_es_la_corte.cfm?lang=pt. Acesso em 12 de junho de 2024.
[13] Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Aprovado pela Comissão em seu 137º período de sessões, realizado de 28 de outubro a 13 de novembro de 2009; e modificado em 02 de setembro de 2011 e em seu 147º período de sessões, celebrado de 08 a 22 de março de 2013 para sua entrada em vigor em 01 de agosto de 2013. Fonte: https://www.oas.org/pt/cidh/jsForm/?File=/pt/cidh/mandato/basicos/reglamentocidh.asp. Acesso em 15 de maio de 2024.
[14] CONCI, Luiz Guilherme Arcaro; PEREIRA, Claudio José Langroiva; RIQUERT, Fabián Luis (Coord.). O direito do acusado ao recurso contra decisão condenatória e os paradigmas da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Impacto da Jurisprudência Interamericana nas Garantias Processuais. Um Diálogo Argentina-Brasil. Editora Quartier Latin. São Paulo, 2022, p. 296 e 311.
[15] CONCI, Luiz Guilherme Arcaro; FARACO, Marina. O bloco de constitucionalidade convencionalizado como paradigma contemporâneo da jurisdição constitucional brasileira. In: CLÈVE, Clèmerson Merlin; SCHIER, Paulo Ricardo; LORENZETTO, Bruno Meneses. Jurisdição constitucional em perspectiva: Estudos em comemoração aos 20 anos da Lei 9.868/1999. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 101.
[16] PESSOA, Manoela Fleck de Paula; SANTIAGO, Nestor Eduardo Araruna. O sistema interamericano de direitos humanos e as medidas de urgência no sistema prisional brasileiro: a perspectiva garantista na proteção dos direitos humanos. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito (RECHTD). Maio-agosto 2021.
[17] Fonte: https://www.corteidh.or.cr/medidas_provisionales.cfm. Acesso em 03 de junho de 2024.
[18] Fonte: https://www.corteidh.or.cr/docs/medidas/asuntos_unidad_se_02_por.pdf. Acesso em 03 de junho de 2024.
[19] Fonte: https://www.ohchr.org/sites/default/files/Documents/HRBodies/HRCouncil/AdvisoryCom/Session19/A_HRC_AC_19_CRP_1.docx
[20] SILVA, Marco Antonio Marques da. Acesso à Justiça Penal e Estado Democrático de Direito. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001, p. 15.
[21] JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. Finalidades da Pena. Editora Manole. São Paulo, 2004, p. 21.
[22] SILVA, Marco Antonio Marques da (Coord.). Política criminal e os fins do Direito Penal no Estado Social e Democrático de Direito. Processo Penal e Garantias Constitucionais. Editora Quartier Latin do Brasil. São Paulo, 2006, p. 108.
[23] Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos (Regras de Nelson Mandela). Fonte: https://www.unodc.org/documents/justice-and-prison-reform/Nelson_Mandela_Rules-P-ebook.pdf. Acesso em 15 de maio de 2024.
[24] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9ª Edição. Livraria do Advogado editora, 2011.
[25] Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Exposição de Motivos nº 213, de 09 de maio de 1983 (Do Senhor Ministro de Estado da Justiça). Publicação: Diário do Congresso Nacional – Seção 1 – Suplemento B – 1/7/1983, Página 017 (Exposição de Motivos).
[26] Fonte: https://www.defensoria.sp.def.br/nucleos-especializados/pagina-inicial-nucleos-especializados/situacao-carceraria. Acesso em 03 de junho de 2024.
[27] Fonte: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4783560.
[28] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347/DF. Relator: Min. Marco Aurélio. Julgamento: 04/10/2023. Publicação: 19/12/2023.
[29] “Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência e a todos os atos do processo, se necessário for, para a execução da sentença”.
[30] “Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo”.