FALTA DE CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NA TUTELA PENAL DOS CRIMES CONTRA OS ANIMAIS NO ESTADO DA PARAÍBA

FALTA DE CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NA TUTELA PENAL DOS CRIMES CONTRA OS ANIMAIS NO ESTADO DA PARAÍBA

14 de agosto de 2022 Off Por Cognitio Juris

THE LACK OF CONTROL OF THE PUBLIC ADMINISTRATION IN THE CRIMINAL PROTECTION OF CRIMES AGAINST ANIMALS IN THE STATE OF PARAÍBA

Cognitio Juris
Ano XII – Número 42 – Edição Especial – Agosto de 2022
ISSN 2236-3009
Autores:
Ana Caroline Silva Gomes
Lara Sanábria Viana

RESUMO: Este artigo tem por objetivo analisar, a positivação do Direito Animal e todo o seu desenvolvimento histórico-constitucional, penal, e jurisprudencial no Brasil e no estado da Paraíba, estabelecendo como marco inicial a sua autonomia que o diferencia do direito ambiental, insculpido na parte final do inciso VII do §1º do art. 225 da Constituição Republicana de 1988, e positivado na Lei Estadual 11.140/08, denominada como Código de Ética e Bem-estar Animal. Da Paraíba, apontando, a atuação da administração pública no que se refere o cumprimento da tutela penal, civil e administrativa, nos crimes contra os animais. Para o desenvolvimento do artigo, utiliza-se uma abordagem qualitativa com procedimentos e técnicas de pesquisa bibliográfico documental, com método Indutivo e procedimento histórico, com a utilização de livros, artigos, leis, doutrinas e jurisprudências. Assim sendo, conclui-se que este é um é um excelente instrumento de pesquisa no cumprimento do controle que a administração pública realiza durante a positivação e a efetivação das normas de defesa / proteção animal.

Palavras-chave: Administração pública. Tutela penal. Proteção animal na paraíba. Direito animal no brasil.

ABSTRACT: This article aims to analyze the positivation of Animal Law and all its historical, constitutional, criminal and jurisprudential development in Brazil and in the state of Paraíba, establishing as an initial mark its autonomy that distinguishes it from Environmental Law, inserted in the final part of subsection VII of §1º of the art. 225 of the Republican Constitution of 1988 and found in the State Law 11.140/08, known as Code of Ethics and Animal Welfare of Paraíba, demonstrating the Public Administration performance in face of the criminal, civil and administrative protection in crimes against animals. For the development of the article, a qualitative approach is used with procedures and techniques of bibliographic documentary research, with inductive method and historical procedure, with the use of books, articles, laws, doctrines and jurisprudence. Therefore, it is concluded that this is an excellent research instrument in the fulfillment of the control that the public administration carries through during the positivation and the effectiveness of the animal protection laws.

Keywords: Public administration. Criminal protection. Animal protection in Paraíba. Animal laws in Brazil

INTRODUÇÃO

No Brasil, a atuação administrativa está condicionada aos princípios expressos no art.37 da Constituição brasileira, pois o poder de fiscalização e correção que a administração deve exercer em sua própria atuação, estão firmados sob os aspectos de legalidade e mérito, por iniciativa própria ou provocação, dever este seja em qualquer esfera, federal, estadual ou municipal. No plano legal essa responsabilização do Poder Público, se consolida através de Leis, decretos, e jurisprudência sendo as normas gerais do sistema de proteção dos direitos dos animais, muitos considerados como o marco histórico da autonomia do Direito animal e da sua separação epistemológica em relação ao Direito Ambiental.

O presente artigo versa sobre a importância do controle da administração pública no que se refere aos crimes contra os animais, destacados no plano constitucional, na singular regra da proibição da crueldade prevista na Constituição Brasileira de 1988, como também na Lei de Crimes ambientais, caracterizando a tipificação dos crimes na parte processual penal, e sem ignorar os códigos e declarações de defesa animal, sejam internacionais ou estaduais.

A problemática que envolve a presente monografia é a responsabilização do Poder público na efetivação das Leis do ordenamento jurídico no que se refere ao cuidado, respeito, educação da população, mostrando para humanidade que eles “ animais tratados como coisa” também possuem natureza biológica emocional, são seres que sentem dor, medo, se movem por impulso próprio, e são passiveis de qualquer sensação emocional derivado da sua senciência.

A metodologia bibliográfica documental terá como objeto fazer um levantamento histórico constitucional, acerca da Tutela jurídica da proteção animal, desde a sua positivação na esfera federal, contrapondo com a legislação estadual de um único estado: o da PB, que segundo a opinião de Vicente de Paula “onde se tem a legislação mais avançada do Brasil e sem igual no mundo em termos de direitos fundamentais dos animais (JUNIOR, 2018, p.2)

Desta forma aparece para o ordenamento jurídico uma realidade que necessita ser posta em pauta, e por este motivo surge a seguinte indagação problemática: “ Se o estado da paraíba, segundo o autor citado, possui a legislação mais avançada do país, porque a mesma permanece ineficaz?”

Para este intento, o trabalho estrutura-se em seis seções, sendo a primeira a introdução e a última as considerações finais. A segunda seção abordará a caminhada histórica de defesa do direito animal evidenciando a diferenciação da proteção ambiental, onde o animal é caracterizado como componente da fauna e da biodiversidade, diferentemente da proteção animal, onde cada um importa independentemente da sua espécie, logo após a próxima seção trará a tipificação dos crimes ambientais e a imposição das sanções administrativas. Em seguida, a quarta apresentará a defesa dos animais na legislação estadual paraibana, trazendo em seu Código Estadual e no Código de ética e Bem-estar animal a tutela protetiva específica para cada animal não- humano. Por fim, a última falará do grande avanço do Direito animal na esfera Federal, com a Lei Sanção, que altera a lei de Crimes Ambientais, na qualificação, tipificação e caracterização dos crimes contra cães e gatos domésticos.

Por ser um tema recente e polêmico, ainda há muita coisa a se fazer em defesa dos animais, de forma municipal, estadual e federal, para isso as autoridades precisam perceber que os animais são sujeitos de direitos, que necessitam da efetivação da proteção do poder público, que levem em

consideração as necessidades e interesses básicos dos animais, sendo a melhor maneira para se alcançar a igualdade de tratamento entre todos os seres vivos que habitam a Terra, que os tutores sejam conscientizados desta importância, e que os infratores respondam criminalmente por cada ato de crueldade contra os mesmos.

O DIREITO ANIMAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

A Proteção animal no Brasil nasceu com a Constituição Federal de 1988. Foi esse texto que positivou de forma constitucional a regra de proibição da crueldade, com reconhecimento do direito fundamental a dignidade animal. Antes dela, nenhuma outra Constituição Brasileira tratou da questão animal.

Segundo o art. 225, § 1º, VII, incumbe ao Poder Público “proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade” Percebemos que a parte final desse inciso constitucional consagra a regra da proibição da crueldade animal

A proibição das práticas que submetem os animais a crueldade é comando constitucional, diverso do dever do poder público na proteção da Fauna e da Flora, pois as práticas de crueldade colocam em risco a sua função ecológica. Disso deriva a separação, ainda não absoluta do Direito animal e do Direito ambiental.

No Direito Animal Constitucional, o animal não-humano é indivíduo; no Direito Ambiental Constitucional, o animal não-humano é componente da fauna e da biodiversidade, elemento da Natureza, com relevância para a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Pode-se alegar em sentido contrário, que a regra da proibição da crueldade contra animais está inserida no capítulo constitucional do meio ambiente, de maneira que sua interpretação deverá ser feita em consonância com os demais componentes do art. 225, que disciplinam o direito fundamental ao equilíbrio ecológico, bem de uso comum do povo.

Nessa linha de pensamento, o Direito Animal estaria absorvido pelo Direito Ambiental ou, mais radicalmente, não existiria na Constituição, essa interpretação atualmente é a existente em alguns estados brasileiros, que levam mais em conta a normativa, do que a sua interpretação jurídica.

Para o Direito Animal, cada animal não-humano interessa, de índole individual, decorrente da sua capacidade de sentir dor, ínsita aos seres vivos que compõem o reino animal, independentemente da sua função ou influência ecológica, esteja isolado ou em grupo, seja silvestre, seja doméstico ou domesticado, por causa da sua individualidade peculiar de ser vivo que sofre e que, por isso, merece respeito e consideração.

O fato de um ser humano maltratar, ferir, abusar sexualmente ou mutilar um animal não-humano pouco importa para a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Esse fato viola a dignidade individual do animal submetido à crueldade e não a sua função ecológica.

O Supremo Tribunal Federal (STF), guardião da adequada interpretação constitucional, já teve a oportunidade de manifestar o entendimento sobre a autonomia da regra da proibição da crueldade e sua desconexão com a preservação do meio ambiente.

No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4983 (ADIn da vaquejada), no final de 2016, o STF, por meio do voto-vista vencedor do Ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que “A vedação da crueldade contra animais na

Constituição Federal deve ser considerada uma norma autônoma, de modo que sua proteção não se dê unicamente em razão de uma função ecológica ou preservacionista, a fim de que os animais não sejam reduzidos à mera condição de elementos do meio ambiente. Só assim reconheceremos a essa vedação o valor eminentemente moral que o constituinte lhe conferiu ao propô-la em benefício dos animais sencientes. Esse valor moral está na declaração de que o sofrimento animal importa por si só, independentemente do equilíbrio do meio ambiente, da sua função ecológica ou de sua importância para a preservação de sua espécie. ”

O Direito Animal, portanto, está na Constituição. A sua autonomia em relação ao Direito Ambiental está presente na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, com todas as suas características fundantes. Reconhece-se que o sofrimento animal importa por si só, o que revela a dignidade animal e o seu direito fundamental à existência digna.

Também se pode objetar que ainda que se reconheça a proteção constitucional da dignidade animal, positivada a partir da regra da proibição da crueldade, a própria Constituição permite a exploração econômica dos animais ao catalogar, dentre as competências administrativas da União, dos Estados e dos Municípios, o fomento à produção agropecuária (art. 23, VIII, Constituição) e ao incluir, dentro da política agrícola constitucional, o planejamento agrícola das atividades agropecuárias e pesqueiras (art. 187, §1º, Constituição).

Em decorrência dessas disposições permissivas da Carta Magna, os animais continuariam a ostentar, mesmo na atual ordem constitucional, a natureza jurídica de coisas ou bens, mesmo que de relevância ambiental.

Como todo ramo jurídico, o Direito Animal tem seu horizonte utópico: a abolição de todas as formas de exploração humana sobre os animais. No entanto, também conhece seus limites contemporâneos. Se o ordenamento constitucional não alberga o abolicionismo animal, o Direito Animal trabalha nas fronteiras das suas possibilidades para garantir a existência digna dos animais submetidos à pecuária e à exploração industrial.

Ainda que não se possa garantir, do plano legislativo, o direito à vida dos animais submetidos às explorações pecuária e pesqueira, isso não lhes retira a dignidade própria como indivíduos que sofrem, nem o seu direito fundamental à existência digna, posta a salvo dos meios cruéis utilizados no processo produtivo.

Permanecem como sujeitos do direito fundamental à existência digna, muito embora o ordenamento constitucional possa não lhes outorgar o direito fundamental à vida. O fato de a Constituição permitir – e até fomentar – a pecuária e a pesca não faz retroceder seu avanço ético em reconhecer os animais não-humanos como sujeitos sencientes – e não como meras coisas ou bens sujeitos à arbitrária disposição humana.

Ademais, podemos notar, a permissão constitucional para a atividade pecuária e pesqueira como suposto fundamento para rebaixar os animais não- humanos ao status de coisa, não pode ser evocado para uma faixa significativa de espécies animais, não submetidos à exploração econômica.

Como o direito fundamental animal à existência digna é direito individual, atribuível a cada animal em si, constitui-se em cláusula constitucional pétrea, não podendo ser objeto de deliberação qualquer proposta de emenda constitucional tendente a aboli-lo (art. 60, §4º, IV, Constituição).

DIFERENÇA DE BEM-ESTAR ANIMAL E DIREITOS DOS ANIMAIS

O bem-estar animal é um estudo que engloba tanto o bem-estar físico, quanto mental do animal, ou seja, é um conhecimento que examina o bem-estar dos animais, levando em consideração o sentimento do animal e a sua perspectiva, e não a perspectiva humana.

Para isso, segundo Monica Grimaldi e Guilherme Durante Cruz, “ tal estudo possui três concepções: sentimentos, comportamentos, fisiologia e particularidades de sua vida natural. Para compreender as concepções acima, são analisados todos os hábitos do animal, suas necessidades, medo, estresse, sofrimento, bem como limites de adaptação. É analisado ainda, o contexto em que o animal se encontra, como por exemplo se é animal domesticado, animal de produção, animal em zoológico ou animal usado em laboratórios. Feita tal análise, levando em conta diferentes circunstâncias, é possível concluir a condição de bem-estar em que o animal se encontra, assim como qual a ação necessária para conter ou findar com determinado sofrimento. ”

Embora a ciência não seja avançada o suficiente ao ponto de detectar os sentimentos mentais dos animais com precisão, a etologia, fisiologia, anatomia e cognição, são sinais que facilitam o entendimento do pensamento anima.

Outro enfoque que deve ser ponderado, de acordo com Monica Grimaldi e Guilherme Durante Cruz, “ quando falamos em bem-estar animal é a ‘’natureza’’ animal, isto é, a liberdade dos animais se comportarem de forma natural. Porém, esse é um ponto que não pode ser levado em consideração totalmente, uma vez que quando criados em ambientes que não sejam os naturais, podem não ter grande pertinência na análise do animal. Assim, o ideal é analisar a saúde e se está sendo respeitado seu livre arbítrio. Além disso, para analisar todas as circunstâncias, há princípios que norteiam o tema bem-estar animal, especialmente o bem-estar daqueles animais que são utilizados com propósitos exploratórios”.

Monica Grimaldi e Guilherme Durante Cruz, enfatizam em seu livro que são dois os princípios norteadores do Bem Estar animal: Princípio das Cinco Liberdades Essenciais aos Animais e Princípio dos 3Rs (Três Erres). O Princípio das Cinco Liberdades significa, que: Todos os animais devem: 1) Ser livres de medo e estresse; 2)Ser livres de fome e sede; 3) Ser libres de desconforto; 4) Ser livre de dor e doenças; e 5) Ter liberdade para expressar seu comportamento natural.

O Princípio dos 3Rs é denominado dessa forma, em razão das iniciais em inglês de seus principais propósitos: Redução (Reduction), Refinamento Refinement) e Substituição (Replacement). Tal princípio se refere aos animais para experimentação em laboratórios, bem como resguarda-lhes os seguintes direitos: 1) Redução do número de animais utilizados; 2) Substituição por alternativas sem animais. Como por exemplo, robôs que simulam as cobaias; e

3) Refinamento – alterando protocolos de experiências para diminuição de dor e sofrimento.

Tais princípios são de suma importância, uma vez que são utilizados para fundamentar legislações específicas em países da União Europeia, acerca da proteção aos animais de produção e animais utilizados em laboratórios.

Assim, conclui-se que o bem-estar animal é uma ciência que leva em consideração as necessidades e sentimentos dos animais não somente na visão dos humanos, mas sobretudo na visão dos próprios animais, a fim de que seja preservada sua qualidade de vida em primeiro plano, inclusive no ramo de experimento em animais.

Salienta-se que muito embora haja princípios que norteiam o experimento em animais e os transformem em experiências mais éticas, responsáveis e

moralmente aceitas pelo público, o posicionamento que prevalece neste trabalho é o de que vida animal nenhuma deve ser minimizada e explorada ao bel-prazer humano, uma vez que possuem o mesmo valor, merecendo respeito como qualquer outro ser.

No que concerne ao direito dos animais, entende-se: O direito dos animais baseia-se em tratar seres sencientes (capazes de sentirem) com respeito e dignidade. E está amplamente ligado ao direito Moral. O Direito Moral esmera- se com o correto e incorreto, com o que é justo e o que é injusto. Assim, em virtude de todo animal sentir as mesmas necessidades que os seres humanos, como frio, fome, sede, calor, alegria, tristeza, dor, etc., estes devem ser bem tratados, respeitados pelos humanos e protegidos, a fim de que tenham autonomia para seguirem sua natureza de forma totalmente livre.

Para que tais direitos sejam levados em consideração é necessária a criação de leis. Assim, o direito dos animais, é um conceito que reconhece que os animais devem ser livres de qualquer ação exploradora do homem, podendo viver com independência, e em outras palavras, escolherem para onde e quando querem ir, sem interferência humana.

Dessa forma, conforme apontado neste tópico, na medida que o bem- estar animal é uma ciência, o direito dos animais é um conjunto de leis que viabiliza a proteção animal. À vista disso, o bem-estar animal complementa o direito dos animais e o direito dos animais complementa o bem-estar animal, de forma mútua. Assim, ambos são estudos que objetivam alcançar o cenário ideal, onde o homem e o animal coexistam em harmonia.

O DIREITO ANIMAL NA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS

Antes de tudo merece registro um diploma legal precedente da Lei de Crimes ambientais, ainda hoje dotado de vigência, mesmo que parcial, pela sua organicidade, generalidade e perspectiva zoocêntrica, é considerado a primeira lei do Direito Animal brasileiro trata-se do Decreto 24.645, de 10 de julho de 1934, editado pelo governo revolucionário de Getúlio Vargas, ainda na vigência da primeira Constituição republicana de 1891.

O Decreto 24.645, 10 de julho de 1934, na sua vigência original, constituiu-se no verdadeiro estatuto jurídico geral dos animais. No seu artigo de abertura estabeleceu que todos os animais existentes no País são tutelados pelo Estado. O Estado brasileiro, naquele momento, chamou para si a responsabilidade pela proteção dos animais, considerados, para esse fim, como “todo ser irracional, quadrúpede ou bípede, doméstico ou selvagem, exceto os daninhos” (art. 17) (BRASIL, 1934).

Esse estatuto geral dos animais foi o primeiro diploma legal de Direito Animal porque disciplinou a tutela jurídica dos animais considerando-os como um fim em si mesmos, capazes de sofrer e sentir dor e, portanto, dotados de dignidade. Não há qualquer referência à importância ambiental e ecológica dos animais a serem tutelados.

Todos os animais existentes são tutelados. Facilmente se extrai desse estatuto que a sua função primordial foi impedir as práticas humanas cruéis contra animais, caracterizando-as como crime de maus-tratos, com farta tipologia de fatos e situações assim consideradas.

Decreto 24.645/1934 positivou, dessa maneira, a primeira regra geral da proibição da crueldade do Direito brasileiro. Mas, a importância mais significativa do Decreto 24.645/1934 para o Direito Animal contemporâneo é outra. Essa lei

considerou especialmente a tutela jurisdicional dos animais, seja pela repressão penal, seja pelas ações civis (art. 2º, caput, parte final).

Cada animal, vítima, ou potencial vítima, de maus-tratos, passou a gozar do direito de estar em juízo. Os animais passaram a poder ser assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público, pelos seus substitutos legais e pelos membros das sociedades protetoras de animais (art. 2º, §3º).

Em outras palavras, inequivocamente, o Decreto 24.645/1934 conferiu capacidade de ser parte aos animais, estabelecendo, no plano legal, seu status de sujeitos de direitos afinal, não haveria sentido algum em conferir capacidade de ser parte a quem não desfrutasse de direitos a serem defendidos judicialmente.

Os animais, enquanto sujeitos do direito à existência digna, têm capacidade de ser parte em juízo, ainda que não tenham capacidade processual, suprida pela atuação do Ministério Público, dos substitutos legais do animal (seus tutores ou guardiões, por exemplo), além das organizações não- governamentais destinadas à proteção dos animais.

Mesmo que a legislação civil brasileira não confira, expressamente, capacidade civil aos animais, ou status jurídico de pessoas, a capacidade de ser parte a eles atribuída pelo Decreto 24.645/1934 já lhes posiciona, dentro do direito positivo, como sujeitos de direitos passíveis de tutela jurisdicional. Em alguns estados do país, como Minas Gerais (MG), Paraná (PR), São Paulo (SP) e Paraíba (PB), já foi reconhecido o direito aos animais serem sujeito das ações penais, partes terciárias, onde pleiteiam direito próprio

Sabe-se que a capacidade judiciária não depende da personalidade civil. Entes despersonalizados têm direitos e podem defender esses direitos em juízo, por meio de seus representantes legais. Os animais, muito embora ainda não contem personalidade civil positivada, são titulares do direito fundamental à existência digna, derivado da regra constitucional da proibição da crueldade, e podem ir a juízo, por meio do Ministério Público, de seus substitutos legais ou das associações de defesa animal, conforme regra, positiva e vigente, do art. 2º,

§3º do Decreto 24.645/1934.

Mesmo que a repressão penal à crueldade e aos maus-tratos a animais tenha sofrido alterações legislativas posteriores, especialmente por intermédio da Lei de Contravenções Penais e da atual Lei dos Crimes Ambientais, o Decreto 24.645/1934 mantém, no âmbito penal, sua relevância para o preenchimento normativo das condutas que podem, efetivamente, caracterizar maus-tratos.

A tipologia de práticas cruéis do Decreto 24.645/1934, ainda que não mais represente as modalidades criminosas da atualidade, pode servir como elemento interpretativo para os tipos penais mais abertos e genéricos existentes hoje. De qualquer maneira, mesmo que se considere a completa revogação dos tipos penais contidos no Decreto 24.645/1934, esse estatuto jurídico ainda permanece vigendo, com seu status de lei ordinária, a orientar as ações civis que tenham por objeto a prevenção ou repressão de práticas cruéis contra animais (art. 2º, parte final, Decreto 24.645/1934), legitimando os próprios animais a estarem em juízo por meio do Ministério Público, dos seus substitutos legais ou das associações de proteção animal.

Segundo o magistério do Fernando Araújo, “a óbvia incapacidade de exercício, pelos animais, dos direitos que convencionalmente lhes sejam atribuídos não obsta a que estes direitos sejam sistematicamente exercidos por representantes não-núncios, precisamente da mesma forma que o são para os incapazes humanos.”

No plano legislativo, como diploma legal geral do Direito Animal, ao lado do Decreto 24.645/1934, encontra-se o art. 32 da Lei 9.605/1998, que tipifica, na atualidade, o crime de maus-tratos contra animais. Esse artigo da Lei de Crimes Ambientais brasileira é uma regra de Direito Animal – e não de Direito Ambiental

– exatamente porque estabelece condutas humanas proibidas por violarem a dignidade individual do animal não-humano.

Não é um crime contra o meio ambiente, mas um crime contra o animal- indivíduo. Mais do que estabelecer sanções penais a quem comete o crime contra os direitos animais, o art. 32 da Lei 9.605/1998 densifica a regra constitucional da proibição da crueldade, especificando práticas consideradas cruéis e, portanto, proibidas. É prática cruel toda conduta consistente em abusar, maltratar, ferir ou mutilar animais (art. 32, caput); da mesma forma, é prática cruel toda experimentação dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos (art. 32, §1º); ainda, é prática cruel matar animais com abuso, maus-tratos, ferimento, mutilação ou experimentação dolorosa ou cruel quando existirem recursos alternativos (art. 32, §2º).

O crime de maus tratos tipificado no artigo 32 da lei 9.605/98, consolidado no capítulo VI, “dos crimes contra o meio ambiente”, seção I – dos crimes contra a fauna”, nos seguintes termos:

Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.

§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.

§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.(BRASIL, 1998)

Como se pode perceber, embora o tipo penal do mencionado artigo seja popularmente conhecido como “crime de maus-tratos”, trata-se na verdade de infração de menor potencial ofensivo, haja vista ser a conduta apenada com detenção de três meses a um ano, aplicada cumulativamente com multa, a ser calculada segundo critérios do Código Penal (art. 49).

Ressalte-se, também, que o tipo objetivo é composto por diversas condutas, não sendo limitado apenas à pratica de maus-tratos, em que pese seja apenas dessa forma comumente denominado.

Classifica-se doutrinariamente como sendo crime comum, comissivo de ação múltipla, material, de dano e plurissubsistente. Qualquer um pode ser autor do crime em questão, e só pode ser praticado por conduta ativa, não sendo possível a configuração do crime por ato omissivo.

Crime material, pois exige a ocorrência de um resultado. O resultado material do crime é de dano, porquanto requer uma lesão ao bem jurídico tutelado, não bastando para sua configuração a mera exposição do animal ao perigo.

A doutrina não é pacífica no que diz respeito à admissão da tentativa. Parece mais correto o entendimento de que não se admite, à semelhança do delito de lesões corporais dolosas, conforme observa Luís Paulo Sirvinskas ao tratar do assunto.

No §1º do artigo em estudo verifica-se a existência do elemento subjetivo do injusto, pois tal dispositivo exige que a atuação se dê para fins didáticos ou científicos. Nessa hipótese, presente também o elemento normativo, tendo em vista que apenas se caracteriza o crime quando existirem recursos alternativos.

Não havendo recursos alternativos, não há que se falar na pratica do crime previsto no §1º.

O bem jurídico tutelado é o ambiente, tendo como objeto material o animal silvestre, doméstico, domesticado, nativo ou exótico.

Animais domésticos são aqueles que convivem harmoniosamente com o homem, enquanto o conjunto de animais domesticados é formado por espécies que são originariamente encontradas na natureza, mas adaptaram-se ao convívio com o ser humano, de modo a converterem-se em domésticos.

Nativos são os animais típicos de determinada região, enquanto exóticos são animais “provenientes de outro local que não aquele em que se encontram”. Por fim, a definição do que vem a ser fauna silvestre encontra-se expressa no

§3º do artigo 29 da lei 9.605/95, nos referidos termos (BRASIL, 1995):

São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras

O tipo objetivo é praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir, mutilar e realizar experiência cruel eu dolorosa em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. O Decreto nº 24.645 de 1994 traz em seu artigo 3º a definição do que se considera por maus-tratos. Nicolao Dino de Castro e Costa Neto diferencia o ato de maus-tratos do de abuso da seguinte forma:

Praticar ato de abuso significa exagerar nas atividades impostas ao animal, exigindo mais do que o nível suportado pelo espécime (…) Maus tratos, dessa forma, diferenciam-se do abuso, porque aqueles se caracterizam pelo exagero nos meios utilizados, e este caracteriza-se pela privação da assistência, da alimentação, e pela imposição de perigo à vida e à saúde.

Ainda, traz as seguintes definição para os atos de ferir e mutilar: Ferir é ofender fisicamente, quer por meio de instrumento contundente, quer cortante, quer perfuro-cortante ou ferfuro-contundente. Tal ação representa a correspondente para a fauna do delito de lesão corporal existente para o ser humano.

A mutilação representa a seção de parte do corpo do animal ou perda de um membro ou função Antes do advento da lei 9.605, o crime de maus tratos era disciplinado pela Lei das Contravenções Penais, em seu artigo 64, com a seguinte redação:

Art. 64. Tratar animal com crueldade ou submetê-lo a trabalho excessivo:

Pena – prisão simples, de dez dias a um mês, ou multa, de cem a quinhentos mil réis.

§ 1º Na mesma pena incorre aquele que, embora para fins didáticos ou científicos, realiza em lugar público ou exposto ao publico, experiência dolorosa ou cruel em animal vivo.

§ 2º Aplica-se a pena com aumento de metade, se o animal é submetido a trabalho excessivo ou tratado com crueldade, em exibição ou espetáculo público. (BRASIL, 1941)

A questão era tratada com enorme desdém, pois não obstante a inexpressiva pena atribuída ao tipo, esta poderia ser substituída pela pena de multa. Com acerto, a nova lei alterou a cominação da pena prevista e aumentou a abrangência de seu tipo penal.

Observe-se que antes, de acordo com a disposição do art. 64 da lei de contravenções penais, a submissão de animais a experiências dolorosas para

fins científicos ou didáticos somente era considerada parte do tipo penal se a experiência fosse realizada em local público, condição não mais existente com a atual redação.

Outra novidade introduzida pela lei dos crimes ambientais foi que a morte do animal submetido à pratica de maus tratos se tornou causa de aumento de pena. A lei 9.605 trouxe grandes avanços no que diz respeito à defesa dos animais, sendo este o diploma que tratou da proteção à fauna com maior fidelidade ao texto republicano até o presente momento.

Embora o artigo 32 da referida lei esteja em consonância com a norma constitucional que veda expressamente a pratica de atos que submetam animais a crueldade, seu conteúdo punitivo ainda se mostra insatisfatório à proteção do bem jurídico em questão, visto que práticas de maus-tratos aos animais continuam ocorrendo de modo corriqueiro.

Em que pese grande parte da população reagir com repulsa a atos de crueldade contra animais e repudiar esse tipo de comportamento, ainda há uma parcela populacional que enxerga os componentes da fauna brasileira como meros objetos, cuja existência se justifica apenas quando ensejar alguma utilidade para o ser humano. Ressalte-se que a fauna é representada não somente por animais nativos e exóticos, mas também por animais domésticos e domesticados.

É nesse contexto de amesquinhamento da vida não-humana que se desenvolvem praticas tenebrosas de tortura animal, que de tão corriqueiras, são vistas por alguns com normalidade, e chega- se ao absurdo de propor que se trata de uma questão cultural, e que, portanto, não podem ser vedadas.

Utilizar como argumento para a justificação desse tipo de atrocidade o aspecto cultural é um despropósito. É justamente em decorrência da cultura humana que a prática de atos cruéis contra animais passou a ser vedada e sancionada.

Muitos autores entendem que a submissão de animais à crueldade é vedada para proteger, em primeiro plano, o próprio homem e sua saúde psíquica. Isso porque a ideia de ver um animal sofrendo por práticas de crueldade humana causa desconforto ao homem.

Seja qual for o motivo da previsão, o fato é que possui natureza constitucional e deve ser respeitada. Devido à relevância que assume, é necessário que se adote medidas capazes de efetivamente proteger o bem jurídico tutelado.

A lei de crimes ambientais não vem sendo suficiente para assegurar a vedação constitucionalmente prevista, de forma que se torna imprescindível maior rigorosidade no tratamento de delitos de ordem ambiental, bem como adoção de políticas públicas que visem a conscientização populacional.

O DIREITO ANIMAL NA LEGISLAÇÃO ESTADUAL PARAIBANA

Segundo o artigo 5° do Código paraibano, todo animal tem o direito: I – de ter as suas existências física e psíquica respeitadas; II – de receber tratamento digno e essencial à sadia qualidade de vida; III – a um abrigo capaz de protegê- lo da chuva, do frio, do vento e do sol, com espaço suficiente para se deitar e se virar; IV – de receber cuidados veterinários em caso de doença, ferimento ou danos psíquicos experimentados; V – a um limite razoável de tempo e intensidade de trabalho, a uma alimentação adequada e a um repouso reparador.

Esse catálogo mínimo de direitos fundamentais não é reservado apenas para cães e gatos, nem mesmo apenas para animais vertebrados, mas inclui os invertebrados, como polvos e caranguejos, muito além do que, originalmente, o Decreto 24.645, de 10 de julho de 1934, editado por Getúlio Vargas, o primeiro estatuto brasileiro dos animais, poderia conceber.

Após a realização de nove Audiências Públicas, em um incisivo processo democrático, e que contou com a presença e participação de parte da sociedade, de entidades e de órgãos ligados à proteção animal, e de outros interessados, restou debatido e aperfeiçoado o texto-base feito pelo Núcleo de Extensão em Justiça Ambiental da UFPB. Depois de uma tramitação de quase dois anos na Assembleia Legislativa da Paraíba, o Projeto de Lei 934/2016 transformou-se na Lei 11.140/2018.

O Código de Direito e Bem-Estar Animal, instituído pela Lei Estadual 11.140, de 8 de junho de 2018, com entrada em vigor no dia 7 de outubro de 2018,oriundo do Projeto de Lei 934, distribuído em 7 de junho de 2016, de autoria do Deputado Estadual Antonio Hervázio Bezerra Cavalcanti (PSB), aprovado por unanimidade, e com veto parcial, apresentado pelo governador do estado na época enfatiza a classificação dos animais tutelados quanto a tipificação dos diversos crimes existentes em sua sociedade.

O texto-base do anteprojeto que deu origem à tramitação legislativa tomou como base a Declaração Universal dos Direitos dos Animais. da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), positivada em Bruxelas- Bélgica, no dia 27 de janeiro de 1978, como também a Declaração de Universidade de Cambridge, no Reino Unido, No dia 7 de julho de 2012, ambas declarações em defesa ao bem estar animal.

Escrito pelo professor Francisco José Garcia Figueiredo, da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), advogado militante na defesa dos direitos animais e presidente/fundador da Comissão de Direito Animal da (Ordem dos Advogados do Brasil seccional Paraíba) OAB-PB, reconhecido, nacionalmente, como uma das mais importantes autoridades em Direito Animal do Brasil.

Trata-se, da primeira lei sem sombra de dúvidas, segundo Vicente de Paula “a mais avançada do Brasil e sem igual no mundo em termos de direitos dos animais, precisamente é a primeira lei brasileira a catalogar, expressamente, direitos fundamentais aos animais não-humanos.’’

A verdadeira codificação das principais regras e princípios de Direito Animal, enfrentando, com coragem e inovação, dentro do que lhe reserva a Constituição Federal, os principais desafios da proteção animal, coibindo o abuso e a crueldade, sem comprometer o desenvolvimento econômico e social do Estado da Paraíba.

São 119 artigos, divididos em três Títulos. O Título I constitui uma verdadeira Parte Geral do Direito Animal, com seus conceitos fundamentais, o elenco dos direitos fundamentais animais, além das bases para uma Política Estadual de Política Animal.

A parte geral inclui um extenso rol de tipificações de maus-tratos a animais (artigo 7º, §§ 2º e 3º), além de uma série de condutas proibidas (artigo 8º). O Título II pode ser considerado uma Parte Especial: trata das peculiaridades dos animais silvestres, dos animais domésticos e dos animais de produção, animais em entretenimento, em veículos de tração/montaria, em transporte, no comércio e em experimentos científicos.

Nessa parte especial, dentre outras medidas de destaque, proíbe: qualquer modalidade de caça (artigo 21), a cirurgia de cordotomia um tipo de

procedimento realizado na coluna espinhal de cães e gatos (artigo 50), a utilização de cães para fins de vigilância, segurança, guarda patrimonial e pessoal nas propriedades públicas e privadas (artigo 51), a permanência, utilização e/ou exibição de animais de qualquer espécie em circos, espetáculos e eventos (artigo 63).

A parte de proibições, estabelece o regime de tutela responsável de animais domésticos (artigo 22 e seguintes), restringe, com cautela justificável, a prática da eutanásia aos animais portadores de enfermidade de caráter zoonótico ou infectocontagioso incurável e que coloque em risco a saúde e a segurança de pessoas e/ou de outros animais (artigo 25, I), bem como institui a cláusula de escusa de consciência à experimentação com animais (artigo 93).

O Título III contempla, além de disposições finais, o Direito Animal sancionador, não-criminal, prevendo as infrações administrativas e as respectivas sanções pela violação, inclusive por pessoas jurídicas, públicas e privadas, das regras do Código.

Atualmente as denúncias dos crimes contra os animais, no estado da paraíba, são realizadas nas delegacias do meio ambiente. As ONGs e a população que conhece o projeto da Universidade Federal da Paraíba, procuram o Núcleo de Justiça Animal (NEJA) – atuante em diversos processos judiciais no estado, onde os mesmos acompanham o inquérito policial até o processo administrativo, civil ou penal.

Ao chegar na delegacia, os advogados voluntários entregam o texto pronto citando as leis existentes, art. 32 da Lei 9.605/1998, o art. 225 da CF/88, como também o Código de ética e Bem-estar animal do estado, as testemunhas são arroladas e acompanhadas em todo processo.

Infelizmente em alguns casos, as denúncias são inúteis, principalmente quando declaradas por pessoas de pouco conhecimento sobre o assunto, os profissionais atuantes as tratam com desdém, chacota ou motivo de piada, ainda em pleno séc. XXI, profissionais tanto das delegacias do meio ambiente ou do próprio MP/PB, sabendo a importância do assunto e a positivação que os regem, não levam em consideração o que está sendo relatado.

Os advogados do NEJA, relatam que em diversos fatos quando o assunto é violência doméstica, em alguns casos há uma relação de violência do agressor, infelizmente sabemos que antes de violentar a uma criança, ou a uma mulher, o homem violenta o mais vulnerável, essa relação utilizada muito pela criminologia é chamada como Teoria do link (Teoria que tem como base o pressuposto de que existe ligação entre crueldade contra os animais e uma futura violência contra seres humanos)

Em Minas Gerais por exemplo, após anos de reivindicação e um abaixo- assinado com mais de 50 mil assinaturas, os defensores dos animais finalmente foram atendidos no ano de 2013, pelo Governo do Estado. A Resolução 7.499 criou a primeira Delegacia Especializada de Investigação de Crimes Contra a Fauna de Minas Gerais.

A Unidade subordinada ao Departamento de Investigação, Orientação e Proteção à Família (DIOPF) tem à disposição pessoal a delegada Maria José Mendes Quintino, um escrivão e quatro investigadores, além de recursos para investigar, na capital de Belo Horizonte, qualquer tipo de crime contra animais domésticos e silvestres, desde o abandono, agressões, maus-tratos e até tráfico.

O GRANDE AVANÇO DA PROTEÇÃO ANIMAL LEI SANSÃO

No dia 29 de setembro, o Presidente da República sancionou o PL 1.095/19, de propositura do Deputado Federal Fred Costa do partido Patriota- MG, o qual passou a ser Lei vigente – Lei Federal 14.064/20, acrescentando o § 1º-A ao art. 32 da Lei 9.605/98. Assim, com a nova redação legal, a pena para quem praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar cães e gatos, passou a ser de 2 a 5 anos de reclusão, além de multa e proibição da guarda do animal.

Durante a tramitação do PL, iniciado na Câmara e finalizado no Senado, houve alterações no texto originário cuja redação final é a seguinte:

Art. 1º Esta Lei altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, para aumentar as penas cominadas ao crime de maus-tratos aos animais quando se tratar de cão ou gato.

Art. 2º O art. 32 da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar acrescido do seguinte § 1º-A:

“Art. 32…

§ 1º-A Quando se tratar de cão ou gato, a pena para as condutas descritas no caput deste artigo será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda“.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Trata-se de relevantíssima alteração legislativa que visa punir, com maior rigor, aqueles que, desumana e primitivamente, praticam atos maldosos contra esses animais domésticos – cães e gatos (BRASIL,2020)

Faz-se necessário destacar que a alteração legislativa não diz respeito a todos os animais, mas tão somente aos cães e gatos. Quanto aos outros, sejam silvestres, domésticos ou domesticados, a pena continua a mesma.

Ressalte-se que, anteriormente, nesses casos, a pena aplicada era de detenção, de três meses a um ano, e multa. Nesse ponto, já é possível constatar a maior das consequências penais no que tange à alteração legislativa. Isso porque, além do aumento da quantidade da pena a ser imposta (que passou de três meses a um ano para de dois a cinco anos) houve, de igual forma, uma modificação que excluiu a detenção a passou a prever pena de reclusão.

Diante disso, a consequência lógica, nos termos do art. 33, caput, do Código Penal, é a de que a pena poderá ter início no regime fechado, o que é absolutamente impossível quando se trata de detenção.

Ademais, o delito deixou de ser considerado de menor potencial ofensivo, nos termos do art. 61 da Lei 9.099/95, porquanto a pena máxima passou a ser superior a dois anos. Logo, não é mais cabível a transação penal (medida que visa evitar a pena de prisão) prevista no art. 76 da Lei supracitada.

Nesse sentido, em razão do crime não ser mais considerado de menor potencial ofensivo, não haverá lavratura de termo circunstanciado. A partir da vigência da norma, quando a autoridade policial tomar conhecimento da prática do ato criminoso (noticia criminis) deverá instaurar inquérito policial, nos termos do art. , inciso I, do CPP.

Para além disso, não é cabível a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei 9.099/95), considerando que a pena mínima para essa benesse deve ser igual ou inferior a um ano, e o crime ora comentado passa a ter pena mínima de dois anos.

Destaque-se ainda que em caso de flagrante delito, a autoridade policial não poderá conceder fiança ao preso, pois a autorização legal para tal ato é limitada para os crimes cujas penas privativas de liberdade máxima não sejam superior a quatro anos – art. 322 do Código de Processo Penal. Assim, apenas o juiz poderá fixar fiança, seja na audiência de custódia, seja no curso do inquérito ou da ação penal.

Outra consequência jurídica com a nova legislação é a de que, nos termos do art. 313, inciso I, do Código de Processo Penal, será admitida a prisão preventiva. Confira-se:

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I – nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; (BRASIL, 1941)

É válido citar as palavras do autor do Projeto de Lei, Deputado Fred Costa, utilizadas na justificativa do projeto originário:

Os animais não possuem meios de se defender, não são capazes de procurar os seus direitos. A única maneira para que tais crimes sejam evitados é o empenho da sociedade, que não deve aceitar tamanha barbaridade, exigindo que as regras que visam reprimir esses crimes sejam cada vez mais rigorosas. (CÂMARA, 2019 ,p.3)

Em que pese toda a narrativa contrária ao PL, certo é que se deve dispor de um tratamento mais severo para aqueles que se aproveitam de sua superioridade humana em detrimento dos animais para maltratá-los de maneira covarde.

Por fim, para encerrar esses singelos comentários, registre-se que havendo morte do animal a pena aplicada será aumentada de um sexto a um terço, conforme prevê o § 2º do art. 32 da Lei 9.605/98.

Diante dessas considerações, resta saber se, no país em que as Leis, no geral, parecem não ter tanta eficácia, haverá a devida aplicação da norma recém incluída no ordenamento jurídico pátrio.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelos vários campos de produção e de investigação jurídica nós encontramos as diversas manifestações do Direito animal, e ao analisarmos podemos sentir um assombro ou surpresa com tudo que vem sendo realizado no Brasil.

A relação do homem em contraste com o meio ambiente sempre ocorreu, e o homem sempre se beneficiou da natureza para a aquisição de recursos. Essa exploração aflui de forma contínua e inconsequente, acarretando a atual crise ambiental.

Portanto, diante dessa explanação, buscou-se responder a indagação, porque a legislação Paraibana de proteção animal, após ser reconhecida no país pelos inúmeros avanços, ainda no estado criador, a mesma permanece ineficaz? E a reposta é a ausência de políticas públicas destinadas a coibir os maus-

tratos e o abandono dos animais domésticos, evidenciando a falta de interesse por parte do Estado em pôr em prática essas políticas, que são propostas pelo Poder Legislativo, mas que são ignoradas no momento de serem colocadas em prática pelo próprio Estado. Resta, portanto, evidente que existem diversas iniciativas públicas e privadas para a proteção dos animais, mas tudo depende do real interesse do Estado em construir um sistema jurídico bem estruturado, bem como a aplicabilidade dessas normas para concretizar a tutela desses animais, que são indefesos e dependem da piedade humana para serem reconhecidos como seres sencientes que são, dignos de respeito e cuidados.

Para mudar a triste realidade de crueldade contra os animais, basta que o Estado aplique políticas públicas concretas e efetivas, que partam da construção de um sistema jurídico bem elaborado, destinado a coibir atos de

crueldade e punir os praticados contra os animais, bem como ações de castração da população de animais de rua (para evitar proliferação), centros de zoonoses bem estruturados para receber e cuidar desses animais, a criação da Delegacia Especializada de Investigação de Crimes Contra a Fauna, uma guarda municipal ou policia ambiental especializada na captura de animais abandonados nas ruas, que atue na prevenção e repressão dos atos de crueldade, campanhas educativas para conscientização contra estes atos e também incentivo à posse responsável. Muitas dificuldades estão por vir, mas por amor aos animais e em parceria com outras pessoas que também se importam com eles, num futuro próximo essa realidade de crueldades poderá ser mudada.

REFERÊNCIAS

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