ATUAÇÃO DA AUTARQUIA DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR DO ESTADO DA PARAÍBA EM FACE DAS ABUSIVIDADES PRESENTES NAS RELAÇÕES DE CONSUMO VIRTUAIS

ATUAÇÃO DA AUTARQUIA DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR DO ESTADO DA PARAÍBA EM FACE DAS ABUSIVIDADES PRESENTES NAS RELAÇÕES DE CONSUMO VIRTUAIS

1 de junho de 2021 Off Por Cognitio Juris

PERFORMANCE OF THE AUTHORITY OF PROTECTION AND CONSUMER DEFENSE OF THE STATE OF PARAÍBA IN FACE OF THE ABUSIVITIES PRESENT IN VIRTUAL CONSUMER RELATIONS

Cognitio Juris
Ano XI – Número 35 – Junho de 2021
ISSN 2236-3009
Autores:
Caio Mendonça Anacleto[1]
Markus Samuel Leite Norat[2]

RESUMO

O presente artigo tem como objeto principal esclarecer a importância e atuação da Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba (PROCON/PB) em face das práticas comerciais abusivas presentes nas relações consumeristas, precipuamente no mercado eletrônico. Inicialmente será realizada pesquisa preliminar com o intento de fundamentar historicamente o início do setor mercadológico e sua principal ascendência para o mundo virtual, elucidando e pontuando sua responsabilidade jurídica em meio a esta nova realidade, conforme o entendimento de nossa legislação vigente; bem como esboçar o advento do órgão protetor, sua relevância estatal e suas principais atribuições legais e administrativas. Além do abarcado histórico, doutrinário e legislativo, serão expostas neste trabalho as principais demandas recepcionadas pelo PROCON/PB, sendo destacadas as relações jurídicas oriundas do mercado cibernético, seus cardiais procedimentos de resolução, sua efetividade e celeridade na tratativa, enfatizando e indicando o fito fundamental da autarquia que é a composição consensual de conflitos.

Palavras-chave: Direito do Consumidor. Tutela do Consumidor. Práticas Comerciais Abusivas. Procon.

RESUMO EM LÍNGUA ESTRANGEIRA

The main purpose of this article is to clarify the importance and performance of the Consumer Protection and Defense Authority of the State of Paraíba (PROCON / PB) in view of the abusive commercial practices present in consumer relations, mainly in the electronic market. Initially, preliminary research will be carried out with the intention of historically substantiating the beginning of the marketing sector and its main ascendancy to the virtual world, elucidating and punctuating its legal responsibility in the midst of this new reality, according to the understanding of our current legislation; as well as to outline the advent of the protective organ, its state relevance and its main legal and administrative attributions. In addition to the historical, doctrinal and legislative scope, the main demands received by PROCON / PB will be exposed in this work, highlighting the legal relations arising from the cyber market, its cardinal resolution procedures, its effectiveness and speed in dealing, emphasizing and indicating the aim fundamental part of the autarchy, which is the consensual composition of conflicts.

Keywords: Consumer Law. Consumer Protection. Abusive Business Practices. Procon.

1 INTRODUÇÃO

Em mais de duas décadas de vigência do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), percebe-se que este se mantém aplicável em face das ramificações encontradas no setor mercadológico. Com o avanço da tecnologia, aumento da concorrência e livre iniciativa, muitos agentes se prevalecem de estratégias e mecanismos com o intuito de otimizar de suas vendas nas plataformas virtuais, trazendo mais visibilidade e atingindo um conglomerado considerável para sua seara.

Para se chegar ao fim almejo, varejistas e demais figuras utilizam-se de meios desleais, como por exemplo a venda com ausência de informações importantes sobre o produto ou serviço, desvinculação da oferta e da publicidade etc, assim acarretando a vulnerabilização do destinatário final elencado no art. 2º da Lei Federal Consumerista 8.078/90.

Diante deste cenário onde há incidência desacerbada de práticas comerciais abusivas em detrimento do consumidor, surge a criação de órgãos fiscalizatórios que atuam diretamente na intervenção e tratativa das demandas, os chamados Procons Estaduais e Municipais, em especial e objeto deste trabalho a Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba, criada mediante a Lei 14.463/15.

Entre esses 6 anos de Autarquia e mais de 30 anos de composição, o referido órgão protetivo atua perenemente no combate aos atos lesivos declinados aos consumidores, mormente nos mercados cibernéticos, tendo em vista a sua facilidade de contratação e maior destaque em nossos dias.

Destarte, diante desta forte crescente e tencionando o tratamento das controvérsias consumeristas, o Procon/PB utiliza-se de meios de resolução bastante eficazes e céleres, sempre objetivando a composição consensual de conflitos de forma menos desgastante para ambas as partes, dentre eles estão os Atendimentos Preliminares, Carta de Informações Preliminares, Encaminhamentos à Fiscalização e, por derradeiro, Abertura Direta de Reclamação.

Nesta esteira, o trabalho em questão terá como intento mostrar a importância deste órgão para o controle das práticas comerciais nas relações de consumo, onde se trará de forma inicial informações históricas de grande valia para o fito deste artigo, entendimentos legais e doutrinários acerca da temática, as principais irregularidades encontradas nas relações virtuais, procedimentos utilizados pela Autarquia para composição dos conflitos e, tendo como principal fim, suas resolutividades.

2 MERCADO CONSUMERISTA

Com o advento da Revolução Industrial no século XVIII, Liberalismo Econômico (século XIX) e a instauração do dogma da autonomia de vontade através da liberdade de contratação e igualdade formal dos contratantes, houve crescente significativa nas transações mercantis, aumentando o poderio produtivo, dando uma nova cara, além da sobrevivência, ao mercado, assim evidenciando o surgimento da denominada sociedade de consumo.

Esta evolução que alavancou a produção industrial, trouxe em contrapartida um aumento progressivo aos riscos de utilização dos produtos ou serviços, sendo estes oriundos das falhas resultantes deste processo. Nesse quadro, em corolário deste déficit de qualidade gerado em face da produção em massa, os fornecedores utilizavam-se de mecanismos a fim de vulnerabilizar o consumidor, tais como práticas abusivas, publicidades enganosas, cláusulas contratuais abusivas, termos de adesão etc.

Devido a insuficiência legislativa da época, percebeu-se que a sociedade precisaria de normas legais que coibissem os abusos impostos pelos grandes produtores aos contratantes, surgindo a iniciativa das autoridades legislativas em criar normativas que blindassem a parte vulnerável da relação, garantindo tão sonhada equidade contratual. Deste modo, fica evidente que o advento da sociedade de consumo está diretamente atrelado à proteção do consumidor.

Umas das precípuas e importantes movimentações sociais que propeliram o consumerismo surgiram a partir dos anos 60, quando se sobressaíram as associações de consumidores nos Estados Unidos, questionando as práticas abusivas realizadas pelos fornecedores, culminando com a consagração de direitos fundamentais do consumidor (GIANCOLI; ARAÚJO JÚNIOR, 2009, p. 18).

No Brasil, o movimento consumerista, iniciou-se timidamente nos anos 70, com a criação das primeiras associações civis e entidades governamentais; em 1974 foi criado o Conselho de Defesa do Consumidor no Rio de Janeiro; em 1976 – Associação de Defesa e Orientação do Consumidor em Curitiba; no ano de 1976 – Associação de Proteção ao Consumidor em Porto Alegre; e, também em 1976, foi promulgado o Decreto 7.890 do Governo de São Paulo, que criou o Sistema Estadual de Proteção ao Consumidor e em sua estrutura dois órgãos centrais: Conselho Estadual de Proteção ao Consumidor e o Grupo Executivo de Proteção ao Consumidor, depois denominado PROCON (GIANCOLI; ARAÚJO JÚNIOR, 2009, p. 19).

Com o surgimento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o direito do consumidor veio com nova roupagem, trazendo relevância constitucional a matéria, adotando a sistemática da proteção ao consumidor, de forma ampla, nos moldes do art. 5º, XXXII, 170, V, CRFB 88 e no artigo 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), consagrando-a como direito fundamental.

Na Paraíba, seguindo a grande movimentação nacional de fortalecer e amparar os considerados menos favorecidos nas relações de consumo e assim concebendo paridade nas contratações, em 4 de outubro de 1988 foi instituído o PROCON como um Programa Estadual de Orientação e Proteção do Consumidor, criado pelo decreto estadual 12.690/1988, vinculado a Secretaria do Estado. Tal brilho veio a se firmar com a publicação do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.076/90), que positivou a proteção do consumidor, de forma específica, trazendo princípios específicos, norteados pelos preceitos constitucionais, que devem ser aplicados nas relações consumeristas, aos quais tem a imputação de auxiliar na hermenêutica contratual estabelecida entre as partes, garantindo a equidade na avença e mínimo essencial.

Segundo José Geraldo Brito Filomeno, trata-se de um ramo do Direito que dispõe de princípios próprios e normas específicas (v.g., responsabilidade pelo fato do produto e do serviço, inversão do ônus da prova, declaração de nulidade de cláusulas abusivas, tutela coletiva dos consumidores, etc), que visam a efetiva proteção e defesa dos interesses e direitos dos consumidores, sem, contudo, prescindir de outros princípios e normas de direito, quando necessários, àquela proteção e defesa do consumidor (FILOMENO, 2007, p. 4).

Com o transcorrer dos tempos, devido ao início da internet na década de 90 e a globalização, muitos agentes começaram a migrar do setor físico para o virtual, assim ampliando cada vez mais seu poderio em detrimento do consumidor e desacerbando de forma exponencial as condutas desproporcionais citadas ao longo desta seção. Posto isto, vale a pergunta: a legislação criada seria considerada obsoleta em face da inovação precoce do mercado? Como ficaria a atuação dos órgãos protetivos, principalmente do PROCON/PB, diante deste novo cenário?

Mesmo diante desta grande introdução, às relações virtuais, independente de não existir norma específica, ainda são caracterizadas como relações jurídicas, sendo aplicadas as disposições do art. 104 do Código Civil de 2002, verbis: “A validade do negócio jurídico requer: I – agente capaz; II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III – forma prescrita ou não defesa em lei.” (BRASIL, 2002), e artigo 1º do CDC, ipsis litteris: “O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias.” (BRASIL, 1990).

Corroborando com a exposição de Ada Pellegrini Grinover (2007, p. 24), evidencia-se que o art. 1º da Lei Federal Consumerista, ao se referir às normas de ordem pública e interesse social, mostra que tais disposições são consideradas inderrogáveis, logo, não podem ser descartadas ou ter seu uso facultado diante das relações de consumo.

Tenha-se em conta que o Código ora comentado visa a resgatar a imensa coletividade de consumidores da marginalização não apenas em face do poder econômico, como também dotá-la de instrumentos adequados para o acesso à justiça do ponto de vista individual e, sobretudo, coletivo. Assim, embora destinatária final de tudo que é produzido em termos de bens e serviços, a comunidade de consumidores é sabidamente frágil em face da outra personagem das relações de consumo, donde pretende o Código de Consumidor estabelecer o necessário equilíbrio de forças. (GRINOVER, 2007, p. 27).

Fica destacada a inderrogabilidade do CDC, ocorrendo a impossibilidade de seu afastamento de qualquer relação consumerista em corolário de sua função social. Destarte, “as normas de ordem pública estabelecem valores básicos e fundamentais de nossa ordem jurídica, são normas de direito privado, mas de forte interesse público, daí serem indisponíveis e inafastáveis através de contratos.” (BENJAMIN; MARQUES; BESSA, 2008, p. 55).

Deste modo, as contratações realizadas mediante o mercado virtual não podem afastar a declinação da normativa federal e demais correlatas, cuja aplicação é considerada inderrogável conforme a interpretação legal e doutrinária. Assim, continua legitimada e embasa na regulamentação a atuação dos intervencionistas estatais, sendo promovidas medidas que buscam trazer equilíbrio e justiça social para os vulneráveis neste novo cenário.

3 LOJAS VIRTUAIS

Devido à grande polarização da informação iniciada na década de 90, houve o que pode ser chamado de “êxodo virtual”, onde muitos fornecedores, com o intento de expandir o alcance de suas vendas, migraram para o ambiente cibernético. Segundo os doutrinadores Efrain Turban e David King (2004, p. 37), loja virtual conceitua-se como um site de uma única empresa por meio do qual são vendidos produtos ou serviços. Ela pode pertencer ao fabricante (por exemplo, geappliances.com), a um varejista (por exemplo, walmart.com), a pessoas físicas que vendem a partir de suas casas, etc.

Não obstante, com o desenrolar dos tempos, algumas marcas se unificaram e formaram os denominados Marketplaces, como por exemplo a B2W DIGITAL (Shoptime, Submarino e Americanas.com) e Via Varejo (Ponto Frio, Casas Bahia e Extra.com). Em corolário deste fenômeno, surge a seguinte indagação: Como fica a responsabilidade civil em face desta unificação? Todos, sem exceção, são considerados fornecedores nos moldes do art. 3º do CDC. O meio eletrônico não modifica a qualificação dos mesmos, sendo-lhes impostas todas as regras de responsabilização, devendo estas serem mensuradas de acordo com cada caso concreto.

No âmbito administrativo e conciliatório, o PROCON/PB, seguindo a ordem legal e jurisprudencial, atua fortemente diante deste novo cenário, imputando a responsabilização adequada aos fornecedores hospedados no ambiente virtual. Através de acordos firmados com o intuito de realizar de forma mais efetiva as intermediações, os fornecedores disponibilizaram canais direitos como endereço eletrônico e linha telefônica, assim sendo facilitada as tratativas junto aos reclamados, garantindo maior resolutividade nas demandas.

Além destes, existe a chamada “Carta de Informações Preliminares”, onde no próprio Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC) a empresa é notificada de forma preliminar, devendo prestar os devidos esclarecimentos dentro do prazo de 12 dias corridos. Ressalta-se que o mecanismo supracitado não é realizado de forma automática, sendo necessário o interesse e disponibilidade do fornecedor em repassar dados cadastrais mediante o sistema utilizado.

Destarte, percebe-se que mesmo com os adventos tecnológicos, a atuação dos órgãos intervencionistas continua atualizada em detrimento deste novo cenário, onde o PROCON/PB utiliza-se de meios que facilitam e garantem maior efetividade e resolutividade nas tratativas como Atendimentos Preliminares e Carta de Informações Preliminares, sendo possibilitado o seu fim principal que é a composição consensual de conflitos.

3.1         RESPONSABILIDADE        CIVIL     DO         FORNECEDOR    NO         COMÉRCIO ELETRÔNICO

Ao adquirir produtos e serviços, o consumidor faz jus ao instituto de responsabilidade civil, sendo garantida a reparação por eventuais danos que venha a sofrer pela violação de um dever jurídico a que se obrigue o fornecedor. Nesse sentido, Sérgio Cavalieri Filho (2008, p. 1), dispõe que se trata da “conduta externa de uma pessoa imposta pelo Direito Positivo por exigência da convivência social.”, ou seja, é um mecanismo originário da autonomia de vontade, gerando direitos e obrigações para ambas as partes. No que concerne ao comércio eletrônico, a temática é bastante fragilizada, tendo em vista a internet ser uma seara polarizada, onde muitos se prevalecem do anonimato para praticar atos ilícitos. Assim, dificulta-se a produção probatória e gera mais custos, pois o acesso é restritivo em detrimento da proteção do sigilo das comunicações ou da privacidade dos envolvidos. É o que preconiza Bruno Miragem:

A prova de que uma conduta deu causa a á e terminados danos é providência que demanda a utilização de instrumental tecnológico da própria internet, o que muitas vezes revela-se custoso, assim como dificultado pela inexistência de registros precisos, ou cujo acesso é restringido em vista da proteção do sigilo de comunicações ou da privacidade dos envolvidos (MIRAGEM, 2016, p. 638).

Em âmbito administrativo, surge a seguinte pergunta: diante desta grande dicotomia entre a polarização e as barreiras legais, como fica a responsabilidade dos fornecedores              em               face       dos        procedimentos  instaurados        pelos     órgãos intervencionistas? Sabe-se que os PROCONs são fiscais da lei, logo, devem seguir as orientações legislativas e consolidações jurisprudenciais a fim de garantir e resguardar o hipossuficiente.

Antes do surgimento do Código de Defesa do Consumidor (1990), o Código Civil de 1916, no seu artigo 159, instituía a responsabilidade subjetiva do fornecedor, isto é, firmava-se na verificação da existência de culpa, e nexo de causalidade entre a conduta culposa e o dano. O CDC, em seu artigo 12 e seguintes, adepto ao pensamento      consumerista     prevalecente,               trouxe   em         seu         corpo    legal      a responsabilidade objetiva do fornecedor pelos “danos que cause no mercado de consumo, o fornecedor – cujo conceito é amplo para compreender todos que disponibilizam produtos ou serviços com habitualidade, mediante remuneração -responde, sem culpa, pelos danos sofridos pelos consumidores.” (BRAGA NETTO, 2011, p. 118).

A responsabilidade estabelecida no Código de Defesa do Consumidor é objetiva, fundada no dever de segurança do fornecedor em relação aos produtos e serviços lançados no mercado de consumo, razão pela qual não seria também demasiado afirmar que, a partir dele, a responsabilidade objetiva, que era exceção em nosso Direito, passou a ter um campo de incidência mais vasto do que a própria responsabilidade subjetiva.

No tocante a exceção prevista no o artigo 14, §4º do CDC, Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpção Neves (2017, p. 90) aduzem que a norma é justificada, visto que os profissionais liberais individuais, assim como os consumidores, estão muitas vezes em posição de vulnerabilidade ou hipossuficiência. Além disso, quando o serviço é prestado por um profissional liberal, há um caráter personalíssimo ou intuitu personae na relação jurídica estabelecida, conforme bem expõe Zelmo Denari. Desse modo, a título de exemplo, a responsabilidade pessoal de advogados, dentistas e médicos somente existe no âmbito consumerista se provada a sua culpa, ou seja, o seu dolo – intenção de causar prejuízo – ou a sua culpa, por imprudência (falta de cuidado + ação), negligência (falta de cuidado + omissão) ou imperícia (falta de qualificação geral para desempenho de uma atribuição).

Destarte, percebe-se que o Código de Defesa do Consumidor disciplina a matéria de responsabilidade civil de forma inversa do Código Civil de 1916 e 2002, onde a lei federal consumerista traz como regra a responsabilidade objetiva e a exceção a subjetiva, restando e assegurando aos órgãos estatais de proteção e defesa do consumidor a aplicação da norma transcrita de forma imperativa em face das abusividades encontradas nas relações de consumo.

4 AUTARQUIA DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR DO ESTADO DA PARAÍBA

Percebe-se que ao longo da história houve crescente no que concerne a defesa e proteção do consumidor. Iniciando-se com a necessidade, no século XVIII, de blindar os considerados vulneráveis na relação jurídica, haja vista os fornecedores se valerem de propagandas abusivas para se chegar ao destinatário final. Com as diversas reivindicações elencadas neste estudo, surgiu o conhecido direito do consumidor, mesmo ainda frágil e prematuro em seu corpo legal, sendo alimentado ao longo dos tempos.

Galgadas as fases, no Brasil encontramos os primeiros precursores como órgãos de proteção e defesa do consumidor: Em 1974 com a criação do Conselho de Defesa do Consumidor no Rio de Janeiro e em 1976 com a promulgação do Decreto 7.890 do Governo de São Paulo, que criou o Sistema Estadual de Proteção ao Consumidor e em sua estrutura dois órgãos centrais: Conselho Estadual de Proteção ao Consumidor e o Grupo Executivo de Proteção ao Consumidor, depois denominado PROCON.

O PROCON, conforme estampado nas primeiras regras de estrutura orgânica, é órgão do Poder executivo municipal ou estadual, destinado à proteção e defesa dos direitos e interesses dos consumidores, assim mantendo uma figura íntima entre os vulneráveis e suas problemáticas. Tendo caráter administrativo e fiscalizatório, incumbindo-se de acompanhar o desenrolar das relações de consumo, garantindo a tutela originária.

Segue salientado que sua criação depende de uma previsão legal, leis e decretos estaduais ou municipais, onde serão estabelecidas suas atribuições, tendo como referência o artigo 4º, do Decreto 2.181/97, cuja finalidade é regulamentar a criação do PROCON no Brasil, nos âmbitos estaduais e municipais, funcionando como instância de instrução e julgamento, no âmbito de sua competência, e legislação complementar.

Tal condensamento de atos ordenados estabelecidos em lei, tem como fito principal subsidiar uma decisão motivada que conclua pelo acolhimento ou não da reclamação fundamentada pelo consumidor. Cabendo-lhe também ao PROCON, a fiscalização, no âmbito de suas atribuições, de estabelecimentos comerciais, aplicando, quando necessário, as sanções administrativas previstas no Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 56, as quais vão de multa, até mesmo a apreensão de produtos, interdição e intervenção administrativa no estabelecimento, desde que fundamentada.

Na Paraíba, o início aconteceu em 1988 quando foi criado pelo Decreto Estadual nº 12.690 o Programa Estadual de Orientação e Proteção do Consumidor, vinculado à Secretaria de Justiça do Estado. Em seguida, esta norma foi alterada pelo Decreto Estadual nº 22.013/2001, vinculando-se como PROCON/PB a Defensoria Pública por força de modificação do Art. 27 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), da Constituição Estadual da Paraíba, através da Emenda Constitucional nº 25, de 06 de novembro de 2007. (PARAÍBA, 2021).

No dia 22 de junho de 2014, foi publicada no Diário Oficial do Estado da Paraíba a Medida Provisória nº 227/2014, dispondo sobre a criação da Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba (PROCON-PB) e sua estrutura orgânica. Com a criação do PROCON-PB, na condição de Autarquia, sob regime especial, o órgão passou a integrar a Administração Indireta, nos termos do Art. 1º, da referida Lei. No entanto, a Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba mediante o Decreto Legislativo nº 241, de 21 de outubro de 2014, considerando a confirmação da inadmissibilidade constitucional, durante votação em sessão deliberativa realizada na citada data, resolveu declarar insubsistente a Medida Provisória n° 227/2014 que dispunha sobre a criação do PROCON-PB. (PARAÍBA, 2021).

Em 31 de Janeiro de 2015, foi publicada no Diário Oficial do Estado da Paraíba, uma nova MP, a Medida Provisória nº 233 de 30 de Janeiro de 2015, convertida em 13 de Maio de 2015, na Lei nº 10.463/2015, e publicada em 21/05/2015, também dispondo sobre a criação da Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba (PROCON-PB) e sua estrutura orgânica, sendo reiterado quase todo o conteúdo normativo da Medida Provisória 227/2014, a qual havia sido declarada insubsistente pela Assembleia Legislativa em 2014. (PARAÍBA, 2021).

Publicada a referida lei estadual que institui o PROCON-PB como Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor, o novo órgão teve suas competências estampadas no artigo 4º da supracitada lei 10.463/2015, sendo imputado o dever de planejar, coordenar, regular e executar no âmbito do Estado a proteção, orientação e defesa do consumidor e receber, analisar, avaliar e apurar consultas e denúncias apresentadas por entidades representativas ou pessoas jurídicas de direito público ou privado ou por consumidores individuais.

Com a nova legislação, o PROCON-PB deixou de ser um mero programa de governo e tornou-se pessoa jurídica de direito público interno, integrante da administração indireta, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da administração pública, nos termos do Art. 5º, Inciso I, do Decreto-Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967. Passou também a ter autonomia administrativa, técnica e financeira, conforme Artigo 2º, da Lei 10.463/2015. Assim, desvinculou-se totalmente a partir desta data (21/05/2015 – publicação da Lei 10.463/2015), da Defensoria Pública do Estado da Paraíba, passando a ser a Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor PROCON/PB. (PARAÍBA, 2021).

Desta forma, em corolário do esboço histórico cultural e dentre esses 6 anos de Autarquia e mais de 30 anos de composição, o referido órgão protetivo paraibano atua perenemente no combate aos atos lesivos declinados aos consumidores, iniciando sua atuação de forma prematura e migrando fortemente para os mercados cibernéticos, cujo proporciona maior facilidade de contratação, incidência elevada dos riscos inerentes à relação e maior destaque em nossos dias.

5 INTERVENÇÃO DO ÓRGÃO E AS PRINCIPAIS RECLAMAÇÕES FEITAS PELOS CONSUMIDORES NO ÂMBITO VIRTUAL

Durante este interstício de 30 anos de atuação, o PROCON/PB revela-se de forma bastante operante na intervenção e fiscalização das práticas abusivas evidenciadas nas relações de consumo, mormente na seara virtual. Destaca-se que os principais procedimentos eram realizados de forma presencial, onde o consumidor se dirigia ao núcleo respectivo da autarquia e realizada sua reclamação.

O atendimento realizado no próprio órgão é, preferencialmente, de forma pessoal ou por procuração, à pessoa física ou jurídica, de acordo com o artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor, sendo formalizado através do SINDEC (Sistema de Informações de Defesa do Consumidor), o qual seria facilmente comparado ao Processo Judicial Eletrônico – PJE, do Poder Judiciário. Por meio dele são elaboradas as reclamações, as quais serão reduzidas a termo e encaminhadas aos fornecedores, seja por meio eletrônico, como por exemplo no caso da CIP eletrônica (Cartas de Reclamações Preliminares), cujo recurso é disponibilizado pelo SINDEC, encontrando-se à disposição de todo e qualquer consumidor que deseja atender sua reclamação de forma mais rápida, não sendo necessário a efetiva abertura de reclamação, possuindo como finalidade intervir no conflito de forma mais célere ou apenas requerer informações, esclarecimentos, cópias de contratos, planilha de créditos ou qualquer outro dado/documento que permita o esclarecimento sobre uma conduta que possa vir a se tornar um potencial prejuízo ao consumidor; ou por carta registrada com AR, no caso da abertura direta de reclamação, por exemplo. (MARTINS, 2017).

No início deste ano, a fim de dar celeridade, resolutividade e visando o maior alcance, foram disponibilizados canais de atendimento virtual, a exemplo WhatsApp e Instagram, assim viabilizando que o demandante faça sua reclamação de forma mais rápida e eficaz, não havendo quaisquer alterações no que concerne aos procedimentos. Desta forma, percebe-se a maior atenção do órgão em reparar o consumidor, pois este poderá realizar sua queixa de onde estiver, sendo amparo efetivamente o mais vulnerável da relação de consumo.

Conforme dados apurados nas mídias sociais e no Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), ao longo de 2020 foram realizados 23.042 atendimentos, englobados todos os núcleos e tipos de procedimentos, e mais de 30.000 mensagens registradas no Whatsapp da autarquia, sendo revelado total respeito e compromisso perante o consumidor em detrimento das práticas comerciais abusivas.

5.1 DIREITO À INFORMAÇÃO (ART. 6º, III DO CDC)

É certo que os consumidores também tiveram benefícios advindos deste novo cenário, sendo o primeiro a disponibilidade de grande acervo de informações da rede, que é apresentado de forma dinâmica e que permite a pesquisa não linear, facilitando o processo de decisão de compra; a facilidade de levantamento, análise e controle de dados sobre os produtos e serviços pesquisados; a redução de preços decorrente da maior competitividade entre fornecedores (PINHO, 2000, p. 120). Todavia, diante desta nova realidade, o comprador vem revelando total insatisfação em corolário da extrema vulnerabilidade advinda da grande gamificação de informação, o que demandaria um reforço protetivo da cadeia de princípios concernentes às práticas publicitárias.

Em face disto, assumindo posição de proteção, o Código de Defesa do Consumidor, em virtude do princípio estampado em seu artigo 4º, inciso I, destaca uma das espécies de vulnerabilidade – a informacional, da qual se sobressai o dever do fornecedor em informar adequadamente o consumidor, conforme preceitua o art. 6º, III, na medida em que preconiza ser direito do consumidor a informação suficiente e cristalina acerca das oposições encontradas nos produtos e serviços.

De tal magnitude é o dever de informação na relação de consumo, que resta previsto em várias ocasiões no decorrer do CDC, a exemplo dos artigos. 6º, III; 31; 46; 54; entre outros. E nessa qualidade, o dever de informar é imposto ao fornecedor não só na fase contratual, mas também e principalmente na fase pré-contratual, onde o consumidor ainda está a confirmar a sua vontade pela aquisição do produto ou do serviço.

Tratando-se de dever correlato ao direito básico do consumidor desde a oferta ao serviço final, informar o comprador acerca dos encargos e especificações do contrato é de suma importância para o equilíbrio relacional, tendo em vista a existência do artigo 6º, inciso III do CDC (BRASIL, 1990) que estabelece como conceito primário a elucidação contratual no momento de qualquer ajuste jurídico, assim evitando disparidades no que tange ao compromisso firmado.

Na fase pré-contratual o fornecedor tem como fito principal informar ao consumidor sobre circunstâncias e fatores que onerem o fornecimento do produto ou serviço além do normalmente esperado pelo consumidor mediano, para que este manifeste sua vontade sem vícios de consentimento, objetivando a minimização dos litígios posteriores nas esferas judiciais e administrativas. Desta feita, Filomeno (2011, p. 154) frisa que o fornecedor tem o dever de informar previamente o consumidor:

Sobre especificações corretas de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem, obrigação específica dos fornecedores de produtos e serviços. Trata-se, repita-se, do dever de informar bem o público consumidor sobre todas as características importantes de produtos e serviços, para que aquele possa adquirir produtos, ou contratar serviços, sabendo exatamente o que poderá esperar deles. (FILOMENO, 2011, p. 154).

Percebe-se, ao longo do transcrito neste tópico, que o direito à informação é de suma importância na formalização e continuação da relação consumerista, devendo ser seguido e não ignorado pelas partes, principalmente pelo fornecedor de produtos e serviços. Sabemos que mesmo diante de todo aparato legislativo, o fornecedor utiliza-se de artifícios ou simplesmente omite as informações atreladas ao bem, trazendo a intervenção dos órgãos protetivos e possivelmente sendo declinada penalidade administrativa.

Conforme apurado no Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), durante o período de 2020 foram registradas cerca de 843 reclamações atreladas a desvinculação de informação, abrangendo internet, peso/volume/quantidade/tamanho,               produto               entregue             divergente          do          pedido, contrato/pedido/orçamento e garantia. A maioria esmagadora destas reclamações são oriundas do ambiente cibernético, seja mediante aplicativos ou sites das empresas, devido justamente ao estado pandêmico da COVID-19, sendo alavancada de forma grotesca as compras fora do estabelecimento comercial.

Neste diapasão, revela-se total comprometimento da Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba (PROCON/PB) em recepcionar as demandas consumeristas, precipuamente aquelas originárias da violação do direito básico elencado no artigo 6º, inciso III da lei federal consumerista 8.078/90, assim assegurando o caráter conciliatório e fiscalizatório do órgão em detrimento das práticas comerciais abusivas presentes nas compras virtuais.

5.2 PRÁTICAS COMERCIAIS – OFERTA E PUBLICIDADE (ARTS. 30 E SS DO CDC)

É de conhecimento em massa que os fornecedores praticam corriqueiramente diversos atos que atingem os consumidores e atribuem, na maior parte das vezes, a culpa na economia, competitividade do mercado entre outras alegações das quais camuflam tais práticas levando o consumidor a erro e, na maior parte das vezes acarretam prejuízos ao seu patrimônio. O prejuízo, ainda que seja considerado ínfimo, enseja responsabilização por parte do fornecedor, cabendo, a depender do caso concreto, perdas e danos ou dano moral.

As práticas comerciais fomentam a sociedade de consumo, aproximando os consumidores dos bens e serviços colocados à sua disposição no mercado de consumo. Hermann Benjamim (1999, p. 213) define práticas comerciais como “os procedimentos, mecanismos e técnicas utilizadas pelos fornecedores para, mesmo indiretamente, fomentar, manter, desenvolver e garantir a circulação de seus produtos e serviços até o destinatário final”.

O Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078/1990 (CDC) regula as práticas comerciais em capítulo específico (Capítulo V), destacando a oferta, a publicidade, a cobrança de dívidas e outras práticas simplesmente qualificadas como – práticas comerciais abusivas, além de disciplinar o manejo das informações sobre o consumidor pelos bancos de dados e cadastros de consumidores. Dentre estas enumerações, pode-se classificar práticas comerciais pré-contratuais, contratuais e pós-contratuais.

A exemplo, a oferta e publicidade são consideradas modalidades pré-contratuais, onde vincula-se o fornecedor a esta conforme o artigo 30 do CDC, ipsis litteris, “toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado”, podendo o consumidor exigir o cumprimento forçado em caso de violação ou rescindir o contrato mais perdas e danos conforme o artigo 35 da lei federal consumerista 8.078/90.

Preocupado com as abusividades oriundas das relações de consumo, os elaboradores legais do CDC instituíram e disciplinaram as práticas comerciais abusivas, sendo inseridos rols exemplificativos nos artigos 39, 40, 41, 42 e 43. Neste diapasão, conforme dicção do clássico Pedro Baptista Martins (1941, p. 57), “o exercício anormal, a falta de interesse sério e legítimo, a desnaturação da finalidade social ou econômica do direito, o seu exercício anti-funcional, a confiança legítima enganada, tudo isso conflui para o mesmo estuário objetivista, reduzindo-se as divergências aparentes a um simples verbalismo”.

Em âmbito administrativo e conciliatório, a Autarquia de Proteção de Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba, utilizando-se das supracitadas normas legais e codificações esparsas, atua fortemente no combate e repressão às práticas abusivas mediante os mecanismos e procedimentos de sua incumbência, garantindo ao consumidor o amparo legislativo adequado ao caso em tela, dando eficácia e resolutividade nas tratativas consumeristas, especialmente nas virtuais.

Durante o interstício de 01 de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2020, no Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC) foram registradas aproximadamente 1.719 reclamações referentes ao assunto de oferta e publicidade, sendo as principais queixas a publicidade enganosa, publicidade abusiva, não entrega e demora na entrega de produtos e serviços (descumprimento da oferta e da publicidade estampado no artigo 35 do Código de Defesa do Consumidor) e venda enganosa.

No que concerne ao descumprimento da oferta e da publicidade, ao longo do lapso elencado, foram registradas cerca de 1.233 reclamações junto ao PROCON/PB, evidenciando-se o descaso do fornecedor perante o consumidor vulnerável em cumprir os termos da contratação, não entregando o produto ou serviço dentro do prazo estabelecido. Percebe-se que é a queixa mais corriqueira entre os reclamantes, assim corroborando com o transcrito neste tópico.

Com efeito, pode-se depreender assim, através de tais indicadores, a eficácia do referido órgão protetivo em face do combate e fiscalização das práticas abusiva presentes nas relações de consumo virtuais, sendo cumpridas suas principais funções transcritas no artigo 4º da lei 10.463/2015, garantindo o amparo adequado ao consumidor em detrimento da hipossuficiência e vulnerabilidade da relação jurídica, recepcionando as queixas e reclamações e efetivando a tratativas dos respectivos litígios.

5.3 DIREITO AO ARREPENDIMENTO (ART. 49 DO CDC)

O Código de Defesa do Consumidor preconiza em seu artigo 49 o direito ao arrependimento. Reza o supracitado texto jurídico que o comprador pode abdicar da contratação dentro do lapso de 7 dias, a contar da entrega ou início da execução do produto ou serviço, sendo imprescindível para exercício desta garantia legal que a compra tenha sido realizada fora do estabelecimento comercial, como telefone ou internet.

Sob o entendimento de José Carlos Maldonado de Carvalho (CARVALHO, 2008, p. 135-136), quando o legislador traz no teor do texto “especialmente por telefone ou a domicílio” trata-se de rol meramente exemplificativo, razão que toda e qualquer compra realizada fora do estabelecimento social será submetida e garantida ao consumidor o denominado pela doutrina de denúncia vazia, seja por e-mail, Instagram, sites, Whatsapp, etc.

O interstício de sete dias, previsto no artigo em comento, é denominado como período de reflexão e confere a possibilidade de o consumidor devolver a mercadoria dentro desse prazo. Frisa-se que exercício do direito de arrependimento é livre de forma, basta que o consumidor envie um comunicado por qualquer meio que seja, e-mail, telefone, correspondência etc, pedindo o cancelamento dentro dos sete dias, sendo irrelevante o fato de o fornecedor vir a receber a mensagem depois de escoado o prazo ou não. (MATTOS, 2007).

A norma assegura ao consumidor o direito de arrependimento sem exigir justificativa quanto aos motivos que o levaram a desistir do negócio e sem impor qualquer ônus, sendo por esta razão chamada de “denúncia vazia”. Destaca-se que todos os encargos financeiros são de responsabilidade do fornecedor, obrigando-se este reembolsar integralmente o comprador com as devidas atualizações monetárias, sendo qualquer cláusula contratual que dispõe em contrário nula de pleno direito nos moldes do artigo 51, inciso II da lei federal consumerista 8.078/90. (MATTOS, 2007).

Corroborando com o entendimento destacado acima, Leonardo de Medeiros Garcia (2008), aduz que a desistência do contrato pelo consumidor é um direito gratuito, sendo qualquer explicação sua um ato meramente optativo. Quanto ao parágrafo único do art. 49, o mesmo autor ensina que:

Exercido o direito de arrependimento, o consumidor deverá receber de forma imediata a quantia paga, monetariamente atualizada, voltando ao status quo ante. Assim, todo e qualquer custo despendido pelo consumidor deverá ser ressarcido, como o valor das parcelas pagas, além de outros custos, como os de transporte, por exemplo. Além disso, a norma autoriza que a restituição seja feita de forma imediata, ou seja, o fornecedor não poderá impor prazo ao consumidor para que restitua os valores. (GARCIA, 2008, p. 260).

No que tange ao início do prazo de reflexão, Leonardo Roscoe Bessa aduz que, especificamente, quanto à compra por telefone ou por Internet, a contagem inicia-se a partir do ato de recebimento do produto e não do dia da solicitação (contratação), pois “a interpretação deve prestigiar a finalidade da norma: proteger o comprador que, até o recebimento físico do bem, não pode examinar adequadamente o produto.” (BENJAMIN; MARQUES; BESSA, 2008, p. 292).

Mesmo diante desta blindagem jurídica declinada ao consumidor, garantindo a este um período de reflexão considerado razoável para as compras fora do estabelecimento comercial, os fornecedores de produtos e serviços utilizam-se astuciosamente do marketing para ludibriar o destinatário final. Desta feita, cabe a Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba intervir nas demandas deste nicho, aplicando as medidas legais e administrativas cabíveis.

Conforme dados apurados no Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), no ano de 2020 foram registradas, entre Aberturas Diretas de Reclamação, Atendimentos Preliminares, Encaminhamentos a Fiscalização e Simples Consulta, 248 reclamações tipificadas como “Desistência de Compra (cancelamento de compra)”. Diante do numerário, percebe-se a forte cooperação do consumidor em trazer as demandas junto ao órgão protetivo, assim possibilitando a medicação jurídica adequada.

Neste mister, registradas e tratadas cerca de aproximadamente 300 reclamações oriundas do direito do arrependimento, fica evidente a preocupação do órgão intervencionista diante do cenário atual, onde este faz a devida resolução do caso concreto de forma célere e eficaz mediante os procedimentos elencados, assim garantindo a tutela específica e coibindo práticas comerciais abusivas originárias do ambiente virtual.

6             PROCEDIMENTOS            REALIZADOS       PARA     A            TRATATIVA         E             SUAS RESOLUTIVIDADES

O PROCON/PB, seguindo seu fito primevo de resolução consensual de conflitos, possui dois tipos de atendimento ao consumidor: presencial e online. Em via de regra, o atendimento é presencial, podendo ser considerado reclamante pessoa física ou jurídica nos moldes do artigo 2º do CDC, cabendo a propositura da reclamação pelo titular ou seu representante legal. Após a recepção do demandante, será necessário cadastro no Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), sendo imprescindível que o consumidor esteja munido de sua documentação pessoal, comprovante de residência, telefones para contato, endereço eletrônicos, bem como toda que for referente a demanda (notas fiscais, comprovantes de pagamentos, extratos, etc).

Com o advento do estado pandêmico de 2020, a autarquia ousou em inovar, pois devidos os decretos estaduais que impediam o atendimento presencial ao público externo dos órgãos estaduais, o respectivo intervencionista precisava de meios tecnológicos para assim garantir o amparo legal aos demandantes e realizar atendimentos de forma remota e eficaz. Sendo pioneira no estado em realização de tratativas à distância, o PROCON/PB disponibiliza canais virtuais a fim de possibilitar que o consumidor realizasse sua reclamação de onde quiser que esteja, assim dando mais celeridade à resolução e atingindo pessoais de todo o estado com um simples “click”.

No atendimento remoto, sendo estes realizados pelos veículos de comunicação em massa Whatsapp e Instagram, o reclamante se dirige a triagem do órgão, onde será realizado um tipo de pré-atendimento, sendo perguntada sobre a natureza da demanda e se o titular está munido da documentação necessária para a propositura da reclamação. Após a identificação do problema e verificação da documentação, o responsável pela triagem emitirá uma “ficha de atendimento”, onde o demandante será direcionado a um técnico administrativo, cabendo este realizar o procedimento adequado para a tratativa do caso concreto.

Informa-se que no atendimento à distância são realizados os mesmos procedimentos disponibilizados no presencial, sendo formalizado cadastro do consumidor no Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), analisadas as documentações referentes a demanda, cabendo ao técnico administrativo conduzir o procedimento escolhendo o mais adequado ao caso concreto, seja Atendimento Preliminar, Carta de Informações Preliminares, Encaminhamento à Fiscalização, Abertura Direta de Reclamação, ou até mesmo uma Simples Consulta.

No atendimento preliminar, o técnico competente poderá utilizar-se de ligação telefônica ou notificação eletrônica com o fito de obter os devidos esclarecimentos dos fatos perante a reclamada, sendo exigido prazo de resposta mediante conveniência e adequação ao caso concreto. Percebe-se que esta é uma das formas mais eficazes e rápidas de resolução do litígio, sendo as vezes necessária somente uma ligação para trazer a tutela almejada pelo demandante.

A Carta de Informações Preliminares (CIP) é outro meio de resolução consensual, onde a fornecedora de produtos e serviços será notificada eletronicamente pela plataforma SINDEC, sendo exigido 12 dias corridos para apresentação de defesa. Revela-se outro mecanismo bastante eficiente, sendo facilitada a intermediação junto a demandada mediante contato direto. Elucida-se que para a realização da notificação mediante CIP, faz-se necessário que a empresa forneça seus dados, por mera liberalidade, perante a administração do SINDEC, sendo cadastrada e aprovada mediante parecer. Após a devida validação, o atendente conseguirá identificar se a respectiva empresa possui CIP ou não mediante destaque em “@”, conforme exemplo da Samsung.

Os Encaminhamentos à Fiscalização são cabíveis em determinadas demandas que atingem contingente expressivo na seara a que está sendo reclamada. A exemplo, nos casos de propaganda enganosa por parte de redes de supermercado, desvinculação da oferta e da publicidade, preços considerados abusivos          etc,        onde      percebe-se         que        tal               fato       poderá  atingir   pessoas exponencialmente. Para realizar a devida reclamação perante ao órgão intervencionista, o consumidor poderá entrar em contato com o 151 ou whatsapp da fiscalização, sendo feito o devido registro e logo em seguida a tratativa do caso em tela.

A simples consulta consiste quando o consumidor pretende sanar qualquer dúvida ou até mesmo quando a demanda não era de competência do órgão, sendo assim gerado tal documento com o devido encaminhamento ao órgão correto. A exemplo, os casos de fato tipificado no artigo 170 do Código Penal (Estelionato), demandas atreladas e regidas pelo Código Civil Brasileiro (Divórcio e Ação de Obrigação de Fazer), entre outras.

Por fim, sendo considerado procedimento máximo, na Abertura Direta de Reclamação o consumidor, munido de toda a documentação necessária (RG, CPF, Comprovante de Residência e toda que for referente a demanda), abre uma reclamação, com número de FA (Ficha de Atendimento, o que pode ser comparado ao número do processo), o qual gerará o agendamento de uma audiência de conciliação, sendo esta conduzida e presidida por mediador da autarquia. Esta modalidade geralmente corresponde a litígio que apresenta certa gravidade, não sendo possível, então, ser sanado por nenhum dos demais meios de resolução apresentados anteriormente. (MARTINS, 2017).

Com o intento de trazer numerário referente as formas de atendimento, durante o interstício entre 01 de janeiro de 2020 a 31 de dezembro do supracitado ano foram realizados cerca de 23.042 atendimentos, sendo 10.568 presenciais, 9.782 virtuais, 2.229 mediante e-mail, 49 de ofício e 344 mediante carta. Desta forma, fica evidente a presteza da referida autarquia, pois mesmo diante do estado pandêmico não deixou de exercer suas funções e garantir amparo ao consumidor vulnerável.

No que tange os tipos de atendimento, estampados os mais de 23.000 procedimentos formalizados, permanece em primeiro lugar as simples consultas com .7.381 registros, logo atrás os 6.939 atendimentos preliminares, prosseguindo com 3.302 CIPS eletrônicas, 1.424 encaminhamentos à fiscalização, 2.182 extra procon (tipo de simples consulta), 1.499 aberturas diretas de reclamação e 315 atendimentos avulsamente catalogados. Nesta perspectiva, conforme tudo que foi exposto nesta seção, a Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba (PROCON/PB) revelou-se com total presteza e eficiência no que concerne ao encosto consumerista, onde mediante os procedimentos e migração para o ambiente virtual conseguiu não estancar seu atendimento e assim não abstendo-se de suas competências legais discriminadas na 10.463/2015, garantindo ao menos favorecido a tutela específica em face das abusividades presentes nas relações de consumo, mormente na seara da internet.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS E/OU RECOMENDAÇÕES

Destarte, o direito do consumidor ao longo da história passou por diversas transformações, onde evidencia-se sua transição durante os primevos, sendo exigida tutela específica com o início da Revolução Industrial no século XVIII, com maior destaque no Liberalismo Econômico (século XIX), fazendo-se a instauração do dogma da autonomia de vontade através da liberdade de contratação e igualdade formal dos contratantes. Mesmo com o advento nos primeiros séculos, o grande estopim foi nos anos 60 com os primeiros movimentos consumeristas e criações de órgãos que defendiam o mais vulnerável em detrimento da relação jurídica. Consolidando-se com a promulgação do Carta Magna de 1988, trazendo relevância constitucional a matéria, adotando a sistemática da proteção ao consumidor, de forma ampla, nos moldes do art. 5º, XXXII, 170, V, CRFB 88 e no artigo 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), consagrando-a como direito fundamental.

Com o advento da globalização e o início da internet, surgiu um grande desafio para os defensores do consumidor e a legislação vigente, onde muitos fornecedores migraram para o ambiente virtual, prevalecendo-se de mecanismos para ludibriar o adquirente no ato da compra. Em face deste grande embate, o CDC, através de sua inderrogabilidade estampada em seu artigo 1º, mostrou-se bastante firme no que tange a sua adequação, sendo plenamente atual e podendo ser aplicada em corolário das abusividades encontradas na internet.

Em decorrência das legislações pertinentes a fiscalização do setor mercadológico aqui na Paraíba, surgiu em 1988 a primeira ideia de órgão intervencionista com a criação do Programa Estadual de Orientação e Proteção do Consumidor, vinculado à Secretaria de Justiça do Estado. Cristalina a necessidade de autonomia no que concerne a sua atuação, ao longo dos tempos e com sensação de vitória, fora publicada no Diário Oficial do Estado no dia 13 de maio de 2015 a Lei nº 10.463/2015, transcrevendo a estrutura orgânica e criando a Autarquia de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado da Paraíba (PROCON-PB).

Consolidado em nosso estado, o PROCON/PB, através de seu poder fiscalizatório e administrativo, atua vigorosamente no que concerne a prevenção e intervenção das práticas abusivas presentes nas relações jurídicas. Prevenindo através de campanhas publicitárias de conscientização, tanto para consumidores, quanto fornecedores; e intervindo mediante seus procedimentos disponibilizados como Atendimento Preliminar, Carta de Informações Preliminares, Encaminhamento à Fiscalização, Abertura Direta de Reclamação, ou até mesmo uma Simples Consulta, enfatizando sua atuação nas demandas mais corriqueiras no mercado virtual, como violação do direito básico à informação, desvinculação da oferta e da publicidade e a denúncia vazia preconizada no artigo 49 do CDC.

Revelando-se bastante eficiente nas tratativas com mais de 23.000 atendimentos realizados ao longo de 2020, o PROCON/PB mostrou total proatividade e celeridade em recepcionar os consumidores com suas problemáticas, onde mesmo com o estado pandêmico sobrevoando nossos dias não deixou de realizar suas atribuições, trazendo as mídias sociais a seu favor, assim recebendo os reclamantes de forma rápida e eficaz. Diante dos desprovidos de internet ou até mesmo daqueles que possuem certa dificuldade em se inserir neste novo cenário, o que a autarquia poderia fazer para alcançar estas pessoas? Com abertura de novos núcleos? Mais divulgação publicitária? Sabendo e acreditando na eficiência do respectivo órgão intervencionista, acredita-se que serão realizadas estratégias para se alcançar os menos favorecidos e assim garantir a tutela fiscalizatória a todos os cidadãos paraibanos.

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[1] Graduado em Direito pelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ).

[2] Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Mestre em Direito e Desenvolvimento; Pós-Graduação em Direito do Consumidor; Pós-Graduação em Direito da Criança, Juventude e Idosos; Pós-Graduação em Direito Educacional; Pós-Graduação em Direito Eletrônico; Pós-Graduação em Direito Civil, Processo Civil e Direito do Consumidor pela UNIASSELVI – Centro Universitário Leonardo da Vinci – ICPG – Instituto Catarinense de Pós Graduação; Pós-Graduação em Direito de Família; Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela ESA-PB – Escola Superior da Advocacia da Paraíba – Faculdade Maurício de Nassau; Pós-Graduação em Direito Ambiental pelo Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ; Pós-Graduação em Tutoria em Educação à Distância e Docência do Ensino Superior; Advogado; Assessor Jurídico do Ministério Público do Estado da Paraíba; Coordenador Pedagógico e Professor do Departamento de Pós-Graduação da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado da Paraíba; Professor convidado da Escola Nacional de Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça; Professor do Curso de Graduação em Direito no Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ; Membro Coordenador Editorial de Livros Jurídicos da Editora Edijur (São Paulo); Membro Diretor Geral e Editorial da Revista Científica Jurídica Scientia et Ratio; Membro Diretor Geral e Editorial da Revista Brasileira de Direito do Consumidor; Membro Diretor Geral e Editorial da Revista Brasileira de Direito e Processo Civil; Membro Diretor Geral e Editorial da Revista Brasileira de Direito Imobiliário; Membro Diretor Geral e Editorial da Revista Brasileira de Direito Penal; Membro Diretor Geral e Editorial da Revista Científica Jurídica Cognitio Juris, ISSN 2236-3009, www.cognitiojuris.com; Membro Coordenador Editorial da Revista Ciência Jurídica, ISSN 2318-1354; Membro do Conselho Editorial da Revista Luso-Brasileira de Direito do Consumo, ISSN 2237-1168; Autor de livros e artigos jurídicos.