ARRECADAÇÃO SUMÁRIA COMO FORMA ORIGINÁRIA DE AQUISIÇÃO DE TERRAS DEVOLUTAS NO ESTADO DO TOCANTINS

ARRECADAÇÃO SUMÁRIA COMO FORMA ORIGINÁRIA DE AQUISIÇÃO DE TERRAS DEVOLUTAS NO ESTADO DO TOCANTINS

9 de dezembro de 2025 Off Por Cognitio Juris

SUMMARY COLLECTION AS AN ORIGINAL FORM OF ACQUIRING PUBLIC LANDS IN THE STATE OF TOCANTINS

Artigo submetido em 08 de dezembro de 2025
Artigo aprovado em 09 de dezembro de 2025
Artigo publicado em 09 de dezembro de 2025

Cognitio Juris
Volume 15 – Número 58 – 2025
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Moisés Pereira do Nascimento [1]
Jefferson Franco [2]

RESUMO: O presente artigo científico aborda a arrecadação sumária de terras devolutas no Estado do Tocantins, analisando seus aspectos jurídicos, históricos e os impactos na regularização fundiária. Discute-se a natureza jurídica da arrecadação sumária como forma originária de aquisição da propriedade pelo Estado, bem como as implicações para a segurança da posse e a regularização fundiária no Tocantins. A pesquisa revisa os instrumentos normativos, buscando compreender o equilíbrio entre a prerrogativa estatal e os direitos dos ocupantes de boa-fé. É analisado o papel do Grupo Executivo das Terras do Araguaia Tocantins (GETAT) e a articulação federativa no tratamento das terras devolutas, com foco na descentralização do domínio para efetivar o direito à terra e à propriedade rural.

Palavras-chave: Terras devolutas; Arrecadação Sumária; Aquisição originária.

ABSTRACT: This scientific article addresses the summary collection of vacant public lands in the State of Tocantins, analyzing its legal and historical aspects and its impacts on land regularization. It discusses the legal nature of summary collection as an original form of property acquisition by the State, as well as the implications for possession security and land regularization in Tocantins. The research reviews regulatory instruments, seeking to understand the balance between the state’s prerogative and the rights of good-faith occupants. The role of the Araguaia Tocantins Land Executive Group (GETAT) and the federative coordination in dealing with vacant public lands are analyzed, focusing on the decentralization of ownership to ensure the right to land and rural property.

KEYWORD: Vacant lands; Summary Collection; Original Acquisition.

1 INTRODUÇÃO

No Brasil, a questão fundiária, inclusive no Estado do Tocantins, constitui uma das situações mais complexas e desafios bem persistentes do ordenamento jurídico, sendo fonte histórica de conflitos sociais e entrave ao desenvolvimento sustentável.

No cerne dessa problemática, encontram-se as terras devolutas, definidas como aquelas que, pertencentes ao domínio público, não receberam destinação específica pelo Poder Público nem foram legalmente transferidas ao patrimônio de particulares. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB), em seu art. 26, inciso IV, estabelece que pertencem aos Estados-membros “as terras devolutas não compreendidas entre as da União”.

Nesse contexto, a identificação e incorporação de imóveis rurais ao patrimônio estatal são primordiais para a realização de políticas públicas afetas à reforma agrária, à tutela do meio ambiente e regularização fundiária.

O procedimento tradicional para a discriminação de terras devolutas é a ação discriminatória, um processo judicial complexo e moroso, regulamentado pela Lei nº 6.383, de 7 de dezembro de 1976. Contudo, buscando maior celeridade e eficiência, a legislação prevê mecanismos administrativos, entre os quais se destaca a arrecadação sumária de terras devolutas (BRASIL, 1976).

Esse procedimento, de natureza mais célere, visa incorporar ao patrimônio público imóveis rurais sem registro imobiliário em nome de particular, presumindo-os como devolutos. Conforme leciona a doutrina agrarista, a arrecadação sumária representa um importante instrumento de afirmação da dominialidade estatal, embora sua aplicação demande rigorosa observância ao devido processo legal, sob pena de violação de direitos de posseiros (BRAGA; SOUSA, 2022).

No Tocantins, cuja criação recente e vasta extensão territorial resultaram em um cenário de acentuada insegurança jurídica quanto ao direito de propriedade da terra, a utilização da arrecadação sumária ganha contornos de especial relevância (BRAGA; SOUSA, 2022).

A natureza jurídica da arrecadação sumária enquanto meio de aquisição da propriedade é, contudo, objeto de intenso debate, porquanto há questionamentos se tal ato administrativo pode ser compreendido como uma forma de aquisição originária, ou seja, aquela que independe de um título anterior e rompe qualquer vínculo com o possuidor ou proprietário precedente (BRAGA; SOUSA, 2022).

A arrecadação sumária de terras, embora seja prerrogativa do Estado para reaver imóveis devolutos, não pode ser executada de forma a suprimir o direito de defesa do possuidor que alega justo título ou posse mansa e pacífica. O procedimento administrativo deve ser pautado pela legalidade estrita e pela demonstração cabal de que a terra é, de fato, devoluta, não se prestando a simplesmente desapossar ocupantes sem o devido processo legal (BRAGA; SOUSA, 2022).

Como instrumento de afirmação da dominialidade pública sobre terras desprovidas de titulação privada legítima, não é uma prerrogativa exclusiva dos Estados. A União, por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), também se utiliza de um procedimento análogo para incorporar ao seu patrimônio imóveis rurais presumidamente públicos (BRAGA; SOUSA, 2022).

A arrecadação sumária de terras devolutas é um procedimento jurídico utilizado pelo Estado para incorporar ao patrimônio público áreas sem titularidade privada comprovada. No Estado do Tocantins, essa prática tem sido objeto de debates acadêmicos e jurídicos, especialmente no contexto da regularização fundiária e da segurança jurídica dos ocupantes dessas terras.

O Decreto-Lei nº 1.164/1971 estabeleceu diretrizes para a arrecadação de terras na Amazônia Legal, incluindo Tocantins, visando garantir o desenvolvimento regional e a soberania nacional. Já a Lei nº 6.383/76 dispõe sobre a discriminação de terras públicas e a arrecadação sumária como forma de incorporação ao patrimônio da União (BRASIL, 1971; 1976).

A jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal (STF) reforça ser necessário efetivar a segurança jurídica na senda da arrecadação de terras devolutas. No julgamento da ACO 478, o STF declarou a nulidade de títulos de propriedade de terras emitidos pelo Instituto de Terras do Estado do Tocantins (INTERTINS) em benefício de particulares por reconhecer que tais áreas são de domínio da União, destacando a relevância da regularização fundiária, bem como a tutela de direitos dos eventuais ocupantes legítimos. Essa decisão evidencia a complexidade do tema e a necessidade de um equilíbrio entre o interesse público e os direitos individuais (BRASIL, 2015).

Diante do exposto, o presente artigo científico busca compreender se a arrecadação sumária pode ser considerada uma forma de aquisição originária da propriedade pelo Estado, bem como quais são as suas implicações jurídicas para a segurança da posse dessas áreas.

Para tanto, delineou-se aspectos legais insertos na legislação pertinente à temática e discutiu-se as consequências dessa modalidade de incorporação patrimonial à luz da doutrina no complexo cenário agrário tocantinense.

2 PROPRIEDADE RURAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

A história do direito agrário brasileiro é complexa, desde a chegada dos portugueses no Brasil até o atual período democrático, o problema agrário brasileiro ainda persiste sem uma resolução efetiva, sendo marcada por inúmeras transformações que refletem os períodos sociais, políticos e econômicos dos pais ao longo de sua história.

Com o movimento de redemocratização do Brasil e a promulgação da CRFB, a propriedade rural é reconhecida constitucionalmente como direito fundamental, regulamentada pelo art. 5°, XXII, da Carta Política, sendo condicionada ao cumprimento de sua função social, especialmente no âmbito rural, em que assume o papel estratégico no que tange política agrária, tentando frisar os problemas que aglomeraram do passado (BRASIL, 1988).

A propriedade rural, por sua natureza, integra o regime jurídico da terra, sendo objeto de regulamentação específica no âmbito do Estatuto de Terra (Lei n° 4.504/1964), que visa disciplinar o uso da posse e aquisição de imóveis rurais através da regularização fundiária (BRASIL, 1964).

A partir dessa legislação, estabelecem-se critérios para a classificação das propriedades, limites para aquisição por pessoas físicas e jurídicas, bem como ferramenta jurídica para a sua desapropriação, em sede de interesse social, quando ocorra situações de descumprimento da função social (SILVA, 2019).

Portanto, a propriedade rural no Brasil não pode ser analisada apenas sob a ótica patrimonialista, haja vista que sua compreensão exige uma leitura integrada entre o direito civil, o direito agrário e os princípios constitucionais, especialmente aqueles ligados à dignidade da pessoa humana, à função social da terra e à sustentabilidade.

Tais fundamentos estabelecem as bases para a atuação estatal na arrecadação e destinação de terras públicas, bem como para a legitimação de ocupações consolidadas, tendo como objetivo final a promoção da justiça fundiária e o desenvolvimento rural sustentável.

No Estado do Tocantins, antigo norte Goiano, o Decreto-Lei n° 1.164/71 teve impacto direto sobre áreas marginais à BR-153 (Belém-Brasília). O dispositivo declarava indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacional as terras devolutas situadas em faixa de cem quilômetros de largura em cada lado do eixo das rodovias da Amazônia Legal (BRASIL, 1971).

Contudo, como observa Bugano e Lippi (2020) sua aplicação não implicou em desapropriação sumária, mas sim na incorporação dessas terras ao domínio da União, gerando disputas dominicais com o Estado de Goiás e, posteriormente, com o Tocantins após sua criação em 1988.

A prática de arrecadação sumária no Tocantins foi marcada por conflitos jurídicos prolongados. Segundo Marques (2015),a ausência de desapropriação sumária automática na implantação do decreto resultou em insegurança jurídica e em ações cíveis originárias que se estenderem até o século XXI, envolvendo a definição da titularidade das terras devolutas e a regularização fundiária.

Embora o decreto tenha sido revogado pelo Decreto-Lei n°2.375/1987, seu legado permanece como um dos principais pontos de debate sobre a destinação das terras públicas na região, evidenciando a tensão entre União e Estado na gestão fundiária (MARQUES, 2015).

3 PROCEDIMENTO DA ARRECADAÇÃO SUMÁRIA

A arrecadação sumária, prevista no artigo 28 da Lei nº 6.383/1976, é instrumento de aquisição originária da propriedade pública, dispensando processo judicial quando não houver oposição ou reivindicação de terceiros (BRASIL, 1976; MIRANDA; PASSOS JÚNIOR, 2023).

No contexto do Tocantins, a atuação do Grupo Executivo das Terras do Araguaia Tocantins (GETAT) evidenciou tanto o potencial regularizador dessa medida quanto seus riscos. Conforme analisado por Miranda e Passos Júnior (2023), a prática administrativa, em diversas ocasiões, desconsiderou situações jurídicas consolidadas, resultando em conflitos fundiários e insegurança possessória.

Além disso, a dualidade entre os registros federais e estaduais contribuiu para a sobreposição de títulos, expondo a fragilidade institucional na condução da política fundiária regional. A partir disso, torna-se necessário reavaliar o uso da arrecadação sumária à luz dos princípios constitucionais da função social da propriedade e do devido processo legal, especialmente em áreas com ocupações consolidadas há décadas (MIRANDA; PASSOS JÚNIOR, 2023).

A arrecadação sumária é um instituto jurídico, de manejo em âmbito administrativo, por meio do qual o Estado incorpora ao seu patrimônio terras presumivelmente devolutas, com vistas à sua destinação pública, especialmente para fins de reforma agrária, regularização fundiária, ou outras políticas de interesse coletivo (MIRANDA; PASSOS JÚNIOR, 2023).

Trata-se de mecanismos de aquisição originária da propriedade, fundado no exercício da função administrativa de polícia do domínio público, mediante processo administrativo simplificado, nos termos da legislação vigente (MIRANDA; PASSOS JÚNIOR, 2023).

No ordenamento jurídico brasileiro, a arrecadação de terras devolutas encontra respaldo no Decreto-Lei nº 9.760/1946, que regula os bens imóveis da União, e na Lei nº 6.383/1976, que trata do procedimento de discriminação e arrecadação das terras situadas nas faixas de fronteira (BRASIL, 1946; 1976).

Em complemento, o Código Civil de 2002, em seu artigo 1.228, §4º, estabelece que a propriedade se extingue quando abandonada, hipótese que também pode dar ensejo à arrecadação administrativa (BRASIL, 2002; MARQUES, 2015).

Na década de 1980, foi promulgado o Decreto-Lei nº 1.767/80, que estabeleceu o Grupo Executivo das Terras do Araguaia-Tocantins (GETAT). O objetivo desse grupo era garantir a regularização fundiária no Sudeste do Pará, Norte de Goiás e Oeste do Maranhão, regiões de competência da Coordenadoria Especial do Araguaia-Tocantins, criada de acordo com o artigo 1º do Decreto-Lei nº 1.523/77 (BRASIL, 1977; 1980; MIRANDA; PASSOS JÚNIOR, 2023).

Após o transcurso de mais de 10 anos, foi editado o Decreto-Lei nº 2.375/87, que revogou o referido Decreto-lei 1.164/71 e deixou de considerar indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacional a grande maioria das terras públicas devolutas a que se referia o ato normativo revogado (BRASIL, 1987).

Verificou-se, ademais, que algumas arrecadações sumárias promovidas pelo GETAT, com base no artigo 28 da Lei nº 6.383/76, deixaram de observar as exceções relativas às situações jurídicas constituídas, as quais deveriam ser reconhecidas e submetidas a processo de regularização pelo INCRA (MIRANDA; PASSOS JÚNIOR, 2023).

Após a extinção do GETAT, em 5 de maio de 1987, por meio do Decreto-Lei nº 2.328, o destino jurídico das terras arrecadadas pela União passou a suscitar questionamentos, sobretudo quanto à possibilidade de sua transferência ao domínio estadual para fins de gestão e destinação fundiária (BRASIL, 1987; COSTA NETO, 2023).

Neste contexto, ganhou relevância a discussão jurídica em torno da doação de terras arrecadadas pela União aos Estados, especialmente à luz do artigo 2º, §2º, da Lei nº 6.383/1976, que trata da discriminação e arrecadação de terras devolutas federais. Tal dispositivo permite que terras já incorporadas ao patrimônio da União sejam destinadas a outros entes federativos, inclusive mediante doação com encargos ou cláusulas de reversão, como forma de viabilizar políticas descentralizadas de reforma agrária e regularização fundiária (COSTA NETO, 2023).

A proposta, defendida por Costa Neto (2023), parte da premissa de que a gestão territorial deve atender aos princípios da eficiência, da função social da terra e da descentralização administrativa, previstos na Constituição Federal.

Nesse sentido, o Estado do Tocantins, enquanto ente federado, poderia dispor de instrumentos jurídicos e administrativos mais ágeis para promover a regularização de imóveis rurais, desde que lhe sejam atribuídas as competências dominiais sobre as glebas arrecadadas (COSTA NETO, 2023).

Importante destacar que, embora o artigo analisado não trate diretamente da arrecadação sumária como forma de aquisição originária pelo Estado, sua argumentação aponta para a viabilidade jurídica de transferência prévia da titularidade fundiária da União para o Estado. Uma vez transferidas, tais áreas poderiam ser objeto de políticas públicas estaduais de destinação, incluindo procedimentos simplificados de incorporação, regularização e titulação (COSTA NETO, 2023).

Assim, a análise jurídica propõe uma articulação federativa no tratamento das terras devolutas, reconhecendo que a descentralização do domínio pode ser um passo estratégico para a efetivação do direito à terra e à propriedade rural dentro dos limites constitucionais e legais (COSTA NETO, 2023).

4 CONCLUSÃO

A análise da arrecadação sumária de terras devolutas no Estado do Tocantins permitiu identificar que esse instituto jurídico, embora previsto há décadas na legislação brasileira, continua sendo um dos mecanismos mais controversos e sensíveis no âmbito da regularização fundiária nacional.

Seu caráter de aquisição originaria que decorre da própria presunção de domínio público em áreas sem legítima titulação particular, revela um instrumento que, em tese, possibilita ao Estado exercer sua prerrogativa administrativa de forma célere, assegurando a destinação social das terras públicas.

Entretanto, verificou-se que essa celeridade não pode ocorrer em detrimento das garantias constitucionais dos possuidores, uma vez que a ausência de controle, transparência e contraditório pode levar ao agravamento de conflitos agrários, sobretudo em regiões historicamente marcadas pela ocupação tradicional, como o Tocantins.

Os estudos doutrinários e jurisprudenciais demonstraram que, embora a arrecadação sumária seja reconhecida como forma originária de aquisição, sua implementação depende da comprovação inequívoca da natureza devoluta da área. A mera ausência de registro imobiliário, apesar de ser elemento relevante, não pode ser considerada prova absoluta, exigindo investigação técnica e jurídica adequada.

A atuação estatal, portanto, deve ser equilibrada, evitando que o instrumento administrativo seja utilizado como meio automático de esvaziamento de posses legítimas, sobretudo diante das realidades fundiárias da Amazônia legal e do antigo norte goiano.

A investigação histórica demonstrou que a criação do Tocantins, a extinção do GETAT e a sobreposição de atos normativos federais e estaduais constituíram elementos fundamentais para a formação do cenário atual de insegurança fundiária.

O Decreto-Lei n° 1.164/197, ao declarar indispensáveis à segurança nacional amplas faixas de terras da Amazônia Legal, e sua posterior revogação pelo Decreto-Lei n° 2.375/1987, produziram efeitos jurídicos que impactaram diretamente na dinâmica dominial da região, gerando dúvidas quando à titularidade de extensas áreas e contribuindo para o acúmulo de conflitos.

A ausência de políticas contínuas e coordenadas entre a União e Estado após a extinção do GETAT reforçou ainda mais esse quadro, conforme demonstram as pesquisas consultadas.

Nesse contexto, a doação de terras federais arrecadas aos Estados, prevista no artigo 2°, § 2º, da Lei n° 6.383/1976, revela uma alternativa constitucional e eficiente para a descentralização do domínio e para a superação das lacunas administrativas que historicamente prejudicam a regularização fundiária no Tocantins.

A transferência de titularidade para o ente estadual possibilita maior proximidade com as realidades locais, maior capacidade técnica de fiscalização territorial e maior eficácia na implementação de políticas fundiárias, sobretudo aquelas orientadas pelos princípios da função social e da sustentabilidade ambiental.

A partir da análise desenvolvida ao longo deste estudo, conclui-se que a arrecadação sumária deve ser compreendida não apenas como um mecanismo jurídico de afirmação da dominialidade estatal, mas como um instrumento estratégico para promoção da justiça agrária, desde que aplicado com rigor normativo, avaliação técnica adequada e respeito as garantias fundamentais dos ocupantes.

Sua legitimidade depende de uma atuação administrativa pautada na transparência, na boa-fé, na eficiência e na observância da realidade social das comunidades rurais que ocupam essas áreas há décadas, muitas vezes prestando função socioambiental relevante.

Dessa forma, ao responder à questão central deste artigo, notadamente se a arrecadação sumária pode ser considerada forma originaria de aquisição da propriedade e quais suas implicações para a segurança da posse, conclui-se que sim.

Trata-se, pois, de forma originária de aquisição pelo Estado, mas sua efetividade está condicionada ao cumprimento rigoroso do devido processo legal e à existência de elementos probatórios consistentes sobre a natureza devoluta do imóvel.

Quanto às implicações possessórias, observou-se que a atuação estatal deve harmonizar o interesse público com os direitos dos ocupantes de boa-fé, garantindo mecanismos de defesa e evitando arbitrariedades.

Por sim, destaca-se que a consolidação de um ambiente fundiário seguro no Tocantins depende da construção de políticas públicas contínuas, técnicas e integradas entre União, Estado e Municípios, capazes de fortalecer a governança territorial, prevenir conflitos, assegurar o desenvolvimento rural sustentável e promovei a regularização fundiária plena.

A arrecadação sumária, quando aplicada de forma responsável, torna-se não apenas um mecanismo de incorporação patrimonial, mas um instrumento de transformação social e de concretização dos princípios constitucionais que regem a ordem agraria brasileira.

REFERÊNCIAS

BRAGA, James da Silva; SOUSA, Gabriela Pitombeira. O PROCESSO DE ARRECADAÇÃO DAS TERRAS DEVOLUTAS DA UNIÃO NO LUGAR DENOMINADO “GLEBA BOA ESPERANÇA ITAPARICA”. Facit Business and Technology Journal, v. 2, n. 36, 2022.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 27 ago. 2025.

BRASIL. Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946. Dispõe sôbre os bens imóveis da União e dá outras providências. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, DF, 5 set. 1946. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del9760.htm. Acesso em: 17 ago. 2025.

BRASIL. Decreto-Lei nº 1.164, de 1º de abril de 1971. Declara indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacionais terras devolutas situadas na faixa de cem quilômetros de largura em cada lado do eixo de rodovias na Amazônia Legal, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1 abr. 1971. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del1164.htm. Acesso em: 16 jun. 2025.

BRASIL. Decreto-Lei nº 1.523, de 3 de fevereiro de 1977. Autoriza a criação de Coordenadorias Especiais no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária nas condições que especifica, dispõe sobre a retribuição do respectivo pessoal e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 3 fev. 1977. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1965-1988/del1523.htm. Acesso em: 10 ago. 2025.

BRASIL. Decreto-Lei nº 1.767, de 1º de fevereiro de 1980. Cria grupo executivo para regularização fundiária no Sudeste do Pará, Norte de Goiás e Oeste do Maranhão, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1 fev. 1980. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1965-1988/del1767.htm. Acesso em: 10 ago. 2025.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.328, de 5 de maio de 1987. Extingue o Grupo Executivo das Terras do Araguaia-Tocantins – GETAT, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 6 mai. 1987. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1965-1988/Del2328.htm. Acesso em: 10 ago. 2025.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.375, de 24 de novembro de 1987. Revoga o Decreto-Lei n° 1.164, de 01 de abril de 1971, dispõe sobre terras públicas e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 nov. 1987. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2375.htm. Acesso em: 17 ago. 2025.

BRASIL. Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964. Dispõe sobre o Estatuto da Terra e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 30 nov. 1964. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4504.htm. Acesso em: 06 set. 2025.

BRASIL. Lei nº 6.383, de 07 de dezembro de 1976. Dispõe sobre o Processo Discriminatório de Terras Devolutas da União, e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 9 dez. 1976. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6383.htm. Acesso em: 06 set. 2025.

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 11 jan. 2002.Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 06 set. 2025.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Civil Ordinária (ACO) 478. Relator: Min. Dias Toffoli. Julgamento em 05 de agosto de 2015. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, DF, 17 de agosto de 2015. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=1608434. Acesso em: 7 ago. 2025.

BUGANO, Karen Cristina; LIPPI, Roger Rodrigues. Regularização fundiária: a disputa dominical entre União e Estado do Tocantins. Conteúdo Jurídico, Brasília, DF, 2020.

COSTA NETO, Antônio Ribeiro. Doação de terras devolutas pela União aos Estados, e o caso do Tocantins. Coluna do CT – Cleber Toledo, Palmas, 2023.

MARQUES, Benedito Ferreira. Direito Agrário Brasileiro. 12. ed. Goiânia: Editora da UFG, 2015.

MIRANDA, Nathary Lino; PASSOS JÚNIOR, Edy César dos. A arrecadação sumária de terras devolutas da União promovida pelo Grupo Executivo das Terras do Araguaia Tocantins: aspectos controvertidos. Revista Cognitio Juris, v. 22, n. 4, p. 1–22, 2023.


[1] Graduando em Direito pela Faculdade Serra do Carmo – FASEC. E-mail: cursodireitofasec@gmail.com

[2] Professor na Faculdade Serra do Carmo – Fasec, da disciplina de Direito Tributário e Direito Administrativo, no curso de Bacharelado em Direito. Especialista em Direito Processual Civil, graduado em Direito pela Universidade Federal do Tocantins UFT/Palmas/TO. Servidor Público Federal da Seção Judiciária do Estado do Tocantins – Justiça Federal da 1ª Região. E-mail: jefferson.franco.silva@gmail.com.