A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO ADMINISTRADOR

A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO ADMINISTRADOR

5 de dezembro de 2025 Off Por Cognitio Juris

THE TAX RESPONSIBILITY OF THE MANAGING PARTNER

Artigo submetido em 03 de dezembro de 2025
Artigo aprovado em 05 de dezembro de 2025
Artigo publicado em 05 de dezembro de 2025

Cognitio Juris
Volume 15 – Número 58 – 2025
ISSN 2236-3009
Autor(es):
Keilla Carol Wilbert[1]
Jefferson Franco Silva [2]

RESUMO: O presente estudo se dedica a analisar a responsabilidade tributária do sócio administrador sob a perspectiva do ordenamento jurídico brasileiro, com atenção especial aos artigos 128 e 135, III, do Código Tributário Nacional. A pesquisa se baseia em observar de que forma se aplicam esses dispositivos nas esferas administrativa e judicial, tendo em vista a constatação de divergências interpretativas que causam insegurança no mundo jurídico. O método de abordagem utilizado é qualitativo e de caráter bibliográfico e jurisprudencial, com foco na legislação e nas decisões do Superior Tribunal de Justiça. Em conclusão, verificou-se que, apesar da Súmula 430 do STJ afirmar que o simples fato de não pagar impostos não torna o sócio pessoalmente responsável, a Súmula 435 presume que a empresa foi fechada de forma irregular, o que pode levar ao redirecionamento da execução fiscal. Essa dualidade demonstra a importância de seguir rigorosamente os requisitos legais e constitucionais para evitar que a responsabilização ocorra de forma automática e injusta. É necessário que haja equilíbrio entre a efetividade fiscal e a proteção dos direitos individuais, tendo sempre como base os princípios da legalidade e da segurança jurídica.

Palavras-chave: Responsabilidade tributária; Sócio administrador; Redirecionamento da execução fiscal.

ABSTRACT: This study is dedicated to analyzing the tax liability of the managing partner from the perspective of the Brazilian legal system, with special attention to articles 128 and 135, III, of the National Tax Code. The research is based on observing how these provisions are applied in the administrative and judicial spheres, in view of the verification of interpretative divergences that cause insecurity in the legal world. The method of approach used is qualitative and of a bibliographic and jurisprudential nature, focusing on legislation and decisions of the Superior Court of Justice. In conclusion, it was found that, although Precedent 430 of the STJ states that the mere fact of not paying taxes does not make the partner personally liable, Precedent 435 presumes that the company was closed irregularly, which can lead to the redirection of the tax foreclosure. This duality demonstrates the importance of strictly following legal and constitutional requirements to prevent accountability from occurring automatically and unfairly. It is necessary to balance fiscal effectiveness and the protection of individual rights, always based on the principles of legality and legal certainty.

Keywords: Tax liability; Managing partner; Redirection of tax enforcement.

1 INTRODUÇÃO

No meio jurídico brasileiro, a responsabilidade tributária do sócio administrador tem suscitado uma série de debates, sobretudo por se tratar de tema bastante complexo, cuja regulamentação apresenta lacunas de interpretação e demanda contínuo aprimoramento teórico e jurídico.

A aplicação dos dispositivos legais que tratam do redirecionamento da execução fiscal aos sócios das pessoas jurídicas, especialmente os artigos 128 e 135 do Código Tributário Nacional (CTN), exige não apenas uma interpretação literal da norma, mas também uma análise jurisprudencial do que vem sendo decidido.

O ordenamento jurídico nacional condiciona a responsabilização pessoal dos administradores à comprovação da prática de atos com excesso de poderes ou em infração à lei, contrato social ou estatuto, conforme preconiza o art. 135 do CTN.

Contudo, observa-se que, na prática, a atuação do Fisco e mesmo decisões judiciais, por vezes, desconsideram esses pressupostos legais, imputando a responsabilidade de forma automática ou com base em presunções, como no caso da dissolução irregular da empresa, prevista na Súmula 435 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Tais situações geram impactos negativos quanto à segurança jurídica e à proteção dos direitos de terceiros.

Neste contexto, a jurisprudência do STJ tem desempenhado papel central na uniformização das interpretações envolvendo a responsabilidade tributária do sócio administrador, buscando consolidar o entendimento quanto aos critérios legais exigidos para a sua adequação.

Ainda assim, persistem divergências interpretativas relevantes, sobretudo em relação ao momento em que o redirecionamento é admitido, à distribuição do ônus da prova e à validade da inclusão do nome do sócio na Certidão de Dívida Ativa sem prévio processo administrativo.

Este estudo tem como principal objetivo a investigação das regras e entendimentos jurisprudenciais que envolvem a obrigação do sócio em relação aos tributos gerados pela empresa no Brasil, com foco nas decisões mais recentes de Tribunal Superior, motivo pelo qual se pretende, por meio desse estudo, demonstrar os principais pontos de conflito e suas implicações concretas, que afetam a terceiros e comprometem a real proteção judicial em matéria tributária.

2 RESPONSABILIZAÇÃO TRIBUTÁRIA DO SÓCIO ADMINISTRADOR NO BRASIL

Conforme disposto no artigo 128 do Código Tributário Nacional (CTN), admite-se a possibilidade de responsabilizar terceira pessoa pelos créditos tributários, desde que ela esteja vinculada ao fato que gerou a obrigação correspondente, podendo essa atribuição excluir a responsabilidade do contribuinte ou ser conferida a ele apenas de maneira supletiva (BRASIL, 1966).

No que concerne à responsabilidade de diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas, o artigo 135, inciso III do CTN estabelece que esses serão responsabilizados pessoalmente pelos créditos tributários decorrentes das obrigações assumidas, desde que os atos praticados contenham excesso de poderes ou sejam realizados de modo a infringir à lei, contrato social ou estatutos (BRASIL, 1966).

Conforme se depreende, há uma necessidade de se verificar, inicialmente, se a atuação dos diretores, gerentes ou representantes das pessoas jurídicas foi realizada com excesso de poderes, e definir também o que é, legalmente, esse excesso no âmbito do exercício da administração de uma pessoa jurídica.

Conforme Sabbag (2024, p. 924):

I. Excesso de poderes: o terceiro age por conta própria, além dos poderes que a norma legal, contratual ou estatutária lhe confere, ou seja, subvertendo as atribuições que lhe foram outorgadas. Diferentemente das hipóteses de omissão do art. 134, neste artigo temos nítido comportamento comissivo. Exemplo: diretor de sociedade que adquire um bem imóvel sabendo-se que, pelo estatuto social, estava impedido de fazê-lo sem a anuência de todos os sócios. A dívida de ITBI, desse modo, recairá pessoalmente sobre ele;

II. Infração de lei, contrato social ou estatutos: é importante enfatizar que o descumprimento da obrigação tributária principal (não pagamento do tributo), sem dolo ou fraude, apenas representa mora da empresa, e não “infração legal” deflagradora da responsabilidade pessoal. É imprescindível para a responsabilização pessoal a atuação dolosa do gerente ou diretor, devendo ser cabalmente provada. O não pagamento, isoladamente analisado, é “mera presunção” de infração à lei pelo gestor da pessoa jurídica. Ademais, a infração a que se refere o art. 135 é subjetiva (e não “objetiva”), portanto, dolosa, e é sabido que o dolo não se presume.

Constata-se, portanto, a necessidade de se existir uma conduta dolosa para a configuração da infração às normas, não sendo aceito o mero descumprimento da obrigação tributária como fator determinante de responsabilização pessoal do sócio administrador.

Reforçando esse entendimento, Nunes, Gomes e Farias (2020, p. 16) analisam o tema da responsabilidade tributária sob a Teoria do Fato Jurídico, afirmando que a incidência do dispositivo do CTN somente ocorre quando configurado um “fato jurídico lato sensu, ilícito, relativo, da categoria ato ilícito civil e indenizatório”.

Em outras palavras, significa dizer que o dolo e a má-fé no momento do descumprimento de lei, contrato social ou estatuto, constituem elementos essenciais para tornar responsável pessoal o administrador, sendo insuficiente a notícia de qualquer inadimplemento, sem conduta intencional e contrária ao direito. Vale ressaltar que a finalidade do dispositivo legal é proteger o interesse público na arrecadação e não punir automaticamente o sócio responsável (NUNES, GOMES e FARIAS, 2020).

Corroborando a exigência estabelecida no art. 135, inciso III do CTN, quanto à necessidade de dolo para transferência das responsabilidades ao sócio administrador, foi fixada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio da súmula 430, a orientação segundo a qual “o inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente” (BRASIL, 2010).

A ideia central é impedir que haja responsabilização automática, resultado do que seria a inobservância da conduta dolosa, fraudulenta ou com excesso de poderes pelo gerente ou diretor da sociedade.

Por outro lado, há entendimento do mesmo STJ, na súmula 435 de 2010, que trata da presunção de dissolução irregular e responsabilização pelo administrador sempre que a empresa interromper suas atividades no domicílio fiscal sem a devida notificação prévia aos órgãos competentes (BRASIL, 2010).

Essa aplicação presumida e objetiva da responsabilidade desperta divergência entre pesquisadores da área, como Calcini e Cruz (2019) e Pazinato e Hippertt (2018), que consideram que a presunção contraria diretamente a previsão estabelecida no CTN.

Para Calcini e Cruz (2019, p. 18):

A responsabilização do sócio com base na malsinada Súmula não encontra amparo na legislação tributária em vigor, nem, muito menos, na Constituição Federal. Trata-se, a bem da verdade, de uma nova hipótese de responsabilidade instituída sem amparo na norma complementar, em completo desrespeito ao disposto no art. 146, inciso III, alínea ‘b’ da Carta Republicana de 1988. E por assim dizer, a dissolução irregular da empresa não enseja o redirecionamento do sócio administrador por força de eventual dissolução da empresa por carecer de norma jurídica autorizadora.

No mesmo sentido entendem Pazinato e Hippertt (2018) ao apontarem que a responsabilização de forma automática importa em afronta aos princípios constitucionais, especialmente o devido processo legal e a não surpresa, uma vez que o redirecionamento da execução fiscal ao sócio, sem a devida apuração prévia de sua conduta, configura violação à garantia do contraditório e da ampla defesa.

Ademais, tal prática, ao presumir a responsabilidade do administrador pela simples ausência de notificação da interrupção das atividades da empresa, revela-se incompatível com os critérios exigidos pelo artigo 135, inciso III, do CTN, quais sejam o excesso de poder e o descumprimento da lei, contrato social ou estatuto.

Nesse cenário, por mais que se reconheça algum avanço na interpretação jurisprudencial relacionada ao tema da responsabilidade tributária, ainda persiste certa controvérsia na aplicação da norma, sobretudo quando se admite a responsabilização de forma genérica e desprovida de fundamento concreto.

Como bem destaca Renan Wanderley Santos Melo (2013, p. 34):

Apesar de a jurisprudência ter evoluído muito no que concerne à interpretação do dispositivo em questão, ainda há muito o que evoluir para que os direitos do contribuinte não sejam desrespeitados pelo Fisco, já que este tem se aproveitado desta exceção prevista no Código Tributário Nacional para responsabilizar o sócio indistintamente, sem obedecer às normas da legislação tributária e societária.

De modo geral, o rigor na análise sobre a responsabilização do sócio administrador pelos créditos tributárias da pessoa jurídica é necessário e a não observação dos parâmetros legais e constitucionais podem implicar em decisões distorcidas, que colocam em jogo a segurança jurídica e a confiança legítima do contribuinte perante o Estado.

Em razão da complexidade interpretativa que envolve os dispositivos legais e as divergências doutrinárias frente às lacunas existentes, mostra-se imprescindível examinar como o Poder Judiciário, em especial o Superior Tribunal de Justiça, tem se posicionado diante de casos concretos.

A seguir, será apresentada uma análise jurisprudencial detalhada sobre a aplicação do art. 135, III, do CTN, evidenciando as principais linhas de entendimento formadas nos últimos anos.

3 DESDOBRAMENTOS JURISPRUDENCIAIS NA APLICAÇÃO DO ART. 135, III, DO CTN PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Como observa Renan Wanderley Santos Melo (2013, p. 40), a jurisprudência tem passado por um processo de evolução interpretativa ao longo dos anos, especialmente no que se refere à aplicação do art. 135, III do CTN. Tal mudança é justificada pela necessidade de se estabelecer uniformidade nas decisões que tratam da responsabilidade tributária do sócio administrador.

No entanto, ainda é possível identificar nuances relacionadas ao momento da dissolução irregular que, embora não representem uma divergência frontal sobre a tese principal, geram debates significativos na aplicação do direito em casos concretos.

É nesse contexto que se insere o Agravo em Recurso Especial (AgRg no AREsp 647563/PE), de relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Vejamos:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. A CORTE DE ORIGEM AFIRMOU QUE O CONSELHEIRO ADMINISTRATIVO, CONTRA O QUAL SE PRETENDE REDIRECIONAR A EXECUÇÃO FISCAL, NÃO EXERCIA EFETIVAMENTE O CARGO DE GERÊNCIA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA À ÉPOCA DO FATO GERADOR DO PEDIDO DE REDIRECIONAMENTO, O QUE AFASTA O REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL AO CASO CONCRETO. AGRAVO REGIMENTAL DA COMISSAO DE VALORES MOBILIARIOS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. A Súmula 435 do STJ diz que se presume dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente.

2. Porém, para a admissão do redirecionamento da execução fiscal é imprescindível que o sócio-gerente a quem se pretenda redirecionar a exigência tributária tenha exercido, efetivamente, a função de gerência no momento dos fatos geradores do tributo e/ou da dissolução irregular da empresa executada; sem essa verificação, a regra do art. 135 do CTN passaria a configurar casos de responsabilidade objetiva, quando se sabe que, de acordo com a matriz de sua interpretação, as situações prefiguradas neste dispositivo tributário codificado se dirigem à contemplação de situações infracionais nas quais se requer a apuração de conduta infratora da parte do agente.

3. Agravo Regimental da COMISSAO DE VALORES MOBILIARIOS a que se nega provimento.

(AgRg no AREsp n. 647.563/PE, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 11/11/2020, DJe de 17/11/2020.)

Nesse mesmo sentido o Ministro Paulo Sérgio Domingues julgou Agravo Interno no Recurso Especial (AgInt no REsp 1.538.914/RS), ao reiterar que o redirecionamento da execução fiscal não pode ocorrer de forma automática, utilizando como base apenas a presunção de dissolução irregular da empresa.

Reforçou-se o entendimento de que é indispensável a comprovação de que o sócio contra quem se pretende redirecionar a cobrança exercia efetivamente poderes de gerência à época dos fatos geradores ou da dissolução, além da demonstração de conduta com excesso de poderes, infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos, conforme exige o art. 135, III, do CTN.

Destaca-se que ambas as decisões levam em conta o Tema Repetitivo nº 962 julgado em 2021 pelo STJ, com o propósito de uniformizar o entendimento acerca de uma matéria que anteriormente resultava em decisões conflitantes entre as turmas.

Contudo, embora se trate de um assunto relativamente consolidado, sua análise permanece frequente na prática jurisdicional, haja vista a necessidade de exame detalhado acerca do período em que o sócio administrador efetivamente exerceu suas funções, a fim de atribuir a responsabilidade tributária em conformidade às regras previstas na legislação.

Outro ponto de constante debate jurisprudencial refere-se à distribuição do ônus da prova no redirecionamento da execução fiscal, especialmente no que tange à presunção de legitimidade da Certidão de Dívida Ativa (CDA).

Quando o nome do sócio administrador já consta na CDA, prevalece o entendimento de que se opera uma inversão do ônus da prova, cabendo ao sócio demonstrar a inexistência de atos praticados com excesso de poderes, infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa, conforme dispõe o art. 135, III, do Código Tributário Nacional (BRASIL, 1966).

Nessa hipótese, o título executivo extrajudicial goza de presunção relativa de veracidade, impondo ao executado o encargo de demonstrar, por meio de prova adequada, a inexistência dos elementos que resultariam a sua responsabilização.

A fim de exemplificar o que se expõe, menciona-se o seguinte julgado, de relatoria do Ministro Afrânio Vilela:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. ART. 135 DO CTN. ÔNUS DA PROVA. NOME DO GESTOR NA CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. CONSONÂNCIA DO ACÓRDÃO RECORRIDO COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 568 DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

1. O entendimento alcançado no acórdão impugnado converge com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que entende ser do sócio gestor, quando seu nome constar na CDA, o ônus da prova em relação à ausência de circunstâncias previstas no art. 135 do CTN.

Precedentes.

2. Agravo interno improvido.

(AgInt no AREsp n. 2.643.132/SE, relator Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em 30/4/2025, DJEN de 7/5/2025.)

Em contrapartida a essa situação, nos casos em que o nome do sócio não figura inicialmente na CDA, a Fazenda Pública, parte exequente, deve demonstrar, através de provas adequadas, a presença dos requisitos legais indispensáveis ao redirecionamento da execução, sobretudo quanto à efetiva gerência à época dos fatos e à ocorrência de conduta ilícita, conforme o art. 135, III do CTN.

Este posicionamento foi reafirmado pelo Superior Tribunal de Justiça em Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial (AgInt no AREsp 913.417/MT), ao concluir que na hipótese de ausência do nome do sócio na Certidão de Dívida Ativa, o ônus da prova quanto à prática de conduta dolosa, fraudulenta ou com excesso de poderes recai sobre a parte exequente.

Seguindo essa lógica, é imperioso também mencionar o risco de se incluir o nome do sócio administrador na Certidão de Dívida Ativa, sem que haja antes a instauração de um processo administrativo que possibilite o direito à ampla defesa.

Para Pimenta e Figueiredo (2017, p. 17), o entendimento do STJ quanto à presunção de legitimidade da CDA é passível de objeção, uma vez que em futura execução fiscal, a discussão se torna extremamente gravosa e onerosa ao sócio executado, que terá o ônus de demonstrar a inexistência de vínculo direto com a infração imputada.

Outrossim, em grande parte dos casos, tal situação somente pode ser contestada por meio de embargos à execução fiscal, os quais exigem garantia do juízo, sendo medida excepcional a manifestação por meio de exceção de pré-executividade, pois essa só pode ser conhecida quando da desnecessidade de dilação probatória, conforme entendimento já consolidado pelo STJ em sede de recurso repetitivo (PIMENTA e FIGUEIREDO, 2017).

Diante desse quadro, fica clara a complexidade que envolve o tema em questão, o qual exige um olhar atento e constante sobre as decisões do STJ, principalmente para entender os detalhes que podem influenciar a sua responsabilidade a depender da situação. A ausência de uniformidade do procedimento a ser adotado por parte da administração tributária e a flexibilização das garantias processuais mínimas acentuam a insegurança jurídica enfrentada pelas partes envolvidas.

Dessa forma, pode-se deduzir que a responsabilização do sócio administrador não pode ser presumida ou aplicada de forma automática. Ao contrário, deve haver um procedimento administrativo formal que assegure a participação do terceiro, com vistas à preservação das garantias processuais essenciais.

Somente mediante a observância rigorosa dos requisitos legais previstos no Código Tributário Nacional, bem como com o respaldo das decisões reiteradas do STJ, é que se poderá legitimar a inclusão de terceiros como responsáveis tributários, sob pena de se colocar em desordem o sistema jurídico tributário do país.

4 CONCLUSÃO

Ao analisar a responsabilidade tributária do sócio administrador sob a ótica do ordenamento jurídico brasileiro, especialmente à luz dos artigos 128 e 135, III, do CTN, reforça-se a necessidade de efetividade fiscal e a observância dos princípios da legalidade e da segurança jurídica para garantir a manutenção do equilíbrio entre a arrecadação estatal e a proteção dos direitos individuais dos contribuintes.

O Código Tributário Nacional, ao condicionar a responsabilização pessoal do sócio administrador ao ato por ele realizado com excesso de poderes ou infração a lei, contrato social ou estatutos, visa a sua proteção patrimonial diante de execução fiscal sofrida pela empresa a qual representa, evitando-se um possível redirecionamento sem justa motivação. Nesse contexto, a ideia do legislador se firma em estabelecer limites claros a todo esse processo, promovendo a estabilidade e previsibilidade jurídica.

Todavia, a prática administrativa e jurisprudencial demonstra que tais parâmetros nem sempre são observados. Embora a Súmula 430 do Superior Tribunal de Justiça reforce esse entendimento, ao afirmar que o mero inadimplemento da obrigação tributária não é suficiente para a responsabilização do sócio administrador, nota-se que a aplicação da Súmula 435 do STJ não segue a mesma coerência interpretativa, já que traz a possibilidade de redirecionamento da execução fiscal ao sócio administrador se presumida a dissolução irregular da empresa.

Diante desse contexto, verifica-se que embora haja um avanço no sentido de exigir a efetiva comprovação da gerência e da prática ilícita para que se redirecione um processo de execução fiscal, ainda persistem contradições que fragilizam a uniformidade e a previsibilidade do sistema, causando insegurança jurídica. 

Portanto, conclui-se que para que o redirecionamento da execução fiscal ocorra da maneira mais adequada, é indispensável observar estritamente os requisitos legais e constitucionais, para combater interpretações amplas que excedem os limites estabelecidos pelo legislador.

A implantação de critérios claros e o zelo na produção das provas são ações fundamentais para coibir atribuição de responsabilidade de forma automática ou injusta, garantindo um equilíbrio efetivo entre o poder de arrecadação do Estado e a proteção daqueles administradores que agem de boa-fé.

Sob esse cuidado e aliado ao contínuo amadurecimento doutrinário e jurisprudencial será possível fortalecer a justiça fiscal, a segurança jurídica e a credibilidade do sistema tributário, em harmonia com os valores que sustentam o Estado Democrático de Direito.

REFERÊNCIAS

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[1] Graduanda do Curso de Direito pela Faculdade Serra do Carmo – FASEC/TO.

[2] Professor na Faculdade Serra do Carmo – FASEC/TO, da disciplina de Direito Administrativo e Direito Tributário, no curso de Bacharelado em Direito. Especialista em Direito Processual Civil, graduado em Direito pela Universidade Federal do Tocantins UFT/Palmas/TO. Servidor Público Federal da Seção Judiciária do Estado do Tocantins – Justiça Federal da 1ª Região. E-mail: jefferson.franco.silva@gmail.com.